FIS01
INF Estas azenhas era o meu falecido pai que explorava. INQ1 Rhum-rhum. INF Eu (...) nunca fui moleira. Só unicamente fui ajudante do meu pai - não é? -, na altura própria, e depois fui servir. E casei. E de casar é que depois viemos morar para aqui para uma casa. E o meu pai entretanto faleceu num esbarramento (...) e eu tomei conta. Tomei conta aqui das azenhas e assim me habituei. E já estou aqui há quinze anos. INQ1 Rhum... Mas quantas são que a senhora tem? INF (...) São... Ora bem, em princípio eram duas azenhas: era esta (...) e aquela de cima. INQ1 ... INF Mas só que aquela já está avariada há sete anos. O patrão não quis arranjar, fiquei só com esta. Como agora também há... INQ1 Ah, porque o, o moinho não era do seu pai, era do patrão. INF Não, não. (...) Isto é arrendado. É do patrão. Isto depois foi um... INQ2 Mas a senhora andou a servir aonde, se não é indiscrição? Aqui perto? INF Ai eu andei a servir, fui para o Porto - tinha dez anos -, fui para o Porto e depois do Porto vim para Braga. E de Braga, casei. INQ2 Isso já foi há quanto tempo? INF Em Braga casei e agora já resido aqui. Não. Resido aqui há vinte anos. Só que ao fim de cinco anos que já morava cá, o meu falecido pai morreu - não é? -, e eu então vim tomar conta aqui destas azenhas, que eu morava (...) nas outras azenhas lá em cima (...) ali na ponte. INQ1 Rhum-rhum. INF E a minha mãe morava cá - não é? -, com o meu pai e depois ela disse-me: "Olha, eu não estou interessada em ficar (...) com as azenhas. Se quiseres vir cá para baixo, era-te melhor, porque a casa é melhor do que a de lá de cima", e tal. E sempre me animaram e eu aqui fiquei, não é? INQ1 Rhum-rhum. INF Tínhamos duas então a trabalhar, mas no princípio havia muito, muito que moer. Até tínhamos dois burritos - não é? -, chamávamos-lhe nós os begueiros... INQ1 Os?... INF Begueiros. INQ1 Eram os burros... INF Que é aqueles jumentos. Jumentos. Havia machos e havia jumentos. Só que no tempo já que o meu pai aqui estava, utilizava-se só (...) os jumentos. Os machos, (...) já não usava, não é? (...) E eu saía sempre duas vezes por dia e sempre com eles carregados. Sempre! E eu levava as moídas, trazia outras para baixo. Agora, ultimamente (...) o povo não coze. É. Coze pouquinho. E agora cozem só nos fogões de lenha, umas broinhas muito pequeninas e tal, e vão assim arremediando. E não se trabalha como se trabalhava - não era? -, antigamente. No meu tempo que eu comecei aqui, que eu morava então lá em cima, e vinha às seis horas da manhã, logo muito cedo pôr isto a moer; quando fosse dez horas, já saía com dois burros carregados. Uma vida difícil - não é? -, no princípio. Agora não. Agora mói-se pouquinho (...) . Ou como agora, está parado, não é? (...) INQ2 Mas ainda mói? INF Mas ainda môo, sim. Agora está parada porque, como o rio cresceu bastante, depois é um bocadinho difícil para a pejar e tal. E eu disse ao meu marido que deixasse estar assim (...) a azenha parada. (...) INQ1 O que é pejar? INF É ali fora. Ali fora, eu vou já explicar. (...) É: a roda que faz tanger esta é a roda de fora (...) da água, não é? Tem um pejeiro e a gente levanta para cima a água, (...) faz moer esta (...) , para pejar, quer dizer, para aparar, a gente (...) - chamamos-lhe nós - pejamos com aquele tal pejeiro. E prontos. E hoje então (...) não está a trabalhar, mas, se a quiser ver aí a trabalhar, também não é o caso (...) de ver. INQ1 Não, não é preciso. O que era moída que a senhora chamou? Que havia, ia buscar moídas ou?... INF Ah! Levavámos a farinha moída - não é? -, para cima, lá (...) para os fregueses e já trazíamos outras para baixo, outro grão para baixo - não é? -, para moer. E era assim isto, era todos os dias. Era os burros sempre carregados. INQ2 Portanto, as moídas era aquela porção de farinha que dava ao freguês? INF Esta farinha, por exemplo, chamamos nós aqui uma fornada - não é? -, esta fornada moída. A gente vai buscar o grão (...) ao freguês, chegamos a casa, aqui à azenha - não é? -, moemos e torna-se outra vez a levar, torna-se outra vez a trazer outras... INQ1 Dava-se algum nome a esses sacos que iam com o grão? INF Estes sacos, chamamos-lhe nós fornadas. É fornadas. Fornadas de grão e fornadas de farinha, não é? INQ1 Rhum-rhum. INF (...) Ou taleiga. Também há pessoas que lhe chamam (...) a taleiga. INQ1 Era a mesma coisa? INF É tudo a mesma coisa, não é? INQ1 Mas aqui era mais fornada do que taleiga? INF Sim, em geral (...) . Aqui nós utilizamos o termo de fornadas. Era fornadas abaixo... INQ2 E, e esse, e esta fornada ou taleiga tinha uma certa medida? INF Sim. Por exemplo, a pessoa (...) mede duas rasas. Antigamente, era por rasa; agora é a arroba - não é? -, é a arroba. Mas, em geral, era duas rasas, três rasas, conforme - não é? - (...) o freguês quisesse (...) ou (...) as pessoas... INQ2 Ah, não era medida certa? INF Não. Por exemplo, se era uma casa (...) de dez ou (...) cinco ou oito pessoas, já eram duas ou três rasas, porque antigamente cozia-se muito pão; agora uma casa que só tivesse três ou quatro pessoas, já era só uma rasa, não é? (...) INQ2 Pois claro. A fornada já era mais pequenina. INF Já era uma fornada mais pequenina, não é? E depois o centeio: havia quartos, havia meio quartos. Que é um meio quarto, que chamávamos-lhe a gente, eram dois quilos, agora; e um quarto eram quatro quilos; depois tem a meia rasa e tem a rasa. Ainda tenho a rasa e tenho a meia rasa. E maquieiros. Usava-se muito os maquieiros e os meios maquieiros, que era uma medidazinha quadrada (...) . Claro, (...) o meu pai... Eu, já não é do meu tempo, os maquieiros. Quer dizer, ainda os tenho, mas nunca vendi farinha a maquieiro nem a meio maquieiro. Mas o meu... "Ai, quero (...) meio maquieiro de farinha para a sopa" - não é? -, para o caldo. Então o meu pai enchia aquele meio maquieiro e custava um xis de dinheiro, não é? INQ2 Mas um maquieiro era quanto? Era o quarto da rasa ou era mais? INF Não, não. É pequenino. INQ2 Mais pequenino que as quartas? INF É muito pequenino! INQ1 Mas como é que chama? INF São (...) as medidas mínimas. INQ1 Pronto. INQ2 Ai é? INF Mínimas. INQ1 Mas como é que se chamava aquela quan-, quantidade de grão ou de farinha que a senhora tirava para si como paga? INF Ah! Por exemplo, depende (...) da fornada então que fosse. Por exemplo, agora... Eu, (...) no meu tempo já comecei a pesar, não é? Em vinte quilos de milho, eu tiro cinco quilos de maquia (...) de milho para mim, não é? INQ1 Muito bem. INF E lá levo outra vez ao cliente. Se for dez quilos, tiro dois quilos e meio. E depende - não é? -, da quantidade. Cinco quilos, tiro um quilo e um quarto ou um quilo. INQ1 Pois. INF Depende, não é? INQ1 Portanto, o maquieiro não tem nada a ver com a maquia? INF Não. O maquieiro... INQ1 Era outra medida? INF É. (...) São medidas, é. (...) INQ1 Era mais pequeno do que o meio quarto? INF Pois. Porque antigamente o meu pai fazia assim: tirava a maquia pelos maquieiros, INQ2 Pois. INF e pelo meio maquieiro - depende da fornada que fosse. INQ2 Claro. INF Mas já agora assim já há bastante tempo, INQ1 Mais para a frente. INF mas já mais (...) para a frente - não é? -, do tempo, da antiguidade, começou-se a pesar e a tirar por quilo (...) na própria fornada - não é? -, (...) que vinham.
FIS02
INF É uma pesqueira, vá, que é (...) uma coisa que veda, que está (...) ao desnível. A água de cima fica mais encorada de que a água de baixo, não é? INQ Mas ela está nessa pesqueira? INF Pois, é nessa pesqueira. Por exemplo, agora o rio cresceu; continua - não é? -, esborda, a pesqueira. Mas no Verão, não. No Verão, fica encorada (...) na parte de cima, e na parte de baixo lá fica só a que tem. INQ Portanto, naquele sítio onde ela está encorada é a pesqueira. INF É a pesqueira. INQ E depois como é que a traz para aqui? Da pesqueira como é que ela vem para aqui? INF Ora bem, ela encora e vem ter aqui ao pejeiro onde eu tenho para pôr a azenha a moer. INQ O que é que a traz até ao pejeiro? INF Ela própria. Quer dizer... INQ Não tem assim uma coisa mais estreitinha para ela ir? INF Não, não, não, não. Ela encora ali. INQ Sim. INF Vai... Eu tapo muito bem a tal pesqueira - não é? -, INQ Sim senhor. INF (...) muito bem tapadinho, (...) e a água chega ali - não é? -, (...) já não vai para baixo, para o rio de baixo, (...) com facilidade, não é? Começa a encorar, a encorar, a encorar e ela depois vem , INQ Corre para aqui? INF corre para aqui. INQ Corre até aonde? Àquela coisa que a senhora diz que pode abrir ou fechar? INF Pois. Ora bem, se for um Verão muito seco, é preciso encorar muito, muito tempo (...) e depois dá assim um poucochinho de tempo (...) para moer; se o Verão não for assim muito seco, - quê? -, duas horas já encora, já eu posso moer aí uma hora, ou duas horas. Já me dá para eu moer um bocadinho. No Verão é assim. (...) É praticamente aos encoros. INQ Mas há algum sítio que viu que abre e fecha para ela poder encorar, ou ela?... INF Não, não, não, não. Ela é que vem directamente. INQ Directamente. INF E eu, ela é encorada aqui e depois vem directamente para o pejeiro. Sim. INQ E no pejeiro a senhora levanta e baixa, é isso? INF Sim, sim. Levanto ao nível, o que precisar para moer a azenha. INQ Portanto, o pejeiro é uma tábua de madeira ou é um?... INF É um... Bem, (...) é mais do que uma tábua. INQ Tem que ser mais. INF (...) São dois barrotes e depois umas tábuas atravessadas, (...) até tapar a água em baixo; INQ Rhum-rhum. INF e depois em cima leva outros três travessinhos para a gente meter a tranca (...) , um pau, vá, uma que chamamos nós uma tranca, para levantar para cima. INQ Portanto, a senhora mete um pau ali que é para poder levantar do pejeiro? INF Pois. Para poder levantar. Sim. INQ Depois a água sai do pejeiro e vai bater aonde? INF Vai por baixo bater (...) na roda que está (...) lá fora. INQ Essa roda tem, está dividida em partes? INF Não. Essa roda está, ora bem, montada num (...) , chamamos nós um eixo, INQ Sim. INF que vem aqui de baixo, que chamamos nós o cabouco, que já tem... INQ Que é a parte de baixo do moinho? INF Pois, por a parte de baixo do moinho. Que tem, vá lá, um ferro - não é? -, está em cima dum pau, aquele ferro está ali colocado (...) e depois tem um carrinho para cima, que é que faz depois moer aqui a pedra.
