STJ01
INF1 Foi como uma que morava ali no Couço e depois... Morou cá uma data de anos. E andou a trabalhar no campo ainda! Tinha cá muitos 'irmões', muita gente. Depois, abalou de cá, foi servir para Lisboa. Esteve lá uns poucos de anos. Ao fim de uns poucos de anos veio cá, (...) e diz ela assim para o irmão (...) : "Ó mano, o que é isto que está aqui"? INF2 " (...) Que ferramenta é"? INF1 "Que ferramenta é aquela que está ali"? INF2 Não sabia que ferramenta era. INF1 Pois. (...) E diz o irmão assim: "Que diabo! (...) Há pouco tempo que abalaste de cá, e não sabes o que é aquilo"? INF2 "E não sabes o que é isso"? INF1 Ela vai , (...) pisa o cabo. INQ Ai! INF1 Pisa o cabo, o ancinho dá uma volta, bate-lhe aquilo na cara, "Eh, ancinho dum cabrão que já me bateu"! INF2 "Então agora já soubeste! Agora"... INF1 "Ah, grande puta! Agora já sabes! Já sabes, minha grande puta! Até aqui não sabias, mas agora já sabes o nome. Já é um ancinho"!
STJ02
INF E eu não 'devera' de ter ido (...) apanhar tomate. Estou reformada. INQ Pois. INF Há onze anos. Mas pensei assim: (...) "Os ganhos são tão poucachinhos"! Ganhei vinte contos. Vai a gente assim, que é pouco... INQ Pois, pois. Já nos disseram que era... INF Pois. A gente diz: "É poucachinho". Mas (...) é bom não os tirarem à gente, não é verdade? INQ Sim. INF É bom! INQ Mas também têm a vida... INF Mas é poucachinho! Eu vou todos os meses a Lisboa ao médico, ao Hospital de Santa Maria. INQ Pois. INF Já lá vou há onze anos. Ora, se a gente gasta dinheiro! Eu nunca vou sozinha, vou sempre com uma companhia. Sou acompanhada. Não posso ir sozinha. A gente gasta sempre. Nem que a Caixa pague alguma coisa, mas o dinheiro que vem assim é o nosso. E eu pensei... O meu homem está no desemprego ainda não há um ano. Ele faz um ano para o mês que vem. (...) Está desempregado. Está desempregado, ele agora não foi trabalhar porque - pronto! - (...) porque não quis, que ele está dentro do tempo da reforma. Ele mete os papéis para a reforma. E depois para onde ele ir já não lhe dá nem o papel do desemprego, compreende? INQ Pois, pois, pois. INF O tempo que falta para a reforma! Eles depois já não lhe davam o papel de desemprego, ele ficava aí sem ganhar mesmo nada, nada, nada, nada! INQ Pois. INF E então não quis ir ao menos estas três semanas ou quatro. INQ Pois! Se fosse, estava a ver que depois... INF Antes quis se manter à mesma com o dinheiro do desemprego, como estava, cá mais tempo agora até ser reformado. INQ Pois. INF E eu comecei-lhe a dizer: "Olha, vamos aí apanhar um tomatinho à caixa". Eu levanto-me melhor , mas eu não posso. E eu fui. Fui mais ele. Eu não 'devera' de ter ido. Mas fui, que eu não sou cá fingida, não digo: "Ai, eu não fui", por causa dos gajos da Caixa que andaram aí e (...) tiram as reformas à gente. (...) Se eles ma tirassem, deixa que o meu médico tentava logo para ma dar, porque eu não posso fazer mais nada, nada, nada, nada! Eu fui. Olhe, fui, deu-me isto (...) . Uns calores muito grandes! E a gente só íamos de manhã um bocadinho! Mas os calores muito grandes! Uma pessoa já anda cansada de trabalhar, uma pessoa já não pode! Fui-me abaixo!
STJ03
INF Então, olhe, mata-se o porco. A gente cá é... Cá na nossa terra é assim. (...) Cada terra tem o seu feitio, não é? INQ1 Exactamente. INF Há pessoas que matam à véspera, deixam os porcos pendurados... INQ2 Rhum-rhum. INF Para eles sangrarem, não é? E depois no outro dia é que os vão abrir, é que os vão 'desfachinar' (...) e salgá-los. A gente aqui não. A gente aqui matamos o porco agora de manhã, musga-se o porco. Uns é com um maçarico... INQ1 E, e quando não havia maçarico? INF A gente cá é... Eu (...) ainda nunca fiz com maçarico. A gente cá é com carqueja. INQ1 Ah, pronto. Isso é que nós... Nós queremos sempre o mais antigo! INQ2 As coisas antigas! INF Pois. (...) A gente cá é com carqueja. Musgamos o porco com a carqueja, abre-se o porco... INQ1 Então e antes de, de o abrir, quando, depois de o musgar, não lhe tira aquela pele? INF Tira-se. Raspa-se. Todo ele raspadinho, tudo raspadinho... INQ1 Raspa com quê? INF Com umas raspadeiras. INQ1 É mesmo... INF Com umas raspadeirazinhas. Depois lava-se os porcos muito bem lavadinhos, muito bem lavadinhos. Depois abrem-se ao meio, abrem-se os porcos, tiram-se-lhes as tripas. INQ2 E não se penduram? INQ1 Mas... Não se penduram? INF Não. INQ1 Ai... Então é no chão? INF A gente aqui não. É em cima da banca. INQ1 Ai, numa banca. INF Em cima duma banca. Tira-se... Depois tira-se as tripas, tira-se o osso do peito, a língua, o fígado e o coração. Lava-se tudo bem lavadinho, põe-se dentro dum alguidarinho, vai-se tirar as tripas. Tira-se as tripas, as mulheres vão para o rio a lavá-las. E as outras pessoas ficam cá a abrir o porco todo, 'desfachinar' tudo. Parte-se tudo aos bocaditos, tudo aos bocadinhos, tudo aos bocadinhos. Tira-se o lombo inteiro, tira-se os lombinhos, tira-se as costelas. Depois parte-se aos bocados, miga-se a carne com duas facas bem migadinha, bem migadinha, em cima das bancas, bem migadinha - dois homens ou esses que souberem, não é? - bem migadinha, bem migadinha. Põe-se dentro dos alguidares com alho, e pimentão, e sal, e água. Uma pinguinha de água, não muita. Uma pinguinha de água. Depois mexe mexe-se todos os dias de manhã e à noite, mexe-se (...) esses enchidos, essa carne. Todos os dias de manhã... (...) E o toicinho está na salgadeira salgado. Agora têm as arcas, mas isso é recente . INQ1 Rhum-rhum. INQ2 Rhum-rhum. INF (...) Eu ainda é salgadeira. INQ2 Rhum-rhum. INF Eu vim daquele tempo antigo. A carne na arca não presta. INQ1 Fica com outro sabor, não é? INF Não presta a carne na arca. Eu não gosto. (...) Mexemos a carne todos os dias, todos os dias. Ao fim dos três dias... INQ1 É ao fim de três dias... INF Ao fim de três dias, vamos enchê-la. INQ1 Rhum-rhum. INF Com as tripas do porco. Estão lavadinhas e metidas em alho e pimentão, e sal, dentro dum balde. Também mexemos todos os dias isso. Depois são lavadas outra vez bem lavadinhas em água limpinha - as tripas. Depois são cheias com a carne do porco. (...) A tripa não chega, compra-se tripa de vaca... INQ1 Rhum. INF E ata-se, voltam-se (...) do outro lado e atamos e enchemos.
STJ04
INQ1 E depois que enchidos é que faz? INF Fazemos linguiças. (...) Alguns chamam-lhe chouriços. A gente é linguiças. (...) A gente aqui é linguiças. INQ1 Rhum-rhum. INF E é as farinheiras - com as gorduras, com as banhas, um bocadinho da banha, pomos por exemplo, um bocadinho da banha branca, manteiga branca. (...) E as morcelas. Chamam-lhe eles aí para... Daqui para baixo é o chouriço preto. A gente aqui não é. A gente aqui é as morcelas. INQ1 Lá na minha terra também é morcela. INF Pois, (...) cada uma tem o seu feitio, não é? INQ1 Pois é. INF A gente cá é assim. É a morcela (...) e é as farinheiras e é as linguiças. INQ1 Chouriços não... Não faz nada a que chame chouriço? INF Não. INQ2 O que a senhora chama linguiça é, é assim gordinho? INF Não. INQ1 Ou é fininho? INF Não. INQ1 É fininho? INF É fininho. É das tripas delgadinhas. INQ1 Rhum-rhum. INF É as linguiças. E o bucho e o palaio INQ1 Rhum-rhum. INF e a bexiga, enchemos de arroz. INQ1 Ah! INF (...) Miga-se um bocadinho da carne mais miuduchinha e põe-se um coisinho de arroz, e pimenta (...) e enche-se aquilo. Depois põe-se ao fumeiro, depois cozemos aquilo inteiro - assim como está, inteirinho - e comemos assim às talhadinhas. Faz-se um caldo verde, ou um puré, ou (...) uma batatinha frita, uma saladinha e come-se aquilo assim. INQ1 Está bem. INF Uma refeição ou duas. Conforme for as pessoas, não é? INQ1 Pois.
STJ05
INQ1 E não faz nada... INF Fazemos pés de coentrada. INQ1 Como? INF Pés de coentrada. INQ2 Pés de coentrada. INQ1 Ah!... É os pezinhos mesmo, não é? INF É os pés. Porque os... INQ1 Assim... Mas não põe nada ao fumeiro? INF Não. A gente não faz, (...) aqui não se usa o presunto. INQ1 Ai não? INF Não. Nem sei. A gente, os pés, partia... INQ1 Aproveita só os pés? INF Os pés, cortam-se logo aqui assim, à ponta do porco assim; e depois é assim uns chispes; depois, os pezinhos, metemos no sal. Eu cá é no sal - há muita gente que é nas arcas, mas a gente é no sal. Depois partimos assim aos bocadinhos, aos bocadinhos... Se é muita gente, põe-se mais pés; se é pouca gente, põe-se pouco - um pé ou dois, não é? Depois coze-se ali com uma pinguinha de água e um bocadinho de linguiça e uma cebolinha. Depois tira-se, em estando cozido, põe-se ali um coisinho de banha num tachinho de barro no lume - no lume, no chão. INQ1 Pois. Assim é que é bom. INF Num tachinho de barro, põe-se um bocadinho de cebola picada, põe-se um raminho de coentros, põe-se o pé do porco e a linguicinha que está ali para dentro daquele tempero, e um coisinho de vinagre. Deixa-se dar ali uma fervura. Está ali (...) a sopa de pão caseiro toda migada dentro duma travessa, despeja-se aquilo para dentro, é comer e chamar por mais! INQ1 Pois. INF Vejam lá o comer que eu sei fazer, (...) que eu me avezei, porque me davam na minha casa e na casa da minha mãe.
STJ06
INF Eu andava lá a fazer a minha casa, aparecem umas meninas assim (...) como vocês - isto é um modo de falar. É preciso a gente compreender. Elas não são como vocês, vocês não são como elas. Deus lhe vos guarde a vocês de serem como elas. Elas são ali do pé de... Elas, eu até tinha ali a direcção delas. São ali do pé do Hospital de Santa Maria, dizem elas. Não sei se são, se não. Elas dizem que são - bem sei eu! (...) Eu andava a fazer a minha casa, aparecem ali aquelas duas raparigas. Uma era assim uma saia muito grande, parecia uma cigana! Tal e qual uma cigana, tal e qual, tal e qual, tal e qual, tal e qual! De preto! Vinha toda carregada de preto. Mas eu, carregada de preto, já não estranho (...) porque hoje a multidão a novidão usam muito o luto, não é? Quando a gente morre, eles não põem luto, mas depois usam o luto por luxo. INQ1 Pois. INQ2 Pois. É. INF E eu estava ali, andava ali a fazer umas coisas. (...) O pedreiro tinha acabado de abalar e eu fiquei ali, à espera dum filho meu que andava na fábrica do tabaco para vir almoçar. (...) E elas tinham dito: "Compre lá algum livro. Compre lá aqui um livro. Compre lá um"... INQ1 É... INF "Compre lá à gente um livro". Depois eu disse: "Ó mulher! Eu não tenho dinheiro para livros! Eu não tenho dinheiro para livros! Eu não sou mulher de livros. Não tenho dinheiro para livros". "Ande, compre lá para dar a alguém "... Mas eu até me defendi muito bem. "Eu não sei ler" - como não sei. INQ1 Pois. INF "Não sei ler e não tenho"... "Então vossemecê não tem filhos? Não tem filhos"? "Não tenho filhos nenhuns. O meu filho... Eu tinha um, já está casado". Mentira, tenho três! "Tenho só um e já está casado" e mais aquilo . (...) Tinha dito que tinha só um (...) porque (...) tinha lá a gaiata ao pé de mim, que era minha neta, tinha de ter um filho, não era? Ou uma filha. INQ1 Pois. INF A menina era minha neta, elas já me tinham procurado, eu já tinha dito que era minha neta - não era? -, não podia estar a dizer que não tinha filho nenhum... INQ1 Que não tinha filhos. INF Então era minha neta (...) ... INQ1 Tinha uma neta como? INF Pois. Exactamente. "Tenho só um filho e tal. Ele está casado". "Então onde é que ele vive? Então onde é que ele vive? Onde é que ele vive"? Oh! Nisto, eu acabo de dizer isto, (...) dá o meu filho a volta aqui à rua grande que vai para a minha azinhaga. (...) Diz ela assim: "Oh, o tio"! A menina, a pequenina. "O tio. O tio. O tio. O tio". Eu disse: "É o tio, é. Vem almoçar". "Olhe, vê, olhe"... Ó mulheres, assim que o elas viram o rapaz parar (...) a mota... Ele parou a mota assim encostada assim à parede. Ele (...) traz - (...) ainda hoje traz, já casou mas ainda os traz - dois fios assim de prata grossos, muito grossalhões ao pescoço. Um é delgadinho, o outro é assim muito grosso. (...) Ele vinha assim todo desabotoado (...) . Estava calor, andava lá (...) na fábrica... Elas agarram-se ali assim a ele, ali assim a ele assim: "Eh, ó amigo! Ó amigo! Ó amigo! Ó amigo"! (...) Aos beijos a ele, aos beijos a ele. "Compre lá um livro! Compre lá um livro! Compre lá um livro! Vá, compre agora "! E aos beijos a ele, e aos beijos a ele, aos beijos a ele, e eu vou e disse assim... Eu só disse isto, duas vezes: "Ó menino"! Que a gente só o trata é por menino. É por ser o mais novo, calhando, ou sei lá. INQ1 Pois. INF "Ó menino, deixa-te lá de conversas. Vai lá ali para casa que a mãe não quer livros". Disse assim: "Vai lá ali para casa que a mãe não quer livros". E elas traziam um cacho de uvas que outra senhora lhe tinha dado lá em cima, lá mais adiante . Ah! "Vai lá para casa que a mãe não quer livros. A mãe já lhe disse a elas que não quer livros. A mãe até disse que não tinha mais filho nenhum. Mas visto que tu 'chegastes'... Mas eu não quero livros". "Ah, minha senhora está a enganar gente". E "porque aqui"... E agarrada a ele, e a beijarem, a beijarem - e depois era com dois rapazes que aí vieram também atrás delas -, e a beijá-lo, e a beijarem, e a beijarem, e eu a ver... E a empurrá-lo assim para o quintal. A empurrarem-no para o quintal as duas, a empurrarem para dentro do quintal - que o meu quintal é fechado à chave . É assim um quintal como este, mas é parede. É todo alto . Está fechado. Pronto. Ninguém vê a casa à gente. Só quem tem o portão aberto. E empurravam, e empurravam. Digo assim: "Ó menino"... No fim, peguei assim nele , disse: "Ó menino, larga-as lá, olha lá a sida". É verdade eu dizer . "Larga-as lá, olha lá a sida. Não venham elas para aqui com ideias (...) de te enganar". Ó rapariga, eu não sei o que elas passaram pela cara do rapazinho - não sei o que foi que passaram - que ele que deu logo um conto e quinhentos. INQ2 Como é que...? INQ1 Ah! Que coisa tão esquisita! INF Deu logo. Elas disseram assim: "Vá, assina lá aqui. Assina lá aqui, Cristiano. Assenta lá". Botou-lhe logo o nome dele, (...) ele tinha já dito, não era? "Assina lá aqui, Cristiano. Assina lá". O meu Cristiano assinou logo. "Vá, dá cá o conto e quinhentos". INQ1 Ah! INF O meu Cristiano deu-lhe o conto e quinhentos. E eu vou, disse assim: "Ouçam lá, mas porque é que vocês"... Apanharem-me elas com a morte na cabeça! Mas depois ainda cá veio um homem, lá daquela empresa, por causa de a gente não o perdoar . INQ1 Pois. INF Então... Escutem. Depois o meu Cristiano deu-lhe um conto e quinhentos (...) . E eu disse assim: "Mas vocês estão a pedir o conto e quinhentos ao moço, vocês já (...) 'himpotinizaram'" - eu nem sei dizer a razão disso, eu não sei dizer a razão - "que vocês (...) que me 'himpotinizaram' o rapaz... E olha lá, ó Cristiano, tu já vieste da tropa. Um homem como tu és e como tu queres ser, e deixares-te iludir com estas raparigas?! Hã? Então tu não iludes aí com outras que a mãe tem-te voltado, e agora iludiste-te destas (...) duas raparigas que me vieram para aqui moer o juízo"? "Ah, minha senhora, aparece cá uma prenda para o seu filho. Aparece cá uma (...) "... - não sei quê - "para o seu filho, com esse conto e quinhentos". Eu digo assim: "Vejam lá o que é que vocês estão a dizer. Ponham lá aqui isso, a direcção do coiso, donde vocês trabalham". INQ2 Pois. INF Elas deram logo uma folha. Tiraram uma folha do livro e deram à gente. " (...) E isto vem pelo correio, e tu vais levantar ali ao correio (...) "... Bem que elas o disseram . Dispuseram ali mais de quantas coisas, digo assim depois eu : "Ele estava iludido, ele raparigas!" Gaiatões novos! Ele tinha vindo da tropa há pouco tempo. Gaiatões novos! E eu fiquei (...) com a coisa de as raparigas - uma arrelia às raparigas, vocês nem queiram saber! Ao fim de poucachinho tempo, veio um postalinho que estava (...) uma encomenda para o Cristiano (...) no correio. Ele mandou o carteiro levar o postal. E eu disse assim: "Olhe lá, eu não posso ir ao correio agora. Eu (...) não estou capaz de andar ali ao correio". Porque eu não andava mesmo já quase nada. E ele disse-me assim: "Não, Dalila. Você não pode lá ir. Quem lá tem de levantar isso é o Cristiano. É o seu filho. (...) Isto é qualquer coisa que vem de alguma coisa que ele comprou - de livros, ou qualquer coisa". Digo eu assim: "Então é uma coisa grande"? "Ah, e tem a pagar mais um conto e quinhentos". INQ1 Ah, mais ainda? INF Mais um conto e quinhentos. Olhe, (...) digo eu assim: "Ah, ainda mais dinheiro?! Então elas disseram que não pagava nada! Disseram". Fui buscar o papel, dei ao carteiro. O carteiro esteve a ler, disse: "Exactamente. Vocês não pagam isto. Ele tem lá uma coisinha assim pequenichinha, do tamanho duma caixa de fósforos das pequenas". INQ1 Ah! INF Disse o carteiro. Ele não viu, estava embrulhado. Disse-me logo: "Não podemos ver. Mas tem-o lá, um bocadinho pequenininho, do tamanho duma caixa de fósforos das pequenas. E o Cristiano tem aqui (...) este papel, o Cristiano vai já mandar voltar aquilo para trás já, já, já, já". O gaiato veio, e eu fui, disse-lhe: "Ó menino, passa isto assim, assim"... Estive-lhe a contar, ele disse: "Cale-se! Cale-se que eu vou já ao correio". Foi ao correio. Chegou lá, os homens no correio disseram: "Olha, volta isso para trás. E tu deste com umas velhacas que te enganaram, chuparam-te, ó Cristiano. O que é que elas te fizeram"? "Eu sei lá! Então se a