MST01
INF1 Mexe-se bem com esta coisa que é - chamam-lhe a pataca. Mexe-se o leite bem mexido. Depois tapa-se. Põe-lhe aquele plástico por cima. Daqui por uma hora e pouco, a gente vem cá e está coalhado mesmo. Depois vou, corto com esta coisita - eu faço assim, não é, no leite. Faço os quadradinhos, corto, que é para não vir a coalhada tão grossa. Depois tenho as formas, sem nada, já limpas. Vou deitando com esta malga. Ponho duas malgas (...) em cada acincho, em cada forma. INQ1 Pois. INF1 Depois (...) a primeira parte, quer dizer, desfaz-se um bocadinho. Dou-lhe uma mexidela, que é por causa (...) de a massa ficar unida. INQ1 Pois, pois. INF1 Depois torno a deitar a outra malga. Depois começo a espremer, a espremer, a espremer até ficarem assim. INQ1 Sim senhor. INF1 A calcar Acalcadas . INQ1 E isto aqui, como é que lhe chama? INF1 Isto é a francela. Chama-se a francela. INQ2 E aquilo com que corta a coalhada? INF1 Isto, olhe, eu não sei. (...) Não sei o nome que lhe dão, mas isto é uma ripa qualquer. INQ1 Pois. INQ2 E esta que tinha na mão, como é que lhe chama? INF1 (...) Esta chamam-lhe uma pataca. Diz Diz-se (...) que lhe chamam uma pataca. INQ1 Pois. INF1 Isto eu não sei. Isto (...) é como que é uma régua, que isto é mesmo para a gente, quer dizer, cortar. (...) A coalhada está rija, depois a gente corta, ficam aqueles quadradinhos ao parece talhadas de pudim. INQ1 Pois, pois. INF1 É assim. E é bem . INQ1 Olhe, e o... Eu ia para fazer a pergunta e depois... Ah! Este, isto é... Estes acinchos são de quanto, mais ou menos? De quanto é que... Qual é o peso do queijo que fica? INF1 Eu, o meu queijo passa de um quilo. Há uns que passam de um quilo, e outros pesam um quilo. É conforme. INQ1 Pois. INF1 (...) INQ1 E estes pequeninos assim, costumam fazer sempre, é? INF1 (...) Não. A gente tempera amanhã dois ou três. Estes é para o lanche. Quer dizer, são só assim... Ponho-lhe até só uma coisinha de nada de sal porque é para comer em fresco. Logo, ao lanche, já o levo. Mas ficam tão bonitos! Eu tenho ali uns dois ou três pequeninos! Ficam mesmo engraçados destas formas pequeninas! É assim mesmo. INQ2 Portanto, isto, estes são os que fez hoje? INF1 Estes são os que fiz hoje. INQ2 E ficam aqui a escorrer até amanhã, é? INF1 Ficam aqui, ou até amanhã ou até logo à tarde. Eu, às vezes, quando tenho tempo à tarde, venho e salgo e ponho para além. Depois de manhã venho pôr a mesa para o café, nesta lida lenda (...) da criação e do leite e assim... E quer dizer, se os deixar salgados, para mim já é um bocadinho mais de adiante. Quando não, salgo-os de manhã. INQ2 E quando os... INQ1 Olhe, como é que chama a isto que vai saindo do... INF1 O soro. INQ1 O soro. INF1 É o soro. INQ1 E isto... INF1 E depois coze-se, minha senhora. Depois coze-se e até se faz requeijão. Por exemplo, aquele soro - este é para os porcos, que está mais sujo, mas aquele ainda está limpinho. A gente, agora, se o puser a cozer, fica requeijão. (...) Fica aquela coalhada rija, que lhe chamam requeijão. INQ1 Como é que faz? Põe a cozer e deixa ficar lá a ferver? INF1 (...) A gente (...) põe ao lume... Não, não se pode deixar porque ele pega-se apega-se . De vez em quando tem que se lhe dar uma mexidela. E quando ele começa a vir aquela (...) , quer dizer, a massa, (...) que ela lá dentro tem aquela coalhada que daqui vai saindo. INQ1 Pois. INF1 E depois Depois a gente, quando já está a vir assim acima, já se não mexe. Deixa-se ferver e depois fica então aquele requeijão assim mesmo duro, assim bom. É bom mesmo! Que há pessoas que até gostam muito de requeijão. INQ1 Pois, pois. E portanto, esta é a primeira parte que sai? INF1 Pois, esse é o soro que sai daqui, da coalhada. (...) INQ1 Exactamente. Este, este aqui... INF1 Isso é a água. Isto foi de eu enxaguar a francela. INQ1 Ah pois! INF1 (...) Não tem nada. INQ1 Pois. INF1 Mas aquele, se a gente o puser ao lume agora, corta. Quer dizer, toma aquela massa, corta. INQ1 Pois, pois, pois. INF1 Costuma-se a dizer que depois fica é requeijão, é travia. Costumam-lhe a chamar requeijão. INQ1 E também costumam a comer com açúcar isto, ou não? INF1 Também é bom! Com açúcar! O requeijão é bom! INQ1 Pois, depois de cozido. INF1 Depois de cozido, é muito bom com açúcar! Há pessoas que comam com açúcar, outras sem açúcar. Mas ele eu , por acaso, quem cá costuma a comer quase sempre lhe deitam açúcar. Bom, ele eu , o senhor Amadeu e a senhora, é raro. Não comem. Mas, por exemplo, têm um sobrinho - diz que é médico - e assim mais pessoas, gostam muito. E, às vezes, quando estão, eu já tenho feito, já tenho 'fazido'. E é bom. INQ2 Portanto, como é que faz aqueles queijos? Agora quando muda para ali, vira-os ao contrário, é? Eles ficam sempre assim... INF1 (...) Agora olhe. (...) Olhe, logo, faço-lhe isto. Tiro-lhe estas formas. INQ2 Pois, pois. Deixe estar. INF1 Não faz mal nenhum. Tiro-lhe as formas e volto, salgo-lhe as paredes, ponho-lhe outros acinchos, porque estes são os mais altos... Deixo sempre para fazer. INQ1 Ah pois! INF1 Deixo sempre para fazer os queijos. Ponho dos mais pequeninos. Ou, por exemplo, quando pedir a um homem , se não tiver, vou tirando aos mais velhos para pôr nestes mais frescos. Volto o queijo e agora ponho daquele sal que é muito fino, parece açúcar, e salgo-lhe as paredes, assim. E a outra parte, (...) enterro-lhe a forma... Tudo para cima das tábuas a escorrer... Até eles virem, deixo secar. INQ1 Como é que se chama aquela parte adonde tem os queijos já feitos? INF1 Bom, (...) aquilo são tábuas. São separadas. Eu é que vou pondo assim de uma por uma, de uma por uma, lá vou pondo. INQ1 Tábuas. INF1 São tábuas. Chama-se-lhe tábuas. INQ1 Sim senhor. INQ2 Quer dizer, mas todos os dias não, não costuma virar ao contrário? Quer dizer... INF1 Não. Até que, por exemplo aqueles, como é para casa, no dia anterior até costumam levar um bocadinho de soro, que é para os passar. Que é para eles... Não é para se porem como são aqueles que além estão no meio. INQ1 Ah pois! INF1 Já estão amarelinhos. Mas aqueles não lhe faço nada. Aqueles, conforme os ponho, ficam lá. Porque ele ao fim de oito dias levantam tudo, não é? INQ1 Pois, pois. INF1 (...) Daqueles não faço nada. Conforme estão, eles ao sábado, se vierem no sábado, levam-nos conforme estão. O que é que se lhe tiram as formas. Já vão desenformados. INQ1 Mas normalmente chamam formas ou chamam cinchos? INF1 Eu, quer dizer, cá é acinchos. Cá é mais acincho do que forma. INQ1 Pois. INF1 É uns acinchos é que costumam chamar. INQ1 Não há mais nada aqui, em relação aos queijos... INF1 Quer dizer, os senhores andam assim a ver (...) ... INQ1 Os trabalhos. INF1 Ai é? INQ1 Destes trabalhos de... pois, do campo... INF1 Pois. INQ2 De tudo. INQ1 Ligados ao, ao leite e... INF1 Pois. INQ1 Ao gado. INQ2 Portanto, e aí nunca, aqueles nunca costuma esfregar, nem limpar... De vez em quando faz isso, faz? INF1 (...) Faço-lhe, um dia entre outro, porque estes 'fize-os' a semana passada, mas foram feitos à ovelheira. (...) Estas duas tábuas, que são maiores, foram feitos à ovelheira. Agora, por exemplo, um dia entre outro - porque que ainda estão muito branquinhos, ainda não têm... Têm poucochinhos dias, não é... Agora, é como digo: leva um bocadinho de soro, cozo - só leva um bocadinho, leva aqui só um bocadinho, que aquilo, eu só molho a mão e passo-os só assim, não é. Volto-os e dou-lhe com a mão. Com a minha mão é que os escorro a todos, de um por um, só para não secarem, para depois eles ficarem realmente... INQ1 Qual é a diferença entre fazer à ovelheira e fazer à cabreira? INF1 Dão muito trabalho, minha senhora, à ovelheira. E tem outro gosto. INQ2 Como é que é à ovelheira? INF1 (...) Eu, por acaso, gosto mais à cabreira do que à ovelheira. Olhe, à ovelheira, quer dizer, (...) são os mesmos acinchos. INQ1 Pois. INF1 O que é que são picados três vezes. O queijo desmancha-se. Quer dizer... Este, a gente não os volta. (...) Não percebe a senhora? Quer dizer, a gente deita só a massa para dentro e acalca. Aperta. INQ1 Pois. INF1 E os outros não. Por exemplo, agora, aperta-se tudo o que pode ser até deitarem o soro. E depois torna-se a voltar o queijo, e depois depois migalha-se outra vez, pica-se a coalhada toda. INQ1 Pois... INF1 Fica toda picadinha. E são muito apertados, muito apertados, porque eles fica a massa que parece uma pedra. Muito rija, muito rija! E depois então, à última vez, torna-se depois a voltar e então dá-se-lhe o jeito. Que é para eles ficarem assim mais ou menos redondos. Quer dizer, o que é que fica muito apertados. INQ1 Pois. E, portanto, não fica no cincho? INF1 Fica sim. INQ1 Ai fica? INF1 Fica à mesma no cincho. O que é que a gente volta-o. INQ1 Pois. INF1 A gente, por exemplo, agora faço assim, não é. Aquele já está assim. E depois Depois (...) desmancha-se todo, todo, todo, todo, todo. E depois (...) esta parte, torna-se a voltar para cima, é quando então depois se lhe dá (...) o jeito do queijo. INQ1 Pois, pois. INF1 Torna-se a espremer. INQ1 Portanto, fica muito apertada, a massa? INF1 Muito. Estes não. INQ1 Pois. INF1 Estes são feitos à cabreira, quer dizer, a massa está mais mole. Mas aqueles ficam uma pedra. É rija. Bom, é tudo... (...) O que a gente lhe pode tirar, tira-lhe tudo. INQ1 Pois. INF1 Porque fica mais... INQ1 Pois. INF1 A gente pica a coalhada, não é, fica mais desfeita, e então enquanto tiver um bocadinho de soro, (...) tem que sair. Sai. INQ1 Pois. Então, aqueles é que são à cabreira? INF1 Aqueles são à ovelheira. Os grandes, minha senhora. INQ1 Os grandes são à ovelheira? INF1 São sim. E estes então são à cabreira. Estes mais pequeninos, assim, INQ1 E estes é que são à cabreira? INF1 (...) são à cabreira. INQ2 Mas aqueles não são tão manteiguentos, ou são?... INF1 (...) Há uns que também saem muito bons. Também saem bons. O que é que, quer dizer, o queijo da ovelha tem um sabor! Não sei por que é. Quer dizer, feitos à ovelheira tem outro sabor. O leite é a mesma coisa. Mas à cabreira é uma coisa e à ovelheira tem outro gosto. Não sei. Eu, por acaso, gosto mais à cabreira. INF2 (...) INF1 Ainda lá não fui. Os senhores estão aqui (...) a perguntar como são estas coisas. INF2 (...) INF1 Vai lá? Então,vá. Que eu vou-me a migar o caldo verde, porque, quando não, daqui a pouco vêm aí vem aí os Amânciozinhos... Vieram da escola e eu não tenho o comer feito. INQ1 Pois é... INF1 Pois é assim, minha senhora. INQ1 Pois. Não há mais nada assim do queijo que se lembre INF1 Aqui, eu aqui, minha senhora... INQ1 de nos falar? INF1 Aqui parece que (...) não há assim grande coisa. É ... Pois é isto, não é. INQ1 Pois. INF1 É os acinchos... INQ2 E... não costuma fazer nada de vaca, queijo de vaca, por aqui, por esta zona? INF1 (...) Nós temos leite de vaca - até que é muito bom, o leite de cá -, mas, quer dizer, temos vendido. Vendemos. Vendemos assim o leite. INQ1 Pois. INQ2 E a, mais ou menos, a quanto é que vendem o queijo? Portanto, é os compradores que vêm buscá-lo aqui? INF1 Olhe, eu, quer dizer, o comprador, não sei como é. Mas assim, por exemplo, as pessoas (...) que já cá tenham vindo, acho que é a cento e quarenta, o quilo. INQ2 Já, assim... INF1 Não. Quer dizer... Estes, estes todos, quer dizer, a pessoa que agora viesse e quisesse levar, era a cento e quarenta. INQ2 Pois. INF1 Mas isso (...) é uma pessoa, ou duas, ou assim. Às vezes, uma quer seis, outra quer quatro. E o senhor Amadeu (...) já lhe tem tirado. Tira-lhe. Mas o resto, como o senhor vem todas as semanas, levanta. INQ1 Pois, pois. INF1 Leva. Mas eu até acho que ele que é por aí mais caro.