FIS03
INF A água bate naquelas penas e fá-la moer - não é? -, fá-la andar. INQ Depois do meio da roda para dentro é que vem o, o eixo...? INF Pois. Ora nem mais. (...) A roda está colocada nesse eixo, mas o eixo é comprido porque depois, dentro, por baixo do moinho, tem outra roda que lhe chamamos nós (...) a entrosa. E essa entrosa (...) tem uns dentes, e é que faz moer o tal carrinho daqui de dentro que faz moer a pedra em cima. INQ Sim, senhora. Portanto, e do, o, o carrinho para baixo não tinha uma ponta que era para a senhora poder levantar e baixar a pedra consoante quisesse? Se queria pôr a levantar... INF Pois, mas não era em baixo. É ali atrás. Chamamos nós a cruz. INQ A cruz. INF Ali atrás tem (...) , vá lá, um pau grande - não é? -, que está colocado nesse (...) chamamos-lhe nós o 'reiro', ali atrás, ali em baixo do moinho. INQ Rhum-rhum. INF E é que a cruz em cima... A gente é que faz, levanta esse tal 'reiro' e o 'reiro' é que faz levantar a pedra ou descer a pedra aqui. Para moer. INQ Pois. O que é que segura a pedra lá em baixo ao 'reiro'? Portanto... INF É o tal ferro, o tal carrinho, INQ O tal carrinho. INF que vem, que tem um buraco aqui no meio dessa pedra, que lhe chamamos nós o pé, tem um buraco e depois nesse buraco é colocado o tal carrinho - não é? -, que sobe. INQ Rhum-rhum. INF Aqui em cima no topo do ferro, tem (...) uma coisa que chamam-lhe a segurelha. Prontos. E a pedra de cima, que lhe chamamos a mó, é colocada ali em cima daquela segurelha. Ora como o carrinho (...) anda, é que faz andar depois a tal segurelha é que faz andar aqui em cima a mó.
FIS04
INQ E onde é que vão buscar as pedras? INF Ora bem, em princípio, nós ainda não comprámos nenhuma nova, que agora é difícil, não é? INQ Sim. INF Antigamente, havia haviam muitos pedreiros (...) que as faziam, não é? Iam buscar uma pedra ao monte; com as medidas, picavam, faziam de maneira (...) a fazer (...) aqueles 'caculos' - não é? -, e já ficava uma pedra feita, não é? Vá, faziam com aquelas medidas, faziam os reguinhos - porque tem que ter um rego - não é? -, para o grão ali andar a trabalhar... (...) E os pedreiros faziam. Mas, agora, como não há pedreiros, nós temos utilizado pedras já usadas (...) de azenhas que estão (...) sem moer, outros moinhos e... INQ Havia muitas azenhas aqui? INF Sim, havia muitas. Muitas. INQ Quantas, mais ou menos, aqui nesta zona? INF Olhe, que eu conheça, ali (...) da Ponte de Caldelas, haviam ali duas. Depois (...) da Ponte de Caldelas para baixo até aqui à minha casa, haviam duas, três, quatro e esta cinco. INQ Cada uma com o seu moleiro? INF Sim. Cada uma com o seu moleiro. Mas havia uma - uma azenha - que tinha duas rodas a moer fora. Duas rodas: uma em baixo e outra em cima! É verdade. INQ Sim senhor. Só neste rio eram... INF Só neste rio. E agora em baixo, tem então o meu tio e depois ainda havia mais: na Malheira, na Ponte Nova. Havia Haviam muitas azenhas, só que não estão é (...) a utilizar. INQ E o que moíam? Que farinha, que, que grão é que moíam? INF Em geral, é centeio e milho. INQ Só as duas coisas? INF Só. Em tempo, o meu falecido pai ainda chegou a moer trigo. Nos princípios, não é? INQ Mas eram as mesmas pedras ou precisava de mudar? INF Ele, em princípio, sim. Em princípio, havia pedras próprias (...) para moer o trigo. INQ Isso. INF Mas o meu pai nunca teve - que me eu lembre - nunca teve pedra própria (...) para trigo. INQ Para o trigo. INF Com a própria pedra, moía o trigo. Porque, claro, o trigo é idêntico ao centeio, o greiro é quase igual, (...) e ele utilizava a mesma pedra, que eu conheça. Havia um aqui também fora, tinha outra roda no Verão para moer o linho. Também moíamos aqui o linho. INQ E também se chamava moinho, a azenha, era isso? INF Não. Nada, nada, nada. Era livre. Era livre. No Verão, colocava-se ali uma roda, aqui fora - que eu posso explicar onde era - (...) naqueles penedos. INQ Como é que lhe chamava? Ali onde? Ah, pois, gostava muito de saber... INF E então colocavam ali uma roda e aquela roda fazia moer o engenho do linho.
FIS05
INQ Explique-me lá como é que era esse, esse moinho do, do linho. INF O moinho do linho... Sei lá! Não sei como é que lhe hei-de explicar. É uma coisa de madeira (...) que se colocava e tirava-se, quase como a limpadeira (...) do milho. Só que depois andava era ali uma coisa (...) de redor, tinha assim umas caninhas. (...) E depois à frente do homem que estava a moer o linho, tinha assim uma tábua larga - ainda parece que estou a ver -, larga. E o homenzinho então pegava numas manadinhas de linho e colocava ali por aquela parte (...) larga da tábua e metia... Aquilo (...) andava e a parte redonda que andava apanhava o linho e ficava, moía, moía naqueles trilheirinhos que tinha, não é? Aquilo era (...) uma coisa (...) redonda, só que tinha assim uns risquinhos (...) . E o linho andava ali (...) a maçar, a maçar, a maçar. Quando ele via que o linho que estava a ficar já bastante moído, tinha um gancho, (...) começava a levantar com o gancho aquele linho que estava ali a moer. Depois começava a sacudir, a sacudir, a sacudir para sair as arestas - chamávamos nós as arestas - (...) do linho e metia-o até assim metido nos braços, fazia assim para um lado, para o outro, (...) e sempre a trabalhar, sempre a trabalhar (...) no moinho - não é? -, (...) do linho. E ao fim, quando ele via que já estava pronto, começava a arrancar, a arrancar, a arrancar, e fazia assim umas meadas, entrava para o lado , tornava outra vez a meter outro. Aquilo era bonito! Era bom tempo que... Era um tempo alegre, um tempo que... Juntava-se muita gente! Enfim, agora é muito diferente! INQ Para, para o linho? INF Para o linho, sim. INQ Para o grão não? Para, para moer a farinha não? INF (...) Todos os dias, todos os dias. Também para moer a farinha, também havia muita gente que vinha trazê-las a casa.
FIS06
INQ Como é que se fabricava o, o milho, por exemplo? INF1 O milho fabricava-se, lavrava-se... Ora, quem quisesse deitar - com licença - estrumo, deitava no terreno. Ora... INQ A primeira coisa que se fazia num terreno? INF1 No terreno era: fazer as beiras, preparar o terreno como devia ser, depois deitar - com licença - o estrumo, que se deitasse, e depois lavrava-se. Como antigamente, antigamente normalmente... Antigamente, normalmente... INF2 Ou ficava ali ... Está ali deitado, ora deitavam está Inverno, não se pode . INQ Como é que chamam àquelas coisas de estrumo que estão ali? INF1 É um monte de estrumo. INF2 É um monte. É para estender-se e depois para lavrar. INF1 Ora, depois, nós antigamente, eu... Eu estive da idade de... Mais pequeno, quando nasci (...) até aos vinte e quatro anos, estive com o meu falecido pai e sempre trabalhei na terra. E depois então (...) para semear o milho, ora lavrava-se (...) com os bois e com as vacas. (...) Nós tínhamos sempre (...) dois bois e quatro vacas, mas quando fosse a lavrar era sempre (...) com os bois e com as vacas. Ora, lavrava-se com o arado; depois, ao fim, gradava-se, ao fim semeava-se - que eu toda a minha vida sempre me lembrou que o meu falecido pai... Nunca me lembra de ele semear o milho (...) à mão, ao lanço, com a enxada . INQ Não? INF1 Sempre semeámos com o semeador. INF2 Agora há semeadores. INF1 Mas sempre semeámos. Nós sempre semeámos. E depois lá se deitava, lá se semeava então. Nós tínhamos uma égua. A égua é que semeava, é que sachava quando fosse o tempo do sachar. E botava-se então o milho à terra e (...) lá se botava à terra. Depois começava a crescer; depois sachava-se (...) ... Ora, quando fosse (...) que ele tivesse quatro semanas ou cinco semanas, sachava-se. Aliviava-se o milho, tirava-se (...) a terra da beira do milho normalmente (...) para o meio. E depois, passado uns quinze dias, ou mais ou menos, (...) ora, deitava-se adubo (...) e juntava-se, e (...) punha-se a terra então 'chanza', punha-se a terra lisa, (...) sem buracos. E depois abria-se uns regos (...) para regar, se realmente esse terreno tivesse águas. Depois, ele começava a crescer, e começava-se a regar, quando fosse (...) no tempo de regar.
FIS07
INQ1 Aqui havia, costumava fazer-se um monte assim grande de lenha, que se pegava fogo, que se tapava com terra? Que era para... para fazer o?... INF Não senhor. INQ1 Não? INF Sim. (...) Já tenho visto, sim senhor, que havia aqui um em Lanhas que fazia (...) uma covazinha, um buraco, e depois deitavam-lhe pinha lá dentro - pinha do pinheiro bravo -, INQ1 Rhum-rhum. INF e depois 'acendiam-o', e depois botavam-lhe terra por cima, e depois então iam buscar o carvão (...) nessas covas (...) INQ1 Rhum-rhum. INF que eles faziam. INQ2 Olha, deixa-me fazer outra pergunta, João. INQ1 Pois. INQ2 No, no Natal, era cos-... Como é que se chamava àquele bocado de árvore mais grosso que se punha na, na, no lume para queimar? Ou não era costume? INF Era, sim senhora. Era (...) ... É o canhoto do Natal. INQ2 Canhoto de Natal? INF Sim senhor. INQ1 Mas era nas casas ou era junto à igreja? INF Não, não... Sim. INQ1 Aqui não era o hábito de se acender um grande? INF Sim, aqui usam, sim senhor. Mas nós, normalmente (...) , quem tem lareira, normalmente, também se põe sempre esse canhoto do Natal. E depois guarda-se esse canhoto... Quando estiver a trovejar, pôr esse canhoto. Diz que é bom pôr esse canhoto no... INQ2 Portanto, é já só um bocadinho, não é, que se guarda depois? INF Sim senhor. Sim. INQ2 O que ficou... INF O que ficou, que sobrou. INQ2 É isso. INF (...) E depois então guarda-se e depois... Assim mesmo como a pinha mansa também, que é normalmente (...) assada dia de Natal, para tirar o pinhão. Ora, também se guarda essas pinhas que dizem que é bom para depois quando trovejar ou uma coisa assim... INQ2 Aquelas pinhas que abriram? INF Sim senhora. Pinha mansa. Ora, (...) abriu-se para tirar o pinhão e depois guarda-se (...) a pinha. INQ2 Ai, eu não sabia. INF Rhum! INQ1 Rhum-rhum. Mas também se fazia... Portanto, além de esse canhoto de Natal da casa, também se fazia um na igreja? Também se punha um à frente da, do adro, ou não? INF Nós aqui (...) não é estilo. INQ1 Rhum-rhum. INF Assim (...) na Enxurreira era estilo, era; mas à beira da igreja não. INQ2 Então era aonde? INF Era aqui num largo que há, que lhe chamam a Enxurreira. (...) E então juntava-se lá muito pessoal, aonde há uma taberna, juntava-se lá muito pessoal e depois botava lá árvores para cima, canhotos e tudo, e depois lá estavam à beira da fogueira. INQ2 E como é que se chamava essa fogueira? Não se chamava nada? INF Não senhor. Era uma fogueira, normalmente. INQ2 E só se fazia essa fogueira durante o ano? Ou faziam-se mais? INF Só, sim senhor, só. Só. INQ2 No, no São João não se fazia? INF No São João, não senhor. No São João, no São João e... É... No São João e São Pedro, normalmente, usam mas é levar, ir às casas, rapaziada nova ir às casas (...) das pessoas... Se tiver um sachador, pegam no sachador, 'levam-o'; se tiver vasos, levam; se tiver uma limpadeira, levam; levam tudo. E (...) depois lá está tudo no adro, à beira da igreja, normalmente. INQ2 Levam tudo para o adro? INF Sim senhor.