minha mãe lá não está, as putas dum cabrão até me capavam, calhando - que era o que elas me faziam"! Disse o gaiato. Bom, aquilo voltou para trás. Aquilo voltou para trás, ao fim duns poucos de dias - estava eu até na matança dum porco dali -, chega ali um carro branco. Com um homem, um senhor (...) muito bem coiso. Chegou um carro branco. Aí pela aldeia acima procurando onde é que morava o Cristiano Cruz Damásio. E elas, as pessoas, disseram-lhe onde é que era. "Olha, numa rua assim, assim, assim, assim (...) . Até estão lá de matança. Ele por acaso, não sei se ele aí está, se não, agora os pais estão de matança hoje. Mas ele deve de aí estar, com certeza. Para os pais estarem de matança, o rapaz está aí. Ele já não é tropa. O rapaz está aí". (...) Mas não estava. Ele estava ali no centro social. Tinha abalado. Tinha comido, tinha abalado e a gente tínhamos aí ficado a ajeitar as coisas. Estava ali ainda aos dois homens e as mulheres, mas a rapaziada nova já tinham abalado. Chegou ali (...) o homem e procurou: "Onde é que mora aqui o Cristiano Cruz Damásio? Quem é que é os pais do Cristiano Cruz Damásio"? Mas o homem conheceu logo o meu Cristino pela pinta. Tirou logo o meu Cristino. Disse logo: " (...) Este senhor de certeza que é o pai do Cristiano". E eu disse: "Então é porque o senhor foi a algum lado que viu o Cristiano, para saber que este que é o pai do Cristiano". O homem (...) já tinha estado no centro. INQ1 Ah! INF O senhor esteve no centro e viu lá o meu Cristiano. Mas não sabia se era o meu Cristiano - (...) não é, nunca procurou nada, o homem veio-se embora. Ele disse: "Por acaso, estive no centro social, onde vocês lhe chamam o centro social, porque me ensinaram para lá ir. (...) Estive lá. É o senhor é que é o pai do Cristiano"? "Pois sou". "Então, olhe, eu preciso de falar com o Cristiano". E eu disse assim para o homem: "Pois olhe, a mim vossemecê não me engana. Tem de me dizer aqui a mim - só lhe digo onde é que está o meu filho - o que é que o senhor quiser (...) ao meu filho. O senhor diga o que é que quer ao meu filho". "Eu venho cá por umas coisas que ele para aí comprou a umas meninas que trabalham lá naquele" - lá disse onde era. " (...) Venho cá para falar com ele para ele me mostrar o papel que aí tem. Porque (...) o projecto dele voltou para trás". E eu disse assim: "Ah, então é isso. (...) Esteja aqui, que vai lá uma pessoa chamá-lo". (...) E o (...) meu Cristino disse: "Onde é que está o nosso Cristiano"? Eu disse: "Está no centro social". "Então olhe, eu vi lá esse moço e é parecido consigo. Você é que é o pai dele. Está lá esse rapaz a jogar (...) ao dominó. Eu é que não sabia se era esse moço. Mas está lá. De certeza que é esse moço, que eu estou olhar quase (...) para a sua cara". Nisto, o meu Cristiano chegou. O meu Cristiano chegou, o meu Cristiano disse ao homem - disse-lhe adeus e disse: "Então porque é o que o senhor não disse lá no centro social quem é que era o Cristiano? Toda a gente lhe dizia quem era, que sou só eu. Que eu é que sou Cristiano - (...) eu e outro rapaz". " Olhe, venho aqui para o senhor me mostrar... E trago aqui (...) o coisinho que elas lhe despacharam". Era uma coisa (...) - aquilo nem era nada, com certeza. O homem nunca disse o que era. Mandei o Cristiano buscar o papel e deu-lho para o homem ver. E o homem disse: "O senhor quer fazer uma acção que a gente fica orgulhosos lá no trabalho? Apareça lá com este papel. Ele a A gente não lho tira. Apareça lá com esse papel para a gente saber quem é que é que anda a trabalhar para a gente. Apareça lá com esse papel". O meu Cristiano não foi. Teve vergonha, não foi. "Apareça lá com esse papel. Peço-lhe mesmo por favor que o senhor apareça lá com esse papel, para a gente saber quem é que anda a trabalhar para a gente". (...) Depois ele disse ali tanta coisa delas, tanta coisa delas, tanta! Eu disse o trajo que elas traziam; ele disse logo que sabia quem era pelo traje que elas traziam e porque é que ele se deixou agarrar por elas. Que ele nunca se devia de deixar agarrar por elas, porque ele já tinha ido a outro sítio, que já (...) tinham se queixado também do mesmo, que não foi só o meu. Não sei onde é que foi que ele nunca disse. Depois, ao fim de três ou quatro dias, ou menos, apareceu aí dois rapazes - rapazões novos! Muito engraçadinhos, pareciam bons rapazes, também a vender isso, livros! Depois disseram assim: "A gente quer vir aqui (...) a esta terra, que esta terra é muito bonita"! E tal, e tal. Estava eu aqui mais esta rapariga. Digo assim: "Olhe, eu não lhe quero comprar nada. Não lhe compro nada. E vocês são rapazes"... " Tal e tal e tal". Depois estivemos aqui a contar isso do meu Cristiano e um rapaz disse: " (...) Isso espalhou-se. Nós também sabemos esse caso. Isso não são mulheres. (...) Não são mulheres que andem aí. (...) Elas têm feito muitas muitas . (...) Elas nem lá trabalham"! (...) Pelo jeito do homem - depois aqueles aqui é que disseram aqui à gente -, com certeza foi elas que apanharam (...) aquilo, alguns papéis... INQ1 Alguns papéis. INF E tanto que ele fartou-se de pedir, o homem. Agarrou-se ao meu Cristiano, fartou-se de pedir: "Ó, ó sujeito vá lá! Ó moço, vá lá! Ó moço, vá lá ao nosso coiso. Ó moço, vá lá. Então a sua mãe vai a Lisboa (...) todos os meses, você vai mais a sua mãe. Aquilo é lá tão pertinho do Hospital de Santa Maria, você vá lá, moço, vá lá"! O meu Cristiano disse: "Então, se eu algum dia lá passar, vou lá"! Agora o meu Cristiano está lá. Ainda agora ontem aí esteve e eu estive-lhe a dizer. (...) Com umas boas conversas , ele diz: "Ai mãe! Agora, se fosse agora que aquelas moças me fizessem aquilo, agora é que eu ia a Lisboa! Trabalho lá"... Anda (...) na Câmara, nas ruas. "Trabalho lá. Agora é que de certeza que já lá passei até onde elas estavam. Já corri... Já estive na garagem, na Setubalense". Gente que corre tudo, não é? INQ1 Rhum-rhum. INF "Agora (...) é que elas me haveram de dizer, que agora eu procurava-as ali como quem não quer ". Não vê que elas fizeram isso? Olhe, (...) anda aí umas raparigas - não sei 'daonde' - a venderem louças, a venderem assim a escolher - a gente a escolher assim pelo catálogo... INQ1 Pois. INF Umas gajas . Umas mulheres Corte na gravação , não é? INQ1 Rhum-rhum. INF Vê-se que as pessoas são sérias. (...) Não se metem com os rapazes, (...) não fazem aí coisas nenhumas, e aquelas (...) duas raparigas não eram boas, ó mulheres! INQ1 Isto há de tudo. INF Não eram boas! Não eram! Não eram boas! E elas, (...) se eu sei o que sei hoje, elas tinham levado ali duas bofetadas no focinho, dele! Eu é que não tive tempo! Não tive tempo (...) e eu não sei o que é que elas lhe fizeram. Não sei o que é que elas lhe fizeram. Não sei o que é que elas ali fizeram. Não sei, não sei.
STJ07
INF Botaram-se logo ali a ele. Ainda comecei: "Ó menino, ó menino (...) ! Ó menino, ó menino"! Porque quando eu vi que elas estavam tão encantadas que tinham que estar aos beijos, aos beijos, aos beijos, aos beijos, aos beijos, aos beijos, - uma de cada lado, ali outra do outro lado com as uvas - e aos beijos. E ele pousou em cima do coiso que eu lá tinha - dos andaimes, da bagagem que tinha ali fora - e aos beijos. Eu só lhe fiz assim (...) ... Empurravam-no assim para dentro, empurravam-no para dentro de casa, do quintal, e eu agarro-lhe aqui a dizer assim: "Ó menino, olha a sida! Olha a sida, menino! Tu vieste há tão poucachinho tempo da tropa, filho. Olha a sida, filho"! E elas ali estavam à labuta : "Vá, já assinou! Pronto! Dê cá já um conto e quinhentos"!
STJ08
INQ1 E é uma planta que diz que quando o gado a come que, as ovelhas... Arrebenta com as ovelhas? INF Ah! Alfavaca-de-cobra. Alfavaca-de-cobra. INQ1 É. Alfavaca. INF De cobra. INQ1 Rhum-rhum. INF Não podem comer, morrem logo. INQ1 É. As ovelhas? INF As ovelhas. INQ1 Ou é qualquer outro? INF As ovelhas. INQ1 Rhum-rhum. INF Logo. Deita uma vagem... INQ1 E, e na vagem está... INF Deita assim uma vagenzinha. INQ1 Rhum-rhum. INF Ora vê, está aqui. INQ1 Sim, sim. INF O pezinho, isto é a vagenzinha. É a alfavaca-de-cobra. INQ1 E não fazem chá com ela? INF Não. INQ1 Não? INF Não. Eu cá faço chá disso, para morrer?! INQ2 Ah, pois. INF Ah! INQ1 Não, há certas pessoas que dizem que há chá bom para rins, para os rins, que é bom. INF Não é! INQ1 Se calhar não. Eu nunca experimentei! INF Eu também não. E a alfavaca-de-cobra, as ovelhas, em bem comendem aquilo, morre tudo. INQ1 Pois. Rhum-rhum. INF Um ano destes, ali (...) num monte chamado - cuido que ele chamava-se a Sesmaria -, isto de manhã com orvalho, as ovelhas comeram e depois morreram. Mas depois deram as ovelhas à gente. Já há muitos anos. Eu também ainda comi e nunca morri! INQ1 Morreram as ovelhas, mas se calhar... INF Morreram as ovelhas mas a carne foi cozida, não era? INQ1 Era boa. Pois. Pois. INF Era boa, mas era com alfavaca-de-cobra. INQ1 Rhum-rhum. INF Pronto. INQ2 Rhum-rhum.
STJ09
INF Bem, sabe como é que eu lhe digo? Olhe, esta flor veio da Madeira, a outra veio dos Açores, a outra veio daqui, a outra veio dalém. Bem (...) ... Elas riem-se! (...) INQ1 Tem cá o país todo? Tem cá o país todo? INF Pois, gostava de ir lá... Eu gostava de ir passear a esses sítios: à Madeira. Tem flores... INQ2 E com flores tão bonitas que lá tem e a senhora a gostar tanto de flores! INF Eu não fui (...) ... Eu gostava só, se tivesse podido... INQ2 Era só para as flores? INF De Portugal, para Norte é que eu gostava. Agora disse-me assim a minha filha: "Ó mãe! Sabe quanto é que custava uma hortênsia azul"? "Quanto"? "Seiscentos escudos". "Ai, a gente não pode comprar"! Estão muito caras! INQ2 Estão muito caras, as flores! INF Estão muito caras as flores! INQ2 Pois estão, estão. INF Pois. Eu já roubei um, dois ramos. Sabe aonde? Eu digo-lhe aonde. Eu fui a uma excursão... À volta saloia - vocês conhecem. À praia do Estoril, Praia das Maçãs, tudo! INQ2 Rhã-rhã. INQ1 Praia do Estoril? INF Fui aí num passeio. E depois estávamos ali (...) a ver... A gente não pode sair de dentro da camioneta. Água e mais água! É agora, em Setembro, que é a volta saloia. INQ2 Rhum-rhum. INF Comecei em Loures, comecei na Malveira, hum? INQ2 Rhum-rhum. INF Fui eu sozinha (...) daqui mais as do Couço àquele passeio. E então, elas é que já sabiam, não é? Depois fui ao Sobral de Monte Agraço, onde estão os bonequinhos? INQ2 Rhum-rhum. INF Hã? E depois fui a - como é que é o outro? - Mafra, ao Convento de Mafra. Gostei muito de ir lá - muito! Vocês também lá têm ido, não é? INQ1 Sim, já lá fui. INF Começámos na Praia das Maçãs, praia do Estoril, praia de Santa Cruz - bem, aqueles pinhais -, à volta de Sintra, à praia do Guincho... Bem, eu fiquei com aquilo tudo (...) na ideia. E eu disse: "Eia, a praia do Guincho é tão grande"! Viemos à volta de Sintra, tudo. Sabem onde é que a gente veio acabar? À Feira Popular. Nunca tinha ido à Feira Popular! Aqui há dois anos. INQ2 Rhum-rhum. INF E elas iam-me dizendo e eu disse: "Ah! Aqui é que é o (...) "?... Elas iam-me dizendo o nome e eu fiquei logo com aquilo tudo na ideia. INQ2 Na ideia. INF Hã? E gostei muito de lá ir. E depois em Sintra... A gente não foi lá abaixo a Sintra, porque era chover e mais chover. E vieram uns corredores que eram - ainda me lembra! - eram vinte e oito corredores! E a gente ali dentro da camioneta, água e mais água, e estavam as hortênsias azuis ali ao pé de mim. Digo eu assim: "Olha" - a minha companheira chamava-se Dea. Eu digo assim: "Olha, eu desço-me aqui"... Levei a sombrinha, emprestei a minha sombrinha aos outros para virem cá acima - mas tive pena de não ir lá abaixo - compreende? -, a Sintra mesmo. E então depois digo-lhe assim: "Olha, eu nunca roubei nada a ninguém, mas vou roubar aqui dois ramos de hortênsias. Um para ti, outro para mim". Porque eram azulinhas. Chegaram cá, não são azuis. INQ2 Ah! INQ1 Ah! Então? INF É da terra. INQ2 Ah! Ai a terra é que faz a cor da?... INF Sim. INQ2 Ai essa é que eu não sabia! INF A terra é que faz a cor. INQ2 Ah! INF Da hortênsia. Pois. E eram mesmo azuis. E eu disse assim: "Eu nunca roubei nada a ninguém, mas agora desço-me aqui... A gente não pode ir lá a Sintra que é água e água"... A gente comeu dentro da camioneta, estivemos sempre a conversar em flores, sempre, mais outras, (...) todas as colegas, todas muito bem avindas sempre. E eu levei a sombrinha e estava a chover muito. Digo assim: "Olha, fulana, toma lá a minha sombrinha" - que eu levei a sombrinha - "e então vai lá tu passear com a sombrinha, que eu não saio daqui da camioneta". Comemos dentro da camioneta e ali estivemos. Chama-se a volta saloia. E eu gostei daquilo! E chego lá ao convento de Mafra e comecei a conversar com a pessoa que lá estava, em Mafra. E diz ele assim: "Então, (...) está aqui (...) o trem onde mataram Dom Carlos", disse ele. "Então, mas como é que isto é amanhado, senhor? Então eu fui a Vila Viçosa e está lá o trem. E agora está aqui outro trem, diga-me lá o senhor como isto foi amanhado"? Ai, o homem ria que 'estrebulhava' , nunca vi ! "Mas esta senhora, isto é que é engraçada! Olha para ela"! "Então mas fizeram dois trens? Então foi no Terreiro do Paço (...) que os mataram; e (...) vi lá em Vila Viçosa (...) o trem e o coche do casamento de Dona Joaquina Carlota". Veja lá que eu fiquei com tudo logo cá em cima . Os coches, aquilo tudo - foi a Vila Viçosa que eu fui -, gostei muito daquilo. Foi a Câmara que levou a gente de graça. E eu gostei muito de ver aquilo. Muito. E depois cheguei lá a Lisboa e disse esta. E eu disse assim: "Então mas como é que é? O trem era só um. Agora o que lá tinham, (...) com o sítio onde estava a bala, agora o senhor aqui está-me a mostrar outro. Mas como é que isso é foi arranjado"? Ai o homem ria, ria e dizia assim: "Mas então esta senhora foi lá e sabe já distinguir tudo e diz como é que foi essa, então"! E ele disse assim: "Mas você viu lá o dizer "? "Vi, sim senhora. E vi lá o coche do casamento de Dona Joaquina Carlota". Hum? Aquilo foi bonito. (...) Lá é bonito, Vila Viçosa! INQ2 Rhum-rhum. INF (...) Tivemos pena foi de não ir (...) lá acima, (...) ao convento - ao castelo. A gente (...) não teve tempo. INQ2 Rhum-rhum. INF Estivemos lá no jardim. Ah, aquilo foi um passeio do melhor! Fomos (...) direito (...) ao Redondo, fomos ao Redondo ver fazer louça de barro. INQ2 Rhum-rhum. INF Todas comprámos uma prendazinha! E eu disse assim: "Olhe, senhor"... Aqui na minha terra também já houve uma olaria. INQ2 Ai já? INQ1 Ah sim? INF Aqui houve antigamente mas acabou. INQ2 E as pessoas... Quem é que lá trabalhava? INF Ele morreu. INQ2 Ai já? INF Morreu. INQ2 E já não há ninguém que lá tenha trabalhado? INF Não. Esse senhor , agora não. Até tinham aqui o forno e tudo. (...) Depois lá eu estive a ver fazer louça e eu disse assim: "Olhe, lá na minha terra também já houve e eu vi fazer muita louça"! E lá também vi estar a trabalhar, a fazer. INQ1 Rhum-rhum. INQ2 Rhum-rhum. INF Lá no Redondo. Depois fomos direito a Évora. E eu disse assim: "Ai! Isto já não parece o jardim de Évora, dantes era tão lindo! E a praça do Giraldo, ali com flores tão lindas"! – eu. "Com crisântemos ali daqueles grandes, não sei se agora ainda lá estão, se não. Estive na Igreja de São Francisco - dos ossos, vocês sabem bem onde é?! INQ2 Sim, sim. INF Pois, eu também lá estive. Agora digam lá que... INQ2 Tem-se farto de passear também. INF Bem, mas é assim em excursões, não é? INQ2 É excursões daqui. Pois. INF Pois.
STJ10
INF É, é. É fetos. INQ1 Algumas não me lembro, mas acho... INF Olhe, antigamente sabe o que é que se enfeitava cá com giestas? No domingo de Páscoa, enfeitava-se as ruas com giestas. A gente ia buscar ali abaixo... INQ1 No domingo de Páscoa? INF No domingo de Páscoa. Ia-se às giestas e punha-se - mas isso já há muitos anos! - e punha-se assim na rua a enfeitar a rua. INQ2 No chão? INF Hã? INQ2 No chão da rua? INF No chão. Pois. INQ2 Cobriam a rua? INF Pois. Cada qual ia buscar (...) . INQ1 Então, mas era porquê? Depois vinha cá o?... INF Não. Era hábito das pessoas irmos às giestas. Quando eu era nova, íamos às giestas e depois punha-se assim à direcção das nossas portas no domingo de Páscoa. INQ1 Ah! Ai, cada uma punha à sua porta e depois ficava a rua toda cheia. INF À sua porta. Pois. Mas isso, perdeu-se isso. INQ2 Já não se faz? INF Não. Mas conheço-as bem, que há ali muitas ali em baixo. INQ1 Rhum-rhum. INF E uma que era (...) piorneiras que chamava-se. INQ1 Sim? INF Para fazer um nó com a mão esquerda para ver se a gente era capaz. (...) Dantes havia além muitas, mas agora já não há! INQ1 Então e a piorneira é como? INF É parecido com a giesta. INQ1 Ai é? Então e qual é que é a diferença? Tem também florzinha amarela ou não? INF (...) Não! Aquela era só assim uma coisa, assim mesmo na haste, uma... Parecia mesmo a giesta, mas chamava-se piorneiras. E a gente com a mão esquerda às vezes era capaz; às vezes fazia um nó, assim com a mão esquerda. INQ2 Com a mão esquerda. INF Pois. INQ1 Deve ser difícil! INF Havia tantos ali! Bem, mas isso agora já não há nada aqui. Há por aí, ele mais longe em mais lados , não é? Isso também aí houve . E havia ali uma à entrada logo da aldeia, e a gente gostava - quando era nova - gostava muito de experimentar com a mão a ver se éramos capazes de fazer o nó.