MST02
INQ1 Portanto, é um pastor que anda com as ovelhas? INF Até são dois, minha senhora. INQ1 Que andam por aí? INF Andam lá no campo. É nas Rasas. INQ1 Não, não conheço. INF (...) As senhoras com certeza (...) que ainda há pouco que (...) cá estão, não é. Mas costumam andar dois pastores. E até que, quando depois as ovelhas têm aqueles borregos, depois têm muitos filhos, não é, só os dois não dão, porque têm que se separar. INQ1 Pois. Claro. Sim senhor. E fazem, e fazem vários rebanhos ou fazem ou têm... INF Quer dizer, (...) os pequeninos, acho que anda só assim um rebanho, não é. INQ1 Pois. INF E depois (...) as paridas, nem sei bem (...) se andam juntas com as outras, se as separam. Isso não sei. Mas sei que os borreguinhos que ficam separados. INQ1 A gente depois pode falar também com o senhor que é o pastor, talvez. INF (...) Pois ele ia , por exemplo nas Rasas, ele já lhe diz bem. Quer dizer, explica mais aos senhores, porque é dentro daquele assunto, pois, é da parte deles. INQ1 Pois, pois. Claro. Do rebanho, claro. INQ2 Onde é que ele costuma estar com o rebanho agora? INF (...) Ele nunca sai das Rasas. Quer dizer, ou mais abaixo ou mais acima, aquilo... A estrada, quer dizer, a estrada é a que vai para Penha Garcia... Não sei se os senhores já conhecem? INQ1... INQ2 Indo é sempre na estrada para Penha Garcia? Nunca se sai... INF É, é (...) . É até mesmo perto de Penha Garcia. Chamam-lhe as Rasas. (...) INQ2 Fica muito para dentro depois da estrada ou fica mesmo à beirinha da estrada? INF Quer dizer, (...) o prédio, assim o prédio, (...) é um olival assim muito grande mesmo. (...) Não sei o sítio onde é que ele anda. Mas quer dizer, nas Rasas anda. INQ1 Pois, pois. INF O sítio das Rasas, ele, ou mais aqui ou mais ali, ele anda. Eu sei que ele que anda nas Rasas. INQ2 Tem um rebanho grande, é? INF É. (...) Ele é muito. Ele são muitas ovelhas. INQ1 Já sabemos que ontem foram tosquiadas. INF Ah, (...) foram ontem e antes de ontem e parece que o outro dia. INQ1 Foi pena a gente não saber para podermos cá vir. INF (...) Agora hão-de estar engraçadas. Ai se os senhores calha em lá ir, quando elas estavam assim, aquilo é tão engraçado a tosquiar, a tirar-lhe a lã. Agora, está claro, agora estão está em courinhas. INQ2 E ele lá a trabalhar... INQ1 É o quê? Agora estão quê? INF Agora estão em courinhas: tiraram-lhe aquela... Parece que é uma manta. Tiraram-lhe a lã. Agora então, é que está claro, não têm nada. INQ2 E a lã é trabalhada aqui ou depois... vendem? INF O senhor Amadeu depois vende. Vende. Costumam cá vir uns senhores - eu nem sei se é (...) da Covilhã -, uns senhores a comprar. INQ2 Já antes costumavam a trabalhar em lã, cá? INF Olhe, eu nunca me lembro. Nunca me lembro assim de trabalharem. INQ2 E do linho, lembra-se ainda? INF Como? INQ2 Do linho? Ainda se lembra? INF Ai, eu lembro. Eu lembro. Mesmo as velhinhas de dantes, ainda fiavam muito. Ainda me lembro de as pessoas assim, de ver muitas pessoas a fiar. Com uma rocazinha... INQ2 Pois. INF E toca de fiar. (...) Esta aqui, ui!, isso (...) sabe mais coisas (...) que eu sei lá o quê. Os senhores se quiserem... Ela é capaz de por aqui não vir, não sei. É cá a mulher do criado que aí está. Mas sabe tudo, tudo, tudo, tudo! Mesmo o que vai na televisão... Aquela cabeça não sabe ler, mas segura tudo. Eu nunca vi. Eu não, eu não ligo nada. Nadinha! Também não tenho vagar. Mas quer dizer, mas não ligo nada, mas ela tudo (...) o que dá na televisão, é capaz quase de explicar tudo (...) da primeira palavra até à última. É verdade. INQ1... Lembra-se de ainda se cultivar o linho aqui? INF Eu, quer dizer, ainda me lembro também, ainda me lembro (...) de saber que pessoas que semeavam e que colhiam. E também me lembro (...) mesmo de ver pessoas ainda a fiar. O senhor Amadeu também cá tem linho. (...) Ainda ali têm muito linho. Linho e parece que estopa, ou não sei. INQ1 Pois. INF É assim. Mas também cá têm linho... INQ2 Pois, só não têm porque já... INF (...) Ai Jesus! Isto, já (...) nem me lembra agora! Quer dizer, já há muita força de anos que não se ouve falar nem em fiar nem em linhos. INQ1 Pois. INF As pessoas de dantes, assim (...) mais velhas, noutro tempo, é que costumavam. Mas agora não.
MST03
INQ1 E na, e aquela de São Pedro de vir, de vir a corça também contavam qualquer coisa, não contavam? INF Pois contavam. (...) Até ele para aí há livros já feitos disso. Essa coisa . Uns chamam (...) . Contavam que tinha sido um eremita qualquer que ali viveu, e uma ocasião, (...) que lhe apareceu lá uma criança, que viu-se aflito e que pediu a Deus, ou à Virgem, ou não sei quê, que lhe apresentasse qualquer coisa que fizesse pudesse alimentar a criança. (...) Depois dizem então que lhe apareceu lá a corça. INQ2 A corça? INF Que lhe apareceu uma corça (...) , que lhe aparecia lá então todos os dias (...) a uma hora certa, para dar o leite à criança. INQ2 Ah! INF E é assim.
MST04
INQ1 E como é que se chama aquele primeiro azeite que se, que sai só de, daqui do... INF Ora, isso é o azeite (...) ... O que sai daí é o azeite virgem. Esse é o azeite virgem. INQ2 Pois. INF (...) Tenho aqui o resto duma garrafa (...) . INQ2 Ah! E tem alguma utilidade especial? INF Tem sim. INQ2 Para que é? INF É que este azeite é muito bom para qualquer (...) . Eu este ano ajeitei uma garrafa dele a uma pessoa (...) que lhe o médico (...) receitou essa... Para tomar (...) o azeite virgem. E até para a vista: quando a gente tem qualquer inflamação nela no olho , se deitar uma gota a duas gotas de azeite virgem (...) na vista faz muito bem a qualquer inflamação que tenha. De maneiras que até guardei esse. Ficou aqui este. INQ2 Pois. INF Mas (...) este não foi caldeado . Está a ver? INQ2 Pois. INF Foi conforme saiu da azeitona, além (...) nas galgas. Foi apanhado além no pio. INQ2 Sim senhora. INQ1 E depois então como é que separa o, este, este azeite que sai aqui das prensas? INF (...) O azeite cai para estes potes, que são as azinagradeiras - chamadas azinagradeiras -, que cai o azinagre, volta ainda com o azeite. INQ1 O que é que cai? INF O azeite daqui corre para dentro desses potes (...) . São chamadas as azinagradeiras, que entra azinagre e o azeite lá dentro. Depois, (...) eu costumo fazer - e faço, sou eu que faço, que trabalho com isto - e meto-lhe a água quente, que o obrigue a disparar o azeite para outra tarefa que está ao lado. E depois da outra tarefa, corre, é puxado por (...) uma bomba, que está além ao lado. Uma pequena espécie de uma bomba elevatória. É puxado além (...) para cima, para um depósito que está além. Depois de além, corre novamente para o cano, vai entrar (...) na máquina. Vai à separadora e está a disparar dalém (...) com água quente. Misturado com em água quente. A água ruça sai (...) para um tubo, para o inferno, chamado inferno. E o azeite corre (...) para dentro... INQ2 A água ruça é a mesma coisa que o azinagre? INF É o azinagre. INQ2 Pois. INF A água ruça é o azinagre. INQ1 Aqui diz-se o azinagre? INF Aqui diz-se azinagre. Praticamente (...) o nome dela é água ruça, que sai depois de sair de além.
MST05
INQ1 Olhe, e em relação ali à, às ovelhas, portanto, a lã é tratada aqui ou, ou vem um colaborador? INF Não, a lã não é tratada aqui. Ele agora vem o comprador, depois vende a lã a peso e depois levam. A lã é amanhada nas fábricas. INQ2 É já, é lavada e tudo... INF Vai à lavagem. Depois vai à lavagem, eles lá é que é que tratam disso. A gente vende assim (...) em bruto, conforme está. INQ2 E, aquelas coisas chamam-se como, aqueles bocados de uma ovelha, o bocado de lã de uma ovelha? INF (...) INQ2 Portanto, toda a lã que tira da ovelha chama-se... INF Isso é o velo. INQ2 O velo. INF É chamado Isso é que se chama o velo. Depois ficam as barrigas (...) . O velo sai inteiro. INQ2 Pois. INF Depois como o animal está apernado, fica com a barriga por tosquiar. Depois ficam as barrigas. É isso que a gente apanha para dentro de uma saca, que é posto à parte. INQ2 Ai, é posto à parte? INF É posto à parte. As barrigas vão à parte para a gente não estar a metê-las junto com o no velo. INQ2 Mas no-, nor-... Mas serve para a mesma coisa? INF Serve a mesma coisa. O que é que, quer dizer, ao comprador facilita porque evita de estar a fazer aquela escolha. Porque assim o velo vai logo directamente direitamente para a lavagem e aquela lã vai para outro lado . O que é lavado à parte são os pedaçozinhos. INQ1 E antes, a lã era tratada aqui? INF Não, nunca. (...) Nós aqui não temos coisas próprias para tratar. A lã daqui vai quase praticamente sempre para a Covilhã, ou para o Porto (...) . INQ2 Pois.