FIS08
INQ E com o gadanho, dizia que estava a quê? INF A cortar erva. INQ E deixava-se lá a secar, não era? INF Sim senhor. (...) Ou até se ia buscar mesmo logo, normalmente. INQ Por exemplo, essa que está aqui na... INF Assim como eu fui buscá-la hoje . Assim como fui buscá-la. Cortei-a e fui buscá-la. INQ E agora o que é que vai fazer com ela? INF Agora vou pô-la num palheiro para depois dar aos animais. INQ Dentro do palheiro, portanto, é dentro, aqui dentro de casa? INF Sim senhor. INQ E aqui era hábito de se fazer, com essa erva também, guardá-la cá fora como se fazia com a palha, ou não? INF Não senhor. INQ Que era pôr num monte, depois de seca. Aqui nunca se seca, nunca se seca? INF Aqui? Seca, sim senhor. O que nós costumamos é pô-las em molhos e depois seca (...) em pé. INQ Rhum-rhum. INF E depois, logo que o tempo esteja bom, guardou-se (...) para os varandões. INQ São aquelas coisas que se punha a meia altura dentro dos palheiros? INF Sim senhor. INQ Rhum-rhum. INF E depois deixa-se lá estar. E depois tira-se-lhe a semente - aí daqui por (...) um mês, ou um mês e meio -, tira-se-lhe a semente, e depois... Agora, nós... Antigamente, fazia-se medas. INQ Pois. Fazia-se. INF Espetava-se um pau no chão, e depois fazia-se uma meda, que lhe chamamos. Agora, normalmente, agora enfardamo-la. INQ Pois. Agora já é tudo... INF Agora é enfardada. Agora é tudo diferente.
FIS09
INQ1 Portanto, o varandão era, era uma coisa que... que saía assim a meia altura da parede, não era? INF Olhe... É... Nós chamamos-lhe varandão. Olhe, mesmo este meu... Eu aqui estou nesta cozinha normalmente, e tenho (...) aqui já por cima... INQ1 Rhum-rhum. INF Por cima, já lhe chamo varandão. INQ1 O que está por ci-...? INF Sim senhor. Sim senhor. Já lhe chamo varandão. É o varandão e a eira. Tem o varandão. Tem o coberto, o telhado, normalmente, e depois, ora, tem as empanadas - que tem as empanadas -, que ele vê-se bem que são (...) umas empanadas que acolá tem, ora, e então guarda-se lá dentro e quando for que seja preciso ter que botar cá fora, já está a eira para deitar cá fora. INQ1 Mas a empanada é que eu não sei o que é. INF (...) É em madeira, normalmente. INQ1 Mas é o, é uma construção ou é?... INF (...) É uma coisa (...) como esta porta. É igual, hã? INQ1 Rhum-rhum. INF O que é é presa em cima. Esta porta está em pé; ora nós encostamo-la para acolá; e depois (...) tem umas dobradiças em cima e ela abre só... INQ1 Assim? INF Sim senhor. INQ1 Abre assim? INF Sim senhor. INQ1 Pronto. Isso é que se chama empanada? INF É empanada que nós lhe chamamos. INQ1 Faz a vez de porta... INF Faz a vez de porta, sim senhor. E depois (...) tem uns ferrolhozinhos em baixo (...) ... INQ1 Que é para segurar. INF Para segurar, para ela não andar a abanar. INQ1 Sim senhor. INF É as empanadas que lhe chamamos. INQ2 E tem ripinhas? É... INF Tem ripinhas. INQ2 É toda abertinha, não é? INF É. É em ripinhas. É toda abertazinha por causa de entrar o ar. INQ2 Pois. INQ1 ... INF Normalmente. Sim senhor. INQ2 Portanto, é assim uma espécie dum estore, com uma?... INF Aquilo elas estão aqui, até para se ver aqui mesmo em cima. Hã? Abre sempre ao para dentro normalmente. INQ1 Sempre para dentro? INF Sempre para dentro (...) do varandão. INQ1 Rhum-rhum.
FIS10
INF É um touro. INQ E se for capado? Portanto, é esses que, que puxam o carro? INF Normalmente, ele é um boi. INQ Rhum. INF Vá, (...) se for que seja pequeno ainda, chamam-lhe touro; se for (...) que seja grande, chama-se-lhe um boi, normalmente. INQ Portanto, touro é quando... INF Quando são mais pequenos. INQ Até que idade, mais ou menos, é que chama? INF Mais ou menos dois anos, ou mais ou menos. INQ E se for uma também é uma toura. INF É, senhor. INQ E quando acaba de nascer? INF Quando ela nasceu lhe chamamos-lhe uma vitela, ou um vitelo. INQ Até que idade, mais ou menos? INF Mais ou menos que cinco meses, seis meses. Chama-se-lhe um vitelo. INQ E depois passa a quê? INF Depois passa já a touro. INQ Mas então o vitelo e o bezerro é a mesma coisa? INF É a mesma. É a mesma coisa. INQ Chama... Mas aqui o que é que se diz mais: é vitelo ou diz mais bezerro? INF Normalmente, normalmente, diz-se vitelo, ou diz-se bezerro. É consoante a coisa.
FIS11
INQ1 Mas diz: "Olha, essa vaca está" quê? INF Anda ao boi. INQ1 Anda ao boi? INF Anda ao boi. INQ1 E se for um, uma porca? INF Se for uma porca, vai ao porco. INQ1 Sim senhor. E vai ao, ao boi para quê? Para o boi a?... INF Para o boi a cobrir. INQ1 Portanto, já falou quando acaba de nascer. Depois, a, que é que a vaca faz com a língua ao vitelo? INF (...) Vai lamber o filho. INQ1 E como é que se diz da, da vaca quando não leva o vitelo até ao fim? Portanto, aí a meio do tempo perdeu-o. INF Perigou. Ainda outro dia me perigou aí uma com seis meses. INQ1 Mas elas perigam porquê? Ou tiveram uma queda, ficaram... INF Não... Pode ser muito fácil uma queda. Eu uma ocasião tinha aqui uma, tinha aqui uma... No ano anterior tinha-lhe deitado bois porque ela dava muito leite; e depois vou abrir os regos a um meu vizinho, a saltar um portelo, saltar um portelo... Ora (...) , eu vi bem - que quem ia a chamá-la era o meu filho -, eu vi bem que ela (...) que não bateu com a barriga no chão, mas escorregaram-lhe as mãos - escorregaram-lhe as mãos -, o bicho assustou-se... Olhe, cheguei a casa (...) , logo teve dois vitelos. INQ1 Rhum-rhum. INF Dois tourinhos. INQ1 Pois. INF Com sete meses. INQ2 Mas é frequente as vacas terem duas crias... INF Não senhor. Mas naquela... E há. De vez em quando aparece. INQ2 Aparece. INF Mas é igual como aos cristãos, normalmente.
FIS12
INF Agora, usa-se muito isto, (...) com as cangas de ferro, porque assim não estorvam. Porque, antigamente, era (...) dos castanheiros (...) ... Os arrebentos dos castanheiros, é como nós tirávamos... (...) Esses arrebentos, quando eles estavam já grossozinhos, tirava-os e metia-os no forno. (...) Saía-lhe a pele, e ao mesmo tempo, ora depois de ele quente, fazia-se a volta e depois já dava para meter acolá (...) naqueles buracos, igual. INQ Ah! INF Agora, como veio esta coisa (...) em ferro, ora já uma pessoa não arrebenta ele nada. Antigamente arrebentava-se muita coisa. Que os animais ao puxar, às vezes, faziam muita força e arrebentava. INQ Mas isto deve-os magoar mais, não? INF Magoa mais um bocado, o que é não (...) anda uma pessoa tanto..., não é? INQ Sim, sim. Não anda sempre à, à procura dos castanheiros. INF Sempre à procura, sempre à procura. Mais das vezes, às vezes não os haviam e, ora andava a lavrar, arrebentava uma e depois? O que é que iam fazer?
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INQ Como é que se trabalhava o linho? Não sei se a senhora se recorda... INF Pois. O linho, quer-se dizer, leva muitas voltas. Levava muitas voltas, vá. Ora bem, por primeiro, começa-se por semear - que é (...) semear um campo. INQ Rhum-rhum. INF Depois puxava, faz uma coisa como a erva da semente agora, (...) que se corta. Depois, quando estivesse vingado, era arrancado. Havia uma máquina, um ripanço - chamava-lhe a gente um ripanço -, de ripar, tirar a baganha. Depois o linho atava-se em feixes, metia-se debaixo da água, ia para lá nove dias. Ao fim, tirava-se, punha-se a corar, estendido no chão, secava e corava até... Quando estivesse bem seco, era guardado. Depois ia para o engenho, um engenho (...) já próprio, desses - chamavam engenho (...) de moer aquilo e ficar em linho. Depois ficava em linho... Depois era feito às manadas... Depois era espadado... Depois era assedado num ripanço... Depois de ser assedado, era fiado. A roca, o fuso, fiava-se. Depois fazia-se as meadas. Eram cozidas, iam ao forno. Depois iam corar. Depois fazia-se em novelos e depois ia à tecelagem, ia para se tecer. Isto é, (...) levava muita volta! INQ Levava muita volta. INF Muito trabalho! INQ Rhum-rhum. INF Depois vinha-se a... Tecia-se. Do pano tecido, era outra vez muito bem escaldado com farinha ou cinza, e depois ia corar até que a gente entendesse que ele que estava mais ou menos bem à vontade da gente: corado, ou mais trigueiro, ou (...) mais claro. INQ Mais branco.
