PFT01
INF1 Isto era a tábua que vinha daqui aqui, o pau. Aqui, a tábua pregava aqui. Vá, que era assim... O pau estava assim... INQ Portanto ela terminava ali naquela coisa... INF2 (...) Mas deve passar este risco para ali, porque isto era a tábua. INQ Pronto, mas isso... INF1 Ela lá depois lá compõe. Ela está a perceber, está a perceber... INQ Isto aqui é que eu não sei como é que é. INF2 (...) E isto é o pio que ia piar os milhos e a tábua (...) tem que chegar mais aqui adiante um bocadinho. INF1 Que a tábua é esta... INF1 Mas depois elas lá compõem que eu estou com pressa. Que ele vem aí o meu filho e ele quer comer. (...) Por exemplo, (...) esta tábua, o pau era aquele que vinha assim, e a tábua era pregada em cima do pau. INF2 Em cima do pau... INF1 E depois ia ao para diante e aqui, era furada. Tinha assim INQ No meio. INF1 um encaixe assim, assim, ó, assim - vá que é um supor - assim. INQ Sim, sim senhor... INF1 Assim um buraco (...) . INQ É que saía o tal pau... INF1 (...) A tábua, tinha assim um buraco - vá que é um supor - e depois ia daqui ao para baixo, assim, um coiso. INQ Este coiso? INF1 Isso. (...) Encaixava assim. A tábua estava assim. INQ Sim, já percebi. INF1 E depois ia assim ao para baixo, assim, assim coiso, e depois no fundo formava INQ O tal pião. INF1 um tal pião, que era para apanhar os milhos. Está a compreender?
PFT02
INQ Olhe, há quanto tempo é que deixou de, de, de trabalhar com isto? INF1 Ah, eu sei lá. Eu já, eu já nem me lembra. INF2 Já aí há uns aninhos... INF1 (...) Quando o comprei (...) . Sim foi , sim eu já o tinha. Nem sei (...) se já tinha. Parece que ainda não, ainda não tinha as casas. Que eu comprei-as. Eu comprei-as, as casas. (...) Foi (...) no tempo da senhora Adolfina já, de certeza. INF2 (...) E mesmo na da senhora Adosinda mais nova , a mãe da Adília. INF1 Pois, na mãe da Adília. INQ Já estava, já pertencia à casa. Mas a senhora a última vez que, que trabalhou com isto... INF1 Eu não, INQ Nunca fez nada disto. INF1 não trabalhei. (...) INQ A senhora, que idade tinha quando, a última vez que... INF2 Eu tinha para aí alguns quinze anos. (...) Já tenho sessenta e três. INF1 (...) INQ Portanto há cinquenta anos que isto não funciona. INF2 Ai, já (...) . Ou mais. Oh, isto já funciona há mais de cento e tal anos. INQ Não. Que deixou de funcionar há cinquenta anos. INF2 Ah que deixou de funcionar, ele deve haver para aí (...) alguns quarenta. Para aí quarenta anos. INF1 Eu não sei. Eu quando o comprei, (...) eu já estava... Eu comprei as casas, a ela. INF2 Eu ainda era novita quando comecei... INF1 Ora eu quando as comprei, ainda estava a minha Adriana solteira. E estaria. INF2 Oh, e estaria. INF1 E ela já está casada (...) . INQ Então e agora já não se fazem milhos? INF1 Não há, não se semeiam. Não há (...) quem faça. INF2 Olhe. Passado de os semear, os passarinhos comiam tudo. INF1 A passarada come tudo. É muita, a passarada. INF2 E o javali, é o milhão e as batatas. Os passarinhos é o milho, é tudo. Isto é uma miséria.
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INF Aqui é a nossa fonte velha, um grande nascente que aqui está. Quer dizer, era (...) de encher o cântaro, aqui, de encherem encher aqui o cântaro. Hoje isto está sujo! Porque já não precisamos dela porque temos a torneira em casa. É. Portanto, aqui era onde enchiam aquele cântaro e pegavam nele e punham aqui. Muitas vezes estavam aqui os rapazes, sentados aqui ou além, e coiso, (...) e as raparigas estavam também. E elas até gostavam bem! Elas até gostavam bem (...) de estar aqui. Portanto, (...) aqui, aqui era (...) um lugar, um reservatório, onde tinham aqui um bocado de água limpa, (...) para passar a roupa depois de lavada aqui. As sobras da água, as sobras da água disto tudo que saía daqui, vinham por aqui, que isto estava cheio, caíam ali. Mas muitas vezes quando isto estava tudo ocupado com pessoas a lavar, ainda lavavam ali no fundo, ainda lavavam também aqui, e essa coisa toda. E então, os restos da água daqui, se sobravam, iam para aqui, e então esta água está dividida por estas partes todas, (...) um 'x' de horas, um 'x' de horas por dia para cada pessoa. INQ Cada pessoa tinha? INF É. As sobras desta água. As sobras da água (...) que a gente deixaria (...) de gastar. (...) Desde lá de cima (...) donde vocês me encontraram, a água ia toda lá para cima, à cabeça, das mulheres. Porque elas eram (...) a que tinham a preocupação de ter a água em casa. O banho, a gente viria aqui, ou então tiraria a água nos poços e deixaria-as nos tanques - como há por aí muito tanque, por aí - e então a gente vinha cá tomar banho. Porque não havia banho de chuveiro, com luxo como hoje , com água quente, como nós temos. Quer dizer, houve (...) uma transformação muito grande. Portanto, isto são as sobras (...) deste nascente. O nascente nasce ali, ali naquele canto. Isto agora está sujo porque (...) como acabei de dizer, não é preciso.
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INF1 E depois esses cobertores - agora desculpe - esses cobertores depois de feitos, iam ali para cima. Iam ali para cima, chamava-lhe a gente o pisão. Ser pisados... INF2 Ah, não eram os cobertores, desculpe. INF1 E os cobertores também iam. INF2 Ah, nunca para lá (...) mandei nenhum. INQ Então o que é que ia para o, para o pisão? INF2 Era as mantas de lã. INF1 Era as mantas. Nós íamos também lá buscá-las (...) . INF2 As mantas de lã. De lã é que iam para o pisão. Iam assim até ralas, mal, mal tecidas, ralas, para ficarem bem no pisão. INQ E como é que era esse pisão? INF2 Isso é o que eu não posso dizer. Nunca vi. INQ Como é que é, não é como... Ah não era aqui ao pé? INF1 Não, aqui não era. INF2 Era no Reboredo, chamavam-lhe o Reboredo. INF1 (...) O pisão era, num rio, movido a água, um malho a malhar na água, (...) nas mantas. INQ Pois. INF2 Mas ficavam boas. Ficavam muito boas. INF1 Ora a manta, depois de vir de lá do pisão, o Senhor (...) se pegasse ali (...) em duas pontas, outro ali noutras duas, e deitasse água dentro da manta, a manta não vertia água. INF2 Numa tábua. Eu aqui tenho então é (...) para fazer o linho.
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INF Aquilo é chuva. Aquilo (...) não é resina. INQ1 Pois, é só aquela parte branca é que é resina. INF (...) A água sai toda fora. Os resineiros agora quando vierem vier a segunda vez botam a água fora. Enquanto há pinheiros (...) que enchem três sacos, há pinheiros que enchem dois, há pinheiros que enchem dois e meio, há pinheiros que enchem um e há pinheiros que nem um enchem. INQ1 Pois, depende da força. INQ2 E os resineiros vêm de quanto em quanto tempo? Todos os meses? INF Durante a época, faz sete renovas.