MST06
INQ O senhor é o encarregado da quinta toda ou só desta terra? INF Só esta terra não. Sou da quinta toda. INQ Da quinta toda? Portanto, aqui normalmente o que há é um encarregado de uma quinta e depois não há encarregados de cada coisa? INF Não senhor. INQ Não? Mas são os homens que trabalham em cada coisa? INF Pois. Mas os homens, minha senhora, já não há homens. Já a gente tem que trabalhar. Olhe, eu, há três dias corri aqui quase tudo em volta para arranjar um homem, para vir para aqui para o meu lugar. Eu não o encontro, tenho que eu (...) aguentar. Pois se eu (...) não acho pessoal. INQ Pois, pois. INF Tenho que eu aguentar a coisa. INQ Claro. INF A gente Ele está assim desta maneira. Depois Pois no campo, ninguém quer saber do campo. A vida agrícola, ninguém quer saber dela. Estamos nesta crise que terá que se ter de deixar isto e abandoná-lo. (...) . Os criadores hoje, andam aí apenas estes sete homens a tosquiar, (...) há centenas deles à espera deles. Que é aquilo que eu outro dia lhe disse, esses que aqui têm estado , é aí a toda a hora à procura deles, para irem tosquiar. INQ Pois. INF De maneiras que isto (...) tem mesmo tendência... A vida agrícola está muito mal !
MST07
INQ Que pastos é que costumam semear para o gado? INF Comem fenos de aveias. Semeio aveias. Já tenho semeado também termocilho, ervas, grão. INQ Pois. INF Mas praticamente, nós aqui semeamos mais termocilha e aveia. INQ Isto realmente, a lavoura está muito, está mau por todos os lados. INF Está, está. Isto está muito mau, muito ruim. (...) E é coisa que toda a gente precisava, porque é (...) daí que a gente se governa. INQ Claro. INF É daí que tem que vir tudo. A gente, se não semearmos a batata, seja quem for, se não semear cá a batata, a agricultura, os que estão em Lisboa, ou no Porto, ou em Coimbra, não podem comer. INQ Não podem comer. INF Praticamente é isso. INQ Pois. INF Se não semearmos trigo, donde é que há-de vir o trigo? Pois nós... O problema é esse: estar a importar trigo e nós tínhamos bem, bem, bem para ter, mas à fartura. INQ Claro. INF Sem comprarmos fora. INQ Pois. INF Ele já cá está muito caro... (...) Logo agora o adubo! Agora o adubo, nem a gente, nem que o queira comprar caro, aquilo nem aparece.
MST08
INQ1 Então, vamos lá ver. Ainda se lembra dos nomes d-, daquelas peçazinhas... INF Sim. INQ1 Portanto, aquela parte em ferro que entra na, na terra? INF (...) Isso é um bico. INQ1 E o bico está preso... INQ2 Do arado? INF E (...) o bico está preso a uma relha; e a relha está presa a uma aiveca; e a aiveca (...) está presa a uma teiró; e a teiró está presa ao mexilho, presa ao cambão. (...) INQ2 Mas isso é tudo ferro? INF Isto é tudo da parte do arado de ferro. INQ2 Do arado de ferro? INQ1 O que é o cambão? INF O cambão é aquela parte que está essas peças todas ligadas a ele. INQ2 É aquele que vai da frente atrás? INF Portanto, está a relha. Exactamente. INQ2 Que é comprido? INF É esse onde o animal puxa. INQ2 Pois. INF As vacas puxam, não é. (...) Há um gancho, chamado um esse, engancha (...) àquilo, a um cambão de pau, e a gente puxa a adiante . E há o outro arado, chamado o arado de pau. INQ2 Pois. INF Ele tinha duas aivecas em madeira. Tinha um mexilho que atravessava o pau (...) e uma relha em ferro. INQ2 Portanto, o mexilho era aquilo que ia pelo chão? INF (...) Não, não. Era o que estava. INQ2 Ou era a... Estava as aivecas. INF Exactamente. (...) INQ2 Que é por dentro de quê? INF Isso. Por dentro (...) do rabiço. (...) INQ2 Portanto, o rabiço era... INF O rabiço era aquela parte torta. INQ2 Aquela parte onde se agarra? INF Exactamente. Isso é a mãzeira do rabiço. E o rabiço é um que vai... INQ2 É aquela parte assim torta que vai até ao chão? INF Isso. Essa parte (...) faz assim. A mãzeira vai cá em cima e aqui vai a relha. Aqui vai o mexilho que vai segurar as aivecas, e depois está uma teiró que entra aqui assim, que dá assim no chão. INQ2 Sim. E que é segurada com quê? INF (...) É segurada (...) com uma cunha de pau, que é a cunha com que se enrosca depois com a teiró. Para se abrir ou fechar. INQ2 Sim senhor... INQ1 Mas o que... INQ2 O mexilho é o que vai das aiv-, é que vai por dentro da rabiça, INQ1 Pois. INF Às aivecas. INQ2 e que vai às aivecas. INF Aquilo faz assim. Aqui, aqui aperta assim e assim abre para fora. INQ1 Pois. INF Depois há um ferro, aqui chamado o mexilho, que enfia num lado e noutro, que segura as aivecas. Que é para alargar e fazer os regos. INQ1 Mas o que é a relha? INF A relha é um pedaço de ferro. É um pedaço de ferro assim - é assim deste género - e que vai então por cima (...) do rabiço, enfia assim e a relha é que é que lavra.
MST09
INQ1 E aqui não havia uma travessa mais grossa, não davam um nome, atrás? INF Não, não. Isso é a travessa exterior que é a mais pequenina delas todas. Portanto, (...) é a única que leva à frente. INQ2 Pois. INF Pois ela leva umas quatro . INQ2 Tem ali o carro fora? Tem aqui ao pé, ou não? INF Tenho. Tenho lá além (...) no arraial . INQ2 Ah! INF (...) INQ1 Olhe e depois... INF Se quiserem podem ir lá ver. INQ2 Não, mas deixe estar. INQ1 E depois, o que é que se punha aqui no carro que era para poder trazer feno e essas coisas? INF Os fueiros. Isto são os fueiros. INQ1 E não se punha mais nada, à, à, assim para, para tapar melhor? INF Nada disso. A gente só põe nos carros só os fueiros. INQ2 Não se punha às vezes de lado assim umas coisas? INF Isso é as sebes. Isso são as sebes. INQ2 Para não deixar cair a carga. INF Isso que se punham em volta isso é a sebe. (...) Leva uma sebe, (...) que é só quer dizer para certas coisas. INQ2 Só para o... INF Só para palhas e estrume e assim é que púnhamos a sebe. INQ1 Era feita de quê? INF Isso é feita (...) de verga. Tínhamos verga e aquilo era tecido. (...) INQ1 E atrás não levava uma, uma coisa com uma corda? INF Uma corda. Levava uma corda. Atrás (...) , quer dizer, atrás levava uma corda porque à frente... (...) Havia umas em madeira, tinha que levar uma porta à frente e outra atrás. Mas praticamente ainda se usava usaram muito aquelas feitas: à frente, fazia o redondo e levava uma porta à retaguarda. INQ2 Pois. INQ1 É que os carros agora que se vêem aí já não são... INF Não. Já não são. INQ1 Não são... São... INF Já são quadrados. INQ1 Quadrados. INF Já são quadrados à frente e atrás. INQ2 Pois.
MST10
INQ1 Olhe, então já agora, diga-me mais uma coisa só: portanto, e que é que se punha no, no cachaço dos animais para puxar o carro? INF Isso é uma canga. INQ2 Uma canga. INF Isso é a canga. INQ1 Nunca chamaram de jugo aqui? INF Não. (...) Também havia jugo. Também há jugo. Eu ainda tenho aí um antigo. Tenho além arrecadado. INQ1 Pois.... INF Mas praticamente nós aqui só trabalhamos com canga. INQ1 Qual é a diferença entre a canga e o jugo? INF Quer dizer, é que a canga - sabe - a canga trabalha com apeaças e o animal (...) anda à vontade, de cabeça à vontade. E o jugo é juntamente aos chifres e é amarrado com umas sogas - chamadas sogas. Portanto, à canga - chamado à canga - trabalha com apeaças; e ao jugo, (...) são sogas. INQ1 Passa aqui pelos chifres... INF Exactamente. Passa nos chifres, passa (...) sobre a testa do animal e então o animal não se pode torcer para lado nenhum. Tem que ir sempre assim, sempre assim : firme. INQ2 Pois, pois, pois. INF E ao passo que a canga já não. Já não. INQ2 Mas o resto da parte de ma-, de pau é igual? INF (...) É tudo a mesma coisa. INQ1 E aquilo, portanto, aquilo onde assentava no cachaço dos animais era assim em redondo ou era... INF Não. (...) O jugo (...) é uma espécie de redondo; mas a canga já é direita. E depois a canga (...) tem uma diferença que é: trabalha com em dois cangalhos, que trabalham, que é onde o animal mete os cornos. E o jugo não tem. Não tem cangalhos. INQ2 Pois. INQ1 Portanto,... era aquele redondo que encaixa aí... INF Exactamente. INQ1 E dava algum nome a esse redondo? INF Não. É só Esse é chamado o jugo. É por isso que é chamado o jugo. O animal anda jugado, anda muito mais oprimido. INQ2 Pois, pois. INF Então, quando o gado era bravo, para se amansar, era sempre (...) . Punha-se o jugo porque antes que queiram fugir não podem. E a canga, podiam fugir, ou tirar a cabeça, ou partir um cangalho (...) . Só partindo os chifres é que se safava.
MST11
INQ1 Amanhã chove? INF Ah, se chover chovera era melhor, mas ele não chove amanhã. INQ2 Desde, desde aquela altura que esteve sempre o tear aqui, agora, é? INF Tem estado sempre aí. O que é que o tear, quer dizer, (...) está armado, mas está mal . Entrou canalha para ali, e daí já levaram deixaram levar muitas coisas. E eu não fiz caso - (...) porque no outro dia armaram-no - à uma, (...) já não tinha idade de estar a tecer mais; e, à outra, metiam-no a casa. Aqui é maior mas, (...) (...) não quis já lá arrumar o tear. INQ2 Então nunca mais teceu... INF Nunca mais teci. INQ2 desde aquela altura. INF (...) Ainda cá vim a tecer umas coisas que cá tinha. Ainda lá há até fiado no tear (...) . Ia buscar uma meada nova e eles que viram que quando cá vinham pessoas gostavam (...) que estivesse assim o tear. (A pontos (...) que não sei ainda). Até um dia que mo mande mandem abaixo vou olhar para cá . INQ2 Pois. E a senhora tecia mais em linho ou... INF Eu tecia naquilo que calhava. Eu primeiro comecei a tecer em linho. Depois o linho deu-se em acabar e comecei a tecer em algodão. Algodão e linho. Algodão e linho. A gente já comprava o algodão para aumentar. - Está a ver que ainda tem uma amostra. INQ2 Claro... INF Porque do que eu tecia -. E depois mantas, farrapos, algodão.