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INQ Portanto, estava a falar dos linhares. Os linhares faziam-se era em terras que ficavam mais perto do rio, por serem mais húmidas, ou mais leitas, ou ficavam?... INF1 Não, não. INQ Não? INF1 Isso era em qualquer terreno. Era em qualquer terreno que a gente se lembrasse de semear, semeava ali em qualquer campo. INQ Porque não... INF1 (...) Dava em qualquer campo. Só depois, a gente trazia-o para casa e era ripado em casa e depois atava-se em feixes e depois, ou se levava ao rio, ou a pessoas que o rio lhe ficava longe - nem todos tinham a possibilidade de estar perto do rio -, então levávamos a umas poças. INQ Rhum-rhum. INF1 Poças com água que cobrisse o linho... E estava ali nove dias. Oito, nove dias. INQ Mas quando ele já estava assim grande, tinha que se ir quê? Quando já estava maduro? INF1 Muito grande . Quando estava maduro, ia-se arrancar. Arrancar. INQ Arrancar? INF1 Era arrancar. Chamava-se a arrancada do linho. INQ A arrancada? INF1 A arrancada do linho. INQ E depois ele ficava espalhado? INF1 Depois da arrancada, atava-se aos molhos, aos molhinhos, e depois trazia-se para casa - ou quem diz para casa, para um coberto, vá lá, um varandão -, e havia um ripanço, uma trave com uns dentes assim em ferro. INQ Era como aqui nos bancos, ou a senhora p-, pen-, punha o ripanço preso no carro, aqui? INF1 Ora bem, o nosso ripanço (...) INQ Era uma tábua mais comprida? INF1 era uma tábua comprida, e depois a gente atava-o até duma coluna à outra. Até se fosse num coberto que tem as empanadas - lhe chama a gente - é aquelas... INQ O que são as empanadas? INF1 São umas portas (...) em madeira, que são gradeadas que é para entrar o ar (...) para a sementeira, e é assim. INQ Sim. Sim senhor. INF2 De madeira. INF1 E nessa altura a gente atava duma coluna à outra com uma corda (...) em cada ponta; INQ E ele ficava preso ali. INF1 ele ficava ali preso. E uma pessoa depois, ele ia-o colocar ... INQ Quando estava a fazer isso no ripanço, o que é que dizia que estava a fazer? INF1 Quando estava a fazer isso no ripanço, quer-se dizer, a gente amarrava assim o linho à manada, e depois fazia acolá e a baganha caía para acolá e a gente ficava com o linho cá. INQ Mas, esse trabalho, como é que se chamava? INF1 Chamava-se: ripar o linho. INQ Sim senhor. INF1 Era ripar o linho. INQ A baganha era o quê? INF1 Era... A baganha era donde depois saía a semente para se tornar a semear ou também se vendia porque a própria linhaça que sai da baganha tem utilidade para medicamentos. INQ A própria baganha? Portanto, a baganha era aquilo que estava à volta da, da linhaça? INF1 É, é, é. (...) A baganha, era, por exemplo: floria e depois criava aquela baganha. Era uma coisa como um greiro de grão, só em ponto redondo. INQ Rhum-rhum. INF1 (...) Com uma casquinha por fora... E a linhaça estava toda lá dentro dele. INQ Portanto, essa casquinha é que era... INF1 Até quando aquilo abria, quando ela estava ao sol - a gente depois deitava a baganha ao sol para (...) colher a linhaça -, INQ Rhum-rhum. INF1 ela abria toda num rufo e ficava assim toda num rufinho e a... INQ Ela abria, portanto, abria assim ao, ao... INF1 Abria. (...) E a linhaça saía. (...) A casca deitava-se fora. INQ Punha-se fora? INF1 Não tinha importância. INQ Sim senhor. Pronto, e depois então punha debaixo de água para quê? Dizia que ele estava ali a?... INF1 O linho... Não era a baganha que ia para debaixo de água, era o linho. INQ Não, não, não. Já depois de ripado. INF1 O linho ia, que era para ele amolecer, para ele curtir - chamava-se-lhe para curtir o linho. INQ Sim senhor. INF1 Depois ficava ali curtido. INQ Ficava nove, os tais nove, nove dias, não é? INF1 Oito, nove dias. INQ Oito, nove dias. INF1 Consoante: se a água fosse bem corrente, chegavam oito; se a água fosse assim mais um pouco parada, então era preciso nove. INQ E depois então tirava-se e secava-se, é isso? INF1 Depois tirava-se fora e depois deitava-se assim às carreirinhas, estendido num prado, num terreno, que tivesse ervas, muito estendidinho e estava ali. INQ Rhum-rhum. INF1 Era consoante o tempo. Ou Oh , se metesse a chuva como está agora, às vezes até estava para aí quinze dias ou três semanas para ali, até que a coisa... Até que viesse bom tempo e ele secasse e limpasse. INQ Depois aí é que levava para o, para o engenho... INF1 Dali depois vinha para cá. (...) A gente depois apanhava, quando estivesse bem seco, e depois levava-se para o engenho. E depois no engenho é que fazia o linho.
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INQ1 Quando estava a fazer isso, o que é que dizia que estava a fazer? INF Espadelar. INQ1 E, era para quê, esse espadelar? Portanto, ela já tinha vindo... INF Esse espadelar era para que depois ficava o fraco ... Aquilo que era fraco - chamávamos-lhe nós os tomentos, que era (...) INQ1 O mais grosso, mais fraco. INF aquele mais fraco, (...) que tinha menos fibra e assim -, caía para o chão, e o mais duro, a fibra boa, ficava na manada sempre, porque aguentava-se com as espadeladas que a gente lhe dava. INQ1 Sim senhor. INF E o que era fraco, não tinha fibra, caía ao chão. INQ1 E só espadelavam uma vez ou espadelavam duas vezes? INF Não, espadelávamos uma. INQ1 Uma? INF Quer-se dizer, daquela vez... Levava muitas voltas. A gente tinha que botar, pôr primeiro o linho ao sol, e dele bem quentinho, esfregávamo-lo muito esfregadinho - até se fosse buscar duas estrigas de cada vez, metia-se uma assim entre os quartos (...) para estar quentinho - INQ1 Sim. INF chamava-lhe a gente para estar quentinho -, enquanto espadelava a outra e depois... Depois de ele espadelado, depois ainda era outra vez. Então é metia-se ao ripanço. Um ripanço... INQ1 Mais fino do que o outro? INF Um ripanço... Depois já não é uma espadela; depois já era é um ripanço que tem uns dentinhos - eu também aí tenho. INQ1 Era... Era como este ou era como este assim? INF Era um... É isto. INQ1 É este de baixo? INF Este. INQ1 Portanto, era o sedeiro... portanto que tem, que tinha em relação... INF Como este . Um ripanço, tudo isso... INQ1 Pois, mas a diferença em relação ao ripanço que a senhora falou da primeira vez... INF Mas o ripanço... A primeira vez INQ1 Era uns pequeninos... INF era um ripanço, e depois o outro é o sedeiro. INQ1 Ah! INF É o sedeiro. INQ2 Senhora Crescência. INF Desculpe lá, que agora estava-me a confundir. INQ2 O ripanço era assim? INF O ripanço... Ora bom, havia quem tivesse assim - por um acaso o nosso não era assim -, havia quem tivesse assim e depois metiam-no numa tábua e já fazia o trabalho. O nosso já era uma trave assim comprida, e depois tinha (...) os dentes metidos na trave e pronto. E a trave dava para prender de coluna a coluna e já estava. INQ1 Em qualquer lado. INF Era. INQ1 Sim senhor. Portanto, então era esse... É o sedeiro. INF Isso é o sedeiro. Isso é o... INQ1 Que era o mais fino? INF É o sedeiro, que é o mais fino. INQ1 Que era depois de espadelar? INF Depois de espadelar, ia ao sedeiro, tirava-se a estopa - então chamávamos-lhe nós a estopa -, INQ1 Sim senhor. INF e ficava o linho. Só que é linho mesmo fino. Depois fazia-se o linho a um lado e a estopa a outro. Quer-se dizer, depois ao fiar, a estopa já se tinha de fiar num fiozinho mais grossinho porque não tinha tanta fibra como o linho; o linho quanto mais fininho a gente o pudesse fazer, mais fininho o fazia porque isso esse aguentava-se, porque (...) INQ1 Rhum-rhum. INF tinha fibra.
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INF Uma estriga é a 'tais' estriga que depois, a gente (...) de a meter ao sedeiro, ela fica numa estriguinha depois. (...) Primeiro há a estriga grande - (...) chamávamos-lhe nós as manadas -, depois é... INQ Sim. INQ A senhora até disse que punham uma estriga, que ficava aqui nos quartos para aquecer e outra... INF Para aquecer enquanto que espadelava a outra, (...) para estar quente. INQ Claro. INF Porque se ele não estivesse bem quente... INQ Portanto, a estriga era como se fosse uma manada mais pequena? INF É uma manada mais pequena, pois. INQ Antes de passar no sedeiro? INF Em antes de passar do sedeiro. Depois ficava uma estriga pequenina, desde que se passasse no sedeiro. INQ E a senhora quando estava a fazer isso nos, no sedeiro, o que é que dizia que estava a fazer? INF Ora bem, quando estava a fazer isso no sedeiro, INQ Assedava? INF ia assedar o linho. INQ Rhum-rhum. Não havia nada aqui que se chamasse o, o rastelo? INF Ora, o restelo já não é pertencente a esta parte. É nessa parte. INQ Não? INF O restelo, depois, é pertencente à parte da 'urdagem' da teia. INQ Ah! Então espere lá, que depois há-de explicar então. Ah, está bem, o restelo do, do, da teia. INF O restelo é depois para restelar, para urdir a teia. INQ Sim senhor, tem razão.
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INQ Pronto. Depois então passava no, no sedeiro, não era? INF Pois. INQ Já estava aquilo separado em estopa por um lado... INF É. Desde que passasse no sedeiro, depois estava pronto a fiar. INQ Fiava nisto, não era? INF Fiava-se. É isso mesmo. Na roca. No fuso. INQ Diga? INF Chama-se isto a roca. INQ A roca. INF E um fuso. Há o fuso. INQ Que é uma coisa assim como isto, não é? INF É, é aí, pois. INQ Sim senhor. Agora, na roca, como é que se chamava àquela porção de linho que a senhora punha na, preso para se, para, para se fiar? INF Ora bem... INQ Nunca se dava nome? INF A gente... Uma rocada. INQ Uma?... INF Uma rocada. INQ E... INF Fazer uma rocada de linho, ou uma rocada de estopa, ou uma rocada até de tomentos. INQ Sim senhor. De... INF É consoante a gente quisesse. Uma rocada. INQ E na, na, na roca havia algum nome que desse às, às diferentes partes da roca? Por exemplo, aquilo com que amarrava, por exemplo, a rocada... INF Ora bem, era a correia de amarrar a rocada. INQ E a correia na ponta tinha uma?... INF Uma fivela. INQ Que era para?... INF A gente dava uma volta em volta da - uma volta ou duas, consoante desse -, INQ Sim. INF em volta da estopa e no fim metia entre a estopa (...) e a correia para ficar preso, para se não soltar. INQ Sim senhor. E era fivela que se dava? INF E tinha de ficar mesmo preso, que a gente depois tinha de tirar acolá (...) a estopa muito agarradinha . Para pormos o dedo, uma pessoa tinha que a governar para que ela saísse mesmo só aquilo necessário para fazer o fio.
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INQ Portanto, agora voltando aqui ao fuso... INF Esse aí é o fuso. Aqui é a parte, é a parte da mainça. INQ Da?... INF Mainça, lhe chamava a gente. INQ Que era aquela rosquinha? INF Que era aquela rosquinha onde a gente INQ Pegava? INF pegava na mão, e para baixo é a parte do fuso. INQ E depois à medida que ia fiando, aquilo ia formando o quê, à volta do fuso? INF Uma maçaroca. INQ E depois que é que se fazia?... Então, quando estava a fazer isso, que é que dizia que estava a fazer? INF "Estou"... INQ Com a roca e com o fuso? INF "Estou a fiar, (...) a ver se faço muitas maçarocas". INQ Sim senhor. INF A gente, às vezes, à noite até, (...) dantes fazia-se muito serão! E contava-se as maçarocas. A minha mãe fiava e eu fiava e ela às vezes dizia - pois ela já tinha mais... Enquanto eu era nova, ela tinha mais prática e às vezes ela dizia: "Ai, olha, eu fiei mais uma maçaroca do que tu"! INQ Mas um serão dava para fazer quantas maçarocas, mais ou menos? INF Bom, consoante a gente, às vezes, também ceasse - que a gente ceava tarde. E depois, consoante pegasse (...) a fiar. Uma maçaroca levava sempre uma hora ou uma hora e pico. Uma hora e qualquer coisa. INQ Rhum. E dava-se algum nome às mulheres que então que fiavam? Nem, nem sequer aqui... INF Não, não tinha, não. Não se dá nenhum . INQ Não tinha. Depois então com a maçaroca, que é que se fazia? Depois de a maçaroca estar feita... INF Depois com a maçaroca depois fazia-se as meadas.