STJ11
INF Até na volta saloia é que eu vi. INQ1 Pois, é capaz de para aí... INF (...) Não. Uma flor assim alilasada, que é a despedida-do-verão. INQ1 Rhum. INQ2 Rhum. INF Que havia assim muita quando a gente passou. Muitas que havia! E fomos lá também onde estava um toiro, sempre à volta, sempre à volta. Também. Veja lá se eu ele sei lhe dizer ou não sei. E aqueles pinhais! Vi aquilo e dizia a gente... Dizia eu assim: "Ah, mas muito gostei eu da volta saloia! Tanto pinhal que eu vi, tanta coisa!" Eu nunca tinha ido à Feira Popular. Mas não cheguei lá bem para a frente. Lá para diante é que era mobílias e coisas mais bonitas. E comecei eu a dizer: "Hum! Há aí gente a fugir para a camioneta". Dissemos: "Pronto. A gente já anda cansada da viagem"! Fomos para a camioneta. Depois estavam lá uma (...) - as meninas também sabem - que vão as pessoas lá para dentro, vêm em braços. Uh, para aí não vou eu! Já sou muito velha. INQ1 Pois. INF Já tenho muita idade. Para aí não me enganam. Vi de lá vir algumas assim! É verdade ou não é? Hein? INQ1 Pois. INF Mas gostei de ir à Feira Popular. Um sítio que eu gostava de ir ainda era às Amoreiras. INQ1 Ah! INF Diz que é muito lindo as Amoreiras! INQ2 É grande! INF Hein? INQ2 É muito grande! INF Já estive lá perto. Mas gostava de ir às Amoreiras. INQ1 Ah, ainda há-de calhar. INF À praia do... Está a ver? Parece porto . Ai, agora onde é a praia? Estive lá aqui há tempo. Costa da Caparica. Gosto muito da Costa da Caparica. INQ1 Rhum-rhum. INF Gosto, gosto. E o comboio que vai lá (...) até à Fonte da Telha. INQ1 Pois é. INQ2 Rhum-rhum. INQ1 É, é. INF Eu não fui, mas vi bem o comboio ir até à Fonte da Telha. INQ1 Rhum-rhum. INF E depois, o ano passado, os da Câmara levaram a gente ao passeio. Fomos mesmo direito a Lisboa, por dentro de Lisboa. Foi de graça, não é? E depois fomos à Costa da Caparica. Entrámos cá por baixo. Eu ouço , quando eu ia para descer mais outra velhota... E diz-me um assim: "Então, vão para a praia e não trazem (...) fato-de-banho"? E digo eu assim, mais a outra pessoa: "Acho que o senhor não tem nada com isso. Quem quer tomar banho toma. A gente vai cá a gente e o senhor meta-se lá na sua vida que eu meto-me cá na minha". E diz a outra que ia comigo: INQ1 Bela resposta! INF "Toma lá, que ele até (...) ficou logo sem fala". Não tinha nada a meter-se. INQ1 Claro. INF "Então não trouxeram fato-de-banho"? Disse ele. INQ1 O que é que ele tinha a ver com isso. INF Vinha de lá . E então - vocês sabem - está lá um café, lá no pinhal. INQ1 Sim. INF Sim. Está ali muitas (...) rulotes. INQ1 Sim. INF Ali naquele campismo, onde está ali um pinhal. Aí assim é que ficaram as camionetas. A gente subiu (...) pela entrada que está por baixo. De maneira que viemos (...) à cidade. Foi só assim . A gente ia para a praia, as duas - eu mais outra velhota -, e ele procurou pelo fato-de-banho. E eu disse-lhe: "Meta-se lá na sua vida que não tem nada a meter-se cá na minha". Pronto. INQ1 Rhum-rhum. INF Ela desata a rir e ele não teve resposta. Pronto. Então ele não é assim que se costuma dizer? INQ1 Pois claro. INF Cada qual... INQ1 Mete-se com o que é seu. INF Hã? INQ1 O que é que ele tinha lá a ver... INF O que é que ele tinha com isso, se a gente levava fato-de-banho ou não? E ela depois desata a rir e diz assim: "Pronto! Tiraste-lhe logo a fala, que ele já não teve resposta para te dar". Então ele e não foi verdade? Eu digo: "Meta-se lá na sua vida que a gente mete-se cá na minha. Você tem alguma coisa com isso, que a gente leve fato-de-banho ou não leve? As velhas não vão tomar banho"! Disse-lhe assim. E pronto. E ele ficou a olhar para mim, como quem diz: "Eia aquela velha! É (...) logo daquelas que volta resposta"! INQ1 Assim é que é! INF E a outra velhota disse assim: "Vê lá, tu tens logo as respostas na ponta da língua"! Ai tenho, sim senhor. INQ1 Assim é que é. INF Tal e qual!
STJ12
INQ1 E os maios ou maias? INF As maias. Também. INQ1 São parecidas? INF Não! INQ1 Não? INF As maias é que é para chá. INQ1 Ah! Ai é? INF É. As maias é. Olhe, este ano fizeram cá: no primeiro de Maio veste-se uma garota toda cheia de rosas. Antigamente faziam isso, depois perdeu-se isso. E agora há dois anos que é assim: no primeiro de Maio veste-se aquela criança com um vestido assim branquinho, com um arco grande além em baixo, cheia de rosas e uma maia. INQ1 Sim, sim. Rhum-rhum. INF Porque é à maia que eles andam a pedir de porta em porta aqui. INQ1 Sim, sim. INQ2 Ai sim? Fazem isso? INQ1 Lá na minha terra também fazem isso. INF Também? INQ1 Fazem. Eu sou de Portalegre. INF Ah, também já estive em Portalegre. INQ1 Também já? INF Já passei lá. Ah, fui (...) a Marvão. INQ1 Ai, Marvão é muito bonito, não é? INF Já lá fui. INQ1 Aquelas ruazinhas estreitinhas. INF Passei mesmo pelo meio de Portalegre. INQ1 Pois. Pois, deve ter sido. INF Fui lá à festa de Marvão. INQ1 Sim? INF Uma festa linda! INQ1 À festa do castanheiro, se calhar... INF Foi, foi.
STJ13
INF Ah, e ainda vou contar uma, ó menina. Eu não tenho vagar mas vou-lhe contar. Onde eu comprei as castanhas, estava um ouriço com cinco castanhas. Hum? Assim onde eu comprei as castanhas para trazer. E digo eu assim: "Ó senhor, tem aqui um castanheiro... Tem aqui um ramo tão lindo"! E diz ele assim: "Está aqui para exposição"! "Ó senhor, dá-me o ramo, fico eu sendo a exposição. E o senhor dá-me o ramo para levar, para mostrar à minha irmã". O homem pega no ramo e deu-me o ramo com cinco castanhas no ouriço! E o homem desata a rir e deu-me o castanheiro. Depois diz assim a minha filha: "Ai, a minha mãe! Como ela foi capaz de dizer assim: "sou eu a exposição" e "dê-me cá" ao senhor"! E o homem deu-me logo o ramo! INQ É p-... É preciso é ter à vontade. INF Ah! Depois iam a passar as pessoas e diziam assim: "Ah, se eu apanhasse um ramozinho daqueles (...) também levava"! INQ Mas já o tinha a senhora levado! INF E eu pensava assim cá para comigo: "Olha, fizessem (...) como eu fiz"! Dizendo que era eu a exposição (...) . Eu comprei as castanhas, não é? Há lá muitas nozes a vender, muito feijão, muita coisa, lá naqueles dois largos. INQ Rhum-rhum. INF Já lá esteve, conhece bem aquilo? INQ Conheço. INF Pois. Também lá vão. INQ Já lá tenho ido também. Se calhar até lá fui dessa vez. INF Eu também, à festa das castanhas.
STJ14
INQ E a senhora disse que faziam aguardente, não era? INF Sim. Nós aqui não fazemos, que não temos caldeira. Mas depois (...) daquilo tudo muito espremidinho, manda-se fazer. INQ E... INF Houve um tempo que até secava-se aquilo e dava-se aos animais - o folhedo lhe chamam. Aquilo, no fim de seco, até lhe chamavam o folhedo. INQ Ah! INF Mas agora não. Agora chamam-lhe o mostro porque tira-se dali - temos ali a outra piazinha, põe-se ali, (...) vai-se acalcando, acalcando. E depois passado a vindima uns dias, há pessoas que têm aquelas caldeiras próprias - não é? -, e depois vêm cá buscar ou vai-se levar e fazem a aguardente eles. À comissão, já se sabe. INQ Rhum-rhum. INF Temos que pagar. INQ Pois. INF Eles têm o trabalho.
STJ15
INF Deve de haver de muito feitio, não é? Agora a gente aqui, quando é a vinha nova - logo nova -, é valas muito fundas para levarem lenha, ou palha, ou isso assim, que é para depois o bacelo ficar ali ao de cima, mas depois ter onde ir comer lá quando for parreira. Naquela altura ainda não. Depois de estar dois anos, ou isso assim, é que ele (...) ... Aquilo é um bacelo que a gente lhe chama. Foi (...) uma vide que rebentou. Cá o meu pai fazia assim: plantava uma vara e depois essa vara, vinha muitos, muitos bravos; e depois ele, desses bravos, arranjava um viveiro e tornava-se bacelos enraizados; desses bacelos enraizados, depois eram plantados nessa tal terra que foi arranjada para a vinha; ao fim de dois anos, se tinha grossura já, é que ela era enxertada com uma estacazinha - uma vide, que se diz -, que se vai cortar a uma das outras; já com uma grossurazinha é que se vai pôr no tal bacelo - lhe chama a gente -, que é um bacelo americano. Corta-se a rama toda que tem, fica só o troço. Com a outra parte duma mais velha que se foi buscar, faz-se a estacazinha. Faz-se um golpe no bacelo, põe-se lá a estacazinha. Faz-se com uma coisa própria que é a ráfia, tudo à volta, tudo à volta, põe-se um moitão de terra. Se ele tiver de rebentar, rebenta, dali é a parreira - a plantação, cá. Mas se for a mergulhia, duma parreira velha fazer uma nova, já é diferente. INQ1 Sim. INQ2 E como é que chama a essa?... INF Chama-se uma mergulhia, (...) ou seja mergulhão, não sei (...) . Por exemplo, aqui agora era a vinha, faltou aqui um. A gente para o ano nesta, com uma aqui vizinha dela, deixa uma vara por baixo. Se se há-de tirar, fica. Depois no outro ano a seguir, ela está grossa, abre-se uma vala, ela vai por baixo da terra e vai ficar só com uma pontinha no sítio onde a outra secou. Essa vai fazer uma parreira filha da outra.
STJ16
INQ1 Umas grandes, que é bom para sopa também? INF Abóboras. Tchi!!! INQ2 Que qualidades de, de abóbora é que conhece? INF Ora, conheço a abóbora-menina e conheço a abóbora - a gente chama-lhe (...) a abóbora-bacoreira, (...) que dá aos porcos. INQ2 Rhum-rhum. INF É a abóbora-bacoreira e a abóbora-menina. Mas ele ainda há mais nomes. As outras compridas nem sei o nome daquilo, mas aquilo não é abóbora - ele dão-lhe outros nomes. Mas eu nem sei o nome daquilo. Ah, já tenho 'ouvisto' mas não me fica na ideia.
STJ17
INQ1 E é casada, a senhora? INF Agora sou viúva. INQ1 Pois, viúva. INF Sou viúva. E já faz agora para Março vinte e três anos. INQ Rhum-rhum. INF Tinha cinquenta e quatro, tenho setenta e sete. INQ2 O seu marido era daqui também? INF Era, sim senhor. E nasceu aqui também, ele . INQ1 E a senhora nunca foi à escola? INF E morreu já... Aqui não. Deu-lhe um ataque. Fomos com ele para Lisboa. Chegou lá, morreu. Nessa noite. INQ2 A senhora nunca foi à escola? INF Ah, ainda fui à escola, mas saí logo. INQ2 Rhum-rhum. INF Naquele tempo ia quem queria. Depois cheguei ao fim da cartilha, não sabia o que estava para trás, a senhora passou-me para o princípio da cartilha. Cheguei a casa, disse à minha avó - que foi quem me criou, que eu tinha quatro anos quando minha mãe morreu -: "Ó avó, já não vou à escola". "Então porquê"? "Olhe, a senhora passou-me (...) para o princípio. (...) Eu não sei o que está no princípio nem o que está no fim. (...) Eu não sou capaz de aprender". "Eh, então não queres ir, não vás"! Pronto. (...) Dantes não obrigavam as pessoas. Ia quem queria. INQ1 E a senhora depois trabalhava em quê? Começou a trabalhar pequenina? INF Ah, eu ele tinha já doze anos, ou treze, quando comecei a trabalhar. Trabalhava: arrancava moitas de Inverno e mondava arroz de Verão (...) e fazia-se muitas coisas.
STJ18
INQ Quer explicar como é que faz o queijo? INF Então faço o queijo: ponho o cardo de molho e depois amorno (...) o leite, e depois ponho o cardo; e depois coalha. Depois ponho em cima da francela, tenho os cinchos, e vou apertando e faço o queijo. Pois, assim apertando com as mãos, e faço o queijo e ponho em cima da francela. No fim de estar os queijos todos feitos, vou, volto-os. Volto-os, ponho sal. Põe-se um bandalhinho por cima. No outro dia volta-se, põe-se sal outra vez, está capaz de comer. É assim é que eu faço o queijo. Pois. INQ Quando o põe na francela, escorre assim... INF Pois, tenho de escorrer assim porque é leite de cabra, não é como o de ovelha. A de ovelha faz-se melhor, porque é uma massa mais dura. Pois. (...) INQ E aquilo que escorre é o quê? INF É o almece. INQ E, e não costumam fazer nada com o almece? INF Fazemos. Fazem atabefe. INQ Rhum-rhum. INF Pois. INQ Rhã... INF De ovelha, até o vendem. Mas eu, como é de cabra, até o dou. E outro, avento-o. INQ Rhum. INF E outro, faço-o eu. É conforme. INQ E põe o cardo... Põe o cardo é para, para quê? INF Para coalhar.
STJ19
INQ1 Quando anda a tirar a cortiça não ficam assim uns, uns bocadinhos, umas?... INF Ficam. INQ1 E chama-lhe o quê? INF A gente cá chama-lhe (...) os bocados, há outros que chamam a migalha. INQ1 Rhum-rhum. INF Pois. Às vezes bocadinhos assim, pois, e mais pequeninos. INQ1 Pois. INF Tanto que às vezes não se apanham e há pessoas que precisam de ganhar alguma coisita, pois vão com uma saca... INQ1 Diz que estão a quê? INF Pois. INQ1 Vão a quê? INF Vão. Depois apanham aquilo para dentro duma saca, depois vendem aquilo. INQ1 Não diz, não diz que vão ao rabisco ou vão?... INF Chama-se o rabisco. Aquilo chama-se rabisco. (...) Chama-se rabisco, pois. (...) Agora quase já ninguém rabisca. Isto está muito barato. (...) Aqui há três anos, (...) chegou a conto e cem (...) uma arroba destes bocadinhos. E o ano passado foi para aí a duzentos ou trezentos e este ano pouco. INQ1 Pois, já não vale a pena ir ao rabisco. INF Pois. (...) Pois não. Tanto que muita gente não vai. Chama-se o rabisco. INQ1 Rhum-rhum. INF Noutros sítios podem-lhe dar outro nome, não é? O rabisco da cortiça. (...) É uma coisa muito rica, a cortiça. Por aí os homens dizem que é até mesmo cá em Portugal das maiores fortunas, não é? INQ1 Rhum-rhum. INF E o concelho de Coruche é o concelho número um do mundo. Vocês não têm ouvido? INQ2 Não sabia, não sabia. INF (...) Eu, pelo menos, ouvi muito tirador... É o concelho do mundo com mais cortiça. INQ1 Nós temos visto aí muita. INQ2 Muita... INF É Coruche. E (...) em bondade dizem que é aqui o vosso. INQ1 Ai é? Em bondade? Ai, essa não sabia eu. INF É. (...) É aqui Ponte de Sor. A freguesia de Ponte de Sor é melhor que aqui. É. Ele então os compradores é que dizem. Tanto que ainda o ano passado andei aqui a tirar - olha, aqui logo (...) , aqui no vosso distrito... INQ1 Rhum-rhum. INF O dono até é um senhor que é engenheiro e é lá o director (...) lá de (...) Abrantes. É lá o professor. É engenheiro mas é professor lá. É lá o director. Vendeu-a a quatro contos, cada arroba. Depois tinha uma pouca, numa propriedade ali ao pé da Chamusca - vocês (...) sabem onde é a Chamusca? INQ1 Sim. INF Da Chamusca logo para cima. Essa (...) só já lhe ofereceram um conto e quinhentos. INQ1 Rhum. INF A qualidade era mais ruim, olha. INQ1 Pois. INF Eles dizem que é a melhor cortiça toda é aqui no concelho de Ponte de Sor - ou de Montargil, pois, no concelho de Ponte de Sor. INQ1 Rhum. INF E em quantidade é em Coruche. INQ2 Rhum-rhum. INF Então agora já anda cortiça - vocês, é aonde? Uma pessoa, por exemplo, vai a Chamusca. Depois vai até aonde? Vocês sabem ali aonde é Alcácer do Sal? INQ1 Sim, sim. Também já lá estivemos. INF Pois para cima há pouco. INQ1 Para cima? INF Pouco. (...) INQ1 Pois, pois há. INF Agora fui lá eu a Cabeço de Vide, e depois (...) também fui ao Redondo. Do Redondo para cima, até por acaso andaram umas pessoas aqui perto de nós a tirá-la. Eram ali do Arrão. INQ1 Rhum-rhum. INF Eu digo : "Então, quem é que tirou esta"? "Olha, foram lá uns colegas lá de vocês". (...) Ora daqui ao Redondo é... Pois. Eram pessoas daqui. INQ1 Rhum-rhum. INF E lá onde eu estive também o ano passado, também lá andaram a tirar também umas pessoas de fora do Arrão. INQ1 Rhum-rhum. INF Pois. Coisas poucas. É também onde há muito tirador é aqui. É onde há mais. INQ1 Rhum. INQ2 Rhum-rhum. INF Tanto que os tiradores de cortiça, os primeiros vêm do Algarve. Depois de lá é que vieram vindo, vieram vindo, depois a gente começou... Já há muito ano, não é? Porque a cortiça dá. Então eu ouvi tanta vez ao meu pai que a cortiça dantes não rendia nada. Pois, rendia pouco, não é? Tanto que (...) fazia-se a tal - até lhe chamavam a tal desbóia, a tal virgem, também lhe chamam desbóia... INQ1 Quando vão tirar a?... INF Pois. Também lhe chamam... (...) Nem a carregavam. Não rendia! Pois, não rendia. Chamavam-lhe também a tal desbóia.
STJ20
INQ1 Olhe, e uma terra de azinheiras como é que se chama sempre? INF A gente às vezes chama-lhe (...) um azinhal, então não é? Isso vocês até depois podem-lhe: "Olha, está aqui um azinhal". INQ2 Rhum-rhum. INF Pois. Uma terra como agora aqui de nove ou dez hectares, não é? INQ2 Rhum-rhum. INF A gente: "Olha, está aqui um azinhal". Pois. Até pode ter outro nome, não é? Vocês depois lá: "Olha, lá aquele, (...) o alentejano ou o ribatejano, olha chamava-lhe um azinhal". INQ2 É alentejano ou ribatejano? INF Não, a gente aqui somos ribatejanos. INQ2 Ribatejano. INF Tanto que quando estive lá em cima - até fui também lá a Portalegre... INQ2 Está quase no Alentejo mas é ribatejano. INF Pois. Sempre . Mas eles conhecem-se (...) . É. A nossa pronúncia aqui não é bem como a do alentejano. INQ2 Pois. INF É logo diferente. Então aqui perto da gente é logo diferente. Tanto que a gente quando vai a Lisboa: "Ah, você é alentejano"! É que a gente tem aqui um sangue misturado, não é? É alentejano, é ribatejano, é...
STJ21
INF Eu até fui tropa lá em Lisboa, dizia: "Olhe, não, a gente não somos alentejanos, somos aqui ribatejanos". Mas há (...) aquela mistura, não é? Pois, o lisboeta fala (...) ... Tanto que para cantar o fado, ainda não houve alentejano nenhum que cantasse o fado, ou já? INQ1 Rhum-rhum. INF Não têm aquela pinta ! Está o Paco Bandeira, mas não é fadista, não é? Porque diz que para cantar o fado que é o lisboeta. INQ1 Rhum-rhum. INF Ainda não houve. Pois, (...) enfim. O alentejano lá tem outro estilo. É. INQ1 É o fado de Lisboa. INF É assim, então. Para cantar o fado é o lisboeta. Sim. INQ1 Olhe... INF Além os de Coimbra (...) vêem-se à rasca para cantar como o Hilário. INQ1 Sim. INF Vocês ouviram? Pois sabem melhor, conhecem melhor - conhecem!? Já ouviram falar nele - não era? -, no Hilário. Ainda hoje os fadistas, quando é o fado lá do Hilário, a maior parte deles vêem-se à rasca, não vêem? (...) E esse tal Hilário cantava muito bem o fado. Lá no choupal. Já foram a Coimbra, já? INQ1 Já. INQ2 Já. INF Agora já não tem choupos. Já são poucos. Era o choupal de Coimbra.
STJ22
INQ1 Olhe, e como é que se chama a folha do pinheiro? INF É caruma. (...) É a caruma. Pois (...) . INQ1 Mesmo enquanto está na árvore? INF (...) É sempre. Tanto que o pinheiro é uma árvore de - pois, dizem eles... O pinheiro - então eles, nos sítios, às vezes davam teorias à gente -, o pinheiro, se a gente tirar a caruma toda, morre. E o sobreiro não. Não tem reserva. (...) O pinho (...) come da... O sobreiro, esse a gente pode-lhe tirar as folhas todas, está ali uns meses, come da reserva e depois rebenta. E o pinheiro não. O pinheiro, se a gente lhe tirar a caruma toda, morre. Dizem eles que não come da reserva, não é? Então (...) todas essas árvores que chama-se caduca - não é? -, que a folha caduca, agora, na parte do Inverno, come tudo da reserva. E elas não se secam. A laranjeira não come, não é? A laranjeira não cai. INQ1 Pois não. INF O pessegueiro come da reserva. Bom, todas estas árvores que caem. E o pinho, já vi. Eu em gaiato experimentei: um pinheirinho pequenino que a gente lhe tire a caruma toda morre. INQ1 Morre. INF Eles dizem que (...) não se alimenta. INQ1 Olhe, e há outra coisa que se tira, e que também se aproveita do pinheiro? INF Isso é a resina. INQ1 E o senhor já alguma vez... INF Eu (...) nunca tirei mas então (...) . INQ2 Sabe como é que se faz? INF Então não sei?! (...) Isso é com uma (...) ... Põe-se um vaso, põe-se assim um coisinho (...) assim a aparar a verniz; e depois (...) com uma machadinha - até uma machadinha com um cabo pequenino - tiram ali e sangram. Aquilo até (...) ... Os homens dizem que dá muito cabo dos pinheiros. INQ1 Rhum-rhum. INF Então a menina, (...) ou eu, se me tirarem sangue não faz mal? INQ2 Pois. INF Pois. (...) Eles dizem que é... Tanto que estes, aqui os pinheiros mansos, dantes (...) ninguém lhe mandava resinar. Que é mais ruim. INQ2 Rhum. INF Que é mais ruim para a pinha.