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INF Tive umas poucas de aprendizas, ainda, a aprender. Cheguei a (...) ao mesmo tempo. E eu fazia-me confusão como é que elas haviam de aprender. Metia-se-me cá na ideia que elas que não eram capazes de aprender. Umas Mas aprendiam logo. Porque eu também aprendia depressa, porque eu não me custa a aprender, porque eu também... Depois de feita (...) a aprender! Não aprendia era o que não me ensinavam. INQ Pois. INF Porque (...) até já tenho estado a sonhar que eu (...) que escrevia uma carta. O que não sabia era ler. INQ Pois, pois. INF Mas aí disse: "A mãe te eduque" . Olhe, eu oriento-me mesmo pus-me com tudo! (...) De solteira, tive uma vida, só com os meus pais, (...) muito bonita. Que os meus pais tinham só duas filhas e tínhamos assim os encarregados , estávamos só em casa, na nossa vida. E depois então quando casei, a vida modificou muito. INQ Pois. INF Comecei a ter filhos e depois (...) o tempo foi muito ruim também. E eu tive que me deitar a tudo. Tive quatro filhos (...) . Tive que me deitar a tudo, que senão só (...) com o ordenado do meu homem não me safava de maneira nenhuma. Mas assim, fui-me safando. Mas naquele tempo custava muito a safar. Porque a gente ganhava poucochinho. Mas também se pagava tudo mais barato. Vai dar ao mesmo . E depois, é como digo: comecei depois nessa altura, comecei a achar graça ao tear (...) . Enquanto fui solteira, (...) nada disso me meteu cobiça. Mas depois comecei a achar graça ao tear, de casada. Gostei até muito! (...) INQ Portanto urdia para fora? INF (...) INQ Tecia para fora? INF Para fora, também muito. Mas havia muito que fazer. É como digo: eu ensinei aquelas aprendizas, tinha-as ali a biscate de mim e tive sempre (...) ... Era para mim e para elas, tinha começar a fazer, mas à fartura. À fartura! E elas então, em pouco tempo, aprenderam. Despacharam aí obra que era uma maravilha! E eu digo assim: "Mas como é que nos havemos de arranjar "? É porque (...) isto aqui faz confusão! A gente a meter aqui os fios todos certos. INQ Pois, pois. INF E então depois quando se parte o cabresto ? Este não parte. O algodão parte todo. Mas o que era linho, isso era a partir, a partir, a partir . A gente ia, está só a atar. Depois tinham que se atar (...) os fios aqui todos, para ficar aqui tudo certo. Um detrás, outro diante. Umas vezes além. E a gente tem que vir de além, e aqui (...) apanha muito, tudo, tudo. INQ Faz confusão, faz. INF Tudo logo assim (...) . Se começa naquesta tem que se acabar sempre naquesta.
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INF E agora a gente já vai tendo outra vida menos-mal. INQ Pois. INF (...) Já nos vamos remediando com o que vamos ganhando. INQ Não, mas para a senhora se entreter é que era bom! Para estar entreti-... INF Mas também tenho umas fazendinhas ainda para trabalhar nelas, que é onde ponho umas batatas e umas couves... (...) E agora já não. Agora já não podia. E falta-me a vista, que me falta o melhor. Estou muito mal de vista. Porque isto quer uma vista muito boa. INQ Claro. INF (...) Para a gente aqui vir tecer nestes (.../N-P) aqueles fios, e para ver as casinhas todas como é (...) . E a ver bem e a ver bem, volta e meia deixa uma sem nada, que até é muito raro de ver aquilo... São duas que entram... E quando a gente acha uma sem nada - que se engana muita vez -, tem que partir (...) uma ao meio. Fica já ali (...) um bocadinho de ranhura no pano. Já não fica o pano tão bom! Mas tem que se tirar um de lado (...) . Ou senão tem que se meter aqui. Faz a gente aquele fio que entre no carretel... (...) Pega no fio, e ata aqui no fio (...) e mete-o aqui (...) naquelas duas casinhas e leva aquele fio encomendado até ao fim. (...) Vai o fio até ao fim da teia. Vai-se acrescentando o fio até que lá chega ao fim, para não fazer falta aqui no pano. Porque qualquer ranhura... Eu pus aqui isto que era para tecer (...) estes tapetitos para fazer uma passadeira.
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INQ1 Esse, este tear, a senhora é que o mandou fazer ou já era... INF Já era (...) da minha mãe. Este tear já era da minha mãe. INQ2 Foi a sua mãe que o mandou fazer? Ou foi a sua mãe... INF Este já foi a minha avó. Que a minha avó ficou viúva muito nova. E ficou (...) com quatro filhas e só um filho. E o filho apenas começou a ganhar pão foi-se embora. Nunca mais quis saber. E elas, coitadas, passaram muita miséria. E tinham então dois teares. Ele eram dois teares. (...) Minha mãe trabalhava num e a minha avó trabalhava noutro. E depois começou então uma outra tia minha, que ela quando já era mais velha, a trabalhar noutro tear. E este que era o que tinha mais ficou então minha mãe com ele. Mas minha mãe depois casou, foi-se para o campo a viver , e ela nunca mais teceu. Mas depois viuvou (...) . Ela já ficou aí (...) com perto de sessenta anos (...) . Quando ela viuvou já os tinha. Arrumou-se ao tear e esteve sempre a tecer até uma certa altura. Que ela depois morreu-lhe (...) uma filha, que era minha irmã, mais velha do que eu um bocadinho - só levava ano e meio -, e morreu-lhe o marido também - ele já era de uma certa idade. Mas ela primeiro (...) . Variou e não se sabe como foi aquele variar. (...) Depois (...) ainda foi para Lisboa e de Lisboa veio boa, menos-mal. Ainda esteve catorze anos a tecer. (...) Foi nervos. Foi coisa de nervos que lhe subiu ao cérebro e ela nunca mais... É como digo: foi preciso uma temporada, foi a Lisboa - lá esteve no... parece-me que esteve no Júlio de Matos. (...) E veio de lá e começou a tecer. Ainda esteve catorze anos a tecer. E morreu até com um ataque que lhe deu. (...) Também não era velha . Tinha para aí setenta e tal anos, mas morreu no tino dela. INQ2 Pois, pois. INF E aquilo foi nervos (...) . Com as penas e tal, foi nervoso nervos que lhe subiu à cabeça e ela pôs-se muito mal.
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INQ1 Olhe e também... A senhora também se lembra de, de cultivarem o linho? INF Lembra, sim senhora, muito bem. INQ1 Como é que era? Como é que se fazia? INF Olhe, o linho tem muita coisa, muita coisa que se lhe diga. Olhe, (...) se for a explicar tudo o que dá o linho... (...) O trabalho que dava o linho é a coisa que dá mais trabalho! Dá mais trabalho do que dava o pão. Bom, vamos lá, primeiro era semeá-lo. Depois, já nem valia a pena em falar (...) em mondar, que também tinha que ser mondado, mas se quiserem era regar . Depois era arrancado (...) . Tinham, então, chamavam-lhe um restelo (...) para tirar a baga do linho. (...) Era a semente. Tinha a semente daquela baga e não a deixavam... Ou senão, tinham que deixar amadurar aquela semente (...) no linho e punham-no assim todo empinado, para amadurar a semente. Mas (...) para não ir aquela semente, (...) mais depressa (...) , tinham o restelo, tiravam-lhe aquela semente toda. INQ1 No restelo. INF No restelo. INQ2 Como é que se chamava? INF O restelo. (...) O restelo, (...) parece que era o restelo, para tirar a baga. Mas se não queria, não a tiravam . E depois era enlagado. Ia para a água. Estava nove dias a curtir numa charca de água. INQ1 Nove dias? INF Nove dias a curtir (...) numa charca de água. E era preciso que a água andasse quente! Se a água andava fria, já custava ficava lá mais a curtir. E ao fim daqueles nove dias, tiravam-no, enxugavam-no bem (...) enxuto, levavam-no (...) para casa. E aquilo era amaçado (...) . Tinham um maço de propósito, ou um pau (...) onde lhe pegavam, (...) e assim um grosso, muito grosso, e só uma mãzeira para pegarem ao pau. Era maçado, maçado... Até maçá-lo bem maçado. (...) INQ2 Em cima de quê? INF Em cima (...) duma pedra, mesmo. Ou dum pau. Havia ali um pau para maçar aquele linho bem maçado. E depois era esmouçado. Com as mãos, aquilo era tudo esmouçado, ficava só quase já (...) aquela pragana quase a sair. E depois, então, a própria mulher que o maçava... Havia outra com uma espadana com um corcho (...) e com a espadana era espadanado. (...) Ficava, então, aquelas - chamavam-lhe uma estriga. Empilhavam o linho, assim (...) muito bem empilhado , chamavam-lhe uma estriga. (...) Já não sei quantas estrigas punham (...) para uma meada. E depois arranjavam aquelas estrigas (...) e iam até, às vezes, elas arranjar aqueles... Todas juntas iam a um restelo - que chamavam um restelo -, que era (...) uma coisa com muitos bicos, um pau com muitos bicos. E tinha: (...) esta, por uma comparação, era assim. Esta parte, os bicos eram mais ralos e mais grossos. E esta parte, eram os bicos mais miúdos (...) e mais bastos. Primeiro passavam (...) aquele linho naqueles mais ralos; e depois vinham ao mais basto. E o que lhe tiravam, do linho - ficavam aquelas estrigas - era o linho fino; e o que tiravam era a estopa. Era então fiado tudo à parte. E depois aquilo arranjavam aquelas molhadas... INQ1 E como é que se chamava então esse, esse coiso com os bicos? INF (...) Era um restelo. Esse era o restelo. INQ1 Não era o sedeiro? INF (...) INQ1 Não? Era o... INF (...) O dos bicos era o sedeiro.
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INF1 Agora, em abalando a senhora ainda quero ter uma conversa , que ele falta-me aqui umas peças do tear, quero saber onde elas estão. INQ Agora espere aí só um bocadinho. INF1 (...) Bem que eles para aqui vinham brincar (...) para aqui, por isso é que me faltam aqui as coisas do tear. Eu quero aqui saber de uma caixa que aqui andava (...) e um caneleiro. INF2 Nós só vimos quando temos catequese , mais nada. INF1 Hem? INF2 (...) Eu nunca vim (...) . INF1 Bom, mas eles para aqui vieram alguns meninos a fazer esse serviço. Eles sabem onde ele está. Porque Que ele estava metido aqui no tear. INF2 Eu não. INF1 Bom! Agora não foi nenhum. INF2 (...) INF1 Bom, mas ele não foi nenhum. (...) Aqui não está. Ele tem de estar nalgum lado. Eles de cá não abalaram, sem os levar levarem , não abalavam de cá. Vamos lá ver onde estão. Eles podem por aí estar. Mas aqui não estão. Que eu venho aqui (...) para ver as coisas do tear e não os encontro cá.
MST17
INQ Olhe, e como é que se chamava a semente do linho? Tinha algum nome? INF Era linhaça. INQ Servia para alguma coisa? INF Ai! Para muita coisa. Servia até (...) para infecções desinfecções (...) , para papas de linhaça. Antigamente até curavam muita coisa com as papas de linhaça. (...) Antigamente, no tempo do meu pai, (...) as pneumonias eram curadas com linhaça. Com papas de linhaça e mostarda. E quando havia (...) uma infecção numa perna ou (...) numa coisa 'qualquera', era posta umas chapinhas de linhaça (...) para aquilo amadurar. E servia (...) para os intestinos, para beber a linhaça. Ainda agora! Quem sofre muito dos intestinos, ainda pode beber um bocadinho de linhaça, mas ela já aparece pouco . Mas vão à farmácia, sempre há. INQ Pois, pois. INF Ainda compram a linhaça - linhaça, umas malvas - (...) para quem sofre dos intestinos. Que até é muito bom! (...) Era muito aplicada a maça... Aquela linhaça, muito aplicada (...) para as pneumonias de antigamente. Que ele Aquilo não havia injecções, não havia nada. (...) Era só curada (...) com os beberes barbeiros ! Nós tínhamos que operar com procurar aquelas coisinhas todas. Tinha muito préstimo, a linhaça. Então não tinha!
