Gabriela Vitorino integrou desde muito cedo a equipa do Atlas Linguístico de Portugal e da Galiza (ALEPG), projeto lançado e coordenado por Luís Filipe Lindley Cintra, no âmbito do Centro de Estudos Filológicos, mais tarde Centro de Linguística da Universidade de Lisboa. Percorreu Portugal de lés a lés, aplicando o extenso questionário do ALEPG, em estadias de pelo menos uma semana em cada localidade, onde sempre fazia amizades, pois a sua natural capacidade de empatia era indissociável da extrema (quase obsessiva) competência profissional. Desta longa experiência de trabalho de campo, guardava muitas histórias, divertidas ou comoventes, de que era exímia contadora, embora nunca tenha sido possível convencê-la a pô-las por escrito. Foi inovadora ao conceber o Atlas Linguístico do Litoral Português, sua tese de doutoramento, e era profunda conhecedora do mundo rural e piscatório português, um conhecimento que dava frutos quer na sua investigação dialetológica quer no seu comprometimento social e político, que era um traço essencial do seu perfil, não tendo sido nunca nem uma investigadora de gabinete nem uma investigadora fechada no seu gabinete. Numa época em que pouco se falava de internacionalização, participou juntamente com a equipa do ALEPG, no projeto transnacional de larga escala Atlas Linguarum Europae (ALE) e, mais tarde, no Atlas Linguistique Roman (ALR), num e no outro tendo sido autora de mapas dialetais, ou contribuído para a sua elaboração. É coautora do Atlas Linguístico dos Açores e integrava a equipa do Atlas Linguístico da Madeira, em preparação. Conhecia como só também o João Saramago o arquivo sonoro de largas centenas de horas de gravação reunido durante as campanhas de trabalho de campo do ALEPG, ALE e outros Atlas linguísticos e empenhou-se ativamente na sua preservação, conseguindo financiamentos de difícil obtenção para as remagnetizações periódicas das fitas originais, mais tarde para a digitalização de todo o arquivo sonoro. Através do projeto Madison, que concebeu, deu a conhecer amostras sonoras dos dialetos portugueses continentais e insulares de todo o território português. Tinha em curso a organização do também extenso arquivo fotográfico obtido no terreno no decurso dos inquéritos dialetais.
Deu formação e acompanhou os trabalhos de sucessivas gerações de jovens investigadores (tendo passado pela equipa do Atlas um grande número de bolseiros, alguns dos quais seguiram a carreira académica) e foi sempre uma força agregadora, tão calorosa quanto exigente, desarmantemente ela própria. Para o CLUL e para a comunidade de dialetólogos, dentro e fora de Portugal, será sempre uma referência. Para os amigos, uma memória preciosa e feliz, presente e reconfortante, mesmo se fisicamente ausente.