STJ23
INQ Como é que se marcava a divisão?... INF1 Era (...) conforme os filhos. INF2 Com marcos. INQ Com marcos? INF1 Era. INF2 Com marcos. INF1 Punha-se um marco. INQ E... INF2 Ou com um rego. Com uma charrua fazia-lhe um rego de alto a baixo. INF1 Pois. INF2 Com uma charrua dum tractor (...) . INF1 Portanto, (...) você eram cinco irmãos. INQ Sim. INF1 O seu pai tinha lá uma courela. INQ Sim. INF1 Depois era dividida. (...) Se tivesse mais... E se tivesse só aquele bocadinho era seu. (...) INF2 (...) A gente aqui éramos oito. INF1 Calhou só um bocadinho a cada um. INF2 O meu Cristóvão e os meus cunhados éramos oito. INF1 Calhou assim um bocadinho. INF2 Calhou aquilo um bocadinho a cada um - uma tirinha a cada um e pronto! Estes aqui, olhe, desta rua para baixo, estão aí quatro. INQ Sim. INF1 Quatro. INF2 Eram quatro. Aqui desta rua para baixo, esta fazenda aqui que vocês aqui vêem, é de quatro. INQ Sim, sim. INF2 E daqui para cima, como era terreno mais ruim, somos dois só. INF1 E ficaram outros dois noutros lados. INF2 A gente ficou com mais terreno porque era mais ruim. INF1 Mas não presta. INF2 Deram menos valor (...) e deram mais terreno. Pois. E ficaram (...) um além e ficou outro lá em baixo. Eram oito. INF1 Foi. Eu não queria isto. Chama-lhe a gente partilha, não é? Vocês lá até lhe podem chamar outro nome, não é?
STJ24
INF1 A agricultura está muito pobre, dizem eles. INF2 Os terrenos são caros as rendas, e vai tudo é ao que dá mais alguma coisita, pois, já se sabe - aos tomates e ao tabaco e ao milho, essas coisas . INF1 A seara mais rica que cá temos agora no país é o tabaco. INQ Pois, eu aqui... Ali vejo, quando vou... Vê-se muito tabaco. INF1 Aqui é uma região que se faz muito tabaco. Muito! É daqui até... Bem, (...) ali em Castelo... INF2 (...) Vocês não fumam? INQ Não. INF1 Não? Então isso podiam fumar, então?! INF2 (...) Para estragar as pessoas. INF1 Aqui é uma região até que se arranja muito tabaco. Que ali, onde é que é também uma... Ali na Ponte de Sor, já... INF2 Eu estive a ralhar com um que estava a fumar: "Vai ralhar com o teu homem"! "O meu homem não fuma"! Era o meu irmão, o Duriano. Lá está sempre a cigarrar, sempre, sempre. INF1 É, é malvado. INF2 E está retirado de fumar e não quer saber. INF1 Vocês, há muita gente que quer é... Pelo menos uma grande parte (...) das raparigas como vocês fumam. INQ Rhum. Pois, mas... INF1 Vocês até podem fumar! A gente não tem lá nada... Não sou eu que lhe compro o tabaco. INF2 Não, elas não cheiram a tabaco. INF1 Pois, podiam-se lavar... Mas o tabaco cheira. Pois. Cheira logo a tabaco. INF2 Eu vejo aí a roupa do nosso Cupertino. Ele não fuma, mas só de lá lidar no café, a roupa aí, às vezes, para passar a ferro e tudo, cheira logo à gente. INQ Ai isso cheira em casa, às vezes. INF1 Então não viste aquelas raparigas, quando a gente chegou lá de Cabeço de Vide? Com certeza que tinham tomado banho - umas raparigas que trabalham ali em Coruche na fábrica do tabaco -, elas vinham todas bonitas. Disse eu : "Ó danadas, se cheiram a tabaco"! E não era do fumo! Que (...) a gente também lidou ali no tabaco. INF2 Era do tabaco. INF1 Andámos ali uns dez ou doze anos. INF2 Só que lá se lide com ele, é logo a cheirar, mesmo sem fumar. INQ Pois é. INF1 (...) E aquilo faz mal, (...) aquele aroma. INQ Rhum-rhum. INF1 Então (...) eles dizem... Aquilo tem quê? É cocaína ou é?... O tabaco mesmo... INQ Nicotina, pois. É nicotina. INF1 Tem nicotina não sei quantos por cento. INQ Pois. INF1 Aquilo, só quem lá andou! Assim em verde ainda se leva. Mas no fim de seco, quando a gente (...) o empilhava... INF2 (...) INF1 O tabaco (...) hoje é diferente; o tabaco dantes era empilhado agora e depois era escolhido de Inverno; e agora é já escolhido. Sai do forno (...) e fazem logo a escolha. Aquilo era terrível. Custava-se lá a andar. Punha-se aqui um pigarro nas goelas. Ai! Mesmo eles dizem que mais de dez anos que não se pode andar numa tabaqueira. Eles é que dizem.
STJ25
INF1 Por isso existe. Chama-lhe a gente também uma esquadra - não é? -, o caso que se disse há bocado: sendo uma esquadra é como daqui a além; depois além está outra regadeira, depois leva , enfim... INQ E como é que vai mudando a água? INF1 Quando estiver regada. INQ Rhum-rhum. INF1 Por exemplo, a rega (...) tem muitas coisas. Por exemplo, temos o tomate ou o pimentão. A gente vai como daqui - até pode ir como daqui à aldeia. (...) Para ser bom... INF2 A regar com a esquadra. INF1 Com a esquadra. INF2 Rega com a esquadra. INF1 Mas (...) não rega tudo a eito. INF2 Deixa-se rego sim... Rega-se rego sim, rego não. INF1 Pois. INQ E como é que muda de rego? INF2 Tapa-se os 'biquetes'. Chama-se-lhe os 'biquetes'. INQ E muda-se com quê? INF1 Com a enxada. INF2 Com a enxada. INQ Com a enxada? INF2 Com terra. INQ E esse pedaço de terra como é que lhe chama? INF2 É o 'biquete'. INQ Ai é esse o 'biquete'? INF1 (...) Chama-se a terra para tapar o 'biquete'. INF2 (...) A gente chama aqui na nossa área é um 'biquete'. INF1 Pois. INF2 Por exemplo, tem aqui agora. Solta-a por aqui para ir por este rego. Tapa-se aqui e ela corre por este rego. Depois para mudarmos, corta-se aqui outro 'biquetezinho' aqui mais aqui. INF1 Por exemplo, deixa lá ver se elas compreendem. Por exemplo: é assim uma esquadra. INQ Rhum-rhum. INF1 Por exemplo, aqui existem dez regos. E a gente, para dar menos trabalho - que isto tem de haver malícia no trabalho - rega-se só cinco. INQ Rhum-rhum. INF1 Porque esses cinco estão abertos. A gente só abre cinco - estão a compreender? Estão dez... INF2 Rega-se esses cinco e depois à volta para cima, rega (...) ... INQ Ah! INF1 Volta para cima, depois vai-se para baixo, à outra rega, está outros cinco destapados. INF2 Vão-os tapando... Dá menos (...) . INF1 (...) Tapa aqueles e os outros já estão tapados. INF2 Não é por malícia, é que a gente depois íamos aqui... INQ É o jeito que tem de regar. INF2 Íamos aqui com a esquadra toda para baixo, depois chegávamos lá abaixo e metíamos a água para aonde? INF1 E então a água, a água punha-se para onde? INQ Pois. INF1 Tem de haver malícia! INF2 E assim, agora leva-se um rego. Ele rega-se, por exemplo: são dez regos, rega-se cinco para um lado e vem-se para cima a regar os outros cinco. INQ Pois. INF1 Pois. INQ Pois é. INF1 E há outra rega no milho, às vezes. Esse, agora, já há mais 'cabilice'. Já há, por exemplo, uma regadeira grande - a gente, os trabalhadores têm de ter malícia! E ele toda a gente quer... Às vezes já se rega cinco e... Depende da terra: se for terra direita, solta-se para cinco ou seis, já só existe um cortador em cinco ou seis regos. INF2 Solta-se para mais regos. INF1 Depois, por outros cinco já... INF2 Mas do tomate não pode ser assim. INF1 Não. INF2 O tomate é cada... INF1 O tomate, cada rego tem de levar um... INF2 Cada rego tem de ser um 'biquete' aberto. INF1 Tem de ser. O tomate é muito odioso! O tomate...
STJ26
INF1 A gente (...) tinha aí um burro pequenino. INF2 (...) Até estava sempre ali (...) muito mais fundo o terreno por onde o animal andava - não é? - dos lados. INF1 Ela já não se lembra. Ainda éramos solteiros. Tínhamos ali uma burra pequenina que sabia ler. Quando enchesse o tanque, que não tivesse de tirar , zurrava logo. INF2 Parava-se. INF1 Ou parava. INF2 Parava-se. INF1 Pois. INF2 Não tinha para encher, parava-se. INF1 (...) Isto foi... Chamava... INF2 E com os olhos tapados. Que ela não via, que tinha que andar com os olhos tapados. INF1 Os olhos tapados. Isso... INQ1 Como é que ela sabia que já estava cheio?... INF1 Vocês não se acreditam... INF2 Não sei se era pelas voltas que dava, se quê... INF1 Chamámos tanta gente! Vão lá ver... Ou parava ou zurrava. INF2 Ou zurrava. INF1 E se zurrasse uma vez ou duas, se não lhe aparecêssemos, que não sentisse os passos, parava-se. Se calhar lá tinha... Ela não via! INF2 Ou se calhar era pelas voltas que dava! INF1 Uma burrinha pequenina! INF2 Já agora mesmo para as outras ... A gente chama-lhe burros mas são inteligentes à mesma, também sabem! INF1 Ela tirou ali mais... Ela tirou ali mais de dez anos, coitadinha! INF2 Aquilo ou era pelas voltas que dava ou não sei. INF1 "Não se acreditam, vá"! Não estava lá ninguém! Meu pai engatava-a. "Vá, (...) deixem-se estar! Não falem"! Não podiam falar que ela depois... Se não estivesse ninguém, ou zurrava ou parava. E ela não via! Lá tinha aquele... É o destino! A gente não sabe, não é? INQ1 Claro. INF1 Olha, também trazem noras! INQ1 Pois também. INQ2 Olhe, e lembra-se como é que se chamava este pau que estava aqui ao alto? INF1 Pois, oh! Eu lembro... INF2 Eu já não me lembro. INQ2 Onde prendia o braço? INF1 Era onde prendia o braço, pois. INF2 Eu já não me lembro também isso. INQ2 Mas qual é o nome dele? INF1 Não me lembro. A gente, ali até era tudo em ferro. INQ2 Ai era? INF1 Era tudo em ferro. INF2 Era. Ali a nora era toda em ferro. INF1 O meu pai mandou vir de fora . Era já uma norazinha bem preparada! Também tinha os tais... E há muitas que a menina está a dizer que isto é em pau. INQ1 Rhum-rhum. INF1 É. INF2 Pois, mas ali não era feito em pau. Era em ferro. INF1 Ali era tudo em ferro. INF2 Mas eu não sei como é que chamavam a isso. INF1 É isto, pois. Isto está ligada e depois está aquilo... Até estava, lá estava (...) . INF2 Já há muito ano, depois começou aí ... INF1 Estava cravejado com os parafusos, e tudo! Mas já tenho visto assim de pau. É mais ruim. INF2 O meu cunhado Custódio ainda há pouco tempo tirou além os alcatruzes e a nora. INF1 Os alcatruzes. (...) E tiravam muito... Desde que tirasse bem - aquilo era muito custoso! -, tiravam uma bela pinga! Ah, mas hoje os motores é que... INF2 Eram metade dos alcatruzes despejados, outros cheios. INF1 Era. INQ2 Pois. INF2 Iam para baixo, iam despejados; quando vinham para cima é que vinham cheios, estava sempre... INF1 É, então... INQ1 Vinham cheios e depois despejavam aquela água... INF1 Despejavam dentro dum tabuleiro. INF2 Despejavam aquela água para dentro dum tabuleiro, de lata. INF1 Aqui, mais ou menos. Aqui, mais ou menos. Olha aqui o... Despejavam. Aquilo estava, aquilo estava... Feito pelos antigos, aquilo estava bem feito! Então não estava?! Andavam em volta, chegavam ali, deitavam para dentro do tabuleiro... INF2 Despejavam para dentro dum tabuleiro, por um rego, por um cano, depois vinha a correr para esse tanque. INF1 Vinha ter ao tanque. INQ1 Rhum-rhum. INF1 Coisas, enfim!...
STJ27
INF1 Era (...) do arroz é que se... Agora também já é enfardada a do arroz, mas dantes não era. INF2 É enfardada mas é... INF1 Mas (...) ainda fazem almeadas (...) de palha, à mesma, para o gado comer, (...) ali ao pé... INF2 (...) Os animais comem melhor essa palha. INF1 Aquela palha sem ser enfardada, os animais comem-na melhor. INF2 (...) Comem-na melhor. (...) INQ1 Rhum-rhum. INF1 (...) E eu (...) andava embrulhada num xaile - não sei se sabem o que é um xaile. Tinha aqueles cadilhos. INQ1 Sim, sim. INF1 (...) E eu andava ali a tirar a palha ali ao cu da máquina, assim... INF2 Ao fagulheiro - chamava-se fagulheiro . INF1 Com umas forquilhas assim, a tirá-la para trás, (...) para as outras carregarem. Deixei apanhar (...) os cadilhos do xaile (...) ali a uma coisa que tinha ali, uma roda (...) da máquina. INF2 É o batedor. (...) Pois. Era um batedor, cá atrás. INF1 Se aquilo não se desabotoa aqui a pregadeira, eu não sei (...) se eu não ia lá também ter (...) lá àquilo. INQ1 Ai, que horror! INF1 O que é que (...) eu a puxar e com o puxão ali (...) daquilo, olha a pregadeira (...) . INQ1 Com o puxão. INF2 Então, cá atrás, o batedor está sempre assim. INQ1 Pois. INF2 Que é para sair o pano. INF1 É ali uma coisa que ali está (...) - uma ventoinha ou não sei como é que aquilo se chama - que aquilo tem que a gente ter cuidado com aquilo. Eu deixei lá apanhar os cadilhos do xaile, já dizia que ficava lá entalada também. INQ1 O burro da palha é... INF1 E os burros da palha é uns paus compridos e as que estão ali ao cu (...) da máquina, põem a palha logo em cima daqueles paus. Depois vai ou homens ou mulheres - duas pessoas, uma pessoa adiante, outra atrás -, os burros da palha é para lá para cima da almeada. INF2 Isso custava também muito. Fiz muito tempo . INF1 Porque os burros (...) era uma porção de palha. E se aquilo era muito difícil ! A gente depois a subir... INF2 Agora já ninguém usa isso. INF1 Agora, credo! As minhas pernas, então agora como elas estão! INF2 Ah, agora isso tudo acabou! INF1 Era a gente a subir lá depois para a almeada da palha - que a palha aqui assim está rente com o chão, mas vamos alteando à ponta (...) de lá, sempre alteando, alteando, ora, chega a pontos que tem lá uma altura enorme! INQ2 E quando anda a passar o trigo na eira, na eira, diz que anda a, a quê? INF2 Isso chamava-se a gente trilhar. INQ1 Rhum-rhum.
STJ28
INQ1 E esses grandes é... Têm o mesmo nome? INF1 É crivo à mesma. INF2 É também o crivo. INF1 É crivo à mesma. INF2 O que é que (...) cada seu crivo tinha lá a sua medida. Mesmo os rapazes que faziam isso já sabiam que era um crivo para isto. INQ1 Rhum-rhum. INF2 Pois. Ou mais miúdo, ou mais largo - é na 'cosimenta' do crivo. INQ1 E não havia uns para duas pessoas? INF2 Isso já a gente lhe chamava... Era uma espécie duma ciranda. INF1 Crivo para duas pessoas? INQ1 Sim. INF2 Havia... INF1 No arroz e no trigo não havia esses crivos. INF2 Não, esse é nos pinhões. INF1 É no pinhão é que há. INF2 No pinhão é que há. INF1 No pinhão é que há. INF2 Pois. INF1 É (...) uma ciranda. INF2 Cada um pega... INF1 Chama-se mesmo uma ciranda. INF2 É uma ciranda. Cada um pega no seu coiso. E é uma rede dessas dos coelhos, uma rede pequenina, cai só o pinhão. INF1 Uma rede esticadinha para cair só o pinhão e ficar as pedras dentro da rede. INF2 Isso é bom é com duas pessoas. INQ1 Pois. INF2 Chama-se uma ciranda. INF1 É isso, é. É bom é duas pessoas. INQ2 Sim, sim, sim. INF2 Depois aquilo joeira-se ali um bocadinho, ainda bem não caía um, depois põe-se a casca fora. INQ2 Rhum-rhum. E não há nada a que chame o joeiro? INF2 A joeira? INQ2 A joeira? INF2 Há sítios que também se chama uma joeira a um crivo. INQ2 Mas aqui é crivo. INF1 A gente é crivo. Aqui é crivo. INF2 Aqui é crivo. Aqui é crivo. INQ2 Pronto. Sim senhor. INF2 Mas há sítios que chamam uma joeira. INF1 Há aí sítios que é a joeira, é. INF2 É. É uma joeira. INF1 Eu já tenho ouvido também esse nome.
STJ29
INQ E juntavam-se muitas pessoas para desencamisar... INF1 Ah! Dantes era até... INF2 Dantes era até aí uma hora ou duas da noite, aí, aí nas eiras a desencamisar milho. INF1 Estandem Quando era nos princípios de namorisco, toda a gente gostava de ir. Era, era. INQ Olhe, e às vezes não encontravam?... INF1 Uma espiga? Preta? INQ Sim. INF2 Uma espiga? Uma maçaroca preta? INF1 Era. INQ Rhum-rhum. INF1 (...) Isso era o abraço. Mas algumas não queriam! (...) INQ Ai era? INF1 Era. Pertencia o abraço. INQ Ai era? INF1 Era. INF2 E havia outras (...) que tinha assim o milho assim rebentado, diz que era um 'espenicão'. INF1 E havia umas que era de beijar. Se ele aí havia ! INF2 Outras era de beijos. INQ Ai era? Ai dependia do... INF1 (...) Do mesmo milho, há isso. INF2 Do mesmo... (...) Pois, havia muita maçaroca (...) assim de várias coisas e depois os antigos diziam que era isso. Não sei dizer . INQ Está bem. INF1 E elas não queriam. INF2 Que era um beijo que eles que tinham que dar às raparigas, outros que era um espenicão, outros que era um abraço... Era para aí muitas coisas! Parecemos a tia Jacinta a ser entrevistada (...) ali por o (...) Fernando Pessa. INF1 É. INQ Ah! Ah veio cá o Fernando Pessa? INF2 Veio. Quando ela fez (...) cento e... INF1 Foi o funeral hoje. INQ Oh! Então afinal a senhora era daqui! INF2 Morreu ontem. INF1 (...) Foi o funeral hoje de manhã. INQ Oh! INF2 Hoje não. Ontem. Pois. Morreu ontem às nove horas da manhã, essa senhora. INF1 Foi hoje às dez horas. INF2 Parecemos ela a ser entrevistada, coitadinha, para o Fernando Pessa! INQ Eu acho que vi isso na televisão... INF1 Faça de conta que (...) foi nossa mãe. INF2 Hã? INQ Eu acho que vi isso na televisão. INF1 (...) Fomos aqui criados. Então a gente... Faça de conta... INF2 Vi, vi. Eu vi ela e ele estar ali, que eu fui lá aos anos. E ele estava com eles . INF1 Faça de conta... INF2 (...) Quando ela fez cento... INF1 Cem. (...) INF2 Não, aos cem não veio. INF1 Aos cem não veio. INF2 Foi aos cento e um ou aos cento e dois, agora já não sei ao certo . INF1 É que ele cá veio. INQ Rhum-rhum. Pois. INF2 E agora (...) aos cento e quatro - foi o ano passado, que ela fez cento e quatro em Janeiro; agora fazia já cento e cinco, agora para Janeiro; mas já lá não chegou, coitadinha! Ainda lhe faltou quatro meses. (...) Quem ali veio foi o Rádio Sorraia. INQ Rhum-rhum. INF1 Então e não veio também ali a Jael , uma que está na?... INF2 O Rádio Sorraia. INF1 Eu pensava de ter vindo aquela rapariga que é ali filha - de quem? - daquele (...) , ali do (...) Daciano. INF2 O Rádio Sorraia. INF1 Pois, mas esta... INF2 Ai, não, não! Essa não. INF1 Ela nunca aqui veio? INF2 Não. INF1 Essa rapariga também trabalha lá (...) na televisão. INF2 Foi ali o Rádio Sorraia é que veio aqui, para ser entrevistada. Eu também a ouvi falar na televisão - na telefonia, essa foi na telefonia. INQ Rhum-rhum. INF2 Vi ela a contar o princípio do namoro dela, ela a perguntar-lhe. Ela começou a entrevistá-la por o telefone, mas ela por telefone (...) não ouvia. Porque a pessoa... INQ Pois. INF2 Ela (...) era já velha e não ouvia, era surda. INF1 E hoje então E a gente , estas meninas é o mesmo, não é? INF2 Era muito surda e ela depois teve que ali vir, a rapariga. Teve que vir cá entrevistá-la, ela. INQ Rhum-rhum. INF2 E eu depois nessa altura não estava lá, mas depois vi ela... Ouvi (...) a telefonia estar a contar (...) as coisas . INQ Rhum-rhum. INF1 Era a mais velha aqui do distrito. Já abalou. Foi o funeral hoje.