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INQ1 E como é que era o sarilho aqui? INF Um sarilho? Um sarilho era um... Ora bem, por exemplos, façamos assim: (...) na ponta tinha umas pombas - chamava-lhe a gente as pombas -, uma tabuinha em cada ponta, uma tabuinha em cada ponta. INQ1 Pois, era uma coisinha que andava à volta? INF E depois ele era montado (...) em cima de duas cangalhas. INQ2 Não era assim? INF Não. INQ2 Não? INQ1 Era um que andava à roda. INQ2 Ai, era de roda. INF (...) Era montado em cima de duas cangalhas. Façamos de conta que tinha uma cangalha daqui, outra daqui, o sarilho era aqui no meio, depois a gente pegava aqui assim (...) ... Metia a maçaroca no fuso e depois com esta mão tocava o sarilho (...) e assim fazia a meada. INQ1 Portanto, era uma coisa que andava assim à volta? INF Andava à volta. INQ1 Ao alto? INF Ao alto. INQ1 Não era... INF Andava assim (...) como a roda de azenha, assim. INQ1 Exacto. INF Pronto . E... INQ1 E tinha duas pontas, portanto... INF Tinha quatro... INQ1 Tinha duas cangalhas que eram assim, que vinham ao ar e a, e o sarilho ficava... INF É. Para pegar. E depois o sarilho ficava no meio. INQ1 Tinha um ... como se fosse um eixo e andava à volta. INF Quatro pontas. Era. INQ1 Tinha quatro pontas? INF Tinha quatro pontas, sim. INQ1 Essas coisinhas chamava as pombas? INF Chamava-se-lhe as pombas. INQ1 Que era nos, em cada uma das, dos pauzinhos? INF Dos pauzinhos. Em cada um dos pauzinhos, tinha, que era onde se fazia a meada em cima . INQ1 Sim senhor. E como é que se fazia andar aquilo à roda? Tinha uma manivela ou?... INF Era... Tinha assim do lado uma manivela. INQ1 Uma manivelita pequenina. INF E a gente com uma mão tocava a manivela e com a outra segurava o fio. INQ1 Sim senhor. Então, quando... Fazia a meada; e depois que é que se faziam com as meadas? Que é que se fazia com as meadas? INF Depois de as meadas estar feitas, pronto, lavavam-se, metiam-se em água bem quente com cinza.
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INQ1 Por exemplo, o trabalho que se tinha que fazer com as meadas. INF Depois então as meadas, depois aquilo era: lavavam-se; depois metiam-se em água bem quente - quanto mais se pudesse aguentar quente -; e depois chamava-se-lhe o 'emborro' e untavam-se em cinza peneirada... INQ2 'Embogo'? INF (...) Dizia-se emborrar as meadas. INQ2 Ah, 'emborro'. INF Que era (...) em cinza, bem peneirada e depois metia-se no forno. Aquecia-se o forno e depois metia-se lá dentro do forno. Estavam lá vinte e quatro horas dentro do forno. Ao fim de vinte e quatro horas, a gente ia lá, tirava-as e pegava nelas e ia lavá-las ao rio. E depois elas ficavam muito amarelinhas. Ficavam, às vezes, assim da cor disto. Ficavam assim (...) da cor disto, amarelinhas. Depois, botava-se a corar, metia-se nuns paus, estendia-se assim num pau, e botava-se a corar e andavam ali a corar. Regavam-se para elas não secarem muito, até que gente entendesse que estavam mais ou menos à vontade da gente: ou mais bem coradas, ou mais claras, ou mais escuras, vá.
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INQ1 Como é que era o caneleiro? INF Um caneleiro (...) era duma tábua, tinha assim dois peguitos, assim, e depois levava (...) um ferro, tinha assim atrás, no ferro, tinha (...) um bocado assim metido de madeira, com uma mãozinha, e depois a gente... Estava acolá o novelo dentro duma cesta, ou (...) dum móvel qualquer, e a gente pegava ali assim na mão e (...) com esta mão segurava acolá no fio e com esta mão, trumba, trumba, trumba, tocava o caneleiro e o caneleiro dobava e (...) fazia a canela. INQ1 A canela. INF Pois. Uma canela para depois se meter na teia. INQ1 Para se meter na?... INF Na teia, (...) para depois se tecer. INQ1 Sim senhora. E, e como é que essa teia era feita? Então agora vamos passar à, à parte de... Como é que se fazia uma teia? INF Ora bom , essa... Essa teia, marcava-se o algodão, INQ1 Rhum-rhum. INF dobava-se também os novelos da mesma maneira como se dobava a estopa e o linho, e depois era urdida. Havia (...) uma urdideira, que eram quatro colunas grandes... INQ1 Quatro? INF Quatro colunas altas, com quatro braços. E depois (...) punha-se assim em cruz e depois começava-se a urdir, com as varas que a gente quisesse. Queria-lhe botar cinquenta... INQ2 Também andava à roda? INF Andava à roda também. Queria-lhe botar cinquenta varas, botava cinquenta varas, ou vinte, ou trinta, ou quarenta, ou sessenta, ou oitenta, aquelas que a gente quisesse. Marcava as que queria, andava com ela à volta até marcar, e depois andava-se (...) até estar completo. INQ1 Mas, mas como é que conseguia pôr os novelos todos no, no mesmo?... INF Os novelos, havia um caixote (...) como esta mesa assim, INQ1 Rhum-rhum. INF cada qual com o seu quarteirãozinho, feito em quarteirõezinhos, doze quarteirões, e depois botava-se uma bolinha em cada quarteirão. INQ2 Sim senhor. INF E depois havia uma... Como é que se chama? Não sei agora. Esquece-me agora o nome (...) INQ2 Tenho a impressão que é... INF da coisa que a gente tinha que era... INQ1 Não, nuns sítios eles chamam espadilha. INQ2 Não, mas não é. INQ1 Não sei se aqui se chamava. INF Era espadilha, era. Era espadilha. Que era de meter os fiinhos, um fiinho em cada... INQ1 É uma tabuinha que tem doze buracos. INF Doze buraquinhos. Uma em cada buraquinho. INQ1 Sim senhor. INF E depois metia-se acolá em cima, enganchava-se e depois começava-se aquilo e tinha que se lhe fazer as cruzes. Com a mão. INQ1 Com a mão? INF Com a mão fazia-se as cruzes. INQ1 Rhum-rhum. INF E tinha que se dar aquelas voltas todas necessárias para... INQ1 Rhum-rhum. E dava algum nome aque-, ao conjunto de cada doze fios que se formava? INF Não. Não. Eram os cadilhos, ficavam os cadilhos.
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INQ Como é que a tirava da urdideira? INF Depois, para tirá-la da urdideira, ora bom, depois a gente cortava os fios, atava-os para que se não juntasse (...) a cruz, para que a cruz se não juntasse; e depois então uma segurava na urdideira, para deixá-la vir pouco a pouco, e a gente ia e fazia sempre, ora bem: (...) uma parte, metia dentro doutra, uma dentro doutra, que era para não enrodilhar. INQ Sim senhor. INF E fazia aquele espécie de um cordão. Deitava para dentro (...) dum cesto, ou duma balaia, ou lá como quisesse, onde quisesse pousar, depois trazia para a beira do tear e depois enfiava aquilo então num restelo. INQ Que, que era uma coisinha que fia?... INF Que era... Com aqueles coisinhos todos. Naquele restelo, em cada um punham um cadilho, um cadilho (...) em cada buraquinho. INQ Rhum-rhum. INF E depois engatava-se (...) na parte do tear... E depois então, por exemplo, (...) a mais sabida, vá lá - a que sabia urdir e a que sabia pôr no tear -, saltava para dentro do tear e pegava no restelo. E o (...) algodão passava por baixo do tear, (...) nuns travessos que tinha, e punha-se um atrás a puxar pelo rabo - chamava-lhe a gente o rabo, mas era o 'tais'... INQ O órgão... INF Não, a puxar por o algodão. INQ Ah, por o algodão. INF A puxar por o algodão para trás. E havia um, que havia quatro fogueiros, dois fogueiros - fazia quatro bombas -, que se metia no (...) órgão, chamava-lhe a gente o órgão - que é aonde enrolava (...) o algodão... Um puxava, sempre a enrolar; o outro puxava para trás pelo rabo, para não deixar ir depressa para aquilo ficar bem 'estique'; e a tecedeira ia sempre pegando no restelo e dando sempre um jeitinho para que os cadilhos ficassem separados uns dos outros porque senão depois enrodilhava a teia. INQ Pois, porque os cadilhos iam, passavam nesse dito restelo? INF Tinham que passar. Tinham que passar no... Tinham que passar ali direitinhos ali no restelo porque se houvesse uma troca de fios: INQ Claro. INF adeus teia!, que depois era difícil de uma pessoa lhe poder ajeitá-lo.
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INQ1 A senhora disse que usava dois fogueiros para fazer quatro bombas. Isso é que eu não percebi. INF Dois fogueiros... INQ1 A se-... Quando estava a montar a teia. INF Ora bem, porque tinha o... INQ1 Fazia... INF O órgão onde se enrolava o algodão, INQ1 Sim senhor. INF uma parte era furado - INQ1 No órgão? INF dois furos -, INQ1 Ah! INF e metia-se lá que era para fazer as quatro bombas para uma mão amarrar outra. INQ1 Ah! Era para puxar assim. INF Para puxar a outra. INQ1 Para enrolar. INF É isso. Uma mão amarrar outra. Pois. INQ1 E depois tinha uma, daí junto a essa parte onde se fazia isso, para aquilo não desandar, havia uma, uma coisa que prendia. INF Depois havia, chamava-se-lhe o... Tinha-se (...) um pau. Nós até lhe chamávamos um pau. INQ1 Rhum-rhum. Não davam nome? INF Não sei se teria outros nomes. INQ1 Sim. INF Chamava-se-lhe o pau do órgão. E depois engatava no tear, que tinha um tear... O tear tinha assim uma tábua alta, uma certa parte, com muitos furos, e a gente, depois então, o pau ia e havia outro pauzinho que metia (...) nos furos, e a gente, aquele pau assentava em cima daquele pau. A pessoa queria a teia mais 'estique', (...) um furo mais para cima; INQ1 Rhum-rhum. INF queria-a mais bamba, descia um furo mais para baixo; INQ1 Rhum-rhum. INF queria botar a teia abaixo porque tinha tecido e era preciso enrolar o pau em baixo, então, deixava, desandava mais (...) um furo, tornava a meter e tornava a pôr lá no sítio . INQ1 Sim senhor. Portanto, depois de aquilo estar tudo enrolado no primeiro órgão, os cadilhos passavam através de umas coisas?... INF Rhum-rhum. Depois os cadilhos eram: tiravam-se então do restelo e eram metidos num pente - chamava-se-lhe o pente de tear... INQ1 Mas antes de chegar ao pente, havia umas coisinhas que eram... INF Ah, (...) até é verdade . É os liços. Passavam nos liços, tinham que se meter todos dois a dois (...) , um fio em cada liço, torcidos. Quer-se dizer, os liços eram duas partes; cada parte (...) tinha duas partes, quer-se dizer... INQ1 Era assim? Era duas coisinhas... INF A fazer de contas que era: os liços é isto assim. INQ1 Rhum-rhum. INF E tinha-se de meter uma vez neste, outra vez neste, outra vez neste, outra vez neste, outra vez neste, outra vez neste, certinhos, porque senão depois enrodilhava. INQ1 Não dava certo. INF E depois dos liços, passava no pente. INQ2 Quem é que fazia esse trabalho de meter nos liços? Era essa tal primeira, a mais sabida? INF Pois. Eu, por exemplo, era eu que fazia tudo, que sabia fazer. (...) Em antes era a outra que sabia mais do que eu, enquanto eu não aprendi. INQ2 Mas essa foi a última coisa que a senhora aprendeu no tear certamente, não? INF Sim. Primeiramente, aprendi a tecer com a minha mãe. INQ2 Pois, que é pôr, só deitar a... INF Só deitar-lhe a alçadeira e tecer. E depois aprendi, a correr do tempo, fui vendo e fui pensando-me em urdir e assim. E então aprendi depois com uma senhora que havia ali em cima, cá em Fiscal. Percebia. Era uma senhora já de idade muito sabida e fui aprendendo com ela e depois comecei eu a... INQ2 Olhe, quando começam a urdir a teia, quando começam a montar a teia no tear, costumam rezar alguma coisa? Costumavam rezar alguma coisa? INF Bom, eu de mim não usava rezar. INQ2 Não? INF Não senhor. A intenção de rezar? Rezava-se sempre. A gente tinha sempre a boa intenção de rezar nas horas próprias. Para isso, não . INQ1 Mas para fazer esses trabalhos não? INF Bom, às vezes, quando ia - às vezes, ou até (...) não sei se seria quase sempre -, quando ia tecer, ao começar a tecer, em antes de começar a tecer, gostava de me benzer. Mas, bom, de resto, não.