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INF Os tomentos tinham assim muita palha, custavam muito a fiar - era aquilo grosso -, custavam a fiar que eu sei lá. Eu o que mais gostava de fiar de tudo em tudo era o linho. O linho era uma beleza de fiar! Tirava-se uma maçaroca... (...) O linho (...) , para fiar era a maçaroca. INQ Olhe e lã, nunca fiou lã? INF Lã, era a minha mãe. INQ A sua mãe fiava lã, também? INF A minha mãe fiava lã. Muito, muito, muito! Fiava. (...) E à lã chamávamos, então, um 'arrátele' de lã por dia. Aquela que tecia um 'arrátele' de lã por dia... Porque dantes era só por 'arráteles', nem era meios quilos. Era um 'arrátele', meio 'arrátele'. INQ Pois. INF Acho (...) que o meio 'arrátele' devia ser meio quilo. Não sei (...) se era mais se era menos. E o meio 'arrátele' havia de ser o meio quilo. Dantes era tudo só por 'arráteles' e meio 'arrátele'. (...) Quando era depois que tosquiavam a lã, e a minha mãe aparava - que nós tínhamos gado. Aparava a lã mais fina, mais boa (...) para as maranhas. (...) Fazíamos as maranhas dos cobertores. Chamavam-lhe elas uma maranha. (...) INQ As maranhas portanto, era os cobertores? INF Para ser os cobertores. Era maranhas. Isso era maranhas. (...) E ela depois fiava aquela lã, (...) , que não fosse tão 'empastagada'. Que havia uma lã (...) mais solta do que outra. E depois aquela lã era tirada e era lavada. Lá ia para um sítio, aquilo era amolecida (...) com água quente e assim. Lavava aquela lã muito bem lavada, quando a tirava da ovelha, quando a tosquiava. INQ Pois, pois. INF E depois ainda era lavada, punham-na a enxugar, bem enxuta, bem enxuta, e apanhavam aquela lã e levavam a um homem com umas cardas, (...) para alisar a lã. (...) INQ O que é que ele fazia com as cardas? INF Com as cardas? (...) Era para cardar a lã. Cardava então. (...) Aquela lã também tinha uma carda: uma mais grossa e outra mais fina. Passava-a primeiro (...) pela carda mais grossa e depois passava-a (...) pela carda... Ficava aquela lã toda cardada. Mas aquilo é que ele ficava toda muito linda, muito linda, a lã! A que ia apanhando, tornava a cardar. A que ia apanhando ficava (...) toda em a ela era a mesma. (...) Aquelas pastas! Ela toda ficava era às pastas. Chamavam-lhe as pastas da lã. (...) Muito lindas, (...) muito bem feitinhas! E empastavam aquela lã uma assim, uma em cima da outra, mas não se pegava uma à outra. Ficava empastada mas ela não pegava. (...) Foi coisa que eu depois nunca fui capaz. Era muito nova. INQ Pois. INF Que eu gostava muito (...) daquilo. Mas aquilo era uma roda grande e aquilo era longe. (...) Elas estavam além e a gente chegava estava aqui para trás, que aquele fio a tocar à roda, a tocar à roda e fia-se tanto linho. E depois eu tinha então um fuso também. E aquele fuso enfiava... Aquele fuso ia enrodilhando enfiando aquela lã, enrodilhando enfiando aquela lã, fazia uma maçaroca grande.
MST19
INF E depois aquilo então, aquela lã vinha fiada, (...) só fiada e preparava aquelas maçarocas. Minha mãe já não fazia mais nada. E vinha trazê-las. (...) Estava um homem com um tear - também cá estava na vila. E o tear era doutra maneira. Não era como este. Era mais grande. Era um tear grande e tinha pentens e tudo como este. (...) Eu lembra-me ainda de lá ir de garota mas não dou conta já de como ele urdia . Eles tinham uma... Chamam-lhe uma urdideira. Mas não era como a nossa. Era uma coisa era coisinha à roda. Era uma coisa assim quase mais pequena do que isto, mas era: tocavam aquilo à roda e aquilo andava à roda. E o fio a andar também tinha umas maçarocas, mas (...) ficavam as maçarocas (...) no fuso. Parece que punham as maçarocas também no fuso e não vi como eles urdiam. E depois o homem tecia aquelas teias, aquelas maranhas, os cobertores. Iam então a... Chamavam-lhe eles aquilo - que ia um a uma fábrica... Chamavam-lhe um pisão. Que iam (...) como a que iam a pisar aquilo. Eu não compreendo como era aquilo. INQ1 Um pisão? INF Um pisão. Quando iam a tecer aquelas... O que é que elas depois parece que diz (...) que aquilo que as que não iam bem arranjadas às vezes, ou bem tecidas, e as maranhas que vinham muito fracas. E elas chamavam: "Ai, vai ao Fulano"! Parece que era para (...) (...) ... Mas então quem as tecia é que remetia para lá aquelas maranhas. E depois vinham então aqueles cobertores, cada um como queria: uns cor-de-rosa, outros amarelos, outros brancos, outros escuros (...) , outros que tinham às riscas. Muito lindos! (...) Tinham. Mas minha mãe (...) nunca lhe importou muito daquilo. (...) Para não pagar as tintas, fazia aquilo tudo mais barato, (...) quase tudo branco. Brancos, (...) outros aos quadrados, pretos e brancos. Aquilo conforme era o que lhe punham, assim era o que pagavam de uso . INQ1 Portanto, já há quantos anos é que isso não se faz cá? Já há quantos? INF Oh! Isso já há muitos anos. Ainda eu era garota quando ele deixaram de... Deixaram depois de usar estas coisas todas. Isto não. Isto ainda não há muitos anos, que (...) foi quando eu deixei de tecer. É como digo, já há-de haver... Foi quando cá veio o senhor Américo Tomás. Eu parece-me que (...) reformaram até a Casa do Povo o outro ano adiante. Há oito... Deve haver uns nove, dez anos, que eu deixei de tecer. Que depois quando eu tive que abalar daquela casa (...) para a arranjarem . Depois foi arranjada (...) pela comissão. Que levaram cá aquela comissão, que arranjaram estas casas... Porque senão a minha hoje também já tinha caído. Porque eu, eu não era capaz de a arranjar. Não ganhava para arranjar a casa. E não a podia arranjar, deixava-a cair. INQ1 Pois. INQ2 E a senhora era a única que tecia? INQ1 Era a última, foi a última pessoa a tecer cá na terra? INF (...) Aqui fui a última pessoa a tecer, cá na vila. INQ1 E portanto a sua mãe a tecer a lã foi a, foi a última pessoa também? A tecer... A urdir... A fiar... INF (...) Também devia ser das últimas (...) que ela deixou de fiar (...) as maranhas. INQ1 E há quantos anos foi isso, mais ou menos? INF Ah, isso já há muitos anos. Já há muitos anos porque é como digo: então eu, eu já casei... Bom, eu ainda casei (...) no tempo de minha mãe. Mas já há muito tempo, já há muitos anos. Havia uma data de anos que tinham acabado com aquilo. Já lá vão talvez mais de... E eu já há cinquenta anos que estou casada. Ou cinquenta e tal. Já, já. Já lá vão muitos anos. Já não dou conta dos anos (...) que isto há (...) .
MST20
INF É como digo: eu estou com setenta e sete. Minha mãe (...) , ela ainda teve muito tempo (...) porque o meu pai morreu com oitenta anos. Já era velho . A minha mãe também casou já de segunda vez (...) com um viúvo. A minha mãe ela casou de primeira vez, mas era viúvo o meu pai quando casou com a minha mãe. (...) E olhe que meu pai morreu já com oitenta anos. E minha mãe morreu parece-me que com setenta e tal. (...) Não sei a idade que minha mãe tinha quando morreu já. Sei a idade (...) que tinha quando ela morreu, mas hoje já não ficou cá. INQ Pois. INF (...) Naquela altura, a gente não tinha nada: não tinha um retrato, não tinha nada (...) dos pais que (...) . Hoje já não. Hoje já toda a gente tem. Ainda bem que fazem tirar as coisas à gente que é para a gente as ter.
MST21
INF Primeiro diziam assim: "Ah, você vai arranjar a casa. Agora, você vai para velho. O que é que você quer arranjar"? (...) E ele diz: "Opinião alheia" ! (...) Deixe que vamos a arranjar a casa e depois é que havemos de falar. "Eh homem, não te aflijas! Eu tenho boas amigas. Elas já me disseram que vá lá todas as semanas comer das suas batatas! E eu pego numa cesta e vou à esmola, mas quero a casa arranjada"! "Ah, lá estás tu"! "Lá estou eu que é verdade. (...) Eu sou capaz de pedir uma esmola, mas quero a casa arranjada. Não quero aqui estar como estamos . Não quero que os meus filhos tenham o desgosto de viver... aqui chamam, como a que é uma cabaninha". Ao menos fico com uma casinha regular. INQ Pois, pois. INF Com que agora, depois que a arranjou (...) : " Vês que já tiveste dinheiro? (...) Já houve dinheiro (...) . Arranjámos a casa e ainda ficámos com dinheiro"? E já pus a luz. Já aí está a água canalizada, mas quem sabe lá quando virá - na minha cabeça é no Verão ... Mas já lá está. (...) A luz ainda foi porque eles não me deixaram arranjar tão depressa . Eu queria arranjar logo apenas arranjei a casa, mas "Ai! Não há dinheiro! Não há dinheiro! Não há dinheiro! Não há dinheiro"! Os filhos abundam . É para eles, não é para mim. Agora, (...) se se acabar a luz já está. Bom, já é preciso pôr o candeeiro. Não se vê a comer ou aqui para ver. Já não vê nada. "Agora já? Já dás graça à luz"? "Ah, (...) não havia dinheiro". "Mas houve dinheiro, não houve"?
MST22
INF Mas a mãe é que é que se escolhem os nomes. As mães agora é que é que escolhem os nomes. Não é os pais.
MST23
INQ E antigamente as cangas eram redondas, não eram? INF1 Eram doutra maneira. INQ Eram doutra maneira. INF1 Eram jugo. INQ Eram jugo. INF1 Eram em jugo Era um jugo . E o jugo tinha então... INF2 Agora é mais moderno. (...) INF1 Era: estavam então os cornos ali... Já não eram como isto. Tinha aquela volta, aquela curva para o pescoço, assim (...) ao pé dos cornos. E depois vinha então (...) a apeaça, a tal apeaça, enrodilhada aos cornos e acama-se . O gado assim trabalha melhor. INQ Trabalha melhor? INF1 Trabalha melhor com estas do que é com a outra. INQ E o outro... O jugo não tinha cangalhos? INF1 Não tinha. (...) INQ Tinha só aquela coisa redonda... INF1 Só aquela volta. INQ Pois. INF1 Só aquela volta. INQ E o jugo era mais pesado que este, não era? INF1 Não era. INQ Não era mais pesado? INF1 Mais pesado não era. Não era. Era mais curto até um bocadinho. INF2 Ainda era mais pequenino. Era mais curto. INF1 Era mais curto. INQ Ah. INF2 Meu pai também tinha isto. Jugo nunca teve mas canga também tinha. INF1 Oh! Dantes havia muito. Havia muito. INF2 (...) INQ E aquelas coisas redondas de ferro que estão ali? INF1 São ferragens para carro, para puxar o gado.