STJ30
INQ1 O que os pássaros têm para comer... Com o que é que eles comem? INQ2 Aquela coisa amarela? INF1 É o bico. INF2 É o Inaco . INF1 É o bico. INF2 Eu vou dar de comer ao porco. INQ1 Com que é que eles voam? INF1 Ah, isso aí é com as asas e com (...) as penazitas das asas. E com o rabo. (...) Se tirar o rabo (...) a qualquer pássaro, voa logo mal. INQ1 Olhe, os pássaros quando estão cansados de voar, vêm?... Vêm assim e?... INF1 Bom, isso é coisa que estandem cansados têm que pousar logo ali em qualquer árvore, ou... Ele só se não tiverem uma árvore é que poisam no chão. E tendem uma árvore, não há pássaro nenhum que poise no chão. Isso é todos os pássaros, excepto a perdiz. A perdiz também é um pássaro mas é diferente. INQ1 Pois. INF1 Pois. A perdiz às vezes também pousa nos chaparros, mas é pouco. A perdiz (...) não é direita a poisar nisso, não é? Agora as outras aves são. No chão nunca poisam.
STJ31
INQ1 E este então? INF1 (...) Isto é que foi também cá... (...) Isto é que não se pode matar. INQ1 Pois. INF2 Então e este aqui? INQ1 E isso hav-, aqui há muitos! INF2 Estes aqui? INF1 Há. INF2 Eu não conheço. Nunca vi esse bicho. Parece... Aqui é perdizes, não? INF1 (...) Isto é uns milhafres de qualquer qualidade. INQ1 Sim, sim. INF1 Até pode ser uma águia e ser... INQ1 Rhum-rhum. INF1 Há águias... Eu conheço águias de (...) três qualidades. INF2 Então aqui este? Este tem aqui os pintainhos. INQ2 Então e quais são as qualidades que conhece? INF1 Olhe, (...) há uma que chamava-lhe a gente os papa-ratos, (...) que andava sempre baixinho. INF2 A caçadeira. E outra era caçadeira - águia-caçadeira. INQ1 Rhum-rhum. INF1 E havia a 'águia-barrolheira' e havia (...) outra águia mais pequenina. E há o milhano. INQ1 Rhum-rhum. INF1 O milhano tem o rabo de bacalhau, parece... INQ1 Rhum-rhum. INF1 Outros chamavam-lhe o minhoto. INQ1 Se calhar é este que tem aqui. INF1 É capaz... Ou este aqui, isto é muito... INQ1 Rhum-rhum. É capaz. INF1 (...) Então, eu em gaiato ainda andei a pedir ovos. Tirava ninhos de milhano. (...) Sabem como é que se pedia? "Dá alguma coisa para o milhano"? INQ1 Ah! INF1 Chegámos a arranjar vinte e trinta ovos. Íamos tirar milhanos (...) . A minha mãe dava! Então, muitas vezes, não podiam aqui ter os pintainhos à solta. Vinham os milhanos - andavam por aí altos... INQ1 Rhum-rhum. INF1 Eu jogava-lhe uma fiada . O último que aí apareceu - nunca mais aqui do pé se viu nenhum -, eu estava aqui no meu cabeço e ele andava ali (...) daquele lado. Andava bem alto! Mandei-lhe um tiro - se calhar algum baguito ainda lhe bateu -, parece que abalou desnorteado, nunca mais o vi. Calhando, algum baguito ou qualquer coisa. E a gente ia pedir para o... "Dá-me alguma coisa para o milhano"? Era.
STJ32
INQ1 Quando a perdiz está a cantar, como é que é o barulho que ela faz? INF Ora, faz tch-tch-tch! INQ1 Está a quê? E diz que está a quê, quando ela?... INF Ora, (...) até quando estão a pôr, (...) às vezes, cantam e o perdigão, às vezes, até está ao pé do ninho. INQ1 Rhum-rhum. INF Pois. Isto é um bicho... Então e com os perdigotos pequeninos - vocês nunca viram? Eu não sei se foi o ano passado... INQ1 Às vezes aí nas estradas... INQ2 ... INF De repente... Até por acaso, se aqui estivesse (...) um irmão meu... Matei uma vez uma, aqui (...) perto da gente. Para defender os filhos, correu assim para mim. Havia muita pedra, mando-lhe uma pedrada, matei-a. Elas tentam... São os últimos a abalar são elas, para os filhos se esconderem. (...) Aquilo só visto! Aquilo (...) dá gosto ver-se uma perdiz. Quando é um cão, não. Mas quando é uma pessoa, que haja pastos, estão tão mirradinhos! A gente vai para... (...) Não dá com nenhum. Aquilo são da cor do... Depois abala a... Depois elas fogem para longe; daí a bocado, se a gente estiver assim perto, elas dão um vôo, cantam, ouve-se logo aqui e além : piu! De maneira que são logo espertos! Com medo também de algum cão, não é? Logo espertos! E ele, ele não há bichozinho nenhum desses que toda a gente lhe tem quizila. Que isto é (...) : em viventes, é do melhor que há para comer. INQ1 Pois é. INF Eu comi poucas, eu matei poucas! INQ1 Quando vão muitas perdizes juntas diz que vai ali?... INQ2 Assim um conjunto de perdizes... INF A gente chama-lhe - cá chama-se-lhe - um bando, não é? INQ1 Rhum-rhum. INF Pois. Pois é. (...) Cá é um bando. INQ1 Rhum-rhum. INF Sejam quinze ou vinte. Ah, são (...) de três para cima: "Olha, é um bando de perdizes"! Até três, diz a gente: "Eh, são poucas. São três"! Mas sendem quatro ou cinco é um bando.
STJ33
INQ Que objectos é que fazia com o barro? INF Então, fazia cântaros, fazia vasos, tachos, panelas, todas essas coisas. Isto assim deste tipo, vasos para as flores, aquilo que está aí, barris, cântaros, diversas coisas, não é? (...) Nesse tempo, era muito diferente do que é hoje. (...) E até exactamente por a coisa se ter modificado é que nós abandonámos a arte. INQ Rhum-rhum. INF (...) É que nós trabalhámos aqui em conjunto e quando (...) começámos aqui, tínhamos, mais ou menos, um nível de vida escapatório: tirávamos um ordenadozinho (...) muito razoável! Tirámos um ordenadozito como tirava qualquer outro operário: um pedreiro, um carpinteiro. A gente safávamos-se aqui bem. Depois a coisa começou assim a evoluir, apareceu os alumínios - foi quando apareceram os alumínios. Quando nós aqui trabalhámos, praticamente nem havia alumínios, não havia... (...) Quem tinha uma peça de alumínio era, às vezes, só para compor, nem se servia dela. Depois apareceram os alumínios assim em grandes quantidades e a preços bons também, preços acessíveis, quer dizer que (...) começou a castigar a arte (...) do oleiro. A gente chegámos aqui a pontos... Porque aqui isto (...) é uma zona que se trabalha muito no campo, uma zona agrícola, muito - ele aqui há pouca fábrica - é muito uma zona agrícola. (...) E então panelas assim daquele género, aquilo gastava-se para ali milhares de panelas. Que as pessoas coziam no campo - e mesmo cá em casa! Nesse tempo até se usava pouco fogão. (...) E então, mesmo até no fogão, trabalhavam. Alguns poucos que havia trabalhavam com a louça de barro. Depois apareceu o alumínio; o alumínio primeiro começou a aparecer com boa qualidade; depois era já mesmo com má qualidade, mas muito barato, (...) reduziu a louça. A gente chegávamos a pontos de só fabricarmos já era vasos para flores (...) e cântaros para a água, porque o alumínio (...) não prestava para a água. E depois começámos a não ter escoamento do produto. Tínhamos de ir levá-lo daqui para longe: a gente chegámos a ir levar... Carregámos muito ali para Montargil, ali para aquelas zonas, ali mais para o Alentejo, porque aqui (...) não se escoava o produto. Então começámos a ter dificuldade (...) no ordenado. É claro, como era só a fabricar aqueles dois tipos de produto e com pouco escoamento dele - às vezes tínhamos aí quantidades de louça armazenada, porque não tinha escoamento. (...) E começámos a pensar (...) que a vida assim que estava mal. A gente (...) já ganhávamos menos (...) do que um qualquer indivíduo que trabalhava aí no campo. E depois o meu pai foi um homem que toda a vida fez searas no campo - toda a vida trabalhou no campo e toda a vida fez searas - e nós até tínhamos cegueira com aquilo, pois fomos criados naquilo. Começámos a pensar (...) em ir para o campo, em ir para as searas. Quer dizer que depois (...) os primeiros anos ainda fizemos searas de tomate, searas de arroz e trabalhámos aqui nos períodos que a gente via que tinha assim mais rentabilidade. (...) Por períodos assim como na Primavera, que dava mais rentabilidade e que o produto também se vendia melhor, porque era nas entradas dos serviços, vendia-se muito cântaro, muita coisa. INQ Rhum-rhum. INF Ainda fizemos assim dois anos. Mas depois começámos a ver que tínhamos muito mais lucros a tratar de tomate e arroz que tínhamos (...) na oficina de olaria e pensámos (...) em abandonar a oficina. E abandonámos. Hoje já há cerca de vinte cinco, vinte seis anos - não tenho bem, bem isso coiso, mas deve ser isso, tudo, aí uns vinte e seis anos, com certeza.
STJ34
INQ1 Os cântaros e isso assim, onde é que, onde é que os fazia? INF Então, a gente, nós (...) tínhamos uma ferramenta que era fixada - não era? -, era fixada aí. Por acaso até era aqui, olhe, aqui onde está (...) ... Não é bem onde está aqui mas é aí (...) onde eu tenho aí essa garagem. INQ1 Rhum-rhum. INF Tenho uma partezita aí de escritório. Nós tínhamos aqui (...) uma casa assim comprida (...) - que depois eu até demoli quando foi para fazer isto; estava assim já muito velho e eu demoli-o. (...) E então tínhamos fixado (...) uma ferramenta que nós lhe chamamos a roda de oleiro. (...) Era fixada ali (...) numa bancada - nós tínhamos uma bancada comprida -, era ali fixada, e por baixo levava um cepo grande. No cepo levava uma chapa assim mais ou menos deste tamanho em ferro; e essa chapa tinha (...) um buraquinho onde trabalhava o eixo (...) da roda - onde trabalhava o eixo da roda. E depois nós trabalhávamos naquela roda, que é com a tal coisa. Até já têm visto aí... INQ1 Rhum-rhum. INF Na televisão, às vezes, (...) ainda dá. Ainda há zonas que ainda trabalham e até já tem dado. Trabalhávamos aí: (...) tínhamos duas rodas - o meu irmão trabalhava com uma e eu com outra. E aquilo... INQ2 E o barro, o barro daqui, para chegar aqui à olaria vinha donde? Como é que tiravam? INF Isso era uma propriedade que há aqui perto. (...) E então isso é (...) duns senhores ali de Mora, (...) dum médico e dum outro cunhado - o cunhado agora até já morreu, mas o médico ainda é vivo. E então estava ali (...) um senhor que era de Brotas, que era ali o feitor deles, mas era uma pessoa aqui amiga, e então a gente falávamos com eles (...) para lhe comprar o barro. INQ2 Rhum-rhum. INF Mas eles até nem... Lá isso foram sempre bons para a gente! Nunca levaram dinheiro. Deixavam tirar à vontade e nunca levaram dinheiro.
STJ35
INQ E antes de ir trabalhar o barro, o que é que lhe tinha que fazer? Quando chegava o barro, antes de o pôr lá na roda?... INF Então nós íamos lá tirar o barro. Arrancávamos o barro do chão. Aquilo o barro, (...) não está logo ao nível do terreno, não é? Aquilo tem (...) outro tipo de terreno por cima, não é? Pode ter areia, pode ter pedra, pode ter... E então tem que ser todo limpinho, a pontos de (...) não trazer impureza nenhuma. Nós até usávamos depois assim uma vassoura áspera, e depois mesmo de estar limpinho, ainda o varríamos todo com essa vassourinha áspera para ver se ele vem quanto mais limpo melhor. Porque a gente, para fabricar o barro, se tiver pedacinhos (...) de pedra ou qualquer coisa, a peça pode ficar até rota, não é? Tinha que ser o máximo cuidado logo lá na limpeza. Depois chegávamos cá, o barro vinha em blocos grandes - não é?, chamávamos a gente em torrões grandes, em blocos grandes - esses blocos era tudo depois, (...) com um martelo, era (...) tudo desfeito para ficar (...) em pedaços pequeninos - não é? -, para ficar em coisas pequeninas para ele derregar. E no momento em que fazíamos isso tinha que ser todo escolhido. Que o barro era tirado em zonas que há muito sobreiro - a nossa zona aqui está muito povoada de sobreiros. Era tirado em zonas de muitos sobreiros, depois vinha muito bocadinho de raiz dos sobreiros agarrado. Tinha que ser todo esboroado e todo escolhido, todas aquelas raizinhas. Porque não sei se estão a ver: se, por exemplo, numa peça daquelas, ficar ali um bocadinho de raiz, ali, depois vai ao fogo, arde, fica um buraquinho. Tem que se ter o máximo cuidado! Depois ainda era passado, através dum (...) ... (...) O barro depois ia para o barreiro, era desfeito e depois ainda era passado através (...) duns tanques - passado por um coador - para todas as impurezas (...) que não se encontraram (...) ao escolher ainda ficarem ali naquele ralo. Depois (...) é que se ia... Depois tinha que estar ali uns dias, uns determinados dias, para ganhar assim uma certa temperatura, mais rijo, não é? Porque depois quando saía de lá estava muito mole. (...) E depois é que se ia tirando dali para se ir fabricando.
STJ36
INF Depois quando era (...) para fabricar, ainda nós tínhamos uma bancada, assim do tipo deste balcão, assim - talvez até mais comprida, assim um bocadinho mais larga. INQ Rhum-rhum. Como é que isso se chamava? INF Nós depois aí ainda tínhamos que passar aquilo tudo (...) à mão. A gente passava ainda aquilo tudo assim à mão e assim com os dedos (...) . Que depois o barro, naquelas transformações, naquelas passagens de tanque para tanque e essa coisa, sempre recebe umas bolhas de ar aqui ou ali. E isso é outra coisa que nos prejudicava. Se nós estivéssemos a fabricar uma peça daquelas, que aparecesse uma bolha de ar, podia até cair a peça toda. Tinha que ser todo passado. Isto (...) é uma arte que requer mil e um cuidado (...) e muita mão de obra. Muito trabalho! E então (...) se houver uma bolha de água, a gente vai a puxar - uma bolha de ar. A gente vai a puxar a peça, se aparecer aquele ar, pode a peça até rebentar e cair. Depois então é que era... Depois de estar com os devidos (...) cuidados é que era depois fabricado.
STJ37
INF Havia só a própria roda. Se, por exemplo, fosse panelas, cântaros e isso, era feito mesmo colocado em cima da própria roda; (...) se fosse um tacho, coisas assim (...) com um fundo mais largo, já era (...) a roda, depois em cima da roda levava uns bocadinhos de barro, e depois era colado ali em cima daquele barro. Nós batíamos assim, ficava agarrado ao barro, isso já era (...) uma forma. E era uma forma que (...) ... Suponhamos um tacho, já é uma coisa com um fundo largo, já tinha que ser seco em cima dessa forma. Mesmo para se transportar depois da roda (...) para os lugares de enxugo. Nós depois tínhamos uma casa grande ali atrás com bancadas - assim no género desta estante - não é? -, mas era tudo em madeira -, aonde secava a louça. Que a louça depois também não... Só no Inverno, quando o tempo vai assim de chuva, assim muito macio, é que nós trazíamos para a rua; de Verão tem que ser recolhida e bem fechada (...) para que (...) a temperatura do Verão, o calor - (...) se a tivesse assim ao calor, rachava tudo. Tem que ter uma enxuga lenta!
STJ38
INF Quando arranhava o barro, para lhe tirar as bolhas de ar e alguma impureza que ainda passava, depois de a gente verificar que (...) o barro estava mais ou menos, (...) ainda era feito nuns blocos redondos da dimensão que nós (...) necessitávamos a peça: se a peça era maior tinha que ser um bloco maior. Nós tínhamos mais ou menos (...) as medidas que, por exemplo, a gente fazia vinte, ou trinta, ou quarenta, ou cinquenta blocos, (...) e depois íamos fabricar essas peças. Mais ou menos, as peças (...) era tudo um lote, tudo um lote - chamados esses os lotes -, que até mesmo depois para a venda (...) e tudo serve esse lote. Era um lote pequenino, lote médio, lote acima. INQ Sim. INF Mesmo até nas panelas. (...) E então, isso depois ainda era (...) enrolado - tipo quase de enrolar o pão (...) do padeiro -, ainda era aqui rolado, rolado, rolado e batido, para, se houver ainda alguma bolha que escapasse à mão, (...) para rebentar ali. Quando se vai fabricar, não interessa ter nada de bolhas lá dentro, senão... INQ Rhum-rhum.
STJ39
INF No barreiro (...) isso era tudo tirado à mão. Quando depois nós levantávamos do barreiro, que lhe dávamos ainda uma pisa, aí dentro duma casa acimentada, dentro dum local acimentado, aí já era tipo duma foice, assim curta, partida - suponhamos até uma foice partida ao meio -, para levantar do chão. Quando era depois para fabricar o barro, no momento que estávamos a fabricar, (...) a ferramenta que nós usávamos (...) era uma cana. Nós escolhíamos uma cana nos canaviais, no tempo que estavam criadas - assim por este tempo, de Setembro, Outubro -, ia-se escolher logo. Escolhiam-se logo ali umas canas assim (...) com boa qualidade, (...) e guardavam-se. Tínhamos ali guardados que dava para todo o ano. As canas, a gente interessa-lhe sempre escolher a cana bem criada. A cana depois quando está bem criada, na parte de fora, quase que se põe tipo de vidro, assim vidrada, assim muito luzidia. Era essas é que eram as boas. (...) E nós depois (...) fazíamos da cana, refiávamos a cana ao meio, e depois fazíamos uma parte da cana assim (...) com dois bicos, (...) um para um lado, outro para o outro (...) . E esta parte aqui da cana era muito bem afiadinha - e mesmo durante a duração (...) da cana, quase todos os dias tinha que ser. Tínhamos umas faquinhas muito afinadas, a cortar muito bem. Tinha que ser a cana afinadinha para depois, quando era mais ou menos deste tamanho... E a cana é que cortava e é que fazia dar o jeito. Nós trabalhávamos com uma mão, trabalhávamos com uma mão por fora... Nós trabalhávamos com uma mão por fora e outra por dentro. Isto era assim: a mão que trabalhava por dentro, era esta parte é que puxava o barro; e aqui (...) era a dita cana (...) , com muito jeito - não é? -, em que a gente empurra de lá com a mão (...) e fixava aqui com a cana. À medida que quisesse fazer esta barriga (...) da panela, ia carregando lá mais e aliviando daqui, e depois quando chegávamos aqui, começávamos a fazer ao contrário... E era assim.
STJ40
INF Depois ainda tinha estas asas. Tanto das panelas, como das cântaras, como dessa coisa, ainda tinha (...) esta asa que era feita depois manualmente, já não era na roda. Mas tinha que se deixar (...) a panela, ou cântaro, ou isso que fosse, ter uma certa sezão própria, assim já mais rijinha, para depois lhe sermos (...) capaz de colocar a asa. Porque se estivesse logo mole quando se acabava de fazer, a gente ia aqui para lhe colar a asa e isto vergava tudo, metia para dentro, vergava tudo e nada... Pegaria até melhor pela sezão de estar fresca, mas tinha que estar rija para aguentar. E nós aqui, (...) isto era já feito à mão. Era (...) um coiso de barro muito bem amassadinho, ainda mais bem amassado que este. (...) E depois era batido aqui na ponta da bancada para ficar aqui pegado. E depois nós com as mãos íamos puxando, puxando, puxando, puxando, puxando, puxando com uma pinguinha de água à mistura, íamos puxando, puxando (...) até pôr mais ou menos esta grossura. Quando pusesse esta grossura, a gente com este dedo e este por baixo cortava; cortava, vinha com ela aqui (...) e pegava. Pegava, depois de estar aqui pegado, punha-se este dedo, nós vergávamos aqui o barro para dar coiso e aqui... Era assim.