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INQ ... Antigamente, que eram em versos, muito compridas. Lembra-se? Lembra-se de ter sabido? INF Olhe, lembra-me de ter sabido e tenho aqui uma irmã que ensinava. Mas ela não está aqui, (...) anda aqui em baixo. Olhe, tem um livro quase todo só de versos que ela fazia para as crianças da escola. INQ Ah! INF Para representarem, quando entregavam o galo. Entregavam o galo e um cabrito à professora, e depois faziam-lhe aqueles (...) versos. Cada criança fazia seu verso, (...) para representar. INQ E ela é que fazia os versos da criança. INF E ela era quem as ensinava. INQ Ah, mas eu não queria desses feitos pelas pessoas. Queria daqueles que, que até, que a senhora aprendeu com a sua mãe, e com a sua avó, e que falavam de... INF Mas eu (...) não sei. INQ Então e rezas antigas, não sabe nenhuma? INF Rezas antigas, eu sei, e até orações. INQ O Justo Juíz, orações daquelas bonitas, INF Ah, pois! INQ o Justo Juíz Divinal, a Oração a Santa Bárbara. INF Eu sei. Ainda sei. INQ O que é que a senhora reza a Santa Bárbara? INF Olhe, as senhoras não sabem, não têm o Livro de Horas de Piedade? INQ Não. INF Não têm? Ah, pois eu tenho. Esse livro é que tem as orações todas, e é o que se faz nas Vias Sacras (...) . INQ Mas eu não queria esses que estão nos livros. Queria as outras, aquelas que não estão em, nos livros nenhuns. INF Não sei. Eu sei orações, quando me deito e quando me levanto e assim.
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INF1 (...) Eu ensinei muito, ensinei muitas crianças, muitas coisas, e outras tirava-as da cabeça... INF2 Esta ensinava a canalha da escola (...) . INF1 (...) INQ Agora já não está com paciência. INF1 Não, sei ainda muita coisa, até tenho escrito em papéis e assim (...) . INF2 Até tem escrito papéis. INF1 Mas não é, não é assim que me pedem. Eles pedem um conto, uma comparação: Fundões. De que é que foi gerado, de que é que veio este nome? (...) Era uma fundição. Acho que era uma fundição de ferro, mas quem é que sabe?
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INF O pão vai para o moinho, não é? INQ Sim. Diga lá. INF Vocês já viram o moinho. INQ Já, sim senhor. INF E depois vem moído . Eu até tenho ali ainda (...) farinha num saquinho. Que de cada passo faço sopinha de farinha. Sego as couvinhas, miudinhas, boto-lhe sal, boto-lhe azeite, a couvinha está cozida, boto a farinha num tacho, desfaço-a bem desfeitinha, boto-a assim à sopa e fica... Porque há quem faça assim: bote logo a farinha na panela. Depois fica aos beloiros, àqueles beloirinhos. Mas eu não. Desfaço tudo em água. Depois é que boto para a panela. Agora (...) para cozer o pão, a gente tem uma masseira - que a masseira já a não tenho, (...) já desfiz, mas tenho a peneira - a gente vai, peneira para a masseira (...) . INQ A peneira é para quê? INF Para peneirar o pão, para sair (...) a casca. Porque a casca não vai junta (...) com o pão. Tem que se tirar a casca. E depois, a gente vai, põe assim na masseira, está a água bem quentinha - a ferver não, tem que ser numa média, mais ou menos -, a gente bota a água, faz assim uma pioca na farinha, tira logo a que tem que ser para tender, para tender o pão, porque se não (...) depois (...) agarra-se às mãos. E depois bota-se aquela água quente (...) naquela pioca com o fermento, desfaz-se o fermento bem desfeitinho, bem desfeitinho, toca a gente a botar água, tudo bem amassadinho, depois, ó amigo, tem que... Até que estoira as mãos. (...) As mãos estoiram no pão. INQ E isso assim é para fazer o quê? INF Amassar o pão, para ele ir para o forno. E depois só se deixa de se amassar, desde que ficaram as mãos limpas. Tem que ficar (...) as mãos limpas. Não pode ficar (...) a massa agarrada às mãos. Depois então é que se apanha, apanha-se e vai-se fazendo assim, aprainando, aprainando, (...) bota-se para cima, aprainando, depois vira-se daqui para ali, daqui para acolá, e depois cobre-se bem cobertinha com um lençol já próprio para cobrir o pão, um cobertor ou uma manta, por cima, depois quando ele começa de abrir assim (...) uns gricheirinhos, assim, e se e que está a abrir, a gente trata de tender. Depois, pesa-se - tem a gente ali a balança - pesa-se e põe-se assim, (...) por exemplo, por cima desta arca, é uma coisa maior, mas põe-se assim aqui por cima, para pesar, só, e depois é que trata de se tender. Depois dá-se-lhe aquelas voltinhas, a gente vai daqui, vai dali, tumba, tumba, e depois vira-se com o debaixo para cima, e depois vai a gente assim por a masseira adiante, fica assim aquele bolinho muito azado. Depois, a gente (...) mete-o ao forno, tem que ter farinha na pá, porque senão, agarra na pá, e mete-se lá para o forno.
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INQ Olhe, nunca usavam farinha misturada de trigo e milho? INF (...) Primeiro não, mas agora já misturam. Já, já. INQ E com a de milho, a de milhão faziam o quê? INF A de milhão fazia das broas, que era o que se comia. Quem metia muita gente, então... INQ Como é que faziam? INF Primeiro, até tinham as broeiras, chamavam as broeiras, assim, duas tábuas, e depois metiam-lhe assim uns paus e punham o pão a secar, para os trabalhadores comerem comer pouco. (...) Agora querem-no dar e não têm trabalhadores para lho fazer. INQ Olhe e como é que tendia? INF O primeiro dente que me partiu foi a comer pão duro, em casa daquela mulher onde fomos ver (...) a pioca. Foi em casa da mãe dessa mulher. Meu dentinho, que eu até chorei por ele! O pão era muito duro, andávamos lá na malhada, eu ia cheia de fome, queria comer... Afinal fui a partir a côdea, o dente, trupa! Ora pronto! Fiquei eu desdentada! Agora os que tenho tive que os comprar.
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INQ Olhe, e para aquecer o forno, como é? INF Ai, tem que se meter lenha dentro. INQ Que lenha é que usa? INF É urgueiras, ou giestas, para dentro. E depois, de vez em quando, vai-se com o ranhão - chamam-lhe o ranhão - mexer o forno e (...) ranha-se o forno. E bota-se as brasas para um lado, que é para meter lenha para outro lado. Depois quando ele está quente, a gente vai, faz um basculho de giesta, apertado (...) com as vergas de giesta. Depois mete-se assim num pau. Depois a gente vai - às vezes, punha assim (...) uns farrapos assim nos braços, porque a gente queimava-se. E ainda tenho aqui cicatrizes das queimadelas. INQ Pois tem. INF Oh! Ia, varria, varria, bem varrido. Depois, (...) aquele borralho, punha-o cá para a frente do forno. Quando acabasse de meter o pão ao forno, ia com o ranhão, botava assim para a frente do forno para pôr cor ao pão. (...) Se (...) o pão (...) não tiver cor, não se podia pôr a porta. Depois que visse o pãozinho já com cor, fechava-se a porta, enquanto não estivesse cozido. Depois, se estivesse cozido, a gente abria a porta, ia com a gancha, mexia-o dum lado para o outro, para não estar em cima (...) sempre daquele lugar. Porque havia lugares, (...) que ele já estava já passado, havia lugares que estava quente e a gente mudava para lá. Depois tirava-se, pronto.