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INQ Para os liços... Portanto, primeiro, a senhora onde é que punha os pés? INF Em baixo numas tábuas que... Chamava-se-lhe as premedeiras. INQ As premedeiras? INF Que estavam em baixo... INQ Que estavam presas aos liços? INF E que estavam presas. Vinham depois uns atilhos para cima, umas cordas já feitas, próprias, que vinham prender aos liços. INQ Sim, sim. INF Que depois se uma pessoa tinha que mandar uma... Consoante andava a lançadeira, tinha que a perna andar também, para erguer a teia ao contrário, uma vez dum lado, outra vez do outro, uma vez dum lado, outra vez do outro. INQ Sim senhor. Depois os liços para poderem andar para cima e para baixo, consoante a senhora carregava nas premedeiras para cima, para um lado ou para o outro, havia um... INF Tinha um... Havia em cima umas... Não lhe sei agora bem dizer como é que isso se chamava, que já não me vem bem à ideia. INQ Está bem. INF Que tinha em cima, com umas rodinhas. INQ Era. INF E eles eram presos nessas rodinhas e consoante a gente carregava na parte de baixo, a rodinha récate!, para outro lado; consoante carregava na outra parte, ela récate!, para trás. INQ Pois. Não se lembra o nome? Isso tinha um nome, mas não se lembra o nome disso? INF Não me lembra bem agora o nome disso. INQ Não chamavam um carrilho ou roldana, ou?... INF Eram os carrilhos... Eram os carrilhos (...) daquilo, mas também a que pegava os carrilhos tinha outro nome, mas agora... INQ Então, o que era os carrilhos? INF Era (...) as tais rodinhas. INQ Rhã-rhã. INF Uma rodinha aonde ia passar a corda INQ Sim senhor. INF e ela enrolava em cima. INQ Não havia nada que chamasse os 'frades'? Também não? INF Eu não usava chamar 'frades'. INQ Sim senhor. INF Nós, aqui não se usa. INQ E a senhora depois para poder estar assim a trabalhar melhor não tinha uma tabuinha atrás onde... INF Uma tábua atrás, de encostar. Que a gente não trabalhava assentada, era em pé. INQ Pois. Era em pé. Mas havia... INF Mas só que havia uma tábua em que a gente se encostava atrás e fincava os pés à frente, para ter firmeza nos pés para poder mandar uma e auxiliava... INQ Não dava nome nenhum a essa tábua? INF Não. INQ Se era o encosto, se era o assento? INF Se é tábua do encosto?! INQ Sim senhor. INF Devia ser tábua do encosto.
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INF E depois, as tripas (...) tiram-se (...) do porco, depois são desfiadas. Depois a gente leva-as ao rio, parte-as em pedaços, elas despejam, uma pessoa vira-as com o de fora (...) para dentro e de dentro para fora, e depois são bem lavadas com sal, limão e sabão ou (...) , aquilo que quiserem. Há pessoas que até lhe deitam lixívia. Ora, lava-se lavam-se ali bem lavadinhas, depois vem-se para casa, torna-se a virar outra vez, a parte (...) que era de fora, outra vez a ficar por fora, na mesma; são untadas em farinha, muito bem untadinhas em farinha; depois com um pãozinho, torna-se a virar a parte de fora para dentro e a de dentro para fora, depois botam-se numa panela a ferver e ferve! A gente deita uns temperos: a gente deita-lhe loureiro, deita-lhe... Deita-se loureiro, limão e pimenta, ou cominhos. INQ1 Isso na água que as coze? INF Na água. Na água que se coze. INQ1 Na farinha não põe nada? INF Na farinha também se põe um bocadinho (...) de cominhos e um bocadinho de pimenta. INQ1 De cominhos e sal com pimenta? INF Até Para depois (...) fica por dentro . INQ1 E sal também? INF O sal só não uso deitar. Haverá pessoas que usam. Eu não uso. E pronto. E depois de elas cozidas, são muito boas! Por um acaso até (...) ... Há pessoas que gostam. Pode pessoas... INQ1 E como é que chamam a isso? Isso como é que se chama? INF Chama-se até... São tripas. Tripas cozidas. INQ1 Chama-se tripa cozida. INF (...) Outros até lhe chamam tripalhada! Quando a é depois ao comer: "Lá vamos comer uma tripalhada"! INQ1 Mas umas que são com farinha e sangue, que são pretas? INF Ah, isso já são chouriças. Isso já são feitas com o sangue de porco. Ao matar o porco, já se põe o sangue com vinho (...) e desfeito, e depois corta-se miudezas do porco - aquelas aparas de porco, o que quiser cortar, ou mais gordo, ou mais magro -, e mistura muito misturadinho (...) com o sangue, e depois deita-lhe um bocadinho de trigo (...) ou uma farinha própria que queira deitar, e depois são cheias, as tripas, os foles... Quem quiser dessas (...) das do próprio porco, enche-as, põe-nas a secar e depois deixa dali. Quem não quer, compra. Depois, os foles, lhe chamam, enchem-se. Depois põe-se ao... INQ1 Mas são de vaca as que se compram? INF As que se compram? Não, também há de porco. INQ1 Também há que se vendem? INF Também há. Também há. Há de porco a vender. Depois enche-se, e depois põe-se ao fumeiro. INQ1 Também ao fumeiro? INF Põe-se ao fumeiro ali uns dias, depois ficam bons. INQ2 Dava algum nome àquela tripa que ficava mesmo perto do rabo? INF Chama-se-lhe a tripa cagueira.
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INQ Portanto, e dá algum nome àqueles bagos ou àquele cacho que tem umas uvas que ficaram verdes? A maior parte está madura mas ou... INF1 Pois. Chama-se-lhe... Por vezes, diz-se que ficou 'requita'. INQ Ficou?... INF1 'Requita'. Diz: "Oh, tem tantos bagos 'requitos'"! Porque não cresceram o suficiente. Ficaram 'requitos'. Outra: às vezes, quando se vai apanhar e há um que amadurece melhor do que ao outro, às vezes algumas partes estão assim bastante esverdeadas, a gente diz assim: "Oh, está tão verdurengo! Não amadureceu bem, está tão verdurengo"! INQ Verdurengo? INF1 Chamava-se... Chama-se verdurengo. INQ Sim senhor. Quando eu tiro, quando eu abro um bago, aquilo que está lá dentro, que a gente não come? INF1 Ora bem, tem o miolo e tem a carunha. INQ Sim senhor. INF1 Tem a carunha da... INF2 A grainha. INF1 (...) Chama-se-lhe grainha (...) . INQ Grainha? Mas aqui? INF1 (...) A gente, enquanto (...) bago, chama-lhe carunha. Depois, desde que vai transformá-lo em vinho, desde que ele ferve e depois se tira o bagaço, então depois chama-se-lhe a grainha. Diz "é a grainha do"... INQ Já depois de pisado, depois de bagaço? INF1 Já depois, já de pisado, já... INQ Não, mas é mesmo se eu pegar num bago aqui e abrir é carunha? INF1 (...) Isso é... É carunha. INQ Sim, senhora. Eu comi os bagos todos de um cacho e fiquei com o quê na mão? INF1 Fiquei com o engaço. INQ Portanto, a época em que as uvas já estão maduras, que a gente vai apanhá-las, diz que é a época de quê? INF1 Das vindimas. "Vamos vindimar. Estamos (...) na altura da vindima. Há que vindimar". INQ Sim senhor.
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INQ1 Portanto, a senhora quando estava na vindima levava uma coisa assim no braço ou na mão, para pôr os cachos para dentro... INF Uma cesta. INQ1 E depois na cesta para onde é que os trazia? INF Depois deitava-se no cesto, INQ1 Sim. INF e do cesto deitava-se em dornas, e das dornas deitava-se INQ1 Trazia-se para onde? INF para casa, deita-se na pisadeira e pisa-se. Há anos atrás, então eram deitadas no lagar ou no dornão e depois ele depois ... INQ1 No?... INF Ou o dornão ou o lagar. E depois (...) eram pisadas a pé. Antigamente eram pisadas com os pés. INQ1 Portanto, o dornão era um bocadinho maior do que a dorna, era isso? Mas era de madeira ou era de ci-?... INF Ora bem, o dornão é maior que a dorna porque já é um dornão. Uma dorna é uma dorna pequena que anda num carro ou está (...) num local qualquer, mas é pequena. INQ1 Exacto. INF O dornão então já é um dornão que leva uma pipa, duas, três pipas de vinho. INQ1 E era de madeira? INF Em madeira. INQ1 E era ali que depois se fazia com os pés? INF Depois ali se fazia com os pés e porque o dornão era alto e não se podia acolá todos, havia um outro casco ou uma outra dorna ao lado e havia uma torneira aberta... (...) Em consoante eles iam pisando, o líquido ia saindo (...) para o lado - tirava-se para o lado -; ao fim de estar tudo pisado, tornava-se a botar dentro para que depois fervesse tudo junto. Mas por vezes tinha que se tirar o líquido porque senão o pisador não podia andar lá dentro a pisar. INQ1 Lá dentro. INQ2 Porque era muito alto e ficava ali, afogava-se... INF Porque era muito alto e ficava ali... Até os próprios lagares, quando era um lagar muito grande, e bastante alto, chegava a pontos que o vinho subia demais e eles eram obrigados então a abrir a biqueira e tiravam para uma dorna um pouco de líquido e depois de ele bem pisado, desde que estivesse pronto, tornavam a deitar o líquido dentro, mexia-se, e pronto, ele lá fervia. INQ1 Mas a senhora... Como é que se mexia? Com?... INF Era mexido (...) com uma gancha ou então um rodo de pau. Mas até ainda melhor é uma gancha porque ela vai e arrasta os dentes INQ1 Rhum-rhum. INF para cima e para baixo e mexe melhor. INQ1 E o que é que chama o lagar? Era uma coisa feita em, em ci-, em pedra? INF Uma (...) feita em pedra, espécie dum tanque, vá lá. INQ1 Dum tanque. INF Ora, é lagar porque era próprio para vinho, já se chama um lagar, e é feito numa adega. INQ1 Exacto.