STJ41
INF Isto para cozer depois (...) tinha que ter uma determinada enxuga - verdadeiramente enxuto, não é? Tinha que estar verdadeiramente enxuto. (...) Se fosse para o forno (...) mal seco, depois no forno racha tudo. (...) Tem que ter (...) uma enxuga mesmo que a gente verifique que está mesmo enxuto por fora e por dentro, (...) para aguentar depois o fogo. Porque se for para lá meio seco (...) e assim meio fresco, isso rebenta tudo, racha tudo. Tem que estar verdadeiramente seco. INQ1 E este barro aqui não tem nada por cima, pois não? Nunca passavam nada... INQ2 Por dentro. INQ1 Aqui por dentro, o que é que passava para ficar?... INF Não, (...) este por dentro é vidrado. Chamamos-lhe nós vidrado. Isto é passado com uma tinta, o chamado zarcão de vidrar. Que esse zarcão de vidrar até serve também para pintar; (...) mas há zarcão só de pintura e há zarcão (...) de vidrar. E o zarcão de vidrar também é mais caro e os pintores fogem a ele. Mas até por acaso é bastante bom (...) para pintar. Isto é zarcão de vidrar, que é um produto que é feito à base de chumbo, à base de chumbo; depois isso era dissolvido (...) numa vasilha qualquer, assim larga; e então depois, nós, depois de termos ali aquilo fabricado, deitávamos aquilo para dentro, abanávamos; esta parte aqui depois da boca (...) molhava-se lá no coiso... E isto que vocês vêem aqui, era na altura que se está a molhar deixa... Ele foi o mestre que deixou escorrer aqui um bocadinho. Aqui até estava a escorrer e o mestre limpou aqui com a mão...
STJ42
INF Como é que eu faço? Olhe, ponho o fermento de molho à véspera. Para estar macio para no outro dia se fazer o pão. Depois compro um bocadinho de (...) fermento inglês e (...) junto ao outro fermento. Não se faz fermento. Dantes fazia-se fermento mas agora não. INQ1 Como é que se fazia dantes? INQ2 Como é que era dantes? INF Hã? INQ1 A senhora ainda sabe fazer como era dantes? INF Como é que era dantes? INQ1 Sim. INF Dantes fazia-se o fermento à véspera para ficar a fintar, no outro dia (...) é que se metia. Mas agora não se faz fermento. Faz-se fermento, deixa-se fermento da massa (...) para cozer depois na outra semana. INQ1 Ah! INF Deixa-se fermento da massa para se cozer na outra semana. INQ1 E depois acrescenta-se? INF E depois põe-se um bocadinho de fermento inglês e o pão finta. Está uma hora, duas horas, conforme, três horas, a fintar. E depois a gente tende-o. E acende o forno e põe-o no forno. Coze-o. INQ1 E onde é que tende? INF Hã? INQ1 Para... Onde é que está a tender? Onde é que?... INF Onde é que está? INQ1 Em que sítio é que?... INF A pá? Ou o pão? INQ1 Sim. INF Num alguidar. INQ1 Num alguidar. E... INF Num alguidar. Põe-se num alguidar grande. Conforme a porção. Se for uma porção maior, põe-se mais num alguidar maior; se for uma porção pequena, põe-se num alguidar mais pequeno.
STJ43
INQ1 Quando o punha a fintar não costumava dizer nada nem fazer?... INF Não. INQ1 Nada? Uma cruz ou isso? INF Ah, uma cruz, mas era dantes. Agora já não se faz. INQ1 Mas dantes, mas não?... INF Dantes punha-se a cruz até ao fundo, bem a cruz estando rasa, estava finto. INQ1 Ah! INF Mas agora já não é preciso. Põe-se uma tábua em cima para se pôr o panal em cima (...) para tapar, e depois vai crescendo, chega (...) àquele limite do alguidar, a gente... Por exemplos, põe-se assim o alguidar, fica por aqui, de uma semana para a outra, já não é preciso cruz. INQ1 Rhum-rhum. INF Já não se faz a cruz. Agora já não faço a cruz. INQ2 Dantes quando fazia... INF Quando amassava... Agora é embrulhado só. Agora é embrulhado, já não se amassa. INQ1 Ah! INF Agora é embrulhado. (...) Está uma hora para se levantar a pasta; ao fim de uma hora vai-se levantar a pasta; depois no fim dessa hora, está a fintar - pode levar duas horas, pode levar três, a fintar, conforme o tempo. Conforme o calor do tempo. Agora tenho tido marés que em duas horas finta-me o pão; depois está uma hora no forno, tira-se, já está cozido.
STJ44
INF1 A abelha principal é a abelha-mestre. INQ1 E ao... INF1 Essa é a abelha-mestre. Em todos os cortiços, em todos os cortiços e em todos... As abelhas só têm uma! INQ1 Rhum-rhum. INF1 Só têm uma! O meu pai teve sempre (...) cortiços e apanhou sempre muito enxame, que esse chegou a ter muitas colmeias. E depois no resto, os enxames eram era pequenos e juntava. Juntava os dois, mas para juntar (...) tem que os molhar. Vai com uma pouca de água, molha a abelha que está ali em moitão - porque a abelha sendo molhada, perde o cheiro. E depois já as que estão dentro do cortiço já recebem aquela, porque perdem o cheiro, não sabem se 'há-dem' aceitar , se não. E a mestre depois, menos da hora que se juntam, filam-se a brigar: a que for mais fraca, a outra mata-a, fica só uma sozinha. E quando é (...) no Verão, fica só (...) um zango para fazer casta. INQ1 Ah! INF1 Escolhido pela mestra. Fica só um zango e os outros são todos mortos. Quando é a entrar no cortiço à noite, as abelhas esperam ali por eles, é tudo morto! INQ2 Ah! Que giro! INF1 Só fica um. INQ1 Não sabia. INF1 Pois. (...) E o Damião, o filho dele (...) é engenheiro agrícola, tem muita colmeia... O ano passado - o outro ano -, cá no país ele até é que ganhou o primeiro prémio, pois, de arranjar mel. E esses, a maior parte delas nem dão tempo de enxamear. Tira-as ele. Tira-as, mas bem vindo mais que uma mestra, mata uma e fica só com uma. Porque a mestra é diferente das outras, conhece-se bem. É maior, é (...) quase da cor duma vespa. A mestra. E é maior que as outras. E as outras são mais curtinhas e são mais escuras, mais negras. Pois. INQ1 Olhe e com que é que a abelha pica? INF1 Hã? INQ1 Com que é que a abelha pica? INF1 A abelha? Pica com (...) um ferrão. INF2 Ferrão. INF1 Um ferrão que tem ligado às tripas. Toda a abelha que pica morre logo. INQ1 Pois. INF1 Porque espeta o ferrão e depois (...) elas começam a zunir até que fogem, largam (...) a tripa fica agarrada ao ferrão, depois a abelha morre. Toda a abelha que pica morde. Morre. INQ1 E a vespa não?... INF1 Pois, porque larga a tripa agarrada ao ferrão, depois morre. INQ1 A vespa também morre? INF1 A vespa não. A vespa não morre. Agora a abelha morre. Mas a vespa também pica. É como um mosquito. Um fulano vem, agora neste tempo: "Eh, os mosquitos estão só a morder"! Eu então sempre que posso dizer-lhe: "Ó diabo, não digas que os mosquitos mordem! Então não vês que eles não têm dentes! Só morde é mordem toda a qualidade de vivente que tem dentes! Agora (...) o mosquito não tem dentes, não morde, pica"! O mosquito pica, (...) a mosca pica, a abelha pica. Toda a bicheza que não tem dentes, todos picam. INQ2 Rhum-rhum. INF1 E os que têm dentes é que mordem. Pois até dantes, (...) às vezes, quando calhava andar calçado, descalçava o pé, quando calhávamos a encontrar, qualquer pessoal, um alacrau. Depois eu ia, punha o pé em cima da cabeça do alacrau para ele picar no pé. Depois ele espetava o pico, depois fazia assim... Às vezes, até o veneno - ele ganhava ali uma bolhazinha de veneno, uma bolha de água de roda. Para eles verem que o lacrau é uma mordidela terrível . Há-de ser aí conforme vinte e quatro horas credo! Agora eu não me faz diferença nenhuma! INQ1 E punha alguma coisa... INF1 Portanto, (...) havia uma casa em Lisboa que davam (...) dinheiro para um fulano pôr o pé em cima do lacrau. E eu já disse ao genro da minha filha para irmos lá umas poucas de vezes, porque ele tem um carro: "Oh pá, vamos lá! Eu descalço-me. Chego lá, descalço-me. Mas primeiro dão-te o dinheiro a ti e depois é que ponho o pé em cima da cabeça do lacrau". Eles de vez em quando até apresentam o lacrau; e é remédios ou não sei quê, e o lacrau, que é para um remédio não sei quê! Até ouvi dizer primeiro que era (...) para o cancro, ou para o 'cangro', ou não sei quê! O veneno do lacrau! Agora não sei, nunca mais ouvi mais nada!
STJ45
INF1 A gente tira o mel e depois fica com a cera. INQ1 Rhum-rhum. INF2 Fica cera. INF1 Depois a cera é vendida para fazer novamente favos outra vez. INQ1 Rhum. INF1 E outros materiais que é preciso. INQ1 Pois. INF1 Que a cera é própria para outras coisas. Mas a cera serve para fazer... INF2 Da cera faz-se água-mel. INQ1 Rhum-rhum. INF1 Para fazer favos (...) . INF2 Da cera faz-se água-mel. INQ1 Rhum-rhum. INF1 Pois. Isso é depois no resto, não é? Isso é no fim de tirar o mel todo, que ela esteja enxuta, é que é depois fervida num tacho, ali um valente bocado, que é para... Vai começando a estar mais grossa, apaga-se, depois fica água-mel. Pronto. INQ2 E em que altura é que, do ano, é que costumava tirar o mel? INF1 (...) É sempre em Junho. É sempre em Junho. Há aí gente que começam às vezes ao fim de Maio, mas é cedo demais. (...) O tempo próprio é sempre em Junho.
STJ46
INQ Como é que fazia o pão antigamente? INF Então, antigamente, a primeira coisa, ia-se buscar a farinha ao moinho. Depois chegávamos a casa, 'peneirávamos-a' por uma peneira - não sei se vocês conhecem o que é uma peneira? INQ Rhum? INF Uma peneira. Peneirávamos a farinha, e depois no fim de a farinha estar peneirada, fazíamos o fermento, à véspera, porque não havia fermento inglês. Pois, não havia fermento desses que agora há. E havia só fermento... Fazia a gente... Guardávamos um crescentozinho de semana para semana - um bocadinho de massa (...) das outras cozeduras - e quer dizer que tínhamos todas as semanas um bocadinho da outra massa. Fazia-se o fermento à véspera, no fim de a farinha estar peneiradinha. E, no outro dia de manhã, levantávamos, amassávamos, dávamos-lhe ali bastante porrada que era para ele ficar bom, olhadinho. INQ Rhum-rhum. INF Ele além aquela mulher que vocês estiveram agora ainda faz assim, mas eu agora já não faço. Já não amasso assim como dantes.
STJ47
INF Quer dizer que depois a gente fazia o fermento, e no outro dia (...) levantávamos-se, amassávamos e depois estava muito tempo para fintar, porque demorava muito tempo, que era só com o fermentozinho que a gente fazia - o fermento, não havia fermento inglês. Estava muito tempo. Depois aquilo lá crescia até a gente lhe parecer. A gente (...) pomos o pano em cima (...) da massa, e pomos uns poucos de farelos, do que a gente tirava... Peneirávamos e o que a gente tirava depois púnhamos (...) uns poucos de farelos em de cima do pano. Depois as nossas mães e isso diziam que era quando estivesse aquilo arregoado, ali os farelos depois começavam a arregoar, que era quando estava finto. E a gente era assim que a gente tratava (...) da cozedura. Depois tendíamos, quando a gente via que estava finto, arranjávamos ali o tabuleiro de madeira - que eu ainda aí tenho também -, punha-se o panal (...) e começávamos a tender e tendíamos o pão. Depois, no fim de estar o forno quente e tudo, plantamo-lo no forno. Pois, varria-se o forno e punha-se.
STJ48
INQ Que qualidades de pão é que fazia? INF1 Ai, eu era pão de milho e pão de trigo. Foi. Eu, centeio, nunca tratei de centeio. A minha mãe ainda tratou, mas eu nunca tratei de centeio. Era pão de milho e pão de trigo, era só o que eu tratava. Pão de milho é, mais ou menos... Pão de milho demora menos tempo a tratar. Porque finta mais depressa, ou não demora tanto tempo a fintar ou não sei quê... INF2 E a peneirar. INF1 E a peneirar também se peneira muito... (...) A gente agora já não peneira. Já vem tudo peneirado. Mas dantes tínhamos que peneirar. Farinha (...) de trigo demora muito tempo a peneirar; (...) a de milho é um instante. A gente num instante ali tratava da cozedura de milho. Demora é mais tempo a cozer. E o forno também tem que ser mais quente, que o pão é mais custoso de cozer! Pois. INQ Rhum-rhum. INF1 Mas, mais ou menos, tínhamos que amassar e peneirar e isso à mesma. INQ Olhe, e para o pão de milho havia assim umas tigelinhas?... INF1 Ah, de tender. Pois, o pão de trigo é à mão. INQ Rhum-rhum. INF1 (...) E o pão de milho tinha que ser tendido na tigela de tender. Que se chamava mesmo a tigela de tender. Eu já nem tenho! INF2 Eu tenho. INF1 Eu não. INQ Quando andava a fazer assim ao, ao pão de milho... INF1 Pois, a tender. INQ Dava algum nome? INF1 É tender. INQ Tender? INF1 É tender o pão de milho. INQ Rhum-rhum. INF1 Pois, é mesmo tender. Então aí não está "tender"? INQ Sim, sim. INF1 Pois, é tender mesmo o pão de milho. INF2 (...) INF1 Ora, eu agora um dia destes cozi aí, tendi aí por outra. Ela tende-se bem à mesma por outra.
STJ49
INQ E como é que pagavam ao moleiro? INF Ai, isso (...) ele tirava percentagem. Eu agora não lhe sei dizer já como é que era. Bem me lembro lembra já eu! Ele tirava lá o... Por exemplos, a gente, é um supor: levava vinte quilos (...) de milho, ele depois tirava lá o que ele pensasse, a percentagem dele, ou dois ou três quilos do nosso milho e pronto! E dava o resto à gente de farinha. INQ E davam algum nome a essa percentagem? INF É a maquia. Chamava-se a maquia. Dantes era a maquia e agora não sei como é. Agora já não há essas coisas. Não sei. INQ Pois. INF Pois. Ele chamava-se a maquia. Tiravam aqueles quilos (...) para o trabalho deles e (...) para despesa deles, pois. INQ Rhum-rhum.
STJ50
INF É o grilo este? INQ1 É diferente do grilo. Diz que... Faz muitos buracos na terra e é castanho. É mais comprido que o grilo e faz, parece que faz assim trrr-rrr? INQ2 A senhora já falou do ralo? INQ1 Isso não?... INF Ai é o ralo? Isto é que é o ralo? INQ2 É? INF Rhum... INQ2 Não... Como é que a senhora?... Como é que é o ralo que a senhora conhece? INF É este. Eu não conheço mais ralo nenhum que é esse ralo que anda aí no chão - amarelo (...) ! INQ2 Sim.
STJ51
INF Então que é aqui? INQ1 Esse a senhora já falou também. INF É o grilo? Não é? INQ1 Tem um, um pico no rabo... INF O alacrau? INQ2 Esse pica. INF Ah, pois é, pois. É o lacrau. Morderam-me cinco. Depois já não... INQ1 E faziam alguma coisa para passar a, a picada? INF Eu, por acaso, o último que me mordeu, eu (...) ... O primeiro que me mordeu (...) não lhe fiz nada. Foi só chorar as vinte e quatro horas cheia de dor, com a perna no ar, que não lhe fiz nada. Não lhe fiz nada! Eu era gaiata ainda, fui calçar um sapato velho, que ele dantes não havia sapatos. A gente em bem apanhando um sapato, enfiávamos lá os pés dentro. E eu fui calçar aquele sapato e tinha lá um alacrau dentro. Ora, aquilo foi morder ali até - até lhe apetecer! Foi (...) uns sapatos até (...) dos meus irmãos, ou não sei de quem, uns sapatos grandes. Encavei aquilo nos pés e andava assim. Depois o alacrau mordeu-me. Eu chorei, e lá, sempre a chorar. Ele não havia outro remédio! A gente não sabia certas coisas, agora já... Mas depois morderam-me mais quatro. Três eram pequeninos. Doeu-me mas não era assim dores... Aquele é que ele me doeu muito! E este último que me mordeu, foi numa altura que eu fiz aqui estas casas aí, (...) as primeiras casas. Fui ali buscar um pouco de tijolo e levantei o tijolo - a gente andava sempre descalços -, e debaixo do tijolo estava um alacrau. Fui, pus lá o pé, mordeu-me. Mas doeu-me muito! Mas depois ali uma mulherzinha assim mais de idade ensinou-me uma mezinha para lhe eu fazer. E eu pus-lhe. Era sulfato de cobre - não sei se vocês conhecem isso, se quê. Era sulfato de cobre - uma pedrinha derregada ali numa pinguinha de água - e banhar... Ali onde o alacrau mordeu, banhar o pé ali (...) com aquela água. Doeu-me muito menos! Não sei se foi disso (...) se o que é que teve de ser. Mas se calhar sempre foi, pois, adormeceu mais o pé. Mas as vinte e quatro horas doeu-me sempre à mesma. Não era era dores desensofridas. Mas o primeiro que me mordeu, aquilo foi dores do pior! Toda a noite chorei e todo o dia!
STJ52
INQ Como é que é: se elas picam, aquilo também?... INF Eu até acho (...) que elas que nem picam. INQ Não? INF O meu filho quando era pequeno - esse que vocês lá estão -, ali em baixo, andaram ali (...) a dar cabo dum valado que ali havia. Não sei se sabem o que é um valado, se não. É um morrão de terra, que ali havia uma coisa antiga e havia ali pencas. INQ Sim. INF E havia aquele morrão de terra ali - tudo ali, um valado, tudo cheio de pencas e isso. Depois fizeram ali uma casa e derrubaram... Pois, arranjaram aquilo. E o gaiato andava lá e aparece-me aqui com uma 'salpeia' - mas uma coisa de vantagem! - na mão. É por isso que eu digo que aquilo... O alacrau, aquilo embora morda - não sei se morde, se não -, mas embora morda - mas é preciso se calhar com muito tempo, não sei. O gaiato (...) apareceu-me aqui com aquele bicho aqui na mão, que arranjou lá no valado, lá na terra. Depois eu, eu cheia de medo, porque dizem que aquilo (...) que se elas morderem, que aquilo que não tem cura. Mas ele se calhar não mordeu, porque ele... Outras pessoas dizem que cada patinha - aquilo tem muitas patas -, cada patinha que é uma dor.
STJ53
INF Se a bicha ouvisse... Eu não sei quais é que é mouca, se era o licanço, se era (...) a víbora. INQ Rhum-rhum. INF Diziam, pois diziam. Se a víbora - parece-me que a víbora que é mouca. Vê mas parece-me que é mouca. Ou é ao contrário. Olhe, eu não sei já bem como é que é. Diziam se a víbora ouvisse e o licanço visse, não havia ninguém (...) que resistisse. INQ Rhum-rhum. INF Mas eu agora não sei quais é que é o mouco e quais é que é o cego. INQ Este é o licanço? INF Ai, este é o licanço! Pois é! Este bicho também dizem que mata as pessoas, mas isto ainda não matou ninguém. Então isto é um bicho 'palarou'. É preciso... Ora a lamber, a fazer sangue! Quais é que é a pessoa que se deixa lamber até fazer sangue?! Diz que tem a língua muito áspera e que é (...) ... Pois, o mal dele (...) ... Ele não morde, é só a lamber (...) . Aqui é alacrau. Oh! Lagartos. INQ Pois.