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INF Havia aí um forno que cozia todos, todos os dias. Todos os dias cozia, porque o povo é muito grande. (...) INQ E era para várias pessoas? INF É, iam. Eu também lá ia quando não tinha o forno, mas ao depois (...) a ladrona roubava a massa da masseira e (...) ia botá-la aos porcos, à pia. E uma vez (...) foram lá dar (...) com um avental dela, não teve tempo de a levar para casa, e o cão agarrou (...) naquele avental (...) de massa e correu pelo povo fora. E depois foi um falatório. E depois a mim também me fez igual. E eu, está claro, um dia disse assim: "Ai, ó Almira, tu não te demores a ir para o forno que é preciso acarrar a água". Que ela, ela a ladrona, bota-se à... Se vou acarrar a água, tenho que ir buscá-la à fonte, e ela cá faz a fateixa. Ele estava a nevar, nevava muito, eles não puderam ir. Eu peguei e digo: "Bem". Depois dizia-me ela: "Vai buscar a água. Vai buscar a água, que é preciso. Vem outro freguês para cozer". Ela o que queria era que me eu desandasse. E eu fui. Quando vim, já estava a fateixa feita. Apareceram os meus filhos, o meu mais velho e a minha filha. E eu disse assim: "Raio vos parta. Ela a excomungada, já fez a fateixa". Diz: "Ó minha mãe, não se aflija que eu vou dar com ela". Lá andámos debaixo da masseira, duma caixa grande, num pilheiro, onde ela tinha para aí obra duma broa (...) , para trás do forno, e o meu filho lá foi dar com ela. Diz: "Ó minha mãe, aqui está". Depois eu, está claro, andei, andei pela picueta. Depois fui lá para me tornar a cozer mas já: "Ai, eu não tenho vagar, ah não tenho vagar". "Então já enriqueceu (...) com a massa que me roubou? Já enriqueceu"? "Ai menino Jesus perdoai-me, já que ela não me quer perdoar"! Digo: " Que te perdoe Deus ou o Diabo". Nunca mais! Depois digo: "Bem, tratem de me comprar um forno". Depois um senhor que mora ali nos Jorjais, ali à borda da estrada (...) . É cantoneiro, o que é agora está reformado. Era de Amarante. Acho (...) que é o carteiro. É, é. Era de Amarante. E eu disse: "Ó senhor Aristipo, o senhor quando for a Amarante, traga-me um forno". Disse: "Trago, sim senhor. E trago um para o Freixo". Trouxe-me então o meu, e trouxe um para o Freixo. Olhe dei em o cozer (...) . Nunca mais me roubou mais nada.
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INF A lavagem era comidas que sobravam e pão duro e cascas de batatas (...) ... INQ1 E trazia-as já feitas? INF Trazia. Ia lá ele com a carrinha buscá-las. Chegava a gente aqui era só botá-la à pia. Nunca lhe botávamos nada cozido. A gente botava tudo rilhado. Botava-se num balde couves troçadas, batatas partidas aos palitos. Botava-se um pouco de farinha, ou ração - que agora usa-se mais a ração. Botava-se para a pia, eles lambiam tudo. INQ1 A pia era... em quê? INF Pia de pedra. Uma pia mais ou menos como o pio. (...) Mas só que é assim : mais largas. Mais largas, em cimento... INQ2 Nunca havia de madeira, de pau... INF Isso chamam gamelos. Isso era só, quando (...) as porcas parissem, (...) para habituar os leitõezinhos a comer é que a gente punha aquele gamelo; para se ele habituar a comer. INQ2 E era redondo? INF Era assim comprido, assim umas tábuas, assim. Era assim comprido. Depois por baixo uma tábua grande e depois dos lados umas tábuas assim, outra dali e depois assim (...) nos cimas, assim umas tabuinhas.
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INQ Então, fale-nos lá da matança. INF Como? INQ Fale-nos lá da matança. INF Ah! Primeiro, pois chama-se pessoal para pegar nos porcos. Mas é uma trabalheira. Eles, coitadinhos, a gente cria-os e depois vê-os vê-los assim morrer à violência; é triste. Eu, fugia! Eu não os queria ver (...) agarrar, coitadinhos. A gente chamava-os para o quintal: "Andai Anda cá, coitadinhos". Eles, então, deitavam-se ao pé da gente: "ah, ah, ah". (...) A gente ranhava-os e eles então abriam as pernas. Quando eles vinham para os matarem, não era preciso andar atrás deles. Eu chamava só: "Pequerruchos, pequerruchos, pequerruchos". E eles então vinham para o quintal. Chegavam, mas os homens não estavam lá. Tinham que estar (...) que ele os porcos não os vissem. Agarrava logo um numa perna, outro noutra, outro no rabo, outro (...) nas orelhas - toca para cima do banco. Às vezes, ele até botava pouco sangue, porque aquilo era de súbito. E depois, com uns alguidares, a gente botava-lhe sal, um bocadinho de alho, folha de loureiro, (...) uma espiguinha de centeio, que era (...) para o sangue tomar melhor. Depois a gente tinha já os potes da água a ferver; ia-se para cima, porque eles ao depois, dês que estão os porcos já mortos, tratam (...) de lavar um lado, não é? Quando o viram para o outro lado, tem que a gente vir com um prato (...) de sangue cozido e (...) uma caneca de vinho e uns copos num prato, para eles comerem comer o bocado de sangue cozido e a pinga. (...) Quando lavasse lavassem o outro lado, tornavam a beber, mas já não comiam sangue. Depois, ia-se pendurar, penduravam-se pendurava-se até alguns aqui, outros em baixo. Chegámos a matar aos quatro.
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INF Há aquela carne magrinha que é para linguiças, aquela carne. INQ As peitugas é o quê? INF As peitugas é aquelas mamocas. INQ Ah, ai são aquelas que a senhora já me disse. INF É. Isso (...) é o rejão da desfeita. O rejão da peituga. INQ Então o rejão pode ser da peituga e pode... INF (...) Há rejão (...) quando se mata o reco, que é o rejão das tripas, que está agarrado às tripas - tem assim um véu, mas muito engraçado - e o rejão morto. E depois da desfeita, é o rejão da peituga. É. Põe-se numa panela, ao lume, e depois come-se aquele rejão com batatas, ou pão ou broa. Como sabe-me bem é com broa de milhão. INQ E quando se desfaz o porco tira-se assim umas grandes partes de gordura, só gordura? INF (...) Se são gordos. Agora, quando são magrinhos, (...) é só carne magra. Mesmo até as bandas, são magrinhas. Agora (...) o cerro é que é um bocadinho mais gordo, mas também tem magro. Nós temos sempre sorte com os porcos.
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INF Vou com o meu rebanho. Vou com o meu gado para o monte. (...) INQ O que é que ele faz ao rebanho? Está... INF (...) Anda com ele e, depois, chega-as aqui a comer. Chega-as ali, onde ver vir que há pasto, que elas às vezes não vão. E ele vai, com o pau, e charonda-as (...) para onde há de comer, para elas virem vir fartas à noite.
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INQ1 Não havia gente que vinha para afiar as facas, quando as facas estavam... INF Ah, bom. Isso, para amolar (...) as facas ou as tesouras, isso até faço eu muito isso aí. Vêm: "Ó, ó ti Abelardo, amole-me aí umas tesouras" ou "aguce-me aí uma faca". INQ2 Por aqui nunca vinha um, um senhor... INF Ah, antigamente vinham. Vinha um amolador... Já há muitos anos não vem. Trazia uma roda. Trazia lá uma coisa, lá punha, com a mão ali e com o pé, ali com o pé. O homem depois fazia andar aquela roda e daí fazia andar (...) o esmeril. Compunha muito as tesouras, as facas, as navalhas de barba e - já não me barbeio - compunha guarda-sóis. É. Vinha. Agora, já por aí não vem. Já há muitos anos, muitos. Já não vem nada.
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INQ1 Não há ninguém que faça cestos? INF Aqui, cestos, agora também não há. Lá para o pé de Vila Real, há. (...) Antigamente faziam-se. Ainda há aí rapazes habilidosos. Olhe, havia aí quem fazia. Agora já deixaram de fazer. Antigamente, havia muita gente. Havia muita gente e tudo trabalhava. A gente fazia de tudo. Tinha irmãos, empalhavam garrafões, faziam cestas aí, que era (...) um encanto. INQ2 Como é que faziam? Que cestas é que faziam? De que feitios? INF (...) Oh, faziam cestas de duas asas, faziam de quatro asas, cestas pequeninas, grandes, para as mulheres, as raparigas fazerem a fazer na meia.Faziam de diversas madeiras, de cor... É .Faziam muito lindas. É umas madeiras que havia, ficavam amarelinhas. Eu tinha ele era um irmão, que trabalha de carpinteiro também (...) . Também em rapazito novo, quando andava com as ovelhas. Quando andava com as ovelhas (...) por lá, tinha vagar... Fazia-se rocas para as mulheres fiarem fiar . A gente de primeiro (...) não estava a ver televisão. A gente agora tem a televisão, passa o tempo na televisão. Antigamente as mulheres fiavam o linho, lã e faziam serão, a fazer fazerem (...) na a meia, outras botavam remendos às roupas, outras cosiam os meiotes. Hoje já nem cosem os meiotes!