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INQ E sempre viveu aqui? É daqui mesmo? INF1 Sou cá de Monsanto. INQ É de Monsanto ou da Relva? INF2 É daqui. INF1 Relva. Vá, Monsanto, Relva. INF2 Relva e Monsanto é tudo o mesmo. INQ Pois. INF2 Tudo, tudo a mesma coisa ... INF1 Bom, é tudo Monsanto, vá. Mas estou na Relva. INQ Pois. E sempre viveu cá? INF1 Sempre, toda a vida. Nasci cá e cá hei-de morrer, com certeza. Vamos lá a ver (...) . INF2 Mora aqui ao pé de nós. Mesmo a casa dele está virada à nossa. INQ Pois. E teve sempre esta profissão? INF1 Sempre, sempre. INQ Ou já trabalhou outras coisas? INF1 Nunca fiz mais nada nenhuma . INF2 Não faz mais nada noutro serviço senão neste . INF1 A idade já chega (...) para o serviço. Já chega. INQ Ah, acho que sim. INF1 Com setenta anos nesta vida! A trabalhar de dia e de noite! Tive semanas Fins-de-semana sem me deitar... Dia e noite sempre a trabalhar. INQ E nunca teve nenhum aprendiz aqui consigo? INF1 Tive muito, muito aprendiz, mas ninguém cá ficou. INQ Não gostam do trabalho? INF1 Ah, não gostam?! Foram a passear para Lisboa e para a polícia, guarda-fiscal, guarda-republicana, e para os bombeiros. É vida mais descansada. Aqui é suja. É uma vida porca. Porca não é... INF2 (...) INQ Pois. INF1 É preta, mas não é (...) . INQ Claro. INF1 É pior quase o moleiro do que é o ferreiro. INQ Ah, sim, sim. INF1 É que ele ainda amassa a farinha e nós aqui ainda sacode-se (...) e abala. Mas enfim. INQ E portanto, a sua família, a sua mulher também é daqui? INF2 Também . INF1 A minha mulher também é de cá. INQ E a sua, os seus pais também eram daqui? Também de Monsanto? INF1 Eram. Um era de Medelim. O meu pai era de Medelim. Veio cá a casar. INQ Sim senhor. INF2 Tem um filho, tem-no em Lisboa. INF1 Tenho um filho. O filho (...) não quis cá ficar. (...) INQ Não quis cá ficar a trabalhar? INF2 Oh, quem se cá pode safar daqui... INF1 Está lá para Lisboa. INF2 Este trabalho do campo custa muito a fazer. No outro ano (...) vieram para cá duas meninas também a aprender o trabalho do campo. INF1 Ele sabe. Ele sabe fazer qualquer coisa mas não quis isto. Não quis. Está no Instituto de Ecologia empregado. INF2 Vieram lá à nossa fazenda connosco . E diziam: "Ai! Eu gosto muito disto, (...) mas anda-se cá muito mal". INF1 É segundo-chefe lá na secretaria. INQ Pois. Então, quando o senhor acabar, quando o senhor já não puder trabalhar, quem é que trabalha aqui? INF1 Ah! Fica fechado. Ele não há cá ninguém quase que trabalhe. INF2 Ninguém. Fica logo fechado. INF1 Quem é que há-de trabalhar? INF2 Ninguém aprende a arte. INF1 Este povo é muito grande, este povo. Quer dizer, o maior que por aí temos ... É dos maiores. INF2 Os arredores, tudo aqui vem a arranjar as coisas (...) . INQ Pois é. E depois quem é que arranja? INF1 Se a senhora desse (...) volta a isto, isto é muito grande!
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INF1 Acabam as artes todas. Nós aqui acabam as artes todas. Aqui já não há quase artista nenhum. Chamam artistas esses homens que estão assim a trabalhar. INF2 Acaba tudo. INF1 Uns arranjam sapatos, outros que sejam os fatos. Isto por aqui já não há ninguém a aprender. É só algum velhote. E depois está assim ... Está aí um velhote, já velhinho... Lá deita umas capas nuns sapatos assim por detrás (...) . INF2 Ah, pouco, não quer . As capas que deita... olhe (...) . Disse que não tinha lá cola, (...) que não tinha lá linha, não tinha nada. Tive que lhe deitar aqui este arame a ver se rompe mais um bocado. INF1 Já ninguém aprende artes. Isto aqui já ninguém aprende. Tudo quer ir mas é só (...) para o que for bom , para o Estado, que é outra vida que não é por aqui. Dantes andavam os filhos a aprender por aqui um ofício. Agora ninguém quer ofícios. INQ É assim. INF1 Agora ninguém quer ofícios. INQ Pronto, olhe... INF2 Isso é verdade, é . INQ Parece que já está tudo, aquilo que o senhor sabe e... fora o resto. INF2 (...) Muito dura a gente! Muito dura a gente! A Ele trabalhar toda a vida nisto, muito a gente dura!
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INF Quando eu era um putozinho, o meu pai que no céu esteja tinha um arado só de pau. INQ1 Pois. INF Depois começaram a vir os de ferro, a gente começou a comprar. Comprámos depois (...) . Agora os de ferro, isto já há muitos anos que (...) a gente os cá usa. INQ2 Pois. INF O que é que ele já se usam pouco, agora. Porque os homens velhos (...) já vão acabando e estes já não precisam de trabalhar. Agora só as máquinas é que trabalham.
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INQ1... No, do arado de pau... Portanto... Como é que era? INF O arado de pau era assim um cambão comprido - ainda mais comprido que aqueste. E depois detrás ele tinha... Era É como que era assim um pau, assim torto. E o cambão enfiava assim (...) na cova do pau. E depois à frente tinha assim uma teiró como aquesta. Bom, não era como aquesta. Era assim uma coisa redonda, uma coisa praticamente assim redondo. Enfiava (...) por baixo (...) assim do rabiço - chamavam-lhe eles era rabiço. Depois, enterrava aqui no cambão, aqui no tamão, com uma porca aqui em cima, com uma coisa para enroscar, (...) para se não tirar . E com uma relha. Põem-lhe uma relha de ferro, assim metida (...) no rabiço. INQ2 E como é que regulava a, quando queria mais fundo ou quando queria mais... INF Abria a gente depois aqui naquesta rosca. INQ2 Ah! Mas também tinha uma coisa que metia, lá atrás? INF Pois. Tinha assim além naquela cova. Assim além, também tinha uma coisa que metia. Tinha assim um pauzinho pequeno. (...) Também aqui andava um. Assim além, naquela cova assim além tinha assim (...) uma falhazinha. E a gente metia além (...) aquele pauzinho, apertava-o... Pronto, andava assim.
MST28
INQ E o senhor Ambrósio ainda se lembra dos carros antigos? INF Cantavam. INQ Sim. INF O senhor doutor lembra-se deles? INQ Lá na minha terra ainda há. INF Ainda há? INQ Ainda há. INF Nós aqui já não há nenhuns. Onde havia muitos, muitos era além em Penha Garcia, um povo que além está adiante. Isso é que cantavam quando iam assim (...) - dantes os senhorios metiam assim ajudas, a acarrejar pedras ou assim. Em certo tempo, as obras (...) era só de pedra. Não era como agora de tijolos. (...) Nem havia camionetas nem havia carro (...) para a gente acarrejar nada. Era só os ganhões é que acarrejavam tudo. Vinham aí (...) em filas de ganhões: "tchiã-tchi". Mas cantavam de rijo. Ouvia-se lá por aí fora. INQ Olhe, mas então nesses carros antigos, como é que chamava àquilo comprido onde... INF Era o tiro. (...) O tiro vinha assim aqui por aí fora e além diante engatava-se (...) e junta. E aqui tem assim dois lados aqui então assim dos lados , eram as chedas. Eu tenho além um carro ainda velho, que era da minha junta, além diante (...) nos palheiros. INQ Depois a gente logo pode ir ver? INF Podemos sim. INQ Pois, portanto... INF (...) Tenho além um carro ainda fechado . Bem, já não presta para nada mas tenho-o além. INQ Pois, era para ver. Portanto, as chedas vinham encostar ao tiro... INF Isso. Além vinham aqui bater aqui ao tiro. Juntavam aqui. INQ E por baixo das chedas não havia uma, uma coisa mais alta... INF Isso. Também. Era para fazer mais altura. INQ Como é que chamava? INF Era uns cocões. INQ E, e nos cocões o que é que entrava? INF Ele punha-se-lhe o eixo. De cima dos cocões, amarrados com uma coisa - pelo eixo, que era é o que enfiava assim nas rodas. INQ Com que é que se amarrava o eixo? INF Com um parafuso. Punha-lhe aqui dois parafusos, assim aqui, amarrava em baixo... INQ Amarrava-o em baixo, não era? Apertava? INF Pois. Punha-lhe assim uma chapa de ferro assim debaixo.
MST29
INQ1 Quando punha as tábuas, portanto, aquilo quando estava com as tábuas, como é que chamava àquilo, onde punha a... INF Chamavam-lhe eles Chamávamos nós o chedeiro. Bom, cá não há assim ... (...) INQ2 Pois, pois. INQ1 Depois de pôr as tábuas? INF Isso. (...) INQ1 Aquilo, aquilo... INF Pois, mesmo digo : "Bom, vou-me (...) a arranjar um chedeiro". Pois. (...) INQ2 E isto aqui é onde põem as coisas em cima? INF Ele era isto aqui. Isto aqui chamávamos nós o chedeiro. INQ2 E neste carro, já não chamam chedeiro? INF Pois, neste carro chamamos-lhe um carroço . INQ1 Olhe, e a-, e atrás não havia uma, uma travessa assim mais larga... INF É quase todas iguais, senhor doutor. INQ1 É tudo... INF É mais ou menos. INQ1 E do tiro... O tiro passava um bocadinho para trás? INF (...) Aquele que queria passava. Aquele que não queria ficava assim resvés. Ficava assim tudo direito. INQ1 E quando passava para trás davam algum nome àquela coisinha que ficava para trás? INF Não davam nada. Andava lá por andar. INQ1 Olhe, e depois aq-, há uns paus que se punham ao alto. Como é que chamava? INF Fueiros. Tenho-os eu ali. Ainda os ontem tirei do carroço. Também os aqui meto.
MST30
INQ1 Portanto e além do, dos, dos..., não usavam uma outra coisa, que era assim entrançada, que era quando queria a- acarrear estrume e, e isso tudo? INF Quando queríamos acarrear estrume tinha a gente umas portas. Punha a gente assim dos lados e outra assim na frente e outra assim detrás baixo . INQ1 Chamava a isso portas? INF As portas. Também as eu ali tenho. INQ1 É em madeira? INF Madeira. INQ1 E se fosse de, de verga? INF Também as havia de verga. O senhor doutor (...) umas portas de verga. Mas aquilo era muito pesado! Carregava muito! INQ1 Pois. INF O senhor doutor lembra-se bem daquelas coisas ? (...) INQ1... Então vamos ver o carro? INQ2 Vamos ver o carro vamos. INQ1... Então podemos ir ver o carro...? INF (...) Vamos lá que eu lhe lá vou ensinar. INQ1 Pronto... A gente vai lá. INQ2 Então vamos lá. INQ1 Até já. INQ2 Vamos ver o carro. INF Vamos além ver o carro velho. Diz que querem ver o carro velho.
MST31
INQ O que é que fazi-... Que é que faz durante todo o ano? INF Olhe, faço muito trabalho, senhor doutor. INQ Então diga lá. A partir, por exemplo, do, do Inverno, a partir do... INF Anda. Anda (...) . Anda. A gente faz muitas coisas. Mesmo na roda do ano a gente cava terra com uma enxada. (...) INQ Por exemplo no mês de Natal, o que é que se costuma fazer? INF No mês do Natal, colhe a gente azeitona. (...) É o mês que a gente anda... Bem, é o mês do Natal e o mês atrás. Colhe a gente as azeitonas. Bom, naquele tempo colhe a gente só as azeitonas, (...) mais nada. INQ E a seguir? INF (...) Depois vem Janeiro, começa a gente nas podas das vinhas, e assim já a tratar das vinhas e assim. E, às vezes depois , a limpar oliveiras também, assim com uma tesoura, a tirar aqueles galhinhos secos, aquelas ramas mais bastas, assim a limpar . E anda a gente assim. (...) Vai o tempo andando e vai a gente assim mudando de outros trabalhos. Que é preciso fazê-los. INQ Pois. INF Depois começa a gente as cavas das vinhas. Se já estão podadas, a gente começa então a cavá-las. E depois quando é para o mês de Maio, a gente esborralha-as. (...) No tempo das vinhas, depois (...) começa então... Ele em Março, começa a gente (...) a tratar da terra: a meter batata, ou a amanhá-las, ou a cavá-las ou amanhá-las com umas máquinas, ou de toda de qualquer maneira. Depois semeia-as a gente. Quando é ali por o fim de Março, vai a gente semeando. Depois muda a gente para outras coisas, para estes trabalhos que assim vão aparecendo. Que é preciso a gente continuar a fazê-los . INQ Pois. Isso é Março e Abril, é? INF Pois. INQ Esse trabalho? E depois assim para Maio? INF Depois para Maio, (...) há mais que fazer, assim doutras coisas também. (...) Nas quintas sempre há que fazer. INQ Pois. INF Para Maio, a gente tem os vivos as vides , quem trata dos vivos das vides . Anda a amanhar os terrenos. Depois chega ali uma altura a modo que pára assim o trabalho dos terrenos. Depois chega ali na meada de Maio, e bem , começa a gente a fazer o corte dos fenos . Não vê além aquele corte? INQ Pois. INF A gente com a gadanha, conforme andam aí eu ia , ou máquinas, corta a cortar os fenos . (...) Depois ata-os. Arrecada-os - porque o meu também já está arrecadado. Agora amanha a gente os terrenos para semear milho ou feijão, feijão-frade. E depois tem o feijão-frade agora (...) para a meada do mês que vem. Para o dia treze ou assim do mês que vem, a gente semeia-os. E depois quando estiver ali dum mês ou assim, a gente sacha-os. Depois quando é ali pela entrada de Setembro, a gente começa a colher as vagens. Bom, e vai a gente assim fazendo outros trabalhos também. Vai a gente assim. INQ Pois. O senhor este ano tem seara? INF A seara que tenho está cá na coisa de sua avó: é além (...) aquela seara que além está diante, cá na quinta.