STJ54
INQ Já alguma vez alguém foi mordido por uma víbora aqui? INF Aqui na nossa aldeia já foi. Olha a mãe (...) desse rapaz que vocês estiveram lá no café desse Dâmocles, desse Jacinto. INQ Rhum-rhum. INF A mãe, mordeu-lhe uma víbora, está aleijada (...) do dedo onde a víbora lhe mordeu. INQ E o que é que se dizia que se fazia para curar? INF Ah! Ela foi para Lisboa, ela cá não... Aquilo... INQ Pois, não faziam nada aqui? INF Diziam dantes (...) que a gente dando um golpinho para sair o veneno, que... Mas ela foi para Lisboa, eu nem sei se lhe deram algum golpe, se que não. Isso já foi coisas já há muito ano, não me lembra já. Essa mulher tem um... Não sei qual é o dedo. Andava a mondar arroz. INQ Rhum-rhum. INF Andava a mondar, mas ela não estava dentro de água. Aquilo estava no combro, porque aquilo tem uns canteiros, não é? INQ Rhum-rhum. INF (...) E ela calhou a pôr a mão assim em cima do combro, estava logo a víbora, mordeu-lhe, aquilo aleijou-a num dedo. Está aleijada dum dedo. E está ali outro homenzinho, também levou uma mordidela duma víbora na ceifa. Pois andava a ceifar o pão, também lá lhe mordeu uma víbora. Agora esse bicho até já desapareceu. Já não há bichos quase nenhuns destes. Mordeu-lhe uma víbora, também esteve muito mal! Foi para Lisboa, enfim... Mas já morreu esse homenzito. Pois já morreu, mas não foi disso. INQ Não foi disso. INF Não foi disso.
STJ55
INF Pois estas parece aquelas flores do mato. Dum mato que se chama... (...) É estevas. INQ1 É. INQ2 Sim, é isso. INQ1 É, é. INF Agora é que eu ele me está a lembrar por causa de esta estar a dizer que eram peganhosas. INQ1 É, é. INF Lembrou-me ser estevas. INQ1 Pois, é, é. INF Eu conheço isso. O que é que, a gente aqui, o desenho não é tão bem coiso como... INQ1 Pois. INF Se eu visse (...) as plantas no campo, eu conhecia melhor (...) as coisas, agora assim... INQ2 Pois é. INF Esta (...) é a sargaça. Não sei se é sargaço que a gente chamava já a isto. Já nem me lembra lembro . Aqui pela flor, (...) mesmo por a folha estou a ver que é. INQ2 Pois. INF Este é amarelo, é o mesmo. INQ2 Esse também é o saragaço. INQ1 O saragaço. INQ2 De várias cores. INF É de várias cores, é. Olha este é cor-de-rosa. Olha, este é (...) um sargaço miúdo, que onde ele há é sempre em terra de barro. Assim uma terra barrenta. É este aqui.
STJ56
INF1 Fazia-se o carvão. A gente arranjava a... Tínhamos ali a lenha arranjadinha, toda tirada, a cortiça (...) ... Sem cortiça! Pois. Cá no meu tempo era sem cortiça, que eu ainda andei a fazer fornos também. Além no... INF2 Além para cima, para (...) . INF1 Ali! INF2 Ah, foi aqui? INF1 Ali mais o Daniel. Não tem ouvido falar (...) no tonto do Daniel? Eu ainda andei mais ele. A fazer fornos. INQ2 E como é que?... Como é que se fazia? INF1 Olha, fazia-se: tínhamos ali a lenha toda arranjadinha, andava lá o carvoeiro e a gente a ajudar, a amanharmos a lenha. Começavam (...) a pôr assim a lenha, a lenha empinada, mas um buraco por baixo, quando não ficava ali... Por exemplos, era assim (...) neste tipo assim. Punha-se assim isto. Isto era o meio (...) do forno. Ficava assim, por exemplos, não ficava unida a lenha, logo fechada por baixo. Ele punham-lhe logo ali às vezes um pouco de mato, ou qualquer coisa assim, ali por dentro, que era para ele atear. E eles iam pondo lenha em volta, lenha em volta assim empinadinha. INQ2 Rhum-rhum. INF1 Assim empinada. E deixavam-lhe ali uma bocazinha que era para depois atiçarem fogo lá ao carvão, à lenha. E iam empinando e depois de todo bem tapadinho com terra... Era muito bem tapadinho com terra, aquela lenha. Aquela lenha toda tapada com terra, e depois no fim andava ali dois ou três dias. (...) O carvoeiro andava lá sempre em volta, porque às vezes ardia mais um lado ou qualquer coisa, para ir sempre tapando com terra, e depois aquilo ficava carvão. Depois ficava lá carvão.
STJ57
INF Esses homens mais antigos (...) não queriam trabalhar... Não queriam o horário das oito horas porque eles trabalhavam... (...) Trabalhava-se: falava-se à segunda-feira; (...) depois (...) iam lá ferrar, era uma hora só a segunda-feira. Trabalhavam cinco dias e ganhavam seis horas. Tinham de manhã, tinham... Ferravam com meia hora de sol; (...) de manhã até ao almoço tinham meia hora de descanso; ao almoço, tinham uma hora e um quarto; depois iam ao jantar - à uma hora da tarde, iam ao jantar; tinham uma sesta, duas horas de sesta. Ferravam-se às três. Toda a gente, ninguém dava as duas horas, davam duas horas e um quarto. Depois ferravam. Da parte da tarde até à despega, tinham quatro fumaças para descansar. Tudo dava meia hora. E tinham meia hora de fumaça. INQ Fumaça, isso era, era... INF Era descansar. Fumassem que não fumassem, aquele período de tempo descansavam. Descansavam. INQ Mas fumavam, aproveitavam para fumar? INF Quem não fumava, não fumava; estava a descansar. INQ Está bem. INF E então enregavam. Esses homens tinham as oito horas aqui na região. Trabalhavam as oito horas na região. Cá o hábito da região era isto: trabalhavam as oito horas na região. Maio, Junho e Julho. Eram os três meses que descansavam cansavam . E desse tempo em diante já não estavam as oito horas. Mas eles queriam. Davam o rendimento que dão hoje actualmente. Isto hoje, o 25 de Abril, na agricultura, (...) foi uma peste que apareceu. Porque a gente na agricultura, por exemplo: tínhamos o gado; a gente lá ia ceifar; ceifávamos, carregávamos o pão com os carros de vacas. Tinha o carro de vacas com cangas e as vacas... INQ E o senhor ainda se lembra da, de como é que eram esses carros? INF Era um carro de bois. Era um carro com rodas de ferro. INQ Ah! INF E uma canga (...) que faziam os carpinteiros... A gente é que lá é que fazia as cangas para a gente. (...) A gente trabalhava a fazer... INQ A gente de lá faziam... Quem é que fazia as cangas? INF Era a gente. (...) Tínhamos um banco e tínhamos ferramentas, fazíamos as cangas. Aqui esses lavradores grandes tinham um carpinteiro para lhe fazer os carros, para lhe fazer (...) as cangas. Depois (...) essa junta de bois que andava à frente, tinha um espelho, uma canga especial muito enfeitada e (...) os chocalhos e campainhas. E campainhas para o gado. Pastava-se Depois estava-se . E (...) ali no período - vocês andam para fazer essa época de tempo - e então de Verão, a gente fazia as debulhas à pata de égua: com um trilho e duas bestas a cortar o calcador. E era tudo a braçal.
STJ58
INF Fazia-se os alqueves. A gente (...) começava a fazer a sementeira aí na última semana de Setembro. Quando era aí no fim de Outubro, entrada de Novembro, fazia. Depois começávamos a alquevar as terras. Alquevava-se até a certa altura, até aí ao fim de Fevereiro estavam os alqueves prontos. Depois esses alqueves que era destinado para o milho gradava-se. Deixava-se. E deixava-se estar a curtir, a terra a curtir - a fermentar, como fermenta o pão. E depois de fermentar, (...) tornava-se a meter as charruas e semeava-se. Semeava-se umas vezes a lanço, outras vezes ao rego. Semeava-se ao rego, onde se semeava ao rego, metia-se o gado, metiam-se as bestas, as éguas, (...) com uma charrua - que chama-lhe a gente o sachador - a sachar o milho. Depois metiam-se uns homens atrás do sachador para conchegar o milho. E então tinha-se grandes produções. Ele a terra, nessa altura, era tratada. As terras (...) ganhavam - agora não - ganhavam aí uns para fazer a produção. Alquevava-se um tempo, adubava-se com o gado. Agora é tudo a tractor. O tractor corta as pestanas às árvores. Os chocalhos, (...) o gado, quando era de Inverno, as ovelhas soltavam-se às nove, dez horas, para não apanhar a maresia. Porque a maresia punha pieira e dava cabo das ovelhas. Só se soltavam no fim de enxugar. E no Em vindo o Inverno... (...) Isto era de Inverno. E de Verão soltavam-se de madrugada: a partir do mês de São João, solta-se o gado de madrugada. Quando era a hora do calor, o gado ia para a sombra. Tirava-se água dos gamelões para o gado dar água. Era aqui o costume (...) da coisa. E antigamente, aqui há trinta anos, falava-se ao pessoal. Havia este respeito pessoal uns pelos outros. Havia respeito. O pessoal respeitava-se todos uns aos outros. Hoje não há respeito por ninguém. Respeitavam-se. Quem ali chegava à praça, falava ao pessoal, oferecia tanto, o pessoal (...) tirava o nome e dava-se a molhadura. (...) Ia-se à taberna pagar o vinho aos homens que iam para a gente. Ainda não apanharam nessa zona quem dissesse isso? INQ Sim. INF No Couço era o hábito desta coisa. INQ Ai era? INF Era. As mulheres (...) e os homens, a maior parte aí dos lavradores (...) não davam meia hora. Havia alguns que davam meia hora só de sol de Inverno. E de Inverno os homens tinham estas vantagens todas, só trabalhavam cinco, seis horas. E faziam mais que hoje que se trabalham oito.
STJ59
INQ1 E quando ia para a prensa, punha as seiras em cima duma?... Punha as seiras em cima do quê? INF As seiras, (...) ia um carro de mão, um carrinho com a massa, e depois punham as seiras, e era escaldado com água - com água a ferver - e enchiam de massa. Depois ia para a prensa apertar, estava duas horas ali a espremer. Eles apertavam com uma roda, (...) e essa roda tinha um cabo em ferro onde eles se agarravam. Mas o meu avô apertava sozinho. Não precisava... Era um homem possante! Ele sozinho (...) apertava a prensa. Mas quando não era... Aqui no Couço, também houve um lagar desses. Houve. INQ1 Aqui no Couço também havia? INF Houve. Havia, sim senhor. Também havia um lagar desses. INQ2 E o sítio onde se punha as seiras, davam algum nome? INF Isto, as seiras chamam-se os capachos. INQ1 Sim. INQ2 Aqui como é que se chamam? INQ1 As seiras. INF As seiras, no fim de espremer, tiravam-lhe (...) dos capachos o bagaço. O que estava dentro é os bagaços. INQ1 E quando apertava a prensa, para apertar, em cima das seiras não tinha assim um, um?... INF Tinha um tampão em ferro. Esse tampão é que apertava, ia a apertar até ao limite. Tinha uma graduação (...) para apertarem até chegar a essa graduação. INQ1 E olhe, quando está ainda lá no moinho, não sai um primeiro, não sai logo um primeiro azeite? INF Não. INQ1 Não? INF Sai a água-ruça. Depois é que eles vão purificar. Tem (...) as 'meduras' (...) . Chama-se aquelas latas onde vai o azeite é as 'meduras'. E dessas latas, das 'meduras', vai purificando, tem um cano para purificar. (...) O homem que trabalha - que é o mestre do lagar - é que sabe: vai a água... O azeite vem ao de cima e a água vem para baixo. Tem uma torneira para tirar. E quando eles querem fazer o roubo para o inferno, estão ali na cara, os tipos não vêem nada. Dão um pontapé na torneira, deixam correr até eles lhe parecer. Depois dão-lhe outro pontapé. Eu era garoto, fui mais o meu pai ao lagar. O meu pai percebia; o meu avô foi quarenta e nove anos mestre de lagar. O meu pai nunca quis ser mestre. Porque ser mestre dum lagar, é preciso ter um feitio! (...) Os fregueses chamam ladrão, chamam tudo, e eles, o que é eles têm de ter um feitio especial para não discutir com os clientes. É essas coisas todas.
STJ60
INF Isso é o azeite cru. (...) INQ Tirava-se como? INF Tiram eles quando... INQ Antes? INF Antes. Tiram eles é o azeite cru antes de sair da água a ferver. É o azeite cru. Chama-se o azeite cru. Para fazer um unguento - eu e depois lhe ensino. Um farmacêutico em Montargil chamado Dario... O meu pai levou uma picada duma balsa e andava no médico a levar - era não sei quê de prata para queimar. E o farmacêutico olha para o meu pai e disse: "Ó rapaz, então andas já há um ano aí no médico e ele não há-de te curar. Vai lá ao teu pai que te dê lá um pouco de azeite cru, que eu faço-te um unguento que sara todas as feridas". O meu pai apanhou-o. - Era muito inteligente: aprendeu a ler e a escrever sem professor, só com explicações doutros, e tudo ! Em matemática, era um matemático terrível! Eu tenho um sobrinho (...) que tem três cursos superiores. É professor de matemática na Faculdade de Ciências. - E então pôs a metade de cânfora e a metade de alvaiade de chumbo, e era batido com azeite cru. Foi para lá uma rapariga, lá para o monte, empregada, tinha uma ferida numa perna que já cheirava mal dessa perna.
STJ61
INF (...) Em Montargil, no 'amanso' de Montargil, compravam-se os bezerrinhos na feira da Ponte de Sor e depois punham-se com uma canga, e andavam atrás dos carros. Quando iam trabalhar, já sabiam voltar, já sabiam várias coisas. Ensinavam-lhe. INQ Aqui é que faziam essas... INF Aqui é que era. Aqui é que era. Os garraios tinham dois, três anos - dois anos... Com (...) dois anos e meio, três é que metiam a amansar. INQ Os garraios? INF Os garraios. Ia um garraio que era mais manso e um boi manso a trabalhar como um garraio - à parelha dele. (...) Ia um boi manso para o segurar e... - um boi já ensinado a trabalhar, para ensinar o outro garraio. Depois quando trabalhava aquele que já viam que estava manso, metiam um outro mais aquele. Depois, ao fim daí dum mês de trabalharem assim, a quatro ou a seis, iam então, é que se juntavam os dois a trabalhar com uma corda cada um, e a lavrar nesses chaparros. Havia homens especialistas. Havia aí grandes homens com grande ciência e com grande arte para trabalhar com esses bois. E eram escolhidos. Havia aí muito homem, muito artista, aí na região. Havia aqui grandes esgalhadores, esgalhavam os chaparros, faziam uns golpes como devia de ser. Esgalhavam, agricultavam, adubavam-se os chaparros, que os chaparros não se secavam.
STJ62
INF Mas em Montargil também se chama sobreiros e sobreiras e chaparros. É a mesma coisa. A oliveira é uma árvore que dá a azeitona, produz bem. É uma árvore que dura oitocentos, novecentos anos, mil anos. Então lá na propriedade que eu tenho, estão lá oliveiras que têm oitocentos anos. Há ali um chaparral à entrada de Montargil... Quando foi a Batalha de Aljubarrota, (...) eles esses que iam para a Batalha de Aljubarrota que vinham de Avis, estava aquilo (...) tudo espetado de estacas, prenderam os cavalos às estacas. É um olival que tem seiscentos e tal anos. Montargil é uma terra antiga e aqui o Couço é uma terra moderna. O Couço foi fundado em 1604 por assassinos e ladrões. INQ1 Ai sim? INF Sim. INQ1 Não sabia. INF (...) E a tradição... INQ2 E, e ali Santa Justa? INF Santa Justa é também antiga. Santa Justa, era - chamavam-lhe - a aldeia da 'pêncora', mas hoje já lá não há... INQ2 A aldeia da?... INF Da 'pêncora'. INQ2 Ah! Não fazia ideia. Tinha... INF A 'pêncora' é uma coisa que dá (...) um figo. Não sei se as senhoras... INQ2 Sim.... INF Pois. Chamam aqui 'pêncora'. INQ1 Rhum-rhum. INF Aqui nesta... INQ2 E tinha muitas 'pêncoras'? INF Com muitas 'pêncoras'. Era tudo, era... INQ2 A aldeia das 'pêncoras'? INF Era a aldeia das 'pêncoras'. Hoje não. (...) Hoje é uma aldeia já (...) muito actualizada, já lá tem gente que... Saem de lá rapazes médicos... Tem mais formaturas Santa Justa que tem aqui o Couço. INQ2 Ai é? INF Tem. INQ1 Pois. INQ2 Pois. INF Os rapazes de Santa Justa saltam todos as cancelas. Chama-lhe a gente todos esses que se formam que saltam as cancelas. INQ1 Rhum-rhum-rhum. INF Aqui no Couço não são amigos de saltar as cancelas.
STJ63
INF Então a doutora Diana esteve a elucidar a vocês quem eu era. INQ É verdade. INF Eu sou cliente dela. INQ É? INF (...) Ela como médica é uma artista. INQ Ai sim? INF É artista. Tenho uma irmã que tem andado... Já gastei com ela quase três mil contos. (...) Aquela doença tinha cura. A cura daquela doença é uma sangria. Todas as mulheres estão sujeitas àquela coisa. Tem dois vasos, que são os maus, que abrem. E quando esses vasos (...) que são os maus - que a ciência não sabe... Fulana pode-se molhar ou pode ter uma coisa qualquer, o sangue sobe à tola, sobe à cabeça. Havia ali um médico chamado David que curou (...) uma quantidade impressionante de mulheres. Levei lá a minha irmã e diz ele: "Se quando ela adoeceu, se vêm cá, abria-lhe uma sangria"... Era uma mulher valente! Era uma mulher que punha cem litros de trigo às costas, ao ombro, sem tocar nos peitos. Levantava a pulso. Podia melhor do que eu e que outros que lá andavam na eira. Experimentou, agarrou no saco e tudo ficou admirado a olhar para ela. E quando era o gado, que era bravo que a gente lá tinha, vestia umas calças e uma blusa e ia ajudar. Agarrava ali e onde ela agarrava segurava.
STJ64
INQ Numa casa agrícola, aquela pessoa que contratava o pessoal para ir, para ir trabalhar para lá? Numa casa, numa casa grande? Tinha vários?... INF Bem sei. Era a manteeira. Chamava-se a manteeira. (...) Assentava o comer. Era a manteeira. Era a manteeira. Chama-se... INQ Mas isso era, era uma senhora, não é? INF Era uma senhora que fazia o comer. Era uma mulher contratada pelo lavrador que fazia e que era a manteeira. INQ E que outras pessoas é que o lavrador lá tinha a trabalhar para ele, para orientarem os trabalhos lá da quinta?... INF Era o capataz. Era o abegão. Chama-se o... INQ O abegão fazia o quê? INF O abegão é o que mandava a lavoura toda. Ia à lavoura, falava ao pessoal, ia ao capataz ver os capatazes, os manageiros. Chamava-se... INQ Os manageiros faziam o quê? INF Os manageiros regulavam... Os manageiros (...) davam as horas ao pessoal e orientavam o serviço. Quando ia um (...) que não sabia, o manageiro, o capataz punha a parelha e ia ensiná-lo como é que se trabalhava, por exemplo, a ceifar, a cavar, a armar a horta, essas coisas. O abegão ia ensinar os trabalhadores. O abegão era um homem que sabia de todos os serviços: sabia semear... Sabia semear... Semeava-se (...) com um saco, chamava-se o sementeiro. INQ Rhum-rhum. INF Chamava-se o sementeiro. Ia o abegão e era o semeador, ia orientar, ia mandar embelgar. Era belgas com cinco passos para se semear. E então o abegão ia orientar, e o boieiro é que ia a abrir os regos, umas belgas com cinco passos, que era para semear, que era para alcançar... E depois ia o semeador. O abegão orientava isso tudo. Via se o semeador semeava bem, se semeava mal; se ele via que ele que semeava, ensinava, dizia: "Ó fulano, afrouxa mais ou vai mais porque este bocado de terra come mais semente, aquele come menos", e era isso tudo. O abegão (...) é que era o homem, tinha de ser o homem que sabia de tudo da lavoura. Sabia como a terra havia de ser lavrada. (...) Por exemplo, (...) uma terra, andava-se a lavrar, uma terra dava para um lado e tinha a metade da outra terra dava para outro lado. A belga dava, por exemplo, para dois lados. O abegão (...) ensinava o homem dos bois; o boeiro ia, abria o rego para outro. E depois semeavam. Quando andavam a semear, a terra estava embelgada e cada um semeava pela sua belga. Quando semeavam todos juntos, chamava-se semear à picola - à picola. Semear... Mas semeava, geralmente, pouco. (...) Nessas grandes lavouras, (...) eles não semeavam à picola. Havia lavouras ali em Montargil que semeavam à picola. Mas aqui não. Aqui no Sorraia era: cada junta de bois por três, quatro belgas. (...) E iam para outro lugar, outras belgas . O abegão andava lá sempre para orientar; e o boieiro (...) ensinava os outros (...) que eram mais fracos. E o abegão andava lá sempre (...) . Acompanhava toda a sementeira. Era um homem que sabia, tinha de saber tudo, era um homem... Tanto que nessas lavouras, era um homem que estava habilitado e que percebia de tudo. Era um homem que percebia de tudo.