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INF É como o pássaro-cabra. De noite até me põe medo. Começa ele: buru burururu. INQ Isso é quem? INF É o pássaro-cabra. INQ Como é que é esse? INF É um pássaro que (...) já me pôs bem medo. Eu estava acordada, até estava a rezar o terço. Tenho-o sempre também debaixo da cabeceirinha. Ó, vê ali? Ó. Estava a rezar o terço e ouvi assim uma coisa: uuuu turururururu. "Ai, que virá para aí"? Depois continuei a ouvir, mas (...) só pia de noite. Põe muito medo, aquele ladrão. E depois eu digo: "Olha, é o pássaro-cabra".
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INF Dos gambozinos? Ah isso, e jogar a reca, também. Fazem uma pioca assim no meio da terra e depois arranja-se assim (...) uma coisa de madeira, chamam-lhe a porca. E depois eles vão - têm assim uns paus compridos - depois cada um vai e atira assim uma porrada (...) na porca, na cova. Aquele que a botar fora é o que ganha. Mas eu não, eu (...) essa porcaria (...) , esse jogo, não gostava de ver jogar. INQ Como é que esse jogo se chamava? INF Jogar (...) a reca. (...) Agora é a porca, mas naquele tempo era é jogar a reca. "Ó fulano, vamos jogar a reca? (...) Vamos jogar o eixo"? O eixo era pôr-se assim... As meninas, quando eram pequeninas, também deviam fazer. Punham-se assim debruçadas e depois vai um a cavalo, depois vai outro e depois vai outra, vai outra, oh!
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INF E foi assim que arranjei a metê-lo no Sanatório Marítimo do Norte. Foi com o Doutor Adalfredo, de Alijó, e o Doutor... - parece-me que era Doutor Adelfo. Depois também já não tinha - o quê? - um rim. Um Doutor que olhou também por o meu marido - parece-me que era Doutor Adelfo - era um Doutor (...) até bem-parecido, forte, e tinha duas meninas. Uma vez ainda lhe levei uma duzinha ou duas de ovos e a menina quis a cesta. E a mãe disse assim: "Olhe, minha senhora, a minha menina está (...) a agradar uma cestinha" - que faziam os que estavam (...) nos hospitais, e depois fazem umas cestinhas muito arranjadinhas, pequeninas. "A menina queria a cestinha. (...) Se a senhora pudesse deixar, preferia de que aos ovos". Eu disse assim: "Eu deixo a cesta e os ovos". E lá ficou. E ela ficou toda contente.
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INF1 Esteve lá cinco anos. E quando veio, ainda era por lhe eu dizer (...) que estava mortinha cá por ele, eu e as minhas filhas. Ou mais, senão, ainda até o lá tinham mais tempo. E o senhor que olhava por ele até já morreu. Ainda morreu primeiro do que o ao meu marido. (...) Era o enfermeiro... INF2 (...) INF1 Era. Mas nem sei já como era que se ele lhe chamava. Era. Era. E é assim. Ele lá esteve, depois cá se veio embora. Ainda andou para aí um ano ou dois, na freguesia. Foi dizer aos fregueses, a Pinhão Cele e à Torre - que tinha os fregueses naquelas povoações lá em cima -, (...) que só podia carregar um alqueire, debaixo do braço. Que não podia levar sacas grandes, de cinquenta quilos, que era que se traziam. "Olhe, eu agora só posso levar um alqueire que chegue a dois, assim (...) debaixo do braço". Agarrava-lhes debaixo do braço. E os fregueses fizeram-lhe isso tudo. "Levar, até te o lá levávamos (...) num carro, ao moinho, se o moesses lá". E tudo. Gostavam todos dele, muito, muito, muito! Pinhão Cele, carago, quem falar no Ademar, Ademar Moleiro, Ademar Adeodato, era como ele era. Mas era moleiro, sempre moleiro, nunca teve outra arte. Nunca teve outra arte. E é assim. Tudo teve pena dele, tudo o vinha cá ver, a casa. Mas lá morreu. Oh, mas depois, depois ainda andou assim no Verão - quase um Verão ou dois - mas depois deu-lhe uma trombose, foi para o moinho. Eu já ia (...) a mandar um homem lá a procurá-lo, à noite, e ele não vinha, (...) e tinha-lhe dado aquela trombose na cabeça e não me disse nada - até lhe deu lá em Pinhão Cele. E ficou-se assim meio tal, e chegou, (...) ainda comeu, ainda jantou, e foi para o moinho. À noite não vinha. Quando veio, não falava. Não dizia nada. Só nhunhunhu, nhunhunhu. "Ó homem, tu como vens?" "Olha, deu-me isto. Já me deu de manhã em Pinhão Cele, nem te disse nada". Não falou. Pus-lhe o comer e ele comeu e foi-se embora. Vinha só: nhunhunhunhu. "E deu-me isto. Agora, olha, não queiras as partilhas" - tínhamos partido com os meus irmãos umas leirinhas que a gente para aí tinha - "e (...) não assines". Ele só queria o moinho. E foi com a paixão disso que lhe deu. Olhe que (...) é uma coisa a gente ter uma paixão por uma coisa, (...) e não a aguentar. Ele queria o moinho. E aqui a minha família - uma era esta irmã, foi esta irmã e a que está em Justes que não lhe deixaram o moinho. E ele com aquela paixão foi-se embora. Estavam a partir (...) e ele queria (...) que lhe deixasse deixassem o moinho. (...) Estava assim doentinho; e no moinho ia ganhando o pãozinho, não era? Para ele e para mim. Os filhos já estavam por lá, a governar-se. Mas, para nós, outra coisa não fazia e eles não lho deixaram. Não lhe deixaram o?moinho. E ele com essa paixão, pôs-se a cavalo no burro e foi-se embora para o moinho. Quando veio à noite, veio assim. (...) Deu-lhe aquilo. Foi de se aborrecer. Eu ainda disse: "Se eu soubesse que o meu marido lhe deu aquilo (...) por via deles (...) remocar com ele e não lhe deixar as partilhas (...) à vontade que ele queria, que até ficava de prejuízo, eu nunca mais falava para eles". Mas o meu filho, coitadito - (...) ainda esteve agora aí, esteve agora cá, no Natal. Até antes . Veio cá no Natal e veio cá no Entrudo e veio cá agora na Páscoa. Ele está em Valadares. Oh, está em Valadares, também só digo maluquices. Não está em Valadares, (...) está no Porto. Não é bem no Porto, é depois, é noutro lugar em deslado, mas tanto faz. (...) E vai-se a ver, pronto, foi assim. Ah, mas já não sei o que estava a dizer - INQ Disse que foi o seu filho que não... INF1 ah, pois, o meu filho. Eu, eu queria ficar zangada com eles, ao menos uma temporada, mas o meu filho disse-me assim: "Ó mãe, a senhora tem que ficar contente com todos. Não se pode aí ficar raivoso. Deixe lá. Nós ficamos com a casa - que é esta casa, tenho lá em baixo outra -, nós ficamos com a casa e eles ficam com o resto das terras". Olhe que eu não fiquei nem com uma hortinha onde plantar uma couve. Ficaram eles com tudo. E eu só fiquei com esta casa. Mas já fui eu e os meus filhos quem a compusemos, que foi tudo abaixo, que era de paredes, como está aqui, de paredes, e aqui eram quartos de madeira. Está madeira debaixo deste quarto, desta casa. Ainda nem se queimou nem se utilizou. (...) E os meus filhos e o meu genro foram quem compuseram isto tudo. E pagámos (...) . Foi tudo composto, mas foi o que eu fiquei. E eles têm bons lameiros. Lameiro bom (...) que lhe dá bons contos. E assim. Mas depois aborreceu-se muito e depois ficou assim. Mas o meu filho pediu-me muito para ficar contente: que não se podia andar raivoso. "Deixe lá, não vale a pena. Nós não enriquecemos assim. Cada um tem de o ganhar onde estiver e deixe lá as terras. Não se importe". E não quis. E nós cá ficámos com isto. E pronto! E depois, ficámos contentes, que ele não quis que a gente ficasse zangada.