MST32
INQ E que é que se punha assim no chão para, para a azeitona não... INF São os toldos. São umas Chamam lonas. A gente estende assim umas lonas, uns toldes toldos grandes, debaixo da árvore. E depois a gente de cima colhe para cima daquilo. E depois a mulher, quando acaba de colher a oliveira, (...) as mulheres ajuntam aquela azeitona. Vão-na alimpando limpando ou fazem um monte dela e depois lá se alimpa limpa : a gente assim ao vento, aos punhados, daqui agarra-se um punhado para além assim... Também se alimpa limpa . INQ E não, e não se pegava às vezes num pau assim mais comprido para... INF Pegava-se. (...) Também se pega pegava num pau para a gente assim bater na árvore. INQ Sim. INF Esses são 'asqueles' que andam de empreitada que é para colherem muita em pouco tempo. Agora os senhorios que é de jornada jornal não querem lá isso. Colhe a gente à mão! Sim, passa a gente a rama toda por a mão e a azeitona corre cá para baixo. Há muita maneira de a gente... INQ Pois há muita maneira de... INF Sim, há muita maneira de a gente trabalhar.
MST33
INQ1 Enquanto a seara estava no campo, para se apanhar como é que se fazia? Antes de a trazer para a eira? INF (...) Mas já estava ceifada ou por ceifar? INQ1 Não, ainda não. INF Ainda não estava ceifada? INQ1 Não. INF (...) Eram pessoas a ceifar com foices. Mulheres e homens. (...) Ainda não havia máquinas. (...) Agora já ceifam as máquinas. Mas quando eu era putozinho (...) era só a gente. 'Asqueles' senhorios arranjavam cordas de homens quase como é daqui além, além àquele rolheiro além, ou àquele caminho além. (...) Bom, era é conforme eram as searas que arranjavam. Pertenciam sessenta alqueires (...) a cada homem e mulher. Depois havia senhorios que semeavam aí vinte e trinta moios, era vinte ou trinta quinteiros que metiam. Depois aquilo era tudo debulhado assim nos ('vais'), tudo assim com gado, tudo à roda. Aqui arranjava um bocado. Ou andava aqui o gado a talhar naqueste... (...) Moíam aqueste, estendiam logo além outro, que era para o gado nunca parar. Quando moíam naquele, os homens andavam aqui a limpar aqueste; depois moíam naquele, estendiam outro - ou aqui, ou noutro lado -, passava o gado para aquele, limpavam aquele. Era sempre assim. INQ1 E como é que chamava a cada bocado que se punha ali para debulhar? Que n-, que não se punha a seara toda, de uma vez... INF Ah pois! Ele ainda lá ficava . Bom, que ele aquilo não se punha toda. INQ1 Como é que se chamava a cada bocado que se punha na eira, ant-, para começar a debulhar? INF Aquilo era vale. (...) INQ1 ... no vale? INF Pois, no vale. Aquilo Que ele é... Chamavam-lhe 'vais'. (...) Aí para (...) havia muitos 'vais' assim direitos. Vinha o tempo (...) assim da coisa , os 'vais' estavam soltos, estendia-se-lhe a semente em cima. O gado comia. Quando o gado moía aquilo, aquilo já lá não ficava pasto nenhum. Ficava só a terra. INQ1 Pois. INF (...) Mas era uma terra que não fazia terra. (...) INQ1 Pois. INQ2 Oh senhor Ambrósio, mas agarravam assim num, num ou dois molhos de, de trigo? INF Ai, dois molhos, minha senhora?! INQ2 Mais? INF (...) Até três e quatro carradas. E sete e oito, conforme eram. (...) INQ2 Mas tudo de seguida? Debulhavam tudo ao mesmo tempo? INF (...) Tudo seguido. Tudo assim assente. Começava-se aqui a assentar, assim aqui. Tudo, tudo. Uns de cima dos outros, uns de cima dos outros. Depois, o gado moía tudo aquilo por riba . Depois passava assim por cima (...) . (...) Havia forquilhas. Depois, voltava-se a semente toda assim para o outro lado. Todo! Aquela coisa toda, botavam assim tudo. Tornavam, vá de entrar para cima daquilo. Bom, o gado nunca parava. Depois moíam aquilo por riba , tornava-se a dar outro tombo para o outro lado, assim. Tudo! Dava três e quatro tombos ao dia, conforme. Chegava-se a ponto que aquilo ficar ali moidinho (...) ... Ficava o grãozinho todo, todo fora da palha! Sim, a gente chegava a puxar essa palha mas depois a gente com o vento... INQ1 Pois. Olhe... INF Com o vento, saía tudo.
MST34
INF Bom, a gente (...) anda a cortar e a gavela é conforme: se a semente é forte, com três ou quatro vezes que a gente bota a foice, faz-se uma gavela. Mas se a semente é fraquinha, a gente anda ali um bocado para arranjar uma gavela. INQ1 Gavela é aquilo que fica tudo na mão? INF Isso. Pois, que fica aqui apertado na mão. INQ1 E depois várias gav-... Se punha várias gavelas o que é que fa-, que é que fazia? INF Depois a gente, 'nasquelas' gavelas, faz a gente aqui uma paveia. Uma paveia paveiinha . (...) Junta aqui umas poucas, assim de além, assim, faz um redondo. Junta aqui umas poucas. Muitas que faz a gente assim... Bem, conforme. Vai a gente ceifando e vai assim andando por aí adiante, fazendo 'asquelas' paveias, fazendo 'asquelas' paveias. Em havendo vendo ali um bocado, a gente depois vai e ata. (...) INQ2 E fazem o quê? INF Faz Fazem uns molhinhos assim pequeninos, uns molhinhos, uns molhinhos pequeninos. Depois a gente ajunta (...) . Em estando ceifado a ceifar , a gente ajunta assim aos montes, (...) - vê além o monte que além tenho? INQ2 Como é que se chama aquilo? INF Aquilo é um rolheiro. INQ1 Pois. INF Agora em eu vindo para baixo, querem ir ver além os molhos (...) como é que são? INQ2 Pois, pois. Sim, sim. INQ1 E como é que, como é que atava os molhos? Com quê? INF (...) É com a mesma semente. INQ1 Como é que chama àquilo? INF É uma nagalheira. INQ2 Pois. INF Sim. É uma nagalheira. INQ1 Pois. INF Devia ter deixado além o saquinho logo que ainda lá voltava. (...) INQ1 Oh, deixe estar. Também não pesa muito. INF (...) Nem tem asas... Custa-lhe a segurar. Isto há assim (...) muitas maneiras. (...) Há pessoas - (...) nós, por acaso, damos assim um nome cá, aqui a certas coisas. Mas muitas pessoas não sabem 'asqueles' nomes, sabe? INQ1 Pois. INQ2 Pois. INQ1 Pois, é por isso. INF Muitas pessoas (...) não sabem esta coisa, como a gente apanhava as sementes.
MST35
INQ Diga-me lá como é que se fazia o vinho. INF O vinho?! (...) Agora andam cá esmagadores. E, bom, dantes também os havia. INQ Pois, antes. Antes, assim há algum tempo. INF (...) A gente tem uns pios. A gente lava os pés bem lavadinhos, as pernas. A gente vai com os pés, anda então... Eu o meu ainda o faço assim. INQ O que é que diz que está a fazer? Assim... INF Eu, que estou a fazer? Estou a pisar os cachos. (...) Estou a pisar os cachos. INQ E depois então aquilo que esmagava para onde é que corria? INF (...) Aquilo, o esmagador está de cima do pio. (...) Depois cai para baixo, para o pio. Estando esmagado, depois, é só mexido já com uns rodos, assim, umas coisas. (...) Chamamos-lhe nós uns rodos, que é para mexer. INQ E depois deixava ficar aquilo quietinho uns dias? INF (...) Depois aquilo ficava ali, depois fervia. Ferve. (...) Esborracha-se hoje, já só quase que amanhã de manhã que já está na hora , porque aquela balsa vem toda ao cimo. INQ E como é que chama àquele, aquilo enquanto ainda é doce? Ao líquido? INF Aquilo, se a gente (...) : "Bom, o vinho ainda está doce"! A gente depois bota-lhe a água no pio. Bom, (...) há assim uns preparos para ver (...) quando já tem a água. O vinho também é pesado. Bom, eu não o peso. Ele boto-lhe assim a água ao meu. Boto-lhe a que me parece. Mas assim as casas ricas têm assim um pesador , que é para pesarem, para verem a coisa da água, se tem ou não tem. INQ Portanto e quando ele se apanhava, portanto onde é que se, onde é que se trazia para, para, para aqui para... INF (...) Havia umas coisas de propósito, que era eram umas dornas. Dantes havia muitas. (...) A casa ainda aí tem uma. É uma coisa assim de redondo (...) . Tem um fundo e por riba está aberta. (...) Aquilo depois estava em cima de um carro como estes. Depois andavam as mulheres a colher, deitavam para dentro daquela dorna. Deitavam para dentro. Depois dali ia para os pios. Estava a dorna cheia. Vinha a junta com aquela carrada para os pios. INQ E quando, quando se andava a apanhar as uvas, INF As uvas. INQ depois quando se acabava voltava-se outra vez atrás, que era para ver se apanhava, se tinha ficado alguma coisa atrás? INF Não, não voltam . INQ Não? INF Não senhor. Em se acabando de colher, prontos! Se fica às vezes algum, fica. INQ Mas antes não se fazia voltar, portanto, não se costumava ver? INF Não. Ele a gente começa a colher e (...) aquilo, ele o que vai é às linhas. (...) Vai uma pessoa ou duas em cada linha, por aí fora, por aí fora. Chegava ao cabo da linha voltam para outra. (...) Acaba-se-lhe de chegar ao fundo, ao acabamento da vinha, pronto! Está a vinha colhida. INQ Pois. Olhe, e então aqui, aqui dentro de casa então, que é que se fazia ao vinho? Portanto, ele deixava-se a ferver ali uns dias no pio. E depois? INF (...) Pois estava. Depois tirava-se. Têm (...) uma coisa assim à roda do pio, que é (...) uma dorna, assim uma coisa quadrada. Caía para aquela dorna e daquela dorna (...) apanhava-se para pipos. Cá em casa, iam levá-los à vila. Tinham numas umas juntas, uns pipos.Punham em cima do carro. Enchiam aqui os pipos no pio e iam lá ficar a encher em cima . Lá em cima tinham uma torneira no pipo e tinham um cano, assim comprido. O vinho da torneira caía para o cano; ao fundo do cano punham uns cântaros a aparar... E outras pessoas a ficar com outras pipas! INQ Portanto, o pipo é maior do que a pipa? INF Os pipos são mais pequenos. INQ Os pipos são mais pequenos? INF São sim. INQ Portanto, até quantos litros ainda se chama pipo? INF Ah! Hoje há pipos de cinquenta litros, há pipos de cem, há pipos de duzentos litros. É assim. INQ Mas se for assim de quinhentos ainda se chama pipo ou já é uma pipa? INF Bom, se já é assim grande, é uma pipa. A gente leva mil litros, leva oitocentos litros ou leva mil e quinhentos litros. É assim. Quando é assim mais pequeno, chama-se-lhe um pipo.