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INQ1 Depois aquilo, o vinho que saía para fora e aquilo que ficava lá dentro do lagar, como é que se chamava? INF Depois, chamava-se-lhe o (...) bagaço, que, INQ1 Que se fazia o quê? INF a gente, o bagaço depois (...) ia a empesar, apertava-se para tirar o vinho todo bem tirado, e depois ia para o lambique e era queimado e dava aguardente. INQ1 E... E empesava aonde? INF Empesava-se em casa, (...) na loja, vá, dentro duma imprensa, se lhe chamava, que era feita de madeira, com umas talisquitas, e depois apertava-se ali. (...) INQ2 Era assim redondinha também? INF (...) Uma imprensa redondinha... E depois tinha o ferro da imprensa, lhe chamava a gente. Tinha o... O ferro de apertar, chamava-se-lhe o macaco. INQ1 Rhum-rhum. INF Um outro ferro, que se lhe metia, INQ1 Andava à roda. INF andava-se de volta e metia-se-lhe madeira para dentro, (...) se o bagaço não chegava acima, se não dava (...) para encher a caniça bem cheia, INQ1 Rhum-rhum. INF (...) para que ele fosse apertado para baixo. E era assim apertado. INQ1 Portanto, a caniça era aquela coisinha de madeira à volta? INF À volta. INQ1 Tinha assim um aro à volta? INF Era. À volta, pois. INQ1 E, e dentro de que é que estava a imprensa? INF A imprensa estava em cima da lagareta. INQ1 Que era uma coisinha de pedra?... INF De pedra. INQ1 E que tinha um?... INF Que tinha uma bica, e depois por a bica saía... INQ1 Tinha um regozinho assim todo à volta que era por onde escorria?... INF Um regozinho, (...) donde o vinho escorria (...) dali (...) para dentro (...) INQ1 Rhum-rhum. INF duma outra piita que houvesse ao lado, ou então um alguidar ou um bacião, qualquer coisa que a gente tivesse ... INQ1 Portanto, caía para dentro duma pia também? Aquele sítio? INF Caía para dentro doutra pia.
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INQ1 Depois guardava-se dentro de quê? Dos mais pequeninos? Vamos começar por esse tamanho. INF Ora bem, chamava-se-lhe cubas, era os grandes. INQ1 Que podia ser?... INF Grandes. Que podia levar aí dez ou doze pipas ou consoante. Chamava-se-lhe (...) dornões, que já são aí de duas pipas, duas pipas e meia, ou mais ou menos. E depois cascos, são de pipa. Depois meias pipas e depois pipos, que são aí de quinto, seis canecos, dez canecos. INQ1 Então quanto é que é um caneco? INF Um caneco são (...) vinte litros. INQ1 Rhum-rhum. E esses é que chamavam?... INF Um caneco. INQ1 Um caneco. Não, quintos, disse a senhora. INF Vinte litros. Não, quintos são cem litros. São pipos de cem litros. Canecos é espécie dum cântaro, que leva vinte litros . INQ1 Sim, sim, sim. Que era o que se enchia... INF É. INQ1 Mais, o mais pequeno que havia era o quinto, ou havia mais abaixo? INF (...) O cântaro mais pequeno é de doze litros, o maior é de vinte litros. INQ1 Sim senhor. INF (...) O casco, há de muitas maneiras. Até havia quem, às vezes, tivesse um casquinho de dois canecos e meio. (...) Nos princípios, quando me casei, até cheguei a ter um de dois canecos e meio. INQ1 E esse chamava-se casco? Quando era pequenino? INF Chamava-se-lhe um pipinho! INQ1 Um pipinho. INF Um pipinho. Depois então chamavam-se os outros de quinto. INQ2 ... O casco é o genérico, dá para tudo. INQ1 Sim, sim. INF Depois chamava-se INQ1 O quinto que era de cem. INF os quintos, que são de cem litros, ou a... INQ1 E depois era meia pipa. INF Depois havia as meias pipas e havia de sete canecos e meio, quer-se dizer, cento e vinte litros. INQ1 E depois havia as pipas? INF E depois havia as pipas. INQ1 Que era mais ou menos?... INF As meias pipas, duzentos e cinquenta litros, e depois as pipas de quinhentos litros. INQ1 Sim senhor.
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INQ1 Então e por baixo do carro, por baixo do soalho, tem algumas coisas a atravessar no leito? INF Tem (...) as cadeias. INQ1 Não tem travessas? INF É travessas ou cadeias. É o que a gente quiser. (...) Tem cinco. INQ2 São cinco. E atrás não tem uma cadeia mais forte, não? INF Não. Este não... Eu não meti. INQ2 Não meteu. INQ1 Mas costuma meter? INF (...) Eu fui que o fez. INQ2 Mas costumam meter geralmente? INF É. (...) O Constâncio da Ponte do Porto tem feito muitos (...) e mete-lhe. Mas eu não meti. (...) Tem uma cadeia, pronto!
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INQ1 Porque é que o barco atravessava o rio aqui ao pé? Aquele rio? Pode explicar? INQ2 Há uma, há uma festa em que vem o barco... INF1 É na Páscoa. INQ1 Na segunda-feira? INF1 Na segunda-feira de Páscoa. INF2 Na segunda-feira de Páscoa. INF1 Já deu na televisão, essa passagem. INQ2 ... INF2 Na televisão , já. INQ1 Então e como é que é? Porque é que fazem essa festa? INF1 Aonde está a minha prima, a 'tais', a Cristina, a moleira, antigamente nós não tínhamos a 'tais' ponte que agora falamos. E passava-se de cá para a parte de lá em barcos. INF2 Para ir para o Pico, assim como vocês foram hoje. INF1 Para ir para a feira do Pico, assim como vocês foram hoje, nós aqui passava-se de barco. INQ2 Rhum-rhum. Passava-se? INF2 Era, sim senhor. INF1 Atravessava-se o rio de barco. Basta que eu tinha uns meus tios, que tinham uns campos, passavam com as ovelhas (...) nos barcos para ir (...) para o que é deles. INF2 E moleiros. INF1 E os moleiros e tudo iam buscar (...) as fornadas e tudo. INF2 E os moleiros também com uns machos e tudo, com as fornadas para o outro lado. INF1 (...) Mas depois, aquilo era duns meus tios, que normalmente aquelas azenhas têm sido sempre de família minha, (...) dos Pegos, que aquela família era dos Pegos. Chamavam os Pegos. E eles depois resolveram, (...) na segunda-feira de Páscoa, a cruz ia daqui para lá - não é? -, de barco, e ao vir de lá para cá, daquele lugar que é São Bento das Pedras, entravam todos, arranjavam barcos - que aqui ainda não os tinham -, iam pedir barcos a outro lado e metiam (...) o padre e os mordomos da cruz e a música e o fogueteiro. Quer-se dizer, haviam quatro barcos: ia o fogueteiro na frente a queimar fogo no meio do rio. INF2 São três pessoas, não é? INQ2 Rhum-rhum. INF1 São três pessoas, os fogueteiros. E atrás deles, (...) ia o padre, a campainha a tocar, e os mordomos (...) da Páscoa. INF2 (...) E os mordomos. INF1 E atrás ia a música, em dois barcos, a tocar. (...) Entraram ali e vão sair noutro lugar (...) ao fundo. INF2 E sair (...) noutra pesqueira, na outra pesqueira em baixo, que tem outra azenha. INF1 Quer dizer, ele passavam dois lugares sempre por o rio abaixo, a cantar ao São João da Ponte, aquelas coisas todas, bem. Junta ali gente que eu sei lá! Tem vindo a televisão e tudo filmar ali. Porque (...) é uma tradição antiga! INQ1 Pois. Mas era o padre saía para ir às casas do lado de lá levar o senhor e benzer a casa? INF1 Sim, sim, sim, e... E benzer a casa. E depois voltava para cá, e ao voltar para cá, já... INF2 Voltava pelo mesmo sítio. Era o caminho deles, normalmente, não havia outro. INF1 Já em vez de vir, ao voltar para cá, ao chegar ao pé do rio aonde entrou, não vinha para onde entrou. Entrava lá e seguia por o rio abaixo para ir ter a outro lugar. INQ1 E seguia, continuava a dar a volta a ver. Portanto, ele, essa, essa procissão era feita para ir a casa das pessoas? INF1 (...) Das pessoas. INQ1 Sim senhora. Muito bem. Deve ser muito bonito! INQ2 O pesqueiro, o pesqueiro era... INF2 (...) Agora como há ponte, ora como isto é antiguidade, continuam a fazê-lo igual. INF1 E isto... INF2 Só vão... Passa para lá na ponte para ir correr o lugar, e depois para cá (...) vem para o barco, e do barco sai logo rio abaixo, logo para o (...) ... INQ1 Portanto, já não passam pelas casas? Já não param para ir às casas? INF2 Não senhor, não senhor. INQ2 É só fazer a procissão? INQ1 Mas continua a procissão? INF2 Continua a procissão. INF1 Eles param... Eles vão às casas todas de cá. INQ1 Sim. INF2 É. INF1 E passam pela ponte. INQ1 Sim. INQ2 Para o lado de lá. INF1 Vão por lá por cima, para a parte de lá, e depois para virem para cá, já estão os carros de lá e seguem já para outro lado. INQ2 Havia carros. INF2 Já iam para outros lugares. INF1 Porque cá já está feito, segue tudo . INF2 Para outro lugar . INF1 Basta que há lá quatro barcos. Foi o meu marido, que (...) em 85 fomos nós mordomos e foi ele que mandou fazer os barcos. INQ1 Ai sim? INF2 A freguesia foi que pagou. INF1 Mandou fazer... Foi a freguesia, não é? INQ2 A freguesia. INF1 A gente andou pela freguesia a pedir. INF2 A freguesia... A freguesia... Eu andei pela freguesia a pedir. E a freguesia deu muita coisa . INF1 Contribuiu muito bem. INF2 Muito bem! E depois eu mandei arranjar então quatro barcos. INQ1 Então e antes de haver esses quatro barcos, iam em quê? INF2 Era em barcos igual, o que é tínhamos de pedir emprestados. INQ2 Emprestados. INF2 Porque antigamente havia muito barco, sabe? INF1 Emprestados. Agora não há nada. INF2 Agora não. Mas antigamente havia muito barco porque INQ2 Não havia pontes, tinha que se passar... INF2 não havia pontes. INQ1 E agora a freguesia guarda esses barcos só para essa festa? INF2 Sim, sim. Só para esse dia mesmo. INF1 Só para essa festa. (...) Estão metidos no fundo do rio. INF2 Estão na água. Estão na água. INQ1 No fundo do rio? INQ2 Sim. INF2 Sim senhor. No fundo do rio. INF1 Estão no fundo do rio. Presos por umas argolas. INF2 Estão no fundo porque assim INQ2 Para não irem, para não apodrecerem. INF2 não empenam e nem secam. INF1 Apodrece. (...) INF2 Não apodrece tão depressa! INF1 Aguenta-se mais tempo. INF2 Porque assim o próprio vento e o sol comia mais depressa. E assim, estão debaixo da água... E, normalmente é pinho. (...) É assoalhado a pinho. INF1 A pinho manso. INF2 A pinho manso. Mas os travessos é que é em... Normalmente é em carvalho. (...) A carvalho. (...) É carvalho, normalmente. INF1 (...) INQ1 E com estas cheias tão grandes e com esta enxurrada que vem... INF1 Estão presos! INF2 Estão presos, estão presos. INF1 Estão presos. Têm umas correntes e umas argolas para eles estarem presos. Têm chave e tudo para fechar. INQ1 Sim senhor. INQ2 Pois. INQ1 Muito interessante. E é a única festa grande que há cá durante o ano, ou há?... INF1 No ano, temos... Quer dizer, assim destas festas temos mais, temos a festa de Nosso Senhor dos Passos, que é uma procissão que também vem da igreja de São Bento das Pedras. INF2 Todos os anos. À capelinha de São Bento. INF1 Atravessa então a 'tais' ponte. INQ2 Pois. INF1 Até este ano foi o meu filho até o festeiro dessa festa. INQ2 Mas qual é a diferença do festeiro e do mordomo? Ou é a mesma coisa? INF1 Como é que hei-de dizer? Eles chamam festeiros porque... Como é que hei-de dizer? Ou são mordomos. Podem-se dizer os mordomos. INQ1 Ah! INQ2 Também se diz? INF1 Porque são os que vão pedir pelas portas, são os que fazem... INF2 Cá diz-se festeiros e diz-se (...) mordomos normalmente. INQ2 Mordomos. Rhum-rhum. Mas o que é que o senhor Confúcio chama o pesqueiro? INF1 Ai, a pesqueira. INF2 A pesqueira, a pesqueira. INQ2 A pesqueira. INF1 A pesqueira é que é... INF2 A pesqueira (...) é: a pesqueira é onde a água... Ora vem a água no ar - hã? -, e depois chega acolá tem um muro e é isso é que lhe chama a pesqueira. INF1 E ali cai. INQ2 Onde cai? INF2 Sim senhor. Acolá cai . INQ2 Por exemplo, em frente à azenha da sua prima tem uma pesqueira? INF1 À azenha. INF2 À azenha (...) dessa minha prima. Sim senhora. INF1 E logo ao cima, tem outra ao pé da ponte - está logo a ponte a seguir. INF2 E ao pé da ponte tem outra, e depois (...) aonde eles vão sair com os barcos, com a uma cruz, tem outra. INQ2 Rhum-rhum. INQ1 Quer dizer, onde há um moinho, há uma pesqueira? INF1 Há uma pesqueira. INF2 É, sim senhor. INF1 Sim senhor. INF2 Há por causa de fazer o encoro para a água ir para a azenha. INF1 (...) Para moer. INQ2 Ela tinha falado nisso, na pesqueira, eu é que já não me lembrava.