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INF1 Olha que hoje bem vi vir aquela e ainda foram para a capela passear. E eu estava na janela. Vós não vistes. Que eu vi-vos vir! Fui à janela (...) . Vi-as (...) . Também vinha a outra, a outra de lá, de Justes; ela também anda sempre a acompanhar. Mas, 'fizestes' o que tinhas a fazer e eu estou a ver. INF2 Fiz o que tinha a fazer (...) , fiz a prova de vida mais nada. INF1 Estive à tua espera. Pois é, mas 'fizestes' a prova de vida e eu fiquei sem fazer a minha. E bem sabes que desde que tenho cá a carta, se não fosse a estar à tua espera como tu me 'dissestes', que esperávamos e que ia contigo, eu tinha ido. Tinha ido com os outros, que já têm ido quase todos. INF2 (...) Hoje é que era o dia. (...) INF1 Pois é, mas... Era o dia (...) mas não me 'dissestes' nada. INF2 (...) Disse-te quando ela me telefonou: "Olha a Ágata telefonou-me". INF1 Pois, (...) mas dizias assim: "Eu tenho de ir (...) com a Agar, que ela tem estado à minha espera, (...) tenho de ir com ela". Nem há (...) ninguém que o não diga. INF2 (...) é para irem mais tarde na camioneta . INF1 Pois. E era o que eu ia. INF2 (...) Tinha umas coisas a fazer com ela. INF1 Pois. Pronto. INF2 Tu sabes que (...) eu já te tinha contado. INF1 'Fostes' melhor com ela de que a pagar, como tenho de pagar eu. INF2 Tanto fazia pagar como ficar a dever. Nuns lados paga-se, noutros dá-se dinheiro. INF1 (...) Tenho de ir segunda-feira com a Afrodite. Diz que vai lá segunda (...) e eu vou com ela. INF2 E eu também quero ir lá segunda-feira. INF1 Porque eu tenho medo, até de ir à vila! Olhe, fui lá tanta vez - por a doença do meu homem e tudo, que tinha de ir por remédios (...) e de ir lá (...) - e tanta vez fui e não tinha medo. Sabia-se onde ia, (...) ali às farmácias. Agora - modifica tudo - está tudo modificado e aqui é uma coisa e ali é outra e a gente também já não tem tino para saber nada. Eu não tenho, não. Ah, tenho oitenta anos! Já irei para os noventa, sei lá! Mas, eu até me parece que não tenho tanto, que ainda sou criança.
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INF1 Quantos (...) irmãos éramos? Seis ou sete ou oito. Nós éramos oito. Mas dois estavam para o Brasil, estavam cá seis. E eu ainda andei, mais de quatro anos, num moinho, a ganhar o pão para os irmãos. A minha mãezinha tinha que ir para isto, para aquilo, para o outro, e ia remendar, e ia trabalhar e (...) olhar por eles. Fazia tudo e eu era que andava no moinho. E ainda ofereci esta para Pinhão Cele - que também ainda lá esteve (...) uma temporadita, não sei o tempo que foi. "Eu dou-lhe para cá uma pequena", para (...) uma amiga minha que lá estava, e ela lá andava com ela, ia com a ovelhinha, com as ovelhinhas para o monte (...) . Ainda lá esteve não sei quanto tempo. INF2 Dois anos. INF1 Ainda. Pronto e foi assim. E os outros criei-os todos. Tinha uma irmã de dois, de dois aninhos, e os outros todos por aí fora.
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INF1 Pois é, agora é tudo assim. Ah, dizem que é tudo, mas ainda não é bem tudo. A gente vai a Vila Real, a igreja está cheia (...) . Outro dia fui lá - cheiinha de gente! INF2 Está cheia (...) mas vai lá povo (...) para vinte igrejas como aquela. INF1 (...) E então ele há muitas. Lá há mais do que uma e que duas, é pelo menos três - que eu conheço-as, já estive nelas todas três - e está tudo cheiinho. E tudo vai, o mais de tudo, vai, tudo vai à comunhão. Esta gente assim deve ter fé em Deus, senão não iam, não acha? INF2 Fé em Deus todos temos que ter. INF1 Então, não. Cuidado . Ao menos eu, por mim... INF2 Pois é. INF1 Eu por mim digo, (...) se me entrasse, como dizem que entram entro , o fim do mundo - eu, por mim, não devo lá chegar - mas, que dizem que: "Queres ser desta lei, ou queres aquela, ou queres a lei de Deus"?, eu preferia que me matassem mas queria a lei de Deus, não queria cá... Então, ele a gente vai à igreja e vê o Nosso Senhor morto, crucificado. Viveu e morreu por os pecadores e a gente não há-de querer essa lei? Eu quero, quero sim senhor.
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INQ1 Olhe, dizia-se alguma coisa quando, numa família, havia sete filhos? Dizia-se alguma coisa do mais novo? INF1 Ah, diziam dizia que um que era bruxo. É. Quando houvesse sete, que um que era maluco - ou assim seguidos (...) ... INF2 Não era maluco, era lobisomem. INF1 É, pois. 'Lúbis'. INF2 E faziam-lhe - não sei com que era - sangue num dedo. É isso? INQ1 Sim, queria saber o que é que diziam. INQ2 Como é que era? INF1 É, diziam que lhe faziam. INF2 Se fosse menina, que era bruxa, e se fosse menino, que era lobisomem. (...) É. (...) Aqui na nossa zona, por aqui não há ninguém que tenha sete filhos. Mas ouvia-se falar que havia uma senhora que tinha sete filhas. Depois à última, disseram-lhe que fizesse: "A esta faz-lhe já sangue no dedo mindinho senão fica assim". Mas não seria verdade? Mas também podia ser, isto é uma lenda. (...) INF1 Eles diziam. (...) INF2 Eu, por mim, eu se tivesse sete filhas - é, não é rapazes e raparigas, é só rapazes ou raparigas -, se tivesse sete filhas ou sete filhos, do último, fazia-lhe logo. INF1 (...) Sete de uma qualidade. INF1 Que é bom fazer-lhe sangue. Quem fizer sangue, (...) já não tem mal nenhum. INF2 (...) Contavam que havia uma menina muito, muito rica - muito rica... Até nem seria assim muito - e que namorava um rapaz, e esse rapaz era lobisomem. INF1 Eram do Souto. Mas hoje já não há nada disso. INF2 E depois, começou-se assim a constar (...) e foi aos ouvidos aos pais dela. E os pais dela não queriam nem por nada que ela namorasse com ele. Mas ele morava numa avenida; e ele morava num lado e ela morava do outro. Depois, disseram: "Eh, ai, é?" "É, é. A senhora, senão, para lho saber, vai ver que quando for meia-noite, (...) se não ouvem por aí adiante um cavalo (...) a estropiar". A rapariguinha coitadinha, encheu-se (...) de coragem, e já tinha 'ouvisto' falar nisso, já tinha 'ouvisto' falar nisso de fazer sangue. Que é que ela fez? Pegou - em vez de se deitar - pôs-se de cá, em casa dela - como agora eu aqui (...) e ali a minha irmã, minha irmã (...) ali - e quando foi à meia-noite, menos um quarto, ela viu lá luz no quarto dele. O que é que ela fez? Na rua dali atrás , foi procurar uma silva, destas silvas muito grandes, que botam para aí esta grossura, vem (...) com aqueles picos virados - deve ser assim só um bocadinho virados. INF1 Silvas-machas. INF2 E ela pegou, foi cortar essa silva, lá a compôs em jeito de pegar nela, nas mãos, que já não tivesse picos, e foi-se pôr num caminho onde ela já tinha sabido que ele ia passar. E então, pôs-se lá detrás (...) - não sei se era de mato, se que era - com aquela silva posta assim nas mãos. Tinha coragem. Porque ela gostava dele. E disseram-lhe: "Olha, (...) só quebrando-lhe o encanto, só fazendo-lhe sangue!" Mas quem é que lhe ia fazer o sangue? Ela pegou, arranjou essa silva - chama-se a (...) silva-macha - e foi então para lá com ela, e quando ouviu (...) o cavalo a trepar, a trepar, ela pegou, fez, estendeu aquela silva fora, os picos vão (...) conforme estão estes meus dedos. INF1 Macha. Pois. INF2 O cavalo ia a passar, ela puxou-a - porque com o andamento do cavalo, passou a silva - e fez-lhe sangue - no cavalo, não foi nele. Mas ele ia transformado no cavalo... Pronto, ficou o príncipe ali de pé, (...) ao pé dela. Olhou, e vem ela. Ora quanto ele não ficou satisfeito! Abraçou-se a ela, trouxe-a para casa e casaram-se!