MST36
INQ Fazia-se de quê? INF (...) É daquela balsa que vinha ao cimo do vinho. (...) Esborracha-se o vinho. Aquilo, sai o vinho. O vinho depois... Sai aquela coisa para cima e o vinho fica colado encalado por baixo. Depois o vinho sai por baixo. Tira-se o vinho todo e cai aquela balsa assim para baixo, para o coiso. Depois aquela balsa é espremida. Põe-se uns caramouços. Arranja-se uns montinhos (...) em cima. Depois o vinho sai tudo daquilo, fica aquela balsa seca, daquilo depois é que é que se faz a aguardente. INQ O que é um caramouço? INF É assim um monte assim. (...) Chamam-lhe agora cá um caramouço. INQ Pois. Portanto, e como é que se fazia a aguardente a partir da, da balsa? INF (...) Não está por aí umas alquitarras? (...) Umas alquitarras, assim: grandes, em redondo (...) . Têm a barriga grande para baixo e tem assim a boca assim em redondo por riba . Foi proibida por vir aquela coisa que tem assim uma cabeça, e depois leva lá a água e sai por lá a aguardente por um cano para fora. INQ E, portanto, a balsa entrava para aquela coisa mais larga? INF Pois. Depois acende-se o lume debaixo e aquilo depois ferve. INQ Pois. INF E depois, estando já a ferver, começa a aguardente a sair lá por riba. Lá por riba depois tem assim um depósito onde leva a água e o cano passa por aquela água. E depois tem assim um cano para além. Põe-se além uma coisa a aparar a aguardente. INQ Pois. INF É assim.
MST37
INQ1 O milho, depois, como é que se debulhava? INF O milho depois, se a gente quer, leva-o para uma eira. Logo além está uma (...) cá na quinta. Aqui atrás (...) daquesta quinta, para aí, está outra. A gente leva-o para uma eira e tem a gente um mangual ou um pau. Ainda não viu o mangual? Já? (...) INQ2 Eu cá não vi. INQ1 Ah, aqui ainda não. INF (...) Eu tenho lá. Eu, Ele , na minha casa, tenho lá. Tem lá a gente assim... Malha. (...) Que ele até com um pau se malha. A gente assim com um pauzinho pequeno: tuca-tuca-tuca. A gente malha.
MST38
INQ Quem deixa o milho na, na, no terreno, como é que faz à palha do milho? INF (...) Aquele que a não quer apanhar lá fica. INQ Ai deixa... Não a apanha, não a põe lá, não a, não a ajunta assim em molhos, não? INF Bem, alguns até têm-no assim em maçarocas. Têm Está o milho empinado . INQ Pois. INF Têm Está o milho empinado . INQ Esse, esse milho empinado tem algum nome? INF Ah, não tem. Está o milho empinado , vai o pessoal, tira assim a maçaroca. Conforme está o milho espetado na terra, a gente vai, tira a maçaroca. Tira além (...) nas vazilhas as vaginhas que a gente traz. E aquela palha lá fica empinada encanada . Depois vai os ratos , apanham (...) o que podem comer, e o que não podem pode lá fica.
MST39
INQ1 Olhe e o linho, ainda se lembra também de se cultivar aqui o linho? INF Ai, então ainda cultivava cultivavam até muito. (...) INQ1 Sim?! Então como é que era? INF (...) A minha mulher ainda andou muito tempo aqui. Enquanto criou os meus filhos, andava sempre a fiar. Agora é que já não. Não vê? Aquilo a gente semeava-o. Semeava-o (...) no terreno. Depois já estava feito, já estava assim - está caladinha, aborrecida - já estava assim amarelo, a gente ia (...) - (...) para isto. Ia a gente, depois arrancava-o. Arranjava assim a gente (...) aquelas gavelas assim pequeninas, atava aquelas gavelas. E a gente arranjava um caramouço, também assim uma medinha , (...) com aquele linho assim todo. Depois secava, depois naquela medinha secava. Depois estava seco, a gente tirava-lhe a semente. A gente agarrava à mancheia, (...) fazia assim e a semente caía-lhe para baixo. Bem, depois a gente, a semente apanhava-a. Depois já estava seco, a gente depois levava-o para a água, para 'asquelas' charcas das ribeiras, que eram assim fundas. Dava até a água aqui por riba do joelho à gente. A gente enterrava ali aqueles molhos. Enterrava aqueles molhos na água, punha-lhe pedras em cima. Estava ali (...) oito ou nove dias a curtir. Depois (...) ia a gente a secá-lo, a lavá-lo. Depois a gente arrecada os molhos. Lavava-se Lavava aquilo bem lavadinho, põe-o a enxugar ao sol. Em estando seco, depois vinha havia mulheres de propósito para arranjar aquilo. Depois havia assim umas maças, assim, quase de tamanho assim, tinham um rabo assim, para a gente pegar-lhe, em cima duma pedra: tuca-tuca. A gente maçava aquilo tudo maçadinho, tudo maçadinho - está caladinha -, assim. Bom, até (...) aquela palha, aquele linho, aquilo por dentro era rijo e só a pele por fora é que era... (...) Aquela pele por fora é que era boa. E por dentro o linho, aquilo era... (...) . Está a ver , (...) isto era a pernada do linho, só assim a casca por fora é que era boa e por baixo era rijo. Por baixo (...) era rijo e aquele pau por baixo depois partia e caía. Ficava então aquelas sobras . Ele Aquilo era rijo. (...) Depois de estar maçado, maçado, tinham os corchos. Se calhar, este aqui (...) até ele seria algum deles. E depois ia iam umas mulheres assim com umas - chamavam-lhe umas espadanas, chamavam-lhe umas espadanas. Punham-se em cima do corcho, assim. Estava o corcho assim . Aquelas mancheias do linho assim... INQ2 Pois. INF (...) Depois caía daqui, caía o pau todo. Só ficava a fibra.
MST40
INQ Mas pagavam o quê? Quando era, quando a semente estava boa, pagavam o quê? INF Pagava aquilo que a gente tratava . Eles depois, (...) quando arrendavam (...) a terra a uma pessoa, (...) diziam logo: "Você há-de-me dar tantos alqueires". - (...) - "Há-de-me dar tantos alqueires". Bom, a gente lá ia , (...) semeava a terra. Vinha a colheita. Se a semente está boa, a gente ia e levava-lhe aqueles alqueires que tínhamos tratado. Se a semente estava reles ruim , é como digo: "Ó Senhor de tal , olhe que a semente não prestava" - ou assim - "veja lá se me perdoava alguma coisa". "Lá vindes vós com o perdoar. Olha lá , ficarás mal, traz-me tantos alqueires". Bom, lá tirava às vezes dois alqueiritos do que a gente tinha tratado. INQ Pois. Olhe, e quando faziam o trato, como é que... Havia alguma... Como é que era? INF Não havia. Quando a gente fazia o trato: "Bom, a terra é tua, mas (...) dás-me tantos alqueires". Mas era só aquele ano. Para o outro ano, se se tornava a fazer, fazia fazia-se . Se não tornava a fazer, já não fazia. (...) Bom, mas aquele ano tinha que pagar a renda. Se não pagava a renda, não a tornava a fazer. E não lhe podia dar nada ao senhorio. Mas ele depois a terra já nunca mais... Nem me arrendava aquela nem mais nenhuma já. INQ Pois. INF Sempre tinha que fazer o contrato. Ou pouco ou muito, sempre tinha que fazer contas com ele.
MST41
INF A gente dantes comia muita vez. Não é era como agora. INQ Como é que era isso da comida? INF A gente levantava-se ainda de noite a juntar os molhos. Depois acabava de ajuntar os molhos, depois comia ali uma buchazinha. Depois, lá para essas nove ou dez horas ia a gente ao almoço, tomava a gente o almoço. Depois vinha o meio-dia ia a gente a jantar. Depois vinha ali por essas cinco horas da tarde, ia a gente a merendar. Era a merenda. - Está quedinha! - Depois vinha ali já à noite era a ceia.
MST42
INF Bem, as mulheres trabalhavam quase tanto como o homem: (...) iam à água, faziam de comer. INQ1 Pois. Depois recebiam menos no fim. INF Pois, depois recebiam menos ao fim. (...) 'Asquelas' que saíam comer, agora saíam umas ... Aquilo era aos dias ao fazer de comer. Hoje ia iam umas, amanhã vão outras, no outro dia vão outras. E à a água também era o mesmo. Eram assim rendidas . INQ2 Olhe e essas pessoas vinham de fora, muitas vezes? Não eram da terra? INF Ah! Eram cá todas de Monsanto. (...) Nós, cá em Monsanto (...) andavam deram gente para... aqui parece que estas coisas tudo em volta, tudo em volta, (...) a apanhar as searas. INQ2 Ai sim? INF Davam sim. INQ2 Mas também iam para fora? INF Não. Bem, só, por fim é que iam para a Terra Fria, alguns. Mas isso iam só os homens. Aquele que tinha vagar é que ia. Vai aqui... Apanhavam aqui para Penamacor, para aqui para a Idanha. Aqui nestes (.../N-P) havia gente para tudo! INQ2 Olhe e eles vinham todos os dias ficar a casa ou ficavam lá? INF Levavam fato , e dormiam lá no corte. INQ2 Levavam o quê? INF Fato, comida , para lá dormirem. Levavam fato e levavam merenda (...) . Bom, levavam logo a merenda nas segundas-feiras para toda a semana. Aos sábados é que é que vinham. INQ2 E o que é corte? INF O que é o corte? O corte... O corte (...) , agora vinha aqui o corte da semente (...) e era aqui. O pessoal estava aqui encampado, cortava aqui este bocado todo, e depois a semente (...) já estava mais para além. Daqui mudavam para além. Assim iam mudando assim para o pé da semente. INQ2 E ficavam a dormir ali de noite? INF Ora iam. Mudavam o fato, mudavam logo tudo, arranjavam outras camas. As camas, a gente deitava-lhe um bocado de terra, um bocado (...) daquele restolho. Ficava assim, daquela palha que a gente cortava por baixo. Depois arranjavam ali um coiso, arranjavam ali umas camas. INQ2 E ficavam... INF Pois. No terreno. Andavam lá agora... INQ2 Com mantas era? Levavam mantas? INF Pois, então não levavam? Pois, levavam mantas (...) para se deitarem. Por causa do frio e para dormirem. Pois era assim. INQ1 Era uma vida dura. INQ2 Era muito pior que agora. INF Oh, oh. A gente agora é uma fidalga. É uma fidalga. Quando me eu criava, a gente comia só pão, daquele pão preto de centeio, e às vezes queria-o a gente mesmo seco e (...) nem seco a gente o apanhava. E agora a gente não pode comer o trigo, come é o conduto. Naquele tempo, (...) o pão (...) ficava com a côdea de baixo e de cima fora, e o miolo ficava despegado, minha senhora. O miolo ficava despegado (...) da côdea. INQ2 Mas porquê? INF Eram as farinhas que não andavam boas - está caladinha, anda lá. As farinhas não andavam boas e depois iam para o forno, e o forno, ao cozer, largava a côdea (...) do miolo. (...) Mas isso não era sempre.