STJ65
INF Não havia veterinários, havia alveitares. Aqui na região (...) havia alveitares. Houve aqui na região um homem chamado Décio das ovelhas, conhecia o gado pelo bigode aos veterinários. (...) E os veterinários convidaram-no - um homem que não sabia ler nem escrever - para ir reger uma cadeira na Escola Veterinária. E davam-lhe dez escudos cada dia e o gajo não quis. E queriam que ele fizesse um livro. Eu tenho um livro que foi escrito - chama-se "O Tesouro do Lavrador" - que foi escrito há duzentos e vinte anos. Ainda os veterinários não sabem o que eles sabem. Porque (...) o veterinário hoje, a ciência dele é conhecer a doença do animal. O animal conhece-o. Por exemplo, se tem uma dor, vai com a cabeça assim (...) ... A gente, como eu, que convivia com os animais, conheço as doenças. Porque aqui na região a doença que ataca mais o animal é a carbunculosa com diferentes sintomas. (...) O gado vacum, há quarenta e cinco moléstias que vão à carbunculosa com diferentes sintomas. A veterinária hoje está mais evoluída do que nunca esteve. (...) O veterinário, dês (...) que conheça a moléstia, aplica-lhe uma injecção, cura o animal. Tem avançado muito. Mas esse tal (...) Décio das ovelhas - contava-me o meu pai, que ele não era cá do meu tempo - chegou a Montargil ver uma junta de bois, disse que: "Aquele que está sadio, que não tem doença, morre; e este que está doente escapa. E este que está sadio, quando for uma hora da noite, à meia-noite, dá o berro e cai para o lado e morre". Era um cientista! O gajo nunca quis deixar - era aqui da Lamarosa. Era cá do concelho de Coruche. Era um gajo cientista, chamava... (...) De Verão não fazia mais nada que era a andar a cavalo num cavalo, a este e àquele; todos os dias, todos os dias iam-no chamar. Ia para o Ribatejo. O gajo em Salvaterra, andavam os veterinários a dar a injecção, já lá andavam há oito dias; e o gajo com um pontapé - (...) o que é que foi? - foi apalpar o boi - ele apalpava o animal - foi apalpar o boi e achou-lhe um marmelo (...) atravessado nas goelas. Mas agora o animal respirava. Ele recua para trás, mandou-o endireitar, deu um pontapé no marmelo, o marmelo foi... "Oh! Está curado"! E na presença de dois veterinários, ficaram a olhar para ele. Foi daí é que ele teve grande fama... Esses veterinários convidaram-no para a Escola Veterinária, falaram com o professor, para o gajo ter lá uma cadeira e fazer um livro. E o gajo não quis. (...) Foi um grande paspalhão! Deixava o nome dele escrito para toda a vida. E ficava escrito como veterinário. Porque os veterinários precisam de saber os sintomas que os animais... Então eu quando tinha lavoura chamava! Uma vez adoeceu-me uma ali e eu digo-lhe , chamei o veterinário. O veterinário disse: "Morre duas vezes"! Ele abalou, eu fui buscar o meu alfarrábio e comecei a estudar: "A doença é esta, os sintomas, é esta, é este". Montei-me na bicicleta, vim aqui ao Couço, comprei sete quilos de farinha de trigo e comprei quarenta onças de raspa de veado. Aqui o farmacêutico, o ajudante de farmácia, não sabia o que era uma onça. Digo eu para ele: "Então tu não sabes o que é uma onça? O teu patrão tinha um (.../N) antigo". "Mas você sabe quanto é uma onça"? "Sei, sim senhor. Uma onça são vinte e cinco gramas. Fazes quarenta papelinhos". Dava dois papelinhos dissolvido em meio quilo de farinha, grosso, pela boca abaixo ao animal. Quando foi ao fim de três tratamentos, o animal, as tripas, a raspa de veado fez sarar. Porque a febre podre é umas feridas nos intestinos que os animais têm como nós temos também. E a raspa de veado fez sarar. Matou o micróbio. Os antigos sabiam muita coisa! Muita coisa!
STJ66
INF O meu avô todos os anos... (...) Os ventos é que mandam no tempo. De dia 21 para o dia 22 eu vou ver os ventos, donde ele cai... (...) De dia 21 do mês de Natal até ao 21 do mês de São João, o quente é que governa. E de 21 do mês de São João até 21 de Natal, os ventos é que governam . Uma vez o meu avô, fui eu, era rapazito: "Vá, Danilo, levanta-te, que é para ires mais a gente para o moinho de vento". Faziam o lume, quando era aquela hora em ponto, e o lume trabalhava... Eu ainda me lembro, o vento no dia 21 (...) ficou sul. Diz o meu avô para o outro, que era o Indalécio... Que lá tinha, eu, na minha terra, todos tinham os seus nomes. O meu avô chamavam-lhe Israel, e o outro era o Indalécio, e o outro era o Ireneu. Ajuntavam-se todos três num sítio que chamam o Moinho de Vento. Hoje há lá um grande jardim em Montargil. Vocês também vão a Montargil, não? Ou já foram? INQ1 Hãa, agora, desta vez ainda não vamos. Somos capazes de ir doutras vezes. INF Ah, mas então andam para estagiar. Então que curso é? As senhoras, que andam - as meninas? INQ2 Em letras. INF Ah, é letras?! INQ1 Nós já, já acabámos o curso e isto agora é já... INF Ah, então letras é para jornalistas. INQ2 Não. É, é para linguística. INF Ah, para linguística. INQ1 Para estudar a língua. Para saber a língua portuguesa, para estudar a língua portuguesa. INF Ah, a língua portuguesa. Andam para saber a língua portuguesa. Está bem. Sabe qual é, no Norte? Fui uma vez de mota, era militar. Ia mais outro rapaz e ouvimos (...) um fulano, era sapateiro. Diz para a mulher: "Ó reco... Ó Dília, vai ver o reco que está a dormir na corte". Diz o outro: "A gente vai perguntar". "Não, que isso são... Chamam chalados a gente, pá. A gente vai atrás dela e vamos ver". Fomos atrás dela, vimos um rodeio . No Norte - foi em Oliveira de Azeméis - chamavam a corte e um porco era o reco. INQ1 Rhum-rhum. INF Vimos então... Ele o Norte ainda tem mais extravagante. A língua portuguesa, vocês têm muito que ler e que... INQ1 Pois é. INF Têm. (...) Vocês nem um ano fazem o estudo todo da língua. INQ1 Ah, pois não. Isso é para a vida inteira. INF É uma coisa inteira?! INQ1 É. INF Mas andam por conta do Estado ou é?... É por conta do Estado? INQ1 Sim, é já... É do Ministério da Educação. INF Ah, vocês andam por conta do Ministério da Educação? INQ1 Sim, porque estamos ligadas à universidade. INF Ah, estão ligadas à Universidade! Andam a fazer um estudo dos usos em Portugal e costumes. INQ2 Exactamente. INQ1 Sim. Das palavras. INF E das palavras. INQ1 Das palavras ligadas a esses usos e costumes. INF E ligadas. Mas eu tenho de dizer isto . Aqui na terra, chamam o boi, (...) quando é novo chama-se garraio; a passar dos quatro anos é que se chama boi. INQ1 E quando acaba de nascer? INF (...) É garrainho. É um garrainho. Quando chega a uma certa idade chama-se novilho. Tem esses nomes aqui na região. INQ1 Rhum-rhum. INF Quando têm dois anos de estar na engorda é os novilhos. Passando os dois anos, passa a ser garraio. A passar dos três para os quatro anos, passa a ser boi.
STJ67
INF Ele Eu outro dia estiveram ali umas pessoas minhas conhecidas, que eram de investigação florestal, vieram aqui, e lá em Mora disseram-me: "Não vá para lá para o Couço, que é comunas". Mas no Couço não havia e chegaram aqui, encontraram-me, e eu vim cá com elas. Disse: "Ó Dédalo, olha que dizem que tu"... "Ó senhor Danilo, tive essas ideias mas hoje, desde que montei essa casa, já não sou comuna". E cá não se pergunta de política. "Eu não"... Eu disse-lhe para ele: "Eu não sou político, nem quero saber da política ". Disse: "Olhe, as gentes são boas"!... No outro dia estive aqui de manhã com eles, dizem-me eles: "Realmente, encontrámos uma pessoa que não encontrámos em Mora e noutros lados! Isto é gente boa! Tanto faz o homem como"... Tem as suas paródias e as suas coisas, as suas mangações, que todos temos. INQ1 Olhe, as pessoas que iam trabalhar, não iam trabalhar ao dia? INF Não, cá trabalhavam à semana. Cá o hábito era: era contratado à semana, e... INQ1 E ganhavam à semana? INF E ganhavam à semana. Mas havia também contratos de fulanos ao mês, a trabalhar. Tanto que esses boeiros, esses ganhões, era tudo ao mês - tudo ao mês. Chegavam ao fim do ano, recebiam as suas 'mediaduras' e as suas forranças. Recebiam uns tantos alqueires de trigo, uns alqueires de milho - chamavam-lhe as forranças ao fim do ano. E tinham horta... Por exemplo, havia lavouras aqui com um vento extremo . (...) O avô deste era onde... Os criados melhores cá na região eram do avô deste. Dava terras, e dava soldada e dava melhores garantias - o avô do Doutor Delfim. INQ1 Sim. INF Dava terras, não queria ninguém debaixo dos telhados dele que passasse fome nem andarem mal arranjados. Dava terras, dava estrume, emprestava-lhe o gado, trabalhavam, dava uns dias para trabalhar, para tratarem das hortas. Não queria lá ninguém com fome! Esses que eram malandros, que não trabalhavam, o gajo chegava ao fim do ano: "Tens de ir perguntar outro patrão. Cá para este patrão não serves. Não trabalhas! Não arranjas comer para comer, nem para a mulher, nem para os filhos"... E dava. Ele repartia ao fim do ano, à socapa. A mulher era assim, era bastante (...) , mas ele à socapa, ele dava. Fazia aí muito bem a muita gente! O avô deste! O avô deste! Dava aí... Dizia então ele para mim: "Ó Danilo, quanto mais dou, mais tenho! Quanto mais dou, mais tenho"! Ia com um saco aí à socapa, metia por baixo da porta e não queria que ninguém lhe agradecesse. Cada um tem os seus temperamentos! INQ1 Pois é. INQ2 Pois. INF Era o tipo que aí na... Agora o avô do engenheiro, esse era um explorador. Quem não tivesse habilidade para trabalhar para o avô do engenheiro (...) não trabalhava. INQ1 Rhum-rhum. INF Dizia-se que o avô do engenheiro (...) era mercenário .
STJ68
INF O avô deste também teve cabras, mas depois as cabras roíam os chaparros e as oliveiras e ele acabou com as cabras. Tinha ovelhas e tinha vacada e tinha porcada: tinha marrãs para criar, para engordar porcos de montado. Agora não. Isto tudo mudou. Mas ainda volta! Uns davam aí arrobas e arrobas de carne, fica aí toneladas que davam... A bolota dos chaparros! E tinham limpo, e era raro secar. Lavravam, adubavam, faziam as esgalhas no seu tempo próprio; faziam a rama para o gado vacum comer a rama - de Inverno, esgalhavam e o gado ia para a rama. Antigamente (...) os boeiros aí na região dormiam... Os boieiros iam para a rama com o gado. (...) Davam assim ao gado e o gado não ficava (...) nos palheiros. Saía para o campo. Dormia a campo. Noites de água e isso tudo. (...) O boeiro era debaixo dum chapéu de sol. Sofriam as 'torruras'. Isso tudo modificou. Por baixo dum chapéu de sol, a guardar os bois de noite! Depois isto modernizou-se. Isto era aqui há cinquenta anos: os boeiros davam a ceia aos bois num palheiro, rua!, iam para o campo. (...) Os animais dormindo a campo eram mais resistentes! O boi era mais resistente. O boi só podia (...) ... Mas (...) por fim também gostava de abrigo. Todos os animais gostam de abrigo. Todos os animais! Não há animal nenhum que não goste de abrigo. Nenhum animal gosta de ficar ao tempo.
STJ69
INF Havia homens que também negociavam em fazendas. (...) O negócio das fazendas é um negócio escuro. Eu até andei aí também a... Arruinei-me no ofício , também andei um ano a ser paneiro. Enganei um padre no Vimieiro (...) com um fato de cotim, com um cotim preto que tinha muito lustro - de volta para o sol, dava lustro. Enganei o padre. Vendi-lhe três metros de cotim por setenta e cinco escudos em 1924 - e 26. Ele foi em 26. Tinha eu treze anos. Enganei o padre. Depois fui lá mais tarde, diz assim o padre: "Malandro, é já tão pequeno e já tens (...) "! "E então o senhor, então não era bonito, então era uma"... "Então hoje trazes aí boa fazenda"? "Trago aqui Santa Clara ". "Então quanto é que queres por um fato de Santa Clara fino cinzento"? "Este posso-lhe vender por quatrocentos e cinquenta escudos". "Agora não me enganes, hã"?! "Não engano nada"! Oh, cinzento, Santa Clara ! (...) Era a melhor fazenda... É o melhor fabricante que se fabrica em Portugal. É melhor que o inglês, melhor que tudo. Cá em Portugal, (...) há de tudo. E tudo muito melhor que os outros países. Isto é um país rico. Está é mal administrado. Isto é um país... Nós, Portugal, não precisamos nada. Cá há de tudo. Há petróleo, há carvão, há cá... Há de tudo cá, de tudo cá no nosso país, o que é que está debaixo da alçada dos americanos (...) e os americanos não lhe convém que se desenvolva isto.
STJ70
INF Eu tive ovelhas dezoito anos... Tive ovelhas quarenta e cinco anos - cinquenta anos. Tivemos ovelhas cinquenta anos. Cinquenta anos. E então dezoito anos tive, quem ordenhava as ovelhas era eu. Eu é que batia ali a ordenhar. Ordenhava ali cem ovelhas, cento e vinte, levava uma hora a ordenhar. Mas era num mocho para não castigar os rins. Mas eles era em cócoras. Mas houve para lá um ovelheiro que foi lá e um (...) que foi criado dum doutor Isaltino, que era médico, foi vê-los a ordenhar e disse: "Vocês nem sabem o que é que estão a fazer aos rins". Um mocho a cada um. E esse homem que foi lá primeiro , que foi lá moural dois anos e disse: "Eu ordenho-te as ovelhas mas têm têm-me que comprar um mocho". "Compra-se um mocho do teu tamanho". Depois ele abalou, fiquei eu a ordenhar. Eu é que ensinava os rapazes a ordenhar. Depois eles não queriam ordenhar, eram homens de idade, eu é que batia. (...) Tinha horas certas para ordenhar. Por exemplo, (...) de manhã era sempre cedo; à tarde, (...) às três horas da tarde ordenhava, ia metia as ovelhas para o prisco e ordenhava. As ovelhas estavam tão amestradas que já sabiam as que eram ordenhadas. Só ao primeiro dia é que custava, mas depois já sabiam, entrava tudo no prisco. Dizia-se: "Prisco, ovelha! Prisco, prisco, prisco"! Elas metia-se tudo no prisco. As que eram. As que não eram ordenhadas, (...) não queriam ir para lá. Agora aquelas que eram ordenhadas, iam... Tinha uma ovelha que era a ovelha-mestra. Era a ovelha-mestra, era uma ovelha que ia do princípio ao fim. Ia à parelha das outras a amparar. Era a 'amparadeira'. Chamava-se a 'amparadeira'. Era uma ovelha que eu tive de ensinar. Ao princípio, custou-me a ensinar. Ali dois ou três dias com um cordel preso à camarada . Era presa na perna e ela ia sempre. Chamava-se a 'amparadeira'. Alguma que era má, ela encostava e apertava-a ali de encontro à cancela. Chama-se isso 'amparadeira'.
STJ71
INF Isto (...) de as vacas turinas dar leite é moderno. É de há cinquenta anos para... É de há cinquenta anos para cá é que se começou a desenvolver a turina. E então, a turina, os veterinários depois desconfiaram, houve vacarias que foram queimadas aqui há quarenta, cinquenta anos - estavam tuberculosas. Isto hoje a vacaria, hoje isto está purificado. Hoje têm uma grande vigilância, têm de vacar ... O fulano que ordenha tem de ter um cartão sanitário , (...) vai ao médico, (...) vão-lhe tirar uma chapa, e se tem doenças crónicas ou contagiosas ou tuberculose, (...) já não lhe é autorizado ordenhar o gado. Isto hoje está tudo muito fino! Os ordenhadores, hoje, das ovelhas... Eu, os últimos anos que fiz, também tive de ir a uma inspecção médica. Souberam que eu que ordenhava, fui chamado pelas autoridades à... (...) Para ter um cartão. Tinha um cartão de sanidade para ordenhar. Fui a uma inspecção médica e tiraram-me chapa. Não fosse (...) que tivesse qualquer (...) doença contagiosa, já não podia ordenhar. Mas para onde a gente ordenha, ele lavava-se e asseava-se, mas entre as mãos. Chamava-se o ferrado. Onde se ordenha chama-se o ferrado. Ainda não tinham ouvido? INQ Já. INF Chama-se o ferrado. E onde as mulheres fazem o queijo chama-se as queijeiras. Põe-se o queijo a fermentar. O queijo (...) passa por três fases. Depois de seco, lá na minha casa, a minha mãe fazia o seguinte: quando o queijo está seco, batia azeite, vinagre e colorau; e depois untava os queijos, era tudo untadinho, posto num asado e por cima era salgado, parecia manteiga de vaca. INQ Rhum-rhum. Ela também fazia manteiga? INF Manteiga não se fazia. Mas sei como se faz a manteiga. Naturalmente, antigamente quem tinha vacas, era dentro duma cântara a baterem. A bater, faziam a manteiga. Depois lavavam-na e tratavam dela, salgavam e isso tudo. Mas era dentro duma cântara a bater com uma colher.
STJ72
INF Todos os dias, levanto-me todos os dias às cinco horas. Bem dormindo cinco horas, estou satisfeito. Faço de manhã: levanto-me, lavo-me, faço a barba, asseio-me e faço a cama. É como na tropa. Faço a vida como na tropa. INQ1 Pois. Bons hábitos. Nunca se lembra, aqui nesta zona não havia linho? INF Não houve quê? INQ1 Linho. INQ2 Linho. INF Não, aqui não houve linho. Agora lá em Montargil houve. Lá à fazenda (...) que é minha lá um bocado, aí chamam-lhe até a Cova do Linho, que ficava aquilo... INQ1 Ai é? INF (...) Tenho lá um bocado de terra em Montargil ainda. INQ1 Lembra-se dos trabalhos do linho? INF Lembro: semeavam e era tal e qual como o trigo. Semeavam, e ceifavam, e punham a secar. Depois vendiam (...) para as tecedeiras. INQ1 Rhum-rhum. INF Eu não me lembro. O meu avô é que me contava. Lá em Montargil havia tecedeiras. Faziam o linho, faziam lençóis e tinham teares para trabalhar. Isso tudo acabou. Mas há regiões em Portugal que ainda não acabaram. INQ1 Rhum-rhum. INQ2 Rhum-rhum. Olhe, e como é que se chamava a semente do linho? INF Era a semente. INQ2 Rhum. INF Era a semente do linho. Era como é a semente do trigo, como é a semente do milho, como é as sementes, era tudo. INQ2 E um campo todo plantado?... INF Malhavam. Malhavam o linho e era semeado como o trigo. Eu ouvi muitas vezes ao meu avô. E eu também, ali em Montargil, era eu rapaz, havia lá um homem (...) no Vale de Mocho, que tinha um moinho e tinha - no meio da leira, no mofedo - (...) tinha uma leira de tabaco. E às vezes o meu pai fumava, ele era lá cliente, dava... Uma vez o meu avô houve uma falta de tabaco e a gente foi - eu mais o meu irmão fomos lá trocar. Um levava meio alqueire de trigo e outro meio alqueire de milho. Depois eu fiquei a entreter o moleiro, e o meu irmão foi pelo vale acima, pôs dentro da blusa, pôs... Cortou seis folhas. A minha mãe torrava-o no forno e fazia tabaco para fumar. Mas ele conheceu o rasto e fez queixas ao meu pai. Estivemos (...) à sombra de levar. O meu avô chegou, senão nós levávamos com a correia. Depois o meu pai ralhou com o meu avô: "Não devia de mandar os rapazes, que eu não quero que os rapazes mexam em nada de ninguém. Senão levam com a correia". É a educação. A minha mãe (...) era uma mulher que tinha muito génio. O meu pai também. Nunca vi o meu pai a ralhar com a minha mãe. Nem a minha mãe com o meu pai. Mas quando um arreava, os outros não diziam nada. Se o outro arreava, não diziam nada. INQ2 Rhum-rhum. INF Não dizia nada. Se a minha mãe arreava (...) com a correia... Era com uma correia; tinham cada um uma correia para arrear. Era à correada. Pela cabeça nunca batiam. Era pelas nalgas é que levávamos porrada. Pela cabeça nunca batiam, pela cabeça de ninguém. Era ali com a correia pelas nalgas e pelas... Era só pelas nalgas é que levávamos. Pelas costas também não batiam (...) nem por coisa nenhuma. Era ali pelas nalgas é que levávamos as correadas.