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INQ E para fazer, para fazer queijo, o que é que se tem de fazer? INF Tira-se o leite das cabras e bota-se-lhe o coalho. INQ Como é que se tira o?... Sim. INF Ah, isso, muge-se-lhe. INQ Sim, e para mugir... Ah, não? INF Eu nunca tive, (...) mas bem sei, já vi muita vez. INQ Para mugir as, as ovelhas... INF Olha, mugem-no aqui bem perto. Nesta, que vedes vejo à minha frente, tira ali o leite todos os dias. INQ E como é que põe as cabras? Põe assim tudo... INF Elas estão direitas. Aqui, aqui não têm... Há lugares que as põem presas e assim, em certos lugares, mas aqui não. Aqui têm-nas no quinteiro (...) e mugem para as tigelas e botam para a panela e faz bem. E faz bons queijos, também jeitosos.
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INF Estou aqui (...) a ver, a ver quando reza ali a missa. Eu não sei se as senhoras têm fé na missa. As senhoras têm fé? Há quem tem, mas há quem não tem. Eu, eu digo assim; eu estou a falar com as senhoras, não sei, porque não sei as ideias de cada um, não é? Mas, tem gente que tem fé (...) . E há, mesmo, até há. As senhoras não são jeovás, pois não? INQ1 Não. INQ2 Não. INF Aqui há uns em Souto que são jeovás. E até foi o que me (...) compôs esta casa. O Senhor Adrião, de Souto. E é jeová. Nunca foi e depois devotou-se a ser. E andou aqui nesta minha casa e tudo (...) e às vezes dizia-me assim. E eu ainda falava com ele com confiança. (...) Mas sei que ele é jeová. E há lá em Souto, mais de quantos jeovás. Deve ser . Há aí uns três ou quatro. E assim. E eu, eu digo a verdade. Eu só não gosto daquela lei por uma coisa. O Ao mais, por as outras, eu tanto me dá de ser daquela como não ser. Agora, dizer eles... Que as senhoras também podem não saber, também são novas, também podem não saber. Mas eu ouço dizer, de há muitos anos, que Nossa Senhora só teve o um filho, (...) e foi tocado na testa. Que Nosso Senhor (...) falou-lhe para ser mãe - de Nosso Senhor - e que não fazia mal nenhum, que ela não queria. Era uma mocinha nova e queria honra e vergonha, não é? Não queria ser casada. Assim como somos nós. Porque quem se casa, já se sabe (...) o que atura com os maridos, não é? E Nossa Senhora não quis. E os jeovás dizem que a Nossa Senhora - nisso é que eu não gosto (...) deles, por eles dizerem dizer isso - dizem que Nossa Senhora que teve mais do que um filho, (...) que fez como as outras mulheres. E eu isso não é que... Não tem padre nenhum, nem igreja nenhuma, nem livro nenhum de católico, de religião, que diga que Nossa Senhora que foi como nós fazemos com os nossos homens. Casamo-nos para dormir com eles e fazer os amanhos que eles querem fazer, não é? Sim, as senhoras são meninas, deverão ser.
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INF O meu homem esteve doentinho tantos anos, tantos, tantos, tantos e eu não andei em bruxedos, nem em lado nenhum, porque ninguém o curava. Ainda fui a Porto de Rio com ele e bem ainda gastei. (...) E lá, havia lá uma mulher, que ela veio do Brasil, e diz que curava tudo; e meteu-lhe as mãos ao meu marido, que ele era da espinha - tinha um colete de gesso (...) - e ela meteu-lhe aqui as mãos, por aqui, e queria que lhe eu tirasse o colete. Digo: "Não, não tiro que senão depois tenho de ir a Coimbra". Foi a Coimbra duas vezes botar o colete de gesso, porque a doença era na espinha. (...) Ela metia-lhe a mão por ali: "A senhora tem que lhe tirar este colete. Se lhe lho não tira, não cura". Digo: "Não, o colete não lhe tiro. Porque senão tenho de lhe ir botar outro". Que depois ele não podia andar. E: "Ah, não têm tem fé". E pronto. E Eu vim-me embora com ele. Viemos embora.
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INF Olhe, tive uma neta, da minha filha - tem os uns filhos aí; eles estão, estão já andam para aí -, e teve uma pequenina, que já tinha dois aninhos, ou mais, e ainda não andava nada. E havia de ser assim. Diz que era assim, que não havia de crescer. (...) Tinha essa corcundinha na espinha, pequenina de dois aninhos, e já tinha assim aqui o papo. (...) Olhe, prometi uma missinha às almas se Nosso Senhor ma levasse. E fui tão ouvida que ela morreu. Fui eu quem lhe paguei-lhe o caixão e fui quem paguei ao padre para a enterrar. E rezei a missa por as alminhas. INQ A senhora há bocado... INF Porque era (...) uma paixão ver depois assim uma menina, toda a vida, marrequinha - que chamam-lhe marrecos, não é? E assim aleijadinhos. Era uma tristeza, não era? Então aconteceu-me a mim. Aconteceu, aconteceu.
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INQ E quando uma pessoa morre e vai para a capela, e vão lá as pessoas todas... INF Foi o meu marido - para a capela, que não pôde entrar aqui. Ainda se lhe aqui pôs a mesa, com tudo INQ Mas às vezes faz-se em casa, não é? INF (...) e não podia... Pois faz-se em casa, mas não entrava aqui a urna. Trouxe-se, e não dava a volta, compreende? INQ Ah, não dava a volta. INF Não dava aqui a volta para entrar. Depois tivemos de o levar para a capela. O mais Mas já estava aqui deitadinho, e a mesinha posta, (...) com as toalhas que tenho, aí, nessa mala. Tenho essa mala cheia delas.
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INF Digo esta oração toda no meio de cada mistério, a rezar o terço, à noite, quando se vai à casa do morto e reza-se (...) por aquela pessoa e digo esta oração cinco vezes. Em cada mistério (...) sua vez. E muitos não dizem nada disso, não a sabem. Nem a rir . Foi uma mulher, que esteve a servir (...) em casa duns padres (...) - mulher é de Maçada até - e depois aprendeu e ensinou-ma. E eu escrevi-a num papelinho e aprendi-a. Depois, durante esse tempo todo, eu era que ia rezar a casa dos mortos quando morriam. Mas agora, já não podia. Tinha medo de me equivocar. (...) Olhe, viu agora (...) que eu (...) ia a dizer e já parei? Que a gente fica equivocada, e depois está muita gente, e não tinha, já não tinha cabeça. Só sendo muito, muito, muito, por muita necessidade, ao mais já não vou fazer nada dessas coisas. E agora muita gente já nem quer que estejam ao pé dos mortos e a rezar. Não quer estar a rezar. Depois a gente, está assim a gente, a casa cheia de gente, não é, e os donos bem gostam que rezem. Mas eles não gostam de estar a rezar, querem mas é estar a rir-se e a conversar. As senhoras bem devem saber, que é assim por lá, mas primeiro aqui era assim.