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INQ1 E este que se apanhava aqui junto aos pinheiros? INF1 Os tortulhos. INQ1 Que são bons para?... INF1 Há uns que são bons (...) para comer. INQ1 E os outros que não são? INF1 E há outros que não são bons para comer. E há uns pequeninos, amarelos, mesmo rentes ao chão que chamavam-lhe mísculas , ou não sei como é que lhe chamavam, que andavam a apanhá-los... INQ1 Mas são umas bolinhas redondas? INF1 Sim, sim. Andavam a apanhar, diz que para fazer com arroz. Eu nunca comi, mas isso diz que faz... INQ1 E nunca comeu? INF1 Eu nunca comi, mas que diziam que isso que era bom. INQ1 Mas havia aqui? INF1 Havia sim. INQ1 Mas é, era uma bolinha mesmo, não era? Crescia... INF1 Era uma bolinha. INQ1 Não fazia um, assim um chapéu como esses, pois não? INF1 E estes, estes nós usamos aqui também comê-los (...) quando eles estão ainda novozinhos e assados com bacalhau. INF2 Quando eles estão abertos. INF1 O bacalhau assado e estes assados também. INQ2 Tortulhos. INF1 Tortulhos. INQ2 Olhe, a senhora não nos deixou o seu nome. Queríamos apontar. INQ1 Espera que vá, quando... Eu tinha pensado que era para mudares o, quando mudares a cassete. INQ2 Ah, está bem. INQ1 Mas está quase... INF1 'Tremocina', homem! Eu estou aqui consumida! INQ1 Coitada da senhora. INF1 A 'tais' coisinha é 'tremocina'!
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INQ1 E costumava haver um... INF1 O texugo. Não é... Isso não é um texugo? Um texugo?! INQ2 Diga? O senhor ia dizer não sei o quê. INQ1 Diga lá da raposa que eu não percebi. INF2 A raposa, ainda uma ocasião acolá na estrada, há coisa de uns três anos, eu vou a passar, ora, uns senhores de noite passaram com o carro por cima, eu agarrei-a, trouxe-a para casa, fui, levei-a ao talho, ainda me deu um conto e duzentos! INQ1 Pela pele? INF2 Sim senhor. INQ1 E depois foi vendê-la por dez. INF2 Pois, com certeza. Não sei. Mas ele (...) deu-me sequer um conto e duzentos. INQ2 Ou por cinquenta. INF2 Deu-me sequer um conto e duzentos. E pronto (...) ! INQ1 Sim senhor.
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INQ1 Então eu digo que a gaiola é boa para guardar os?... INF1 Os pássaros. INQ1 E quando ele acabou de nascer, diz: "Olha ali está, estão cinco", quê? Cinco?... INF1 (...) Estão cinco sapinhos, ou quatro sapinhos, ou os que tiver. INQ1 Sim senhor. De qualquer um dos pássaros? INF1 Sim senhor. Qualquer um dos pássaros. INQ2 Mas porque é que lhe chama sapinho? INF1 Diz que é por causa... Se um só disser que (...) são passarinhos, que são passarinhos, que, depois, (...) as formigas, que vão e 'comem-os'. INQ1 Rhum-rhum. É isso? INF1 Não sei se é verdade, se é mentira. INQ1 É o que se diz. É disse o que diz-se. INF1 Olhe que duma vez este... INQ1 Diga, diga, então. INF1 O pisco... O pisco, olhe que duma vez, (...) ele viu-se à rasca com o Senhor. INQ1 Então conte lá essa história, eu não sei o que é que ele fez. INF1 Porque, olhe, ele veio (...) uma chuvada muito forte. Chuvada muito forte e ele meteu-se debaixo duma carvalha! Meteu-se debaixo da carvalha, depois, quando tal, (...) ele vem então uma luzerna de sol muito forte e diz ele assim: "Senhor, já podia com outra"! Ele, ao mesmo tempo, o Senhor deixa-lhe cair um bugalho na cabeça, diz ele assim: "Ó Senhor, não olheis para os meus ditos, olhai para os meus calditos , Senhor"! INQ1 Mas, o, uma carvalha é diferente do carvalho em quê? INF2 É tudo carvalho! INF1 É tudo carvalho normalmente, mas a carvalha (...) (...) o bugalho normalmente. O carvalho (...) já não dá o bugalho, normalmente. A carvalha é mais (...) para dar o fruto; o carvalho não dá tanto o fruto. Não dão não. INQ1 Olhe, então quando o pássaro está a bater as asas, diz que está lá assim em cima?... INF1 (...) Anda a voar. INQ1 E depois quando vem para baixo, diz que vai?... INF1 Vai a descer. INQ1 Vai quê? Vai?... INF1 Vai aterrar.
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INQ1 E a rã, a gente ouve e diz assim: "Olha, a rã está a" quê?... Está a?... INF1 Está a cantar. INQ1 E há uns maiores do que a rã que andam mais no campo? INF1 É os sapos. INF2 Mas não é só o sapo. Também se lhe chama a carteira. Mas isso já... INQ1 Qual é a diferença? INF2 Mas já é um grande sapo. É como este, só que tem... Chamamos-lhe nós a carteira porque é muito grande! É até... Tem uma barriga... INF1 Mas isso é um sapo. É um sapo. INF2 É um sapo, mas (...) chama-se outro nome. INQ1 Mas é outra, uma qualidade de sapo? INF3 É sapo, igual. INQ1 E, e este que é preto e... INF2 Sardão. INF1 Não. É uma saramela. INF2 Saramela. INQ1 E esta que é assim comprida? INF1 É uma cobra. INQ1 E aquela que pode ser perigosa? INF1 É o 'escanço' . INF2 É isto que está aqui . INQ1 O 'escanço' é um assim pequenito, não é? INF1 É esse. É esse assim. INQ1 Mas assim parecido com a cobra, não há uma que também pode ser?... Pronto, que a mordedura pode ser?... INQ2 O 'escanço' é pequenino, não é? INF1 É, é. É este. INQ1 É pequenino. INF1 É este. INQ2 Mas há outra que é, pode ser mais grandinha e que... O 'escanço' anda escondido debaixo da terra sempre, não é? INF1 Sim, sim. Mas, quando a gente corta erva ou assim, aparece. INQ2 Aparece. INF1 E depois a gente (...) ... INQ2 Mas esta que nós dizemos anda. Também se esconde no Inverno, mas... INQ1 Ah, era para ver o passarinho mas já se foi embora. INQ2 Mas tem a picadura venenosa. INF1 Nós aqui dizem que é o 'escanço'. Não sei agora o nome... INQ1 Não há nada que chame a víbora ou?... INF1 Sim, a víbora é cobra também. É cobra. INF2 Mas essa tem asas, não é? (...) Chamamos-lhe a cobra do Inferno Inverno , não tem asas?! INQ2 Já viu alguma? INF2 Eu, não senhora. Mas os antigos é que diziam que havia umas que avoavam. INF1 (...) Há ali, na senhora do Coriolano - aqui, temos aqui -, que estão lá duas cobras enormíssimas. INF2 Três. INF1 Três? INF2 Três, são três. INQ2 Mas a pele delas, é? INF1 A pele, é... INF2 É a pele delas, mas... INF1 Jesus! Elas parecem que estão inteiras. INF2 Mas é cada um! INF1 Mas é cada bicho que têm lá na parede! INQ2 Mas não tem asas? INF3 Não senhor. Não tem asas nenhumas.
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INQ1 Olhe, e uma que é parecida com a tartatuga, que anda assim na terra? INF1 Ai (...) é o cágado. INQ1 Mas há por aqui? INF1 Não. INQ1 Ou não? Não conhece? INF1 Já há muito... Eu nunca vi por aqui. Unicamente vi um... Quando estávamos aqui na quinta, era pequenita, fui (...) para Braga, INQ1 Rhum-rhum. INF1 estive lá uns dias com a patroa, com a dona da quinta, e tinha. Andava lá sempre pela casa fora, era o que apanhava o lixo (...) de beira . Diz que comia o cotão (...) da casa. INF2 Ai é? INQ1 É. INF1 "Uh! Lá vai um cágado"! INQ1 Rhum-rhum. E umas que são pare-..., que são parecidas com as, com as bichas que a gente tinha dentro dos intestinos, mas que andam aí na terra? INF1 (...) As minhocas. INQ1 Diga. INF1 Minhocas. INQ2 Olhe e, e uma que se mete no nariz, no nariz nas, das vacas? Parece uma rã pequenina, que, que, se ela está a beber, que entra para o nariz das vacas, não conhece? INF1 Não conheço, aqui não... INQ1 Que diz que é venenoso, portanto? INQ2 Não há uma que se chama reira? INQ1 Ou rela? INF1 A rela. INF2 Rela. A rela. INQ2 Só a rela? INF1 A rela. Antigamente diziam que, se andasse com as vacas a comer muito... INF2 (...) Mas isso (...) não é por elas ir para o nariz. É no próprio INF1 Comer. INF2 pasto que elas estão a comer, é que, se ela passar, é que pode muito fácil envenenar (...) o animal. Mas já é dela. INF1 Diz que (...) chegam à noite, dizem: "Ai, trazei as vacas para a corte, porque não se pode andar com elas, que lhe cai a rela. Elas comem a rela". INQ1 Mas a rela era uma espécie duma rã, era, ou?... INF2 (...) É tipo duma rã normalmente. INQ2 Mas pequenininha? INF2 Mais pequenina.