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INF Há pessoas que dizem que têm mal a outro e que o vêem invejam, que o invejam . Mas eu, eu disso não conheço. Não sei... INQ Deitar mau olhado? INF É. Isso não sei dizer. Não sei dizer, que nunca... Nem nunca procurei nada disso, mas dizem assim, tem gente... Mas primeiro, até se dizia que, primeiro, que havia mais essas coisas. E até assim bruxas, que andavam (...) nos rios (...) e assim. Agora, já nem se fala quase nada nessas coisas. Digo eu, não sei.
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INF Andam a jogar (...) , a jogar o quê? A cabra-cega. Eu não sei a que é que jogam, essas coisas, para aí! Eu nunca usei muito isso. Que é como já lhe acabei de dizer: logo desde nova, pequenina, eu fui servir e depois vim, vim (...) para a minha vida, nunca andei como andam agora, nunca tive esses vagares.
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INQ Costumava pôr uma, uma corda ou uma coisa para prender uma pata e uma mão do, do animal para ele não poder saltar? INF (...) Espere aí, a ver se me eu lembra. Depois há nomes... Apernar. INQ O que é que?... Como é que chama? Apernava com quê? INF É com a corda, não é? INQ Chamava corda àquilo? INF Então, ia e é com uma corda. E há quem faça e há quem tenha. Eu até tinha para aí (...) essas coisas que eu gosto de aproveitar. E às vezes, a gente, há coisas (...) que as procuram e eu estraguei. Eu tinha aí de apernar os cavalos para eles andarem andar a pastar e não fugirem fugir ; tinha isso tudo em ferro (...) . INQ Era uma corrente? INF Era (...) uma corrente mas tinha a coisa para não aleijar, para não partir partirem (...) as pernas (...) e coiso.
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INF Porque é preciso ver, vamos lá, a rega; que se a gente tem que andar ao pé dela a regar. Porque há terrenos que não é dado a gente ir botar a água... Que há aí águas que a gente não pode ir vir cá botar e deixá-la lá ficar, que pertencem a outros, mas pertence de rega. A gente (...) vai, rega, anda ali ao pé dela. Regou, vai tornar outra vez. Vai botar fora, vai botar para onde ela andava, ao caminho que ela trazia. E essas águas são de particulares, mas que têm parte, que a gente também tem. (...) Temos uma coisa que é (...) do São João a 18 de Setembro. Aí, as águas, é tudo partilha, cada um tem as suas. Mas despassa se passa o 18 de Setembro, as águas pertencem só ali. A gente só pode vir ir cá botá-las, mas é para ir regar. Se ela lá estiver, a gente: "Olha, eu vou regar aquilo" mas ao depois tem que ir botar para a do vizinho, como (...) nas açudas, não é? Nós aqui não, mas temos (...) , vá aqui (...) , para cima, temos muita largueza. Já se vê até verde lá cima e, olhe, até se vê daqui uma casa, lá. Está a ver? Para ali temos umas larguezas, chamamos-lhe chamamos nós as madorras. Aquilo é uma Aqui numa planície grande. Já lá têm tem pousado até aviões de emergência. Já lá pousaram dois. Mas aquilo (...) é muito grande, é uma largueza muito grande. Ora bom, daí tem os nascentes... INQ1 O que são os madorras? É essa largueza grande? INF Olhe, isto, antigamente até diziam, nós chamamos madorras (...) - que até espanhóis, eu já fui lá mostrar aos espanhóis - chamam-lhe madorras porque têm tem lá montes, que era dos mouros. Ali, há alguns há uns tempos, (...) travaram guerras. INQ1 Mas ainda tem lá? Ainda lá estão? INF Os madorros há. INQ1 São uns montinhos de...? INF São montões assim de terra, para cima... Tinha pedras, à moda (...) de coiso. Bem, uns dizem que - mas aquilo diz que foi tudo aberto - diziam que antigamente que, nas guerras, (...) dos mouros, não é, que enterravam lá (...) os grandes. E depois faziam aqueles... INQ2 Aqueles montes. INF Têm Tem pedras, assim grandes. Bem, alguns já os desfizeram, mas ainda lá há muitos assim, com aqueles rasgos, e ainda com pedras... Mas havia muitos. INQ1 Mas já estão todos escangalhados? INF Não, ainda há muitos que não . (...) INQ1 Ainda lá existem. INF (...) INQ1 Mas é assim um plano grande, é? INF Lá é. É plano, é. É mais praino do que isto aqui. Ah, vai lá o carro! INQ1 Ah, eu gostava bem de ver! INF Olhe, vocês querem ir ver? INQ1 Se nos sobrar tempo. INF Vocês, se quiserem ir ver, não se enganam nada. Vocês chegam ao Pópulo, (...) há lá um restaurante e há a garagem (...) do Agripa. Ora bom, quem vai daqui, antes de chegar ao Agripa, há uma estrada florestal para cima. Metem-se por essa estrada fora... INQ2 Mas para a direita, então? INQ1 Não. INF Para a esquerda, para a esquerda. INQ2 Para a esquerda, para a esquerda. INF Vocês metem-se por essa estrada acima, vocês vão ter... Lá vêem (...) as plainas e lá vêem os tais (...) madorros, os montões. INQ2 Madorros.
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INQ1 E como é que se chamam os homens que vêm segar? INF Segadores. INQ1 E se for uma mulher? INF Oh, segadeira. INQ1 Com que é que eles segam? INF A foucinha. INQ1 E põem alguma coisa nas mãos? INF Há quem ponha, há quem não ponha nada e há outros quem ponha um... Uns chamam-lhe uns dedais, outros umas dedeiras, conforme. INQ1 Mas aqui? INQ2 Mas eram de cabedal ou de cana? INF (...) Nós aqui é de cabedal. Eu não consigo segar sem eles. INQ1 Só com eles? INF Só com eles (...) . Também sego sem eles, mas não faço nada. Nem fazia. (...) Aquilo é de proteger mas também... Eu se for segar sem eles, parece que é a palha muito amorosa, parece que eu não a agarro bem. Fui habituado desde criança com aquilo.
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INQ Aqui há algum sítio perto onde se façam cestos? INF Aqui agora, perto, há ali para o pé de Vila Real. Ao pé de Vila Real, ali, é onde a gente vai comprar. Primeiro vinham até. Até cá os havia. Eu tenho irmãos que (...) faziam cestos e eu também lhe dava jeito. Mas tudo... Quando a gente era pequenito e charros a gente era jeitoso para aquilo . Agora já ninguém lhe pega e não dá! INQ O senhor chegou a fazer cestos? INF Cheguei. Oh, ia além arranjá-los (...) e coisa.
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INF E depois, com a pá, bota-se as uvas. Lá correm. INQ1 Mas aquele sítio fechado onde as uvas se deitavam é o lagar? INF É o lagar. INQ1 Que é um tanque, uma espécie de um tanque. INF Ah. Pois, isso é o lagar. Depois tem, donde sai o vinho, tem a lagareta, que é (...) para onde esse vinho, para onde se depois colhe, assim... INQ1 Mas como é que o pisava, era com os pés? INF Era É com os pés. Não, agora temos as esmagadeiras também. Também já há as esmagadeiras. (...) Mas ao depois trabalha-se (...) ... INQ1 Com os pés. E aquilo ficava lá alguns dias dentro do lagar, não era? INF Pois, agora aquilo, comparação: a gente mete a vinho, depois (...) tem que lhe dar o tempo de ferver. Ele ferveu, puxa o bagaço todo. Depois dá-se-lhe trabalho. Começa-se a trabalhar, anda-se lá a primeira noite. Sim, (...) ou de dia, vá lá, sei lá, quatro ou cinco horas. Ao depois deixa-se ferver; enquanto se não ferver, (...) a gente não torna lá a entrar. Depois ele ferveu, levantou tudo todo para cima; então a gente depois dá-lhe o trabalho que puder. Quanto mais trabalho puder lhe dar, com os pés, ou (...) com um engaço (...) ou como acá que se faça - já tenho feito, para diversos. Para não estar doente dentro , a gente põe um travessão no lagar e depois trabalha o vinho. Depois, têm-no lá até que ele dê a prova. INQ1 Não havia uma coisa... INF (...) Ele começa, quando se está a fazer, começa aí com dez, onze graus ou doze, conforme o peso que ele tem de doçura. Depois começa a azedar, só quando ele estiver para aí (...) a seis, a cinco, seis, cinco, a gente aí começa a envasilhar. (...) INQ2 E fica esse tempo todo no lugar? Quantos dias, no máximo? INF Fica. Bom, (...) às vezes pode só estar dois dias. Mas também pode estar três ou quatro. Ele tem que dar a prova. Bem, há muitos que o vindimam (...) que o metem para as pipas até de sete graus. Mas eu não gosto. Eu, eu gosto de o meter azedo. Eu, cá no quando o meu vinho, quando entra para o lagar está sempre a cinco, quando acaba do lagar está para aí a um ou dois, só. Primeiro, a gente metia-o assim cedo e ficava assim, parece que adocicado, e o vinho nunca se aguentava. E o vinho quer entrar, para ele ficar bom e coiso.
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INQ1 Há, chega uma altura em que é preciso mudar o vinho do pipo... INF Isso é passá-lo a limpo. INQ1 Passar a limpo? INF Passar ou engarrafar. INQ2 Não há nada que o senhor diga trasfegar? INF (...) Hã? INQ2 Trasfegar, fazer a trasfega, não, não se diz aqui? INF Bem, alguns dizem. Não, nós aqui não. Ele aqui é passar o vinho a limpo. Ou engarrafar ou passar a limpo. (...) Como agora, vou ter uma pipa dele engarrafado, agora tenho lá outra que eu não tenho garrafões para o meter, lavo (...) as outras e passo para ela. É passado a limpo.
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INF Ah, carvão, há. Antigamente usava-se muito. Agora, agora já ninguém tem vagar de andar a fazer isso. INQ1 Mas fazia-se cá? INF E eu bem precisava dele (...) para trabalhar lá na forja de ferreiro. INQ1 Mas era feito cá, esse carvão? INF (...) Isso era . Oh, nessas serras! INQ1 E como é que o senhor fazia? INF Oh! Eu ajudei a fazer muito ao meu pai que Deus tem. A gente arrancava o torgo, das urgueiras, não é, aqui era tudo de urgueira, boa, torgana, que isso era bom. Bom (...) para assar as castanhas e, vá lá, (...) para os ferros de passar e coiso. A gente ia, fazia (...) uma cova no chão; depois, chegava-lhe o fogo, ia botando para lá. Depois, conforme aquilo ia queimando, a gente ia puxando os toros para cima e os carvões ficavam para baixo. O lume vinha vindo sempre ao cimo, não é? A gente ia, vinha , ardia até ao cimo. Depois, com as lanchas de pedra, ia-se (...) pondo por cima do carvão, botava-se terra, abafava-se aquilo, o lume, quando fosse ao outro dia, ou coiso, estava tudo apagado, e já se podia tirar. A gente ia com uma criva... INQ2 E tinha umas coisas para respirar? INF Não senhora. Aquilo tapava, que era para o lume (...) não queimar mais, para ficar o carvão todo... INQ1 Portanto, a primeira coisa, quando ardia era mesmo assim a céu, a céu descoberto, se quisesse... INF Era, é. Quando ardia era, era aí, a gente, a gente fazia só aquilo (...) mais de Inverno. Que a gente botava, daqui lá para aquele cabeço, arrimava para lá com ele, era um calor! Então aquilo faz Até aquilo faça ... Carago! Era um brasume brasão que... Depois ia aquilo e aquilo coiso. Depois a gente tinha um pau comprido, ranhava aquilo, (...) os grandes vinham vindo para cima, não é, e o carvão queimado ia descendo para baixo e o outro vinha vindo para cima. Ainda há aí uma rapaziada aqui que já me tem dito: "Temos que ir fazer um bocado de carvão". Porque (...) a forja é uma coisa (...) que dá muito jeito.
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INF A gente quando é criado e tem pouco... (...) O meu pai tinha uma casinha boa de vez , mas éramos dez irmãos. Quando eles morreram, que fomos a dividir, foi um bocadito para cada um. A gente foi criado na lavoura (...) e deu para investir em terras. Mas olhe, tenho um bocado aqui em baixo, que dei onze contos por ele, é o dinheiro que está melhor investido (...) é na raiz, na terra. Olhe, dei onze contos por um bocado aqui em baixo, outro dia mandaram-me setecentos contos por ele. E eu estive para o dar. E eu não lho o não dei, que foi por via dos filhos. (...) Bom, e a gente tem amizade àquilo (...) . Porque, o dinheiro, pode vir o fogo e queima-o, mas a raiz não. Pode-se queimar o pinhal mas fica lá terra. Isso é que é verdade. Olhe, já vê, vê aquelas miras de verde? INQ Sim, sim. INF Aquela erva para cá, onde os senhores me viram, aquela terrinha que está feita e em cima já tem uns dias, chega até àquele muro alto, assim a cimo , tudo aquilo comprei. (...) Já comprei lá duas partes, mas a primeira parte que comprei, comprei muita. Comprei (...) um casalzito, era pequeno. Mas comprei ali e noutros lados. Mais além, ao pé daquele pinhal, aqui para baixo, (...) uma tapada grande, também de giestas que se vê por o lado de lá dos pinheiros, há uma vinhazita, aquilo para cima é aquela tapada grande de lenha forte. Bom, comprei aquilo tudo, mais lá ao pé de casa, uns bocados que valem vale muito, hoje, por treze contos. INQ Mas também naquela altura era dinheiro. INF (...) Era dinheiro. (...) A gente nem tinha esta coisa de pôr nos bancos nem nada, se o tivesse em casa, era sempre (...) o mesmo dinheiro. INQ Pois claro. INF (...) E agora também lhe digo outra. (...) Eu fui a França, estive lá pouco tempo e depois também ganhava lá pouquinho, mas todo o dinheiro que lá ganhei, se eu não empregasse, gastava-o todo, não tinha nenhum. INQ E assim empregou. INF E assim empregou-se, com custos. Mas a gente hoje, vá lá, se me visse enrascado, punha em venda e fazia (...) uns milhares, e assim tem-se o terreno e os filhos também. Eu gostei (...) de receber algum e os filhos também vão gostar, porque (...) a raiz não foge. E é como diz a história: (...) finca-te na raiz. A gente, olhe, este bocado aqui, comprei há dois anos (...) essa bouça e a que é que plantei este ano. Plantei; tem aí à beira de quase setecentos americanos, seiscentos e tal e ainda falta faltam uns poucos. Também comprei e dei seiscentos contos, também por uns catorze, eram era treze ou catorze números. Comprei bem. (...) Os seiscentos contos, tinha-os na Caixa, pouco rendia rendiam . Isto também não rende nada, mas se eu hoje fosse a vender, (...) davam-me três vezes mais, e só comprei há dois anos. INQ Veja lá. INF E daqui amanhã, ainda mais há-de dar, porque isto, o povo agora foge todo, mas deixe que em a ceia sendo tudo toda igual, você há-de ver muitos que hão-de vir para cá. Isto ainda vai ser tudo granjeado.
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INF Há aqui um regato, conforme vai estes ribeirozitos. E havia ali, também - que é (...) tudo em lameira - carvalhadas (...) e coiso. E havia, ao longo do ribeiro, por aí fora, vindo por aí acima, também havia (...) esses negrilhos. Mas olhe, (...) veio um... Não sei que doença isso foi... Ali para o lado de Murça, também me disseram que a doença deu (...) nessas árvores, secou